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Crítica

Ouvimos: Cardi B. – “Am I the drama?”

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Cardi B volta feroz em Am I the drama?, misturando vingança, ostentação e caos pop num rap afiado, teatral e cheio de provocações.

RESENHA: Cardi B volta feroz em Am I the drama?, misturando vingança, ostentação e caos pop num rap afiado, teatral e cheio de provocações.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8
Gravadora: Atlantic
Lançamento: 19 de setembro de 2025

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Aparentemente a pergunta de Cardi B no título de seu segundo disco, Am I the drama? (“eu sou o drama?”) vem em clima de “ah, pronto, virei assunto agora de novo!”. Na real, trata-se de uma maneira que Belcalis Marlenis Almánzar (nome verdadeiro da rapper novaiorquina) arrumou para mostrar que ao contrário de qualquer outra artista que queira aparecer, ela simplesmente aparece. O passado conturbado de Cardi já garante que seus raps vão acabar atraindo atenção: ela foi integrante de gangue, enfrentou violência doméstica em casa na adolescência, passou por relacionamentos abusivos quando era bem nova, e trabalhou como stripper para pagar seus estudos.

Bom, vale dizer que o presente e o passado recente de Cardi também seguem cheios de assunto: brigas com o ex-marido (o rapper Offset), encrencas com Nicky Minaj, acusações de agressão, brigas na justiça com outros rappers e com criadores de conteúdo, um novo relacionamento (com o jogador da NFL Stefon Diggs). Tudo isso, misturado num caldeirão, dá as caras em Am I the drama?, um disco que, seja lá qual assunto venha pela frente, fala basicamente de vingança, ódio e verdadeiro desprezo por um monte de “vadias” que copiam o visual dela, falam mal dela pelas costas e não chegam aos pés do sucesso que Cardi faz desde a época em que postava vídeos na rede social Vine e lançava mixtapes. E de fato, o interesse pelos passos dela, na música ou na vida real, sempre foi tão monumental quanto o êxito de seu primeiro álbum, Invasion of privacy, lançado no distante ano de 2018.

  • Ouvimos: Earl Sweatshirt – Live laugh love

Musicalmente, Am I the drama? tem menos barrigas do que parece (são 70 minutos de disco!). O foco é quase sempre num rap sombrio e ameaçador que volta e meia é invadido por um clima mais, digamos, solar. O som beira o hyperpop na bacana Pick it up (com Selena Gomez), ganha mumunhas psicodélicas em Man of your word, traz o r&b da antiga de volta em Principal (releitura-interpolação de Pleasure principle, de Janet Jackson) e invade a área do trap e do rap latino algumas vezes. Na maior parte do tempo, Cardi faz a rapper novaiorquina apressada, impaciente, disposta a explodir rinhas de rimas e a humilhar competidores.

Até Cardi mandar pérolas da ostentação e da tiração de onda em faixas como Hello, Magnet e a ágil e ousada Imaginary playerz (cuja letra tem uma boa frase: “essas vadias não sabem a diferença entre o que é vintage e o que é arquivo”), o/a ouvinte encara Dead, com participação da cantora de r&b Summer Walker, e uma narração que fala em uma onda de assassinatos de blogueiros, jornalistas e rappers mulheres – sendo que Cardi B, a principal suspeita, está solta. A barra é pesada de verdade, e ganha clima gangsta em Up, rap sacana em que ela avisa que “moleques falidos não merecem nenhuma buceta” e manda as vadias lamberem o pau imaginário dela.

Em Pretty and petty Cardi solta os cachorros na rapper Bia, de Boston – que tirou onda com Cardi em sua faixa Sue me e se tornou a maior desquerida dela. E avisa aos jornalistas que vai apontar uma arma para a cabeça deles, e pedir que eles deem “cinco nomes de músicas da Bia, agora!”. Em Salute, ora vejam só, Cardi saúda os verdadeiros amigos e amigas, coisa bem rara num disco tão cheio de raiva.

Agora, em faixas como Man of your word, o assunto é o ex-marido – a rapper reclama das mentiras e traições, admite que chegou a se interessar mais pela carreira do que pelo casamento (uma reclamação feita por ele em entrevistas), mas conta que Offset era sua “versão maligna”. What’s going on, com participação de Lizzo, e feita com uma interpolação de What’s up?, das 4 Non Blondes (pode acreditar, ficou ótimo!), traz Cardi B arrependendo-se de ter feito vista grossa para montes de infidelidades do ex-companheiro (“deixei passar a merda tantas vezes que ele se sentiu confortável”, vocifera).

