Lançamentos
Radar: Guandu, Black Pantera, Stefanie, Superafim e outros sons nacionais

O carro do Radar do Pop Fantasma passando na sua porta com seis novidades nacionais. Duas delas, por sinal, lançadas hoje (Guandu e Apenas Juno), além de coisas que já estão na nossa mira há alguns dias. Ouça no último volume.
Foto Guandu: João Orlando/Divulgação
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GUANDU feat. MARINA MOLE, “OTIMISTA”. Originalmente uma dupla voltada ao slowcore (o EP da fase anterior, Planos em cima de planos, foi resenhado aqui), o Guandu virou trio e deu uma ligeira mudada no som, mas a paixão pelo lo-fi continua a mesma – Otimista, o novo single, foi gravado em fita K7, e evoca o som das guitar bands dos anos 1980/1990, com participação de Marina Mole – e tem uma letra “quase otimista” (palavras da banda) sobre como é legal ter uma boa companhia para sair dos momentos deprês da vida. Em maio sai o primeiro álbum do grupo, pelo selo Feitio.
BLACK PANTERA, “SELEÇÃO NATURAL”. O grupo de metal mineiro – já escalado para tocar no festival The Town – andou fazendo vários lançamentos quase ao mesmo tempo: a fita K7 do álbum mais recente da banda, Perpétuo; um registro ao vivo no Palco Supernova do Rock In Rio (gravado em 2024 e lançado mês passado nas plataformas digitais); e um single novo, Seleção natural. Entre evocações de metal e hip hop, a música é outro recado na lata: “machista, homofóbico / fã de milionário / pega seu privilégio e vai pra casa do caralho!”
STEFANIE, “DESCONFORTO”. “Essa música nasceu da dor”, diz Stefanie. E não é força de expressão. Em Desconforto, ela traduz o racismo cotidiano: da criança negra que não é chamada pras festinhas à advogada confundida com secretária. A faixa antecipa o disco Bunmi (lançamento dia 25 de abril), produzido por Grou e Daniel Ganjaman. O clipe tem direção de Gabi Jacob. Dói, e precisa ser dito – e ouvido: Stefanie conta que fez a música para transmitir essa dor para dividir com amigos que viveram experiências semelhantes, e para que “pessoas que não vivenciam o racismo no dia a dia possam entender como ele se manifesta em nossas vidas”.
SUPERAFIM feat DUDA BEAT, “MOUTH”. Saiu Mouth, o primeiro EP da nova banda Superafim, formada por Adriano Cintra e Clara Lima — ambos ex-Cansei de Ser Sexy. São cinco faixas que apostam alto: produção caprichada, refrões que colam instantaneamente e um feat com Duda Beat na faixa-título, que flerta com o melhor do pós-punk-pop. O clipe, por sua vez, parece gameplay de um videogame alternativo: explosivo, retrô e envolvente. A brincadeira já era séria, e agora tem cara de hit.
APENAS JUNO, “SOBRE AMORES DISTANTES”. Um synthpop quase espacial, com letra romântica, esparançosa e tristonha (note o nome da música) e batida cardíaca – é o single novo do compositor que usa o codinome de Apenas Juno, e cuja letra evoca um momento especialmente complicado na vida dele, em que Juno vivia uma espécie de “bifurcação emocional” (quem nunca?). “A gente sabe quando tem que ir, mas a gente sente quando é pra ficar”, diz.
JOSYARA, “FESTA NADA A VER”. Avia, terceiro álbum de Josyara, já está entre nós, trazendo o violão e a voz dela disputando espaço na frente. Uma das faixas que mais têm cara de hit é Festa nada a ver: um bolero indie/folk sobre um amor que termina na festa errada, do jeito mais estúpido possível. Tem ecos de Gonzaguinha, Joanna e Maria Bethânia, e um final que não é exatamente trágico: a narradora se despede dizendo que vai brincar em outros cais. Nada de gilete no pulso – só maturidade poética.
Crítica
Ouvimos: Mark Pritchard & Thom Yorke, “Tall tales”

