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Crítica

Ouvimos: Snoop Dogg, “Missionary”

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Ouvimos: Snoop Dogg, "Missionary"
  • Missionary é o vigésimo álbum do rapper estadunidense Snoop Dogg. Dr. Dre, seu amigo há anos, e que havia produzido sua estreia Doggystyle (1993) volta ao cargo de produtor. Algumas canções estavam guardadas há bastante tempo – Pressure, por exemplo, foi encontrada por Dre num antigo DAT que estava numa caixa de fitas K7.
  • “Eu e Dre ganhamos nossas flores, estabelecemos nossos impérios. Não devíamos nada a ninguém, não tínhamos nada a provar. Mas estávamos curtindo um dia, e tínhamos tantas ideias sobre trilhas sonoras de Fortnite (videogame) que sabíamos que finalmente era hora de escrever nosso próximo capítulo. Missionary foi uma extensão natural, uma expressão perfeita de quem somos e do que fazemos — assim como o Gin & Juice By Dre and Snoop, primeiro produto pronto para beber da nossa nova empresa de bebidas destiladas premium”, diz Dogg, contando como começaram a fazer o disco.

Snoop Dogg é um mestre da reinvenção, mas, desta vez, a nostalgia parece ser o caminho. O rapper vinha dizendo por aí que a convivência com a filha Cori iria mudar sua música, indicando que ele havia repensado a maneira como se referia a mulheres em seus discos. Conta outra: Missionary, o novo álbum, já entrega sua pegada sexual logo na capa (que simula um pacote de camisinhas) e no próprio título, referência à clássica “posição missionária” (enfim, o bom e velho papai-e-mamãe). No conteúdo, pouco mudou: a velha gíria “bitch” aparece com frequência, assim como a palavra racista que começa com a letra “n” – marcas praticamente inextirpáveis do rap norte-americano.

A grande sacada nostálgica foi trazer Dr. Dre para a produção, repetindo a parceria que fez história no álbum de estreia de Snoop, Doggystyle (1993). Dre lidera um time de produtores de peso, compositores e uma avalanche de samples e interpolações. A ideia é clara: acenar para os fãs das antigas. E tem, sim, um gostinho de revival. Last dance with Mary Jane foi feita em cima do clássico de mesmo nome, lançado por Tom Petty & The Heartbreakers, enquanto Another part of me resgata Message in a bottle, do The Police (com direito à voz de Sting), lembrando a onda dos raps que sampleavam grandes sucessos do rock nos anos 1990.

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Um número considerável de críticos musicais fez questão de afirmar que não gostou muito de Missionary. Teve gente que achou forçada a capa “sexualizada”. Outros acharam tudo ali mais próximo do ultrapassado que do retrô. É um disco nota 7, por sinal uma nota próxima à cotação dele no site Metacritic. Isso porque Snoop recorre a truques bem antigos em termos de contação de histórias, o repertório não chega a apresentar coisas de imenso destaque, e nem a pau é um dos melhores discos dele.

Mas fazer feio, não faz. E o disco reserva alguns momentos que valem a audição. Foreplay abre o álbum com clima de trilha sonora. Outta da blue traz um batidão que reaproveita Paper planes, da M.I.A. (que, por sua vez, já havia usado Straight to hell, do The Clash – o sample do sample, como já havia previsto Isaac Hayes numa entrevista nos anos 1990). Gorgeous aposta em um piano quase disco, enquanto a sombria Pressure traz um groove funk-rock-jazz envolvente. Thank you surpreende com um hip hop ágil, de pegada quase funk metal, e cita Purple haze, de Jimi Hendrix.

Quem gosta de histórias, hum, controversas, pode achar diversão em duas faixas bacaninhas: a latina Fire, que começa com o nada agradável som de um sujeito sendo assado no “microondas” e depois sendo abatido a tiros, e Gunz n smoke, um papo sobre bandidagem, armadilhas da fama e drogas, com doses generosas de sexismo. A venturosa Skyscrapers e Sticky situation – essa última com riff vocal emprestado de Tom’s diner, de Suzanne Vega – completam a lista das faixas mais interessantes.

No fim das contas, Missionary não é a evolução “madura” de Doggystyle que alguns poderiam esperar – aliás note o clima pornô envolvido nos nomes dos dois discos. Em certos momentos, o novo álbum chega a soar como um retrocesso. Felizmente, só em alguns momentos.

Nota: 7
Gravadora: Death Row/Aftermath/Interscope.
Lançamento: 13 de dezembro de 2024.