Vingança e sacanagem dividem espaço em faixas como Better than you (com Cash Cobain) e On my back, mas o pau come mesmo é em Killing you hoes, rap sinuoso e próximo do boombap, e uma das músicas onde a palavra “bitches” mais aparece no álbum, em meio a ótimas frases: “É tarde demais, vadia, eu sou uma história de sucesso / tudo sobre vocês, vadias, é falso, eu não gosto disso / as vadias te abraçam para saber onde colocar a faca”.

Agora, ousadia de verdade acontece na pornográfica WAP, gravada com  Megan Thee Stallion. Uma música que, na real, nem é novidade: saiu em 2020, rendeu bate-bocas na mídia no lançamento e acabou entrando no disco da maneira que foi gravada porque Cardi bateu o pé (sente o drama: “sim, você está transando com uma buceta molhada / traga um balde e um esfregão para essa buceta molhada”).

Basicamente, Am I the drama? é Cardi B fazendo sua versão pessoal e muito solta do rap como CNN negra, mostrando que a fama atrai coisas bem estranhas e ganhando dinheiro com sua própria história. Em meio a tudo, ela se diverte bastante.

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Ouvimos: Katy da Voz e As Abusadas – “A visita”

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Álbum novo de Katy da Voz e As Abusadas, A visita mistura funk, punk, metal e synthpop em faixas violentas, sexuais e empoderadas, homenageando Claudia Wonder com energia feroz.

RESENHA: Álbum novo de Katy da Voz e As Abusadas, A visita mistura funk, punk, metal e synthpop em faixas violentas, sexuais e empoderadas, homenageando Claudia Wonder com energia feroz.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 10
Gravadora: Independente
Lançamento: 22 de outubro de 2025

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Travesti ativista do underground paulistano oitentista, Claudia Wonder era chegada em doideiras como cantar banhada de sangue, ou numa banheira de groselha – numa ocasião, a groselha foi parar no olho de João Gordo, segundo o próprio contou em entrevistas. Também esteve à frente de bandas de rock como o Jardim Das Delícias, grupo com sonoridade pós-punk (a música-título Jardim das delícias, que está no YouTube, lembra o Teardrop Explodes) que contava com integrantes do grupo paulistano Kafka na formação.

  • Ouvimos: Mia Badgyal – Mucho sexy

Daí que Claudia é bastante lembrada como inspiração em A visita, novo álbum do trio Katy da Voz e as Abusadas – basicamente uma união azeitada de funk, house music, punk e metal, indo além de nomenclauras como electroclash e outras coisas. O disco começa com Santo, synthpop com bateria de escola de samba, spoken word, participação de Lynn da Quebrada, guitarra pós-punk e uma anti-oração na letra (“me traga saúde, saudade, dinheiro / você está me escutando, santo?”). Navalha une metal, funk e batidão dance, numa porrada existencial e musical. Na força do ódio mantém um clima unindo batida forte, sexo e zoeira.

Existencialmente, A visita não é putaria pura e simples – como rola no disco de Mia Badgyal, Mucho sexy, é afirmação, empoderamento, sexo e uma estranha vontade de devolver os maus-tratos do mundo numa moeda bem mais violenta e sexualizada. Daí tem a dance music derretida e pesada de Sufocunty e o metal dance de Salto (com MC Taya, que ajuda a música a quase se transformar em algo parecido com um Ministry Miami-bass).

Tem também a zoação de rolar de rir de QRcude – esta, um funk violento que lembra Cabaret Voltaire e Alien Sex Fiend, e que pede que você escaneie “seu cu na porra do Qrcude / cria um código / põe um foto / para ver sua nude (…) / e já podemos foder ele / a partir de hoje”. No final, Disco inferno, um synthpop vingativo e cheio de altas energias, que preconiza: “eu vou pro inferno / e quando eu achar essa vagabunda no inferno / eu vou matar ela de novo”.

Pode ser que não aconteça com Katy da Voz, Palladino Proibida e Degoncé Rabetão o que elas pedem no funk pesado Famosa (“famosa eu quero ser / acordar às 8h / e aparecer no Mais você”, gritado entre samples do “top de 5 segundos” da Rede Globo). Quem perde é a televisão matinal brasileira, por não programar essa afronta musical e underground.

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Ouvimos: Soulfly – “Chama”

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Soulfly acerta com Chama, 32 minutos de peso, ambiência e rituais sonoros: thrash, hardcore, doom e groove se misturam num disco curto, intenso e surpreendente.

