Crítica
Ouvimos: Kurt Vile, “Back to Moon Beach”
- Mesmo com 52 minutos de duração, Back to Moon Beach, novo disco do cantor e compositor norte-americano Kurt Vile (ex-guitarrista da banda The War On Drugs), é considerado por ele como sendo um EP. O álbum foi gravado em 2019 e teve sete nomes na produção (o próprio Vile, seu colaborador frequente Rob Laakso, Adam Langellotti, Cate Le Bon, Rob Schnapf, Kyle Spence e Jesse Trbovich).
- O repertório tem seis faixas autorais exclusivas, uma regravação de sua música Cool water, e mais duas covers: Must be Santa, canção natalina gravada por Bob Dylan, e Passenger side, do Wilco.
- Rob Laakso, parceiro de Vile morto em maio de 2023, aparece em suas últimas colaborações com o cantor, dividindo-se em instrumentos como baixo, guitarra e programações em cinco das nove faixas.
Considerar o disco novo de Kurt Vile como um EP, como o próprio chama Back to Moon Beach, é gozação. São nove músicas (LPs de Led Zeppelin, Donna Summer e até Rita Lee tinham entre seis e nove faixas) em mais de cinquenta minutos. Vale encará-lo como uma espécie de mixtape bem alimentada e turbinada, já que não se trata de um álbum de verdade. É um disco de entressafra, feito em antes de seu lançamento, e realmente menor que os álbuns anteriores de Kurt, que chegam a durar quase 80 minutos.
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A sonoridade do novo EP é tão enraizada no country e no rock alternativo clássico quanto a de álbuns como Watch my moves (2022, o anterior) e Bottle it in (2018), mas o clima é outro. As nove músicas de Back to Moon Beach são extensas e viajantes como o usual, trazendo letras variando entre a poesia beat e a crueza punk – como em Touched somethin (Caught a virus), que une pandemia e reminiscências. Além de surpresas como a faixa-título, um longo bolerinho country com programação tosca e tons deprê, e o folk-punk em tons graves de Like a wounded bird trying to fly. Para marcar a diferença entre o suposto EP e os LPs, rola uma boa rédea solta na produção, como se fosse um disco artesanal, autobancado e decididamente low profile – não por acaso, o clima do blues de piano Blues come for some lembra Singin’ alone (1982), o disco de Arnaldo Baptista em que o ex-mutante fez de tudo e tocou de tudo.
Ja em Tom Petty’s gone (But tell him I asked for him), a melhor do disco, Vile brinca com sua própria distância dos nomes mais populares do universo country-rock: lamenta nunca ter conhecido o músico morto em 2017 (“como vou fazer as pazes comigo mesmo por nunca ter conseguido falar com ele?”) e diz que “provavelmente derreteria como um reator nuclear” caso encontrasse o temperamental Bob Dylan. Soa como uma improvável mescla entre o próprio Tom Petty – com quem volta e meia Vile é comparado -, o já citado Arnaldo Baptista e Lou Reed. Já a releitura de Must be Santa é quase uma demo, com programação, sintetizador e vocais improvisados. E Another good year for the roses, primeiro single do projeto, é um primor de viagem country psicodélica.
Nota: 8
Gravador: Verve Forecast
Foto: Reprodução.
Crítica
Ouvimos: Salmos, “Salmos” (EP)
- Salmos é o EP de estreia da banda de mesmo nome, formada por Sergio Wong (voz, guitarra e baixo) e Carlos Ernesto (bateria). O disco foi produzido por Lisciel Franco, que também fez a mixagem e a masterização.
- O disco foi gravado em mídia analógica no estúdio ForestLab, no Rio de Janeiro.
- A banda foi formada em 2018 e inicialmente era só um projetinho criado em cadernos de escola, que foi se tornando uma banda de verdade gradualmente. “Carga emocional, inevitáveis movimentos da vida, isso é o que Salmos é pra mim”, explica Wong.
Salmos, o EP epônimo do projeto de Sergio Wong e Carlos Ernesto é a prova de que o rock, em 2025, vai acabar apontando para uma mistura sonora filtrada pelos anos 1990. Cala boca, a faixa de abertura, abre em clima de Nirvana, e a poética crua da letra lembra bastante o estilo de Kurt Cobain – posteriormente, a faixa ganha um aspecto mais tranquilo e rock + MPB.
Persiana, regravação do primeiro single do projeto (2019), tem uma cara meio soul, mas lembra o estilo de produção de Steve Albini, com foco em pratos, baixo e eco, e tom misterioso. A boa Água de piscina tem riff distorcido e batidão meio punk, meio samba. Vale, de qualquer jeito, apontar que a letra da faixa traz um desencanto com todas as faces da política brasileira que soa meio desatualizado numa época em que já se conhece o pior de todos os lados. Ela abre apontando para o emo, e ganha uma inusitada batida de bossa nova.