Crítica

Ouvimos: The Cure – “Mixes of a lost world”

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Ouvimos: The Cure - "Mixes of a lost world"

RESENHA: O novo disco de remixes do The Cure, Mixes of a lost world, tem ótimos momentos e surpresas, mas com 2h30 de duração, exige paciência e fôlego.

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Só avisando, de início: o novo disco de remixes do The Cure, Mixes of a lost world – que remexe no sorumbático e meditabundo Songs of a lost world, lançado pela banda no ano passado – é uma audição que vai tomar duas horas e meia do seu dia. “Tudo bem, eu ouço treinando, lavando cuecas, passando roupa ou dando um trato na louça”, você pode me responder.

Não é a melhor maneira de ouvir um disco, enfim. Mas lançar um compilado de remixes é o modo mais, digamos, “familiar” que Robert Smith encontrou para esticar a vida útil de Songs, um álbum que fez sucesso quando saiu – e já havia ganhado uma edição deluxe com disco ao vivo. Afinal, o Cure já havia se saído muitíssimo bem com Mixed up, de 1990, que trouxe novos públicos para o grupo (tem ainda Torn down, de 2018, segundo disco de remixes, feito para o Record Store Day e pouco lembrado).

  • Quando Jimmy Page e Robert Plant cantaram The Cure.
  • Ué, e o Dinosaur Jr, que gravou The Cure e Peter Frampton?
  • E o aniversário de Standing on a beach, do The Cure?
  • Vocês têm noção de que o tema do Roda Viva de 1985 a 1994 era… The Cure?

A pergunta é: faz sentido repetir a dose com um disco em que Robert Smith basicamente anuncia o fim iminente do mundo e de si mesmo? Sim e não. Sim, porque mais de um milhão de ouvintes no Spotify já correram para os ótimos remixes lançados previamente, como o retrabalho do Four Tet em Alone e a versão de Chino Moreno (Deftones) para Warsong.

E não, porque são duas horas e meia de som – e é remix demais. Muitos deles confundem experimentação com chatice, como All I ever am, com Meera. Quem não ouviu o disco original talvez nem se anime a procurar. A boa notícia é que há surpresas: o remix desértico de Omid 16B em Warsong, o brilho inesperado de Cosmodelica em Nothing is forever e a reconstrução post-rock de Endsong pelo Mogwai.

Mais: o Joycute extrai algo do The Cure de Disintegration (1989) de Drone: nodrone e Daniel Avery esculpe quase um nu-metal na mesma faixa – que já era bem pesada e eletrônica no original. No fim das contas, Mixes of a lost world é um disco que recompensa quem insiste. Mas cansa, viu?

Texto: Ricardo Schott

Nota: 6
Gravadora: Fiction/Polydor
Lançamento: 13 de junho de 2025

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Crítica

Ouvimos: King Gizzard & The Lizard Wizard – “Phantom Island”

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Ouvimos: King Gizzard & The Lizard Wizard - "Phantom Island"

RESENHA: Misturando Electric Light Orchestra, Roy Wood solo e progressivo de FM, Phantom Island, novo álbum de King Gizzard & The Lizard Wizard, divide opiniões – mas traz faixas criativas e grooves que merecem ser descobertos.

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O King Gizzard & The Lizard Wizard, que acaba de lançar Phantom Island, é uma banda cuja situação é a mesma do Ty Segall (cujo disco mais recente, Possession, resenhamos aqui): tem sua história marcada por discos a rodo e mudanças rápidas de direção.

No fundo – e faltou observar isso quando falamos do Ty – esse modus operandi é herdeiro da maneira como Neil Young sempre encarou sua carreira. Ou seja: os discos reproduzem meu momento, faço o que tenho vontade, fã que é fã entende minhas mudanças, quero ir para todos os lados que eu quiser, e é isso aí. Dá certo em alguns casos: Neil tem mais discos ótimos em sua discografia do que momentos entediantes, Ty idem, e o King Gizzard une discos excelentes a outros que beiram o tédio.

A julgar pelas resenhas que andam saindo de Phantom Island, o 27º (!) disco do KGLW agradou pouco. A Pitchfork falou que as faixas costumam ser “frustrantes e exageradas, mas incluem ocasionais faíscas de magia”. O brasuca Popload não se animou igualmente, lembrando que Phantom Island foi gravado nas mesmas sessões do anterior, Flight b741 (2024), e que é composto pelas músicas menos empolgantes da leva.