DJ e produtor, o britânico Mark Pritchard é uma companhia perfeita para Thom Yorke mergulhar em experimentações. Além da experiência de ambos em criar atmosferas sonoras densas e sensoriais, há um espírito comum: o gosto por projetos paralelos. Pritchard coleciona codinomes e colaborações; Yorke, por sua vez, é o tipo de artista que raramente se acomoda.
Tall tales, projeto que une música e filme, nasceu de um encontro entre os dois em 2011, quando Pritchard remixou faixas do Radiohead, e começou a tomar forma em 2020, em plena pandemia. Foi justamente o isolamento que impulsionou a colaboração: Thom, entediado em casa, pediu que Mark lhe enviasse ideias para trabalhar. O que se seguiu foram cinco anos de trocas virtuais — mensagens, conversas no Zoom — sem um único encontro presencial.
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A proposta era buscar sons não convencionais. Mark cavou fundo em synths fora de linha e softwares obscuros, enquanto Thom deixou de lado guitarras e investiu em sintetizadores e distorções vocais. O resultado? Um disco sem calor, nascido da distância e da incerteza — e que reflete exatamente isso. E não entenda o “sem calor” como depreciativo: o gelo faz parte da aventura.
Mesmo para os padrões já estranhos de Yorke, Tall Tales soa dissonante, tenso e desolador. A fake in faker’s world e Ice shelf, que abrem o disco, sugerem que estamos sempre à beira de um abismo — a segunda amplifica essa sensação com uma sirene circular e hipnótica. Bugging out again até soa etérea, quase sonhadora, mas só depois de atravessarmos um corredor de vocais distorcidos e espectrais.
Do início ao fim, Tall Tales é um álbum gelado. Suas letras lembram fábulas, e suas faixas se alinham ao modelo de “não-canção” explorado pelo Radiohead em Kid A. Back in the game e Gangsters poderiam muito bem estar em trilhas de videogame — assim como a batida seca e minimalista de This conversation is missing your voice evoca o som vintage de um Tele-Jogo (lembra disso?). The white cliffs traz um blues ambient repleto de sintetizadores, com clima espectral e distante, quase como uma miragem — uma imagem potente para um mundo confuso como o de 2020. Já a faixa-título sintetiza o mundo como um deserto, em clima sombrio.
Entre tantas abstrações, The man who dances in stag’s head se destaca por lembrar uma canção de verdade — ainda que no sentido mais torto do termo. É uma balada que remete a Lou Reed, com pandeirola, vocais quase falados e atmosfera desolada que remete a Here she comes now, do Velvet Underground. Já a faixa final, Wandering genie, mistura vocais sobrepostos, cordas e sintetizadores até virar puro vento — como se tudo fosse varrido por uma força invisível.
No fim das contas, é art rock — mas bem mais art do que rock puro, como boa parte da trajetória do Radiohead.
Nota: 9
Gravadora: Warp
Lançamento: 9 de maio de 2025
Crítica
Ouvimos: Shn Shn, “Serpent’s skin”

Vinda do Canadá, a musicista, compositora e cantora Shn Shn (nome verdadeiro: Shanika Lewis-Waddell) se dedica a um experimentalismo eletrônico que lembra bastante a vibe dos anos 1980 – e daquele som que costumava ser chamado de new age. A música de seu primeiro álbum, Serpent’s skin, é um ambient relaxante, que se cruza com vários estilos, e que alterna silêncios e sons em poucos segundos. Outerlands une esse design sonoro com reggae, Divergent paths é um soul eletrônico que lembra um tema de filme (com direito a conversas ao fundo) e Home is another place cria um ambiente relaxante e caseiro, com teclados, cordas e poucas notas.
O som esparso do disco traz outras coisas na receita. Há um toque forte de jazz e afrobeats distribuídos pela sonoridade de Serpent’s skin. Um som que lembra uma steel drum coadjuva a visonária Glimmer, batidas afro criadas por baixo, teclados e cordas criam New horizons e um concretismo musical cavernoso dá as caras em Tender bodies. Anomalies e Blip in the… são temas de piano, marcados por ruídos de fundo, barulhos marítimos e por uma microfonação que revela o ruído do banquinho usado por Shn Shn. Já Flow é um ambient “voador” e percussivo. Um disco que convida à escuta atenta, e que revela novas camadas a cada audição.
Nota: 8
Gravadora: Stadik Records
Lançamento: 28 de março de 2025.
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Crítica
Ouvimos: Big|Brave, “OST”

O som do grupo canadense de metal experimental Big|Brave já está bem longe de ser um dos mais acessíveis do mundo – sonoridades como rock industrial e shoegaze são pouca areia na hora de definir a banda. Mas dessa vez o grupo foi longe demais: OST (original soundtrack, “trilha sonora original”) é uma “trilha sonora” feita sem que haja um filme para o qual ela tenha sido composta – e a banda entrou em estúdio sem ter nenhuma composição pronta, só com a disposição para improvisar em cima do que aparecesse.
Esse clima de Araçá azul do demo perpassa todas as oito faixas do disco – todas chamadas Innominate, variando apenas o número delas (de I a VIII). Quem quer conferir sons aterrorizantes, pode pular para a Innominate nº II, com notas sombrias de piano, ruídos de estática e um zumbido que parece alguém bem de longe querendo dizer algo. O disco abre com ruídos que vêm de longe (na Innominate nº I), segue com tremeliçações sonoras (na III) e com algo que se assemelha a barulho de metal vibrando (na IV) – praticamente uma enciclopédia experimenta musical, que soa mais como os ruídos de fundo de um filme do que com a música usada para um galã beijar a gatinha, ou a câmera mostrar um cenário infinito.
Se você não estiver com a menor vontade de se irritar, recomendamos pular a Innominate nº V – os barulhos soam tanto como um inseto voando, que chega a dar vontade de pegar um jornal para matar o bicho. A Innominate nº VII volta vagamente para o clima de terror da segunda faixa, com gritos que parecem vir de uma comemoração, mas ganham logo um tom de horror – em meio a sons que lembram um berimbau sendo tocado e tratado eletronicamente. Ousadia musical para poucos, e poucas.
Nota: 7,5
Gravadora: Thrill Jockey Records
Lançamento: 25 de abril de 2025
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