Infância, a melhor do disco, surge como um rock tranquilo, com som entre o emo e o grunge, prossegue com uma letra repleta de boas frases (“a não ser a infãncia/não sinto falta de nada”) e vira algo próximo da crueza do Sonic Youth. Ouro Preto, música de sete minutos que talvez pudesse ter tido pelo menos uns dois minutos cortados, começa com uma batida circular na guitarra, ganha um andamento próximo do blues, e depois chega perto do som de bandas como Cloud Nothings.
Nota: 7,5
Gravadora: Cavaca Records
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Crítica
Ouvimos: Desu Taem, “Yeoouch”
Tá aí um bom disco “pesado” de 2024 que foi bem pouco ouvido e comentado. O Desu Taem é uma banda bem pouco conhecida, com menos de 300 ouvintes no Spotify, e que mesmo não sendo um grupo exatamente inovador, faz uma mistura musical bem bacana, que vai do metal ao punk anos 1990, passando por estilos como hardcore e emo. Aliás passando até por recordações do rock dos anos 1950 que mostram que provavelmente eles escutaram Stray Cats. Esse, no caso, é o som que surge em Wood chipper Freddy, uma das melhores de Yeoouch, e um pouco na zoada Has anyone seen my underwear?.
Uma boa curiosidade em relação a eles é que se trata de uma banda de pai (Shan) e filho (Nick), que tem “setenta anos de experiência”, juntando as idades de ambos. Sons próximos do hardcore e do punk surgem em faixas como What just happened? e Assbite mania. Uma mescla de punk e hard rock a la Aerosmith aparece em Don’t stick your fingers in the cage. Chuncky stool mistura punk e metal no estilo Dio. Dammit! e Everything crawls away from me são mais próximas de um lado blues-rock da dupla (e mais próximas da turma que junta rock clássico e coolzice indie). Blasted with rebirth aproxima power metal e hardcore.
Yeoouch vai prosseguindo com country-punk (Six guns and scorching suns), mais mesclas com anos 50 (o tom quase Cramps de Crazy bitch addict), pauleira cromada (Time to choose, Meat head) e alguns hinos punk (F**K! F**K! F**K! e Which part of no didn’t you understand?).
Nota: 8
Gravadora: Independente.
- E esse foi um som que chegou até o Pop Fantasma pelo nosso perfil no Groover – mande o seu som por lá!
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Crítica
Ouvimos: Ack, “Aurora”
- Aurora é o novo EP da banda punk carioca Ack, que retorna após 20 anos de hiato. O grupo retorna com Fabio Seidl (voz e baixo), Felipe Sad (guitarra e voz), Rapha Erichsen (guitarra) e PP (bateria).
- A gravação do disco foi remota. “Começamos a falar sobre vários temas num grupo de WhatsApp, e de vez em quando alguém falava: isso aí dava uma música. E aí a gente começava a trocar letra, melodia, ideias”, conta Fabio Seidl.
- O EP tem participação de Rodrigo Lima (Dead Fish) e Nobru Pederneiras (Planet Hemp), além de uma música em homenagem ao saudoso Fábio Kalunga, da banda Cabeça – e que se chama Cabeça. “Foi ele quem apresentou alguns integrantes do Ack, falava da gente em tudo que era entrevista, aparecia do nada em nossos shows”, lembra Seidl. “Essa música é sobre aquele amigo que todo mundo tem, que está sempre lá, incondicionalmente, até o dia que a vida leva”.
Uma surpresa de 2024 foi a volta, depois de vários anos, do grupo punk carioca Ack. Aurora, o novo EP, relembra velhas escolas do punk brasileiro e tem gravação de disco antigo de hardcore e punk, focando no peso. O disco abre logo com Som e fúria sob o sol, uma lembrança do punk nacional mais antigo e um hino de resistência, prestando homenagem a todo mundo que sofreu censura no decorrer dos anos. Rodrigo Lima, do Dead Fish, participa nos vocais dessa música.
Aurora às vezes soa como uma gravação nacional dos anos 1990 – o que tem lados bons (soa como uma continuação do que a banda fez há anos) e ruins (sim, em alguns momentos dá para sentir a falta de mais peso na mixagem). De qualquer jeito, o recomeço do Ack vem com ótimas canções como Vera Cruz, na escola do punk californiano de protesto, e a rápida Dois minutos de raiva (cuja duração, vale citar, é menor que dois minutos). O disco traz ainda o punk distorcido de Insubordinar, e duas canções para emocionar fãs antigos: Cabeça, homenagem ao saudoso vocalista do grupo carioca, Fabio Kalunga, e Garage, punk melódico lembrando antigos shows do Garage Art Cult, casa roqueira carioca que voltou há um ano.
Nota: 7,5
Gravadora: Independente
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