Olha, sei lá: Phantom Island tem mais músicas ótimas do que desperdícios de tempo, e é um disco recomendadíssimo para quem curte Electric Light Orchestra, por exemplo. Aliás, o disco se parece até mais com The Move (embrião da ELO), porque Phantom Island super tem a cara do Roy Wood, que era o geninho da banda nos primeiros tempos.

Por consequência, o disco igualmente pode interessar a fãs do Wizzard – a banda que Roy montou após sair do ELO, uma espécie de ABBA místico com músicos fantasiados de alquimistas glam, que estourou com o hit See my baby jive. E a fãs de álbuns solo de Roy como Mustard (1975). Admiradores das fases yacht rock de bandas como Gentle Giant e Grateful Dead – respectivamente os discos Giant for a day! e Shakedown Street, ambos de 1978 – também não vão se arrepender se derem uma escutadinha.

O King Gizzard larga de vez a psicodelia surrealista que marcou vários álbuns do grupo e invade a grande área do rock orquestral e do progressivo de FM. Phantom Island abre com o progressivo dançante da faixa-título, prossegue com a vibe Elton John/The Who de Deadstick, ganha batida funkeada e clima orquestral celestial em Lonely cosmos – esta, com cordas lembrando Marionette, sucesso do Mott The Hoople.

A boa tradição do prog de rádio é louvada com Eternal return, com o clima meio beatle, meio Alice Cooper de Aerodynamic e Sea of doubt, e com o balanço quase disco de Silent spirit – cujo início lembra a abertura de Sleepwalker, hit da fase norte-americana dos Kinks. Vale conferir também o groove de Panopsych, o tom Madchester de Spasesick e a vibe voadora de Grow wings and fly.

E enfim, eu se fosse você, ouvia Phantom Island correndo: poucas vezes o King Gizzard fez um disco com uma soma de referências e emanações tão bacana.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 9
Gravadora: p(doom) Records
Lançamento: 13 de junho de 2025

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Crítica

Ouvimos: Billy Nomates – “Metalhorse”

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Ouvimos: Billy Nomates - "Metalhorse"

RESENHA: Em Metalhorse, Billy Nomates transforma perdas e dor em um disco sombrio, intenso e visceral, entre o pós-punk, o glam e ecos dos Stranglers.

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Tor Maries, que assina como Billy Nomates, descobriu recentemente ser portadora de esclerose múltipla – pouco depois de perder o pai, vítima de complicações causadas pelo Mal de Parkinson. Entre essas duas pancadas da vida, ela começou a gravar seu novo disco, Metalhorse: um álbum que oscila entre o pós-punk e o glam rock, com o peso maior do lado punk. Mas nada é tão direto: logo no início, a faixa-título surpreende, abrindo caminho para um clima de café-concerto, com pianos e vocais de presença.

Atravessado por temas como morte, doença e os perrengues da existência, Metalhorse tem momentos como o tecnopop sombrio de Nothing worth winnin (“este quarto é alugado / estou de olho nas horas / diga que estou louca / como se todos estivessem bem”) e o folk enigmático de Strange gift (“a morte é um presente estranho que você não queria / alguém te entrega isso”). A angústia noventista e os timbres oitentistas se cruzam em The test, no pós-punk seco de Override e no eletrônico nervoso de Gas, faixa que passeia entre o country e o hard rock com vocais cheios de veneno.

  • Stranglers avacalhando uma dublagem do hit No more heroes na TV holandesa
  • Ouvimos: Ty Segall – Possession
  • Ouvimos: Raveonettes – PE’AHI II

Hugh Cornwell, ex-vocalista dos Stranglers, aparece na sombria Dark horse friend, selando de vez a influência do lado mais sinistro da clássica banda britânica no som de Billy Nomates – que nos primeiros discos flertava mis com o tecnopop, mas aqui mira em terrenos mais obscuros. O fantasma dos Stranglers também ronda Comedic timing, música sobre como o mundo muda quando a gente muda (e nem sempre para melhor), com ecos de ironia e mistério.

O título Metalhorse alude a forças estranhas e incontroláveis, e esse mesmo espírito atravessa Plans e Moon explodes, que ficam entre o punk e a new wave, além da vinheta Life’s unfair, que junta blues e jazz com atmosfera de fim de festa. Intenso, imprevisível e rasgado de dor, Metalhorse é o trabalho mais sombrio e poderoso da carreira de Billy Nomates – e também o mais visceral.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 9
Gravadora: Invada Records
Lançamento: 16 de maio de 2025

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