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Crítica

Ouvimos: The Lumineers, “Automatic”

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Ouvimos: The Lumineers, “Automatic”

Curto, tranquilo e girando em torno de variações do alt-country, Automatic, o novo disco do duo norte-americano The Lumineers (Jeremiah Fraites e Wesley Schultz são os integrantes), é um álbum carregado na ironia fina – e ela suplanta, muitas vezes, a própria nova seleção de melodias da dupla, que nem sempre acerta no alvo.

No álbum, dá para destacar a abertura com Same old song, country com referências de punk e até de emo, fala sobre insucessos, canções tristes e lança mão de versos como “ei, mamãe, você pagaria meu aluguel? / você me deixaria ficar no seu porão? / porque qualquer um de nós poderia fazer sucesso ou poderia acabar morto na calçada”. A auto-explicativa Asshole é marcada por um piano nostálgico e alguma grandiloquência, com letra falando de um desencontro bem estranho: “a primeira vez que nos encontramos / você me achou um babaca / provavelmente está certa”.

O lado melódico-ao-extremo do pós-britpop bate ponto na faixa-título e em You’re all I got, e também no piano “voador” de Sunflowers, cujo arranjo impressiona pela beleza. So long tem um clima mais classic rock e estradeiro que o resto do disco, com um arranjo que cresce e vai ganhando outros elementos. A doçura do grupo dá aquela enjoadinha básica no country-gospel de Plasticine e patina de vez nas acústicas e chatinhas Ativan e Keys on the table – para recuperar tudo na mistura de despojamento e rigor pianístico quase clássico de Better day, um anti-hino ao vazio que rege a vida de muitas pessoas (“sonhando com dias melhores / assistindo pornô e programa de imóveis na TV”).

Nota: 7
Gravadora: Dualtone
Lançamento: 14 de fevereiro de 2025.

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Crítica

Ouvimos: Mamalarky, “Hex key”

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Vindo do Texas e baseado em Atlanta, Georgia, o Mamalarky é formado por três amigos de colégio (a cantora e guitarrista Livvy Bennett, o baterista Dylan Hill e o tecladista Michael Hunter) e por uma baixista (Nook Khan) que depois se juntou à formação por um meio bastante incomum: a vocalista Livvy fez uma convocatória de músicos pelo Tinder (!) e ela apareceu.

Vem dando match, musicalmente falando, na história musical do quarteto até o momento – e Hex key, o terceiro álbum, continua a tradição não apenas de discos legais, como também de criações desafiadoras. Basicamente Hex key é cheio de canções que parecem com uma coisa, mas logo logo vão revelando outras faces.

É o que rola no alt pop de Broken bones, no tecnopop repleto de camadas de Won’t give up, no pop espacial e psicodélico da faixa-título (remetendo a Mutantes, The Waeve e a estranhices como Joe Meek) e em especial nas dissonâncias e no som “derretido” de The quiet – cujo ritmo, a maior parte do tempo, é dado por um barulho que parece uma flautinha percussiva, como numa trilha de desenho animado.

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Anhedonia, por sua vez, tem uma guitarra na abertura que remete a Pixies. Até que fica claro que aquele acorde que costura a faixa é uma referência ao início de Ziggy Stardust, de David Bowie, servindo de base para uma canção de clima espacial. Uma música que, como acontece em quase todo o disco, sempre tem uma mudança brusca de tom, de nota. Tanto que ainda tem Take me, um easy listening que é tudo, menos uma música de “fácil audição”, e um dubstep-bossa nova que lembra um Sparks moderninho, #1 best of all time.

A estranhice do Mamalarky em Hex key se torna um troço sem edição (e com rédea solta demais) em poucos momentos, como no pós-disco esquisitaço de Nothing lasts forever. De modo geral, é um pop estranho com alguma noção de que aquilo ali tem que ser compreendido de alguma forma (ou uma música pop com tendência a se desfazer a qualquer momento, tanto faz).

O grupo vai chegando perto de novo da psicodelia em músicas como MF e Blow up, e parece recriar Word, lado B dos Beatles, no indie pop Blush. Como hoje em dia é quase impossível que uma banda ou um artista não tenha um forte lado soft rock, ele aparece nas duas últimas faixas, Feel so wrong e Here’s everything.

Trafegando entre o som acessível e a experimentação com uma categoria que volta e meia lembra a fase anos 1990 do Pato Fu, o Mamalarky pode virar uma daquelas bandas que mudam para chegar ao mainstream – ou um daqueles grupos que fazem com que o mainstream fique um pouco igual a eles. Ou pode ficar num meio termo bem interessante para seu público. Só vendo.

Nota: 8,5
Gravadora: Epitaph
Lançamento: 11 de abril de 2025

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Crítica

Ouvimos: Divide and Dissolve, “Insatiable”

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Ouvimos: Divide and Dissolve, “Insatiable”

Insatiable, quinto disco do Divide and Dissolve, não é um disco. É um ambiente sonoro aterrador e sombrio, criado pela guitarrista australiana Takiaya Reed, mulher preta de ascendência cherokee. O som dela pode ser classificado rasteiramente como doom metal – ou quem sabe, indo mais além, pode ser definido como um stoner rock bem violento, bem psicodélico e bem arrastado.

