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Crítica

Ouvimos: Deafheaven, “Lonely people with power”

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Ouvimos: Deafheaven, “Lonely people with power”

Não parecia que o Deafheaven, considerado uma banda de blackgaze (black metal + shoegaze) iria voltar para a porrada. Infinite granite (2021), álbum anterior do grupo, era basicamente um disco de pós-punk e shoegaze, com vocais melódicos e melodias “bonitas” no sentido real da palavra – e foi um disco que, de certa forma, expôs que sempre houve uma vida deprê e celestial até mesmo no metal mais apodrecido.

Era um caminho que a banda já vinha seguindo, e que já havia sido bastante tentado no disco anterior a Infinite – Ordinary corrupt human love (2018), álbum que alternava entre as referências de Mercyful Fate e Drop Nineteens. Só que no meio da história houve uma mudança para a Roadrunner (leia-se Warner) e curiosamente, foi quando a banda voltou a se interessar em fazer som bastante pesado. Lonely people with power, o novo álbum, por pouco mal pode ser chamado de “disco de blackgaze”: a maior parte do material consiste num black metal com referências de pós-punk e um ou outro toque de shoegaze, além de sons que poderiam estar num disco da gravadora Ipecac.

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Doberman, The garden route e Magnolia, por exemplo, são músicas com um clima de black metal deprê – e que estão dentro do contexto do rótulo post metal, que muita gente prega no Deafheaven. Os diferenciais do grupo surgem com mais intensidade na sequência: Heathen soa como se uma banda de black metal fosse reler Andrea Doria, da Legião Urbana. Amethyst começa em tom quase cool, contemplativo, como se fosse uma balada de uma banda tipo Pulp ou Travis – mas ganha parede de guitarras e gritaria lá pela metade, além de um segmento pesado, belo e triste logo depois. Body behavior é pós-punk metal.

Para quem é fã de metal e olha torto para o Deafheaven (ah, dá um tempo, vai), o grupo até solta guitarras com ambiência típica de banda de doom metal em Revelator – música que por sinal, mexe com ruídos e silêncios (cuidado com os sustos!!). A dobradinha Incidental III, com participação de Paul Banks, do Interpol, e Winona, são quase uma onda sonora só, com guitarra, cordas e ataques de bateria encapsulados. No final, The marvelous orange tree, surfando a mesma onda de peso, soa como um Mogwai violento.

Em Lonely people with power, o Deafheaven parece um som pesado e impiedoso que vem do espaço, como um cometa prestes a passar pelo céu, ou um asteróide que vai se chocar com a Terra. Parece que dessa vez, a noção deles de “paraíso” volta a se parecer com um útero de guitarras pesadas.

Nota: 9
Gravadora: Roadrunner
Lançamento: 28 de março de 2025.

Crítica

Ouvimos: Smut – “Tomorrow comes crashing”

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No terceiro disco, o Smut funde grunge, pós-punk e dream pop com letras angustiadas e distorções, alternando urgência e climas melódicos.

RESENHA: No terceiro disco, o Smut funde grunge, pós-punk e dream pop com letras angustiadas e distorções, alternando urgência e climas melódicos.

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O Smut veio de Cincinatti, Ohio, e radicou-se em Chicago. Desde End of Sam-Soon (2017), dedicam-se a uma curiosa mescla de rock pauleira, guitar rock e pós-punk – mistura de gêneros que nos anos 1990 era simplesmente chamada de “rock alternativo”. Após mudanças de formação, afiaram a receita e ganharam mais peso no terceiro disco, Tomorrow comes crashing. Um álbum de distorções aparentes, letras angustiadas e climas sombrios mesmo quando as melodias têm climas solares – como na abertura, com o indie rock funkeado e pesado Godhead.

A poética de Tay Roebuck, cantora do grupo, é bem crua – os vocais dela volta e meia lembram uma versão grunge de Dana Margolin, do Porridge Radio. Syd Sweeney, pesada, ágil e distorcida como uma canção do Hüsker Dü, é punk anos 1990, com letra apontando para relacionamentos tóxicos e falidos. “Construída com fardo pesado e selada com lições aprendidas / fui feita para durar, selar as rachaduras e vencer, pelo que valer a pena (…) / você me desnuda para me sentir bem, nega meu discurso de vendas perfeito”, diz a letra, encerrada com 30 segundos de desespero vocal.

  • Ouvimos: Porridge Radio, Clouds in the sky they will always be there for me
  • Ouvimos: Deradoorian – Ready for heaven

Nem só de urgência vive o disco. O clima muda na melodiosa Dead air, dream pop com peso e clima misterioso, e se mantém relativamente tranquilo no pós-punk Waste me e na vibe mágica e semi-acústica de Ghosts (Cataclysm, cover me). Mas Tomorrow comes crashing apresenta também heranças do grunge nas ferozes Spit e Burn like violet, une blues, folk e balanço em Touch & go, e invade a área do jangle rock em Crashing in the coil. Já Sunset hymnal, no fim, é som com guitarra batida e andamento estradeiro e urbano – até que uma guitarra distorcida entra e leva o Smut para seu terreno familiar.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Bayonet Records
Lançamento: 27 de junho de 2025.