RESENHA: Soulfly acerta com Chama, 32 minutos de peso, ambiência e rituais sonoros: thrash, hardcore, doom e groove se misturam num disco curto, intenso e surpreendente.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 9
Gravadora: Nuclear Blast
Lançamento: 24 de outubro de 2025

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Enquanto o Sepultura vira discussão de bar (“vai acabar ou não?”, “vai ter reunião com os irmãos Cavalera ou não?”, “poxa, mais uma troca de baterista?”) tem quem não perceba no que o Soulfly, banda criada por Max Cavalera ao sair do grupo, se transformou com o passar dos anos. Boa parte das antigas experimentações do Sepultura foram parar na conta de Max – que, com o grupo “novo”, experimentou grooves, fez thrasheira como no comecinho de sua ex-banda, muita coisa.

Chama, décimo-terceiro álbum do Soulfly, é um álbum tão imersivo e tão pesado que fica difícil colocá-lo em alguma categoria comum do heavy metal. Com o filho Zyon Cavalera na produção, o grupo passa a contar com uma mescla de peso e ambiência em que vozes se misturam à música (a rápida Indigenous inquisition, que abre o disco) e instrumentos como guitarra e bateria se transforma em verdadeiros tanques de guerra (Storm the gates, uma porrada funkeada e quase industrial, em que Max destaca-se pelo vocal desesperado e cheio de invocações).

  • Ouvimos: Trivium – Struck dead (EP)

Essa tensão de climas permite que Ghenna, iniciando como hardcore, se torne um verdadeiro ritual sonoro e guitarrístico. E cria uma linha do tempo entre o Metallica da primeira fase e o doom metal em Nihilist, além de ir do quase pós-hardcore ao thrash metal nas apocalípticas Black hole scum e Favela / Dystopia. Já No pain = no power, com percussão de samba e guitarras que soam como buzinas ou lâminas, apela para a resistência de cada um ao seu próprio dominador: “Busque o destruidor interior, veja o mundo queimar / para morrer com minha espada / sem dor, não há poder”.

Talvez para dar uma cara diferente ao trabalho de Max – cuja carreira costuma ser marcada por discos de longa duração – Chama é curto e direto: dez faixas, 32 minutos, recado dado. Como já rolou em vários discos do Soulfly e do Sepultura (neste caso, com e sem Max), há surpresas no final. A devoção a Oxóssi e a recordação do extermínio indígena são os temas da quase psicodélica Always was, always will be, que abre com efeitos de gutarra, drones e percussões, e emenda numa citação de Refuse + resist, do Sepultura, num clima sonoro que se eleva ao céu. Soulfly XIII é um instrumental belo e ritualístico. Na faixa-título, que encerra o disco, o peso retorna em forma de rap-groove-metal, mas a música se torna quase um dub-metal das matas. Ficou bonito.

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Ouvimos: Sha Ru – “Vibra vibra”

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Duo Sha Ru mistura dubstep, drum’n bass e ruído em Vibra vibra, EP cheio de voz tratada, batidas sujas e clima experimental hipnótico.

RESENHA: Duo Sha Ru mistura dubstep, drum’n bass e ruído em Vibra vibra, EP cheio de voz tratada, batidas sujas e clima experimental hipnótico.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 7,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 23 de outubro de 2025

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O Sha Ru é um duo nômade, que funciona entre Nova York e Berlim, e que se localiza entre estilos como dubstep e drum’n bass, mas sempre acrescentando experimentalismos diversos. Tanto que o EP Vibra vibra é basicamente uma viagem de ruídos, que começa parecendo algo feito para assombrar (em HZ bath), ganhando depois uma batida meio industrial, meio eletrônica. Vibrasun, na sequência, é mais ritmo do que melodia: o beat se aproxima de algo quase reggae, associado ao vocal com efeitos.

  • Ouvimos: Stealing Sheep – GLO (Girl Life Online)

Uma experimentação que é marca de Vibra vibra (cujo lançamento abre uma nova série da dupla) é o uso da palavra falada como algo que pode ser transformado e recriado como melodia ou ritmo. Above, below, around é cheia de ruídos que se assemelham a gritos ou cantos, em loop – é um drum’n bass que depois ganha uma aparência de raggamuffin sujo. To know repete o título por toda a faixa, abrindo como um Miami bass apodrecido e herdado diretamente do Kraftwerk do disco Computer world (1981), transformando-se numa dance music psicodélica e hipnótica. Press thirteen (VIP) tem som vindo lá de longe, e vai ganhando mais densidade e mais peso.

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