Uma análise mais profunda enxergaria até música clássica ali: Insatiable é devastador, parece gravado no fundo de uma caverna, e parece, do começo ao fim, falar de sentimentos há anos deixados de lado, ou de histórias que não se conta a ninguém. A abertura com Hegemonic ainda não diz o que o álbum é: tem ruídos de voz operística, um barulho que lembra motor de helicóptero.

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Dai para a frente, tem o som destrutivo e metálico de Monolythic, parecendo um Black Sabbath perdido no horizonte, com guitarra, baixo e bateria enterrados na música. Withholding é como se no fim do túnel não houvesse uma luz, mas sim uma banda de metal ensaiando – como se viesse um som cavernoso de lá. Dichotomy é stoner blues metal soturno, enquanto Disintegrate parece uma longa introdução transformada em música – depois engrenando num riff cuja velocidade vai sendo diminuída.

O lado mais, digamos, erudito vai surgindo com Loneliness, que inicia com órgão e violino, e soa mais como uma música de igreja satânica do que como algo próximo do metal – e prossegue com a fantasmagórica Provenance, que soa como correntes rangendo, além da vinheta Grief, quase um acalanto, mas à distância. Death cult tem instrumentos de sopro vindos do inferno, compondo um só riff que funciona como um loop sombrio e satânico.

O mais louco é que, com todos esses predicados, Insatiable serve até para dar um relax e descansar a cabeça, em meio a ruídos e à descoberta de um mundo subterrâneo e lúgubre. Não é por acaso: a própria Takiaya faz questão de avisar que Insatiable é um disco “sobre o amor”, e que o repertório tem relacionamento com a sobrevivência dos dois povos aos quais ela pertence – e espelha a luta contra a supremacia branca. Ouça como se escutasse o som da guerrilha e da resistência.

Nome: 8,5
Gravadora: Bella Union
Lançamento: 18 de abril de 2025.

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Crítica

Ouvimos: Anna Ratto, “Vison negro”

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Com raras exceções, disco não é filme para ter parte 2. No caso de Vison negro, novo disco de Anna Ratto, ele é a “parte 2” de um álbum lançado pela cantora em 2021, Contato imediato, dedicado à obra de Arnaldo Antunes. Mas felizmente, Vison negro, mais um mergulho na obra do ex-titã, está entre as exceções citadas no começo do texto, e confirma a regra inserindo bastante força no repertório relido (e lançado com exclusividade, já que há cinco faixas inéditas feitas especialmente para o disco).

Isso acontece até mesmo quando Anna comete ousadias, como a de resgatar Um branco, um xis, um zero, parceria de Arnaldo, Marisa Monte e Pepeu Gomes imortalizada na voz de Cássia Eller – e que aqui volta fiel ao rock-MPB dos anos 1990, da qual o co-produtor Liminha (que divide a função com Kassin) fez parte trabalhando com Titãs, Cidade Negra e outros nomes. Aliás, vale informar que o disco, inicialmente pensado como um EP, surgiu justamente da própria tour de Contato imediato, já que o set list foi ganhando outras músicas ao longo do tempo.

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Um detalhe que já vinha sendo revelado na história de Anna, e que surge com força em Vison negro, é que, partindo da MPB, ela chegou a um design sonoro bem mais próximo do rock. É o que surge na faixa-título, um blues-rock que depois se torna um som indie na onda dos White Stripes. E em Melhor não enfeitar, country-rock com cara de Raul Seixas, surgido de uma parceria entre Arnaldo, Paulo Miklos e Liminha. E também no ligeiro noise blues de Se tudo pode acontecer (de Arnaldo, Alice Ruiz, Paulo Tatit e João Bandeira).

Lágrimas no mar, do ex-titã com Pedro Baby, João Antunes e Marcia Xavier, é uma balada com cara beatle e uma slide guitar que remete a George Harrison. E uma curiosidade é Não temo, um power pop feito por Arnaldo e pela própria Anna, com bateria lembrando os ataques de Dave Grohl na cozinha de Smells like teen spirit, hit do Nirvana. O lado mais eminentemente MPB do disco, por sua vez, é exposto em faixas como a ciranda Bam bam bam (música que lembra bastante o som de Hyldon, parceiro de Arnaldo e Céu nesta faixa), e também no pop-reggae Dança – que é a cara de Marisa Monte, compositora da faixa com Arnaldo.

Um outro destaque é a popíssima Todo dia e toda hora com você, que a exemplo de Lágrimas no mar, tem algo de composição beatle – e tem os vocais divididos por Anna e Fernanda Takai. Uma música feita por Arnaldo com Marcelo Jeneci, Betão Aguiar, Fefê e Junix, e que chega a Vison negro com cara de sucesso, por sinal.

Nota: 9
Gravadora: Biscoito Fino
Lançamento: 11 de abril de 2025.

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