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Crítica

Ouvimos: Miçanga – “Velhos rabugentos não falarão sobre Malk Espanca em 2099”

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RESENHA: Rapper com flow perturbador e irônico, Miçanga toca no nervo exposto das lutas diárias em Velhos rabugentos não falarão sobre Malk Espanca em 2099, álbum que une hip hop e experimentalismos.

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Um dos convidados do álbum Cybertrópico, da banda Disstantes (que resenhamos aqui), o rapper Miçanga – nome artístico de Tiago Malta – destaca-se com um álbum solo de inéditas, com título enigmático: Velhos rabugentos não falarão sobre Malk Espanca em 2099. O repertório do álbum segue o ritmo perturbador e irônico de De noite poeta de dia operário, parceria de Miçanga com o Disstantes, que narra o dia a dia de quem vive entre a ralação e a criação de versos, e usa as horas perdidas no transporte público para escrever.

Por acaso, são justamente o tempo e os jogos diários de azar ligados a ele, que dão o tom no começo do álbum, com Teu futuro é meu passado. Um rap que mistura synthpop, distorção e provocação em doses iguais. “Voltando ao tópico do aqui agora / acho prudente você se focar nele / pois toda angústia vem de uma viagem do tempo mal planejada”, dispara. Viagens no universo cyber tomam conta do rap forró A lenda leiteira enferrujada do burrico espacial, com som de videogame.

Levante para um amigo é samba-rap com união de drum’n bass e samples de narração de futebol. Experimento para se criar + um anti-herói é prosa-poesia falada, com programação simples, batidão com “foda-se” repetido várias vezes, e letra demolindo sebastianismos. “Acreditar num heroísmo é um fascismo disfarçado, esperando a ser pregado, para que você homem comum, não tenha nenhum plano a superar ou a repensar os problemas”, diz.

Malk Espanca tem uma parte 2, predominantemente experimental e instrumental, que funciona a golpes de baile funk (Satélites, cicatrizes, lousa, acrílico), eletrohardcore (a bizarra Remoção de cola do braquete sem broca e espancamento, que põe BPM acelerado num motorzinho de dentista) e ruído punk (os 14 segundos de Lá embaixo).

A experimental e falada Ode ao papa está mais para “ódio (com zoeira) ao Papa” (“Papa, você é um cara legal / Papa, você é sensacional / Papa, será que você papou criancinhas?”) e Maracatu de cyborg põe mangue-bit robótico e marcial na história. Já Power juice forever (Brazilian cyber funk) é uma colagem perturbadora e pornô no estilo dos Residents. Uma viagem delirante e crítica pelo futuro – ou pelo presente mal disfarçado e mal embrulhado.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8
Gravadora: Independente
Lançamento: 30 de abril de 2025.

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Crítica

Ouvimos: Pedro Palma – “Emocional”

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Ouvimos: Pedro Palma - "Emocional"

RESENHA: Em Emocional, Pedro Palma mistura pop, rock e ironia para narrar dores afetivas e identitárias com intensidade e lirismo.

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Talvez Pedro Palma seja o primeiro artista brasileiro a se dizer influenciado pelo popstar britânico Yungblud. E de fato, o clima existencial e dramático dos discos do inglês, oscilando entre o emo e o metal, paira bastante sobre as 14 faixas de Emocional, sua estreia solo. Pedro insere boas doses de ironia na equação, como no single P.Q.P., que gira em torno dos tropeços sentimentais de quem se joga de cabeça num relacionamento… e se arrebenta logo depois (“já me falaram que a expectativa é a mãe da merda / mas eu insisto em me entregar sem nem pensar na queda”).

Emocional é dividido em duas partes: a primeira é mais rock do que sofrência, a segunda é de sofrência pura com elementos roqueiros. O repertório, a exemplo de P.Q.P., é mais voltado para feridas emocionais expostas, como no emo pós-pós-adolescente de 27 (“vejo meus ídolos olhando bem pra mim / como um convite que não dá pra recusar / muito estranha essa sensação / de que eu não fui feito pra durar”) e o som pesado e afirmativo de Emocional e Eu quero me explodir – esta, de versos reveladores e graves: “dizem que eu faço tudo ser mais complicado / que o mundo me odeia só porque eu sou viado / e minha ansiedade não passa de uma invenção / você é um péssimo exemplo pro seu irmão”.

O tom começa a ficar mais baixo em músicas como a balada O que você fez comigo não se faz, o post-rock de FM Queda livre e a tristonha Se eu te disser. No final, o Pedro do passado e o do presente encontram-se na balada épica Para Pedro: “Tudo que eles falam, e os dedos que apontam, não podem te perfurar assim / não há nada de errado em ti”.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 7,5
Gravadora: Deck
Lançamento: 20 de junho de 2025

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