Crítica
Ouvimos: Albert Hammond Jr, “Melodies on hiatus”

- Com quase 70 minutos de duração, Melodies on hiatus é o quinto disco solo do guitarrista dos Strokes, Albert Hammond Jr. O músico é o integrante mais produtivo da banda – afinal, são cinco solos contra seis álbuns dos Strokes.
- Para o disco novo, o guitarrista fez cerca de 30 canções e enviou para a cantora e compositora canadense Simon Wilcox, que fez as letras. Os dois não se conheciam pessoalmente. Simon escrevia as letras em sua máquina de escrever (!) e enviava para Albert pelo correio (!!).
- No meio da elaboração do disco, Albert precisou enfrentar uma situação inusitada para um homem de 43 anos: o divórcio dos pais. Por outro lado, nasceu a filha dele com a esposa Justyna, hoje com dois anos.
Em algum ponto de Melodies on hiatus, fica a dúvida sobre se Albert Hammond Jr é um compositor que criou uma fórmula bacana de canção pop-rock, ou se falta variar um pouco nas composições. Vale dizer que Melodies on hiatus tem tudo o que falta aos discos pós-Room on fire dos Strokes: bons solos, melodias bacanas e refrãos que pegam de cara, repletos de fragmentos de indie rock e até de brit pop.
Só que lá pela quinta faixa, Thoughtful distress, dá a impressão que alguma coisa não mudou e que elementos das canções do guitarrista dos Strokes foram se repetindo faixa após faixa. Ou que o fantasma do single 12:51, do grupo, baixou ali, em boa parte do disco. Nisso ele se parece um pouquinho com sua banda: no fim das contas, dá uma sensação mais de barriga cheia, do que a de ter ouvido algo tão mutante quanto os discos que possivelmente influenciaram Albert. O músico adotou um design sonoro um tanto parecido com de álbuns de seu grupo: som que parece orgânico (afinal, tem guitarras), mas é pródigo em batidas robóticas.
O jogo vira em Memo of hate, a sétima faixa, new wave sujinha com refrão lembrando um misto The Jam + Ramones. Seguida por Home again, mecânica como qualquer canção influenciada pelo krautrock, mas com vocais decididamente influenciados por Byrds e R.E.M. (este último, também batendo ponto em Dead air). Já I got you talvez pudesse ser uma canção dos Psychedelic Furs, ou dos Replacements, desde que rearranjada. One chance é análoga a Reptilia, dos Strokes, mas sem o mesmo peso. Riffs lembrando New Order e Echo & The Bunnymen batem ponto na garageira 818.
Já o power pop Fast kitten é um belo momento no disco, em que Albert soa um pouco como Warren Zevon ou Nick Lowe. Vale a audição do fim do álbum, repleto de canções ricas e variadas, fechando com um tema de piano, synth e coral lembrando Todd Rundgren, Alright tomorrow, com a multiartista Rainsford nos vocais. Só faz falta que Melodies on hiatus soe como um álbum de verdade, e não como vários singles ou EPs unidos.
Gravadora: Red Bull
Nota: 6
Foto: Scottie Cameron/Divulgação
Crítica
Ouvimos: Radiohead – “Hail to the thief live recordings 2003-2009”

RESENHA: Registro ao vivo de Hail to the thief (2003) mostra Radiohead intenso e renovado entre 2003 e 2009, revalorizando o disco original.
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Thom Yorke, líder do Radiohead, nunca se sentiu muito confortável fora da sua casca. De certa forma, mesmo suas opiniões “polêmicas” sempre trouxeram aquela visão abstrata das coisas que costuma brotar em entrevistas de gente acostumada a ser chamada de “gênio” – mesmo que nem seja. Em alguns casos, as opiniões de Thom são ruins, mesmo. Ou simplesmente atabalhoadas, como naquela situação em que ele foi praticamente forçado a expor sua visão sobre Palestina x Israel, protestou contra o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, mas deu um jeito de sair pela tangente.
No caso de Hail to the thief, disco de 2003 do Radiohead, havia algumas coisas para notar assim que ele saiu. O Radiohead havia feito um disco político – ainda que com letras extremamente oblíquas e que se pareciam mais com fábulas estranhas do que com qualquer outra coisa. Livros como 1984, de George Orwell, e discursos do então presidente norte-americano George W. Bush em época de guerra serviram como inspiração. O som do disco, tão dolorido quanto o dos álbuns anteriores, soava como um pós-punk maníaco (ou um progressivo com alfinetes na bochecha, vá lá), em que tudo transpirava pressa.
- Ouvimos: Shearling – Motherfucker, I am both: ‘amen’ and ‘hallelujah’ …
- Ouvimos: Paul Weller – Find El Dorado
- Ouvimos: Apeles – Cru
Hail to the thief, vale dizer, estava mais para uma espécie de “obra aberta”, na qual cabem diversos entendimentos – aliás, recentemente Yorke retrabalhou todo o conteúdo de Hail para a produção da Royal Shakespeare Company Hamlet hail to the thief, o que já mostra o caráter (vá lá) elástico do álbum. E foi justamente por causa dessa produção que Thom decidiu ouvir gravações ao vivo das faixas de Hail – o que gerou esse Hail to the thief live recordings, com registros entre 2003 e 2009.
A versão ao vivo de Hail está bem longe de ser um caça-níqueis barato. O Radiohead vai no repertório como quem vai atrás de um prato de comida, como comprovado pela audição das releituras de faixas como There there, 2 + 2 = 5, Where I end and you begin, The gloaming e várias outras. Tem um subtexto histórico: o Radiohead de 2003 é diferente existencialmente do de 2009, já que o primeiro ainda era contratado da Parlophone e o segundo, uma banda independente que estava divulgando In rainbows (2007), o disco do “pague o quanto quiser”. Era também uma banda descontente consigo própria, já que Hail foi considerado por eles como um disco grande demais e meio enfadonho.
Musicalmente, é a vitória do rock experimental em tempos incertos, com faixas chorosas como I will sendo aplaudidas por plateias de arena (em Londres, Amsterdã, Buenos Aires e Dublin, lugares onde as gravações foram feitas). Hail to the thief está bem longe de ser o melhor disco do Radiohead, mas sai revalorizado das versões ao vivo.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: XL Recordings
Lançamento: 13 de agosto de 2025
Crítica
Ouvimos: Apeles – “Cru”

RESENHA: Gravado ao vivo em uma tarde, Cru mostra Apeles em voz e guitarra, revisitando faixas antigas e tendo o eco do local como um instrumento a mais.
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Eduardo Praça, o músico, cantor e compositor por trás do Apeles, já havia lançado um diferentíssimo álbum triplo em março, 2015-2022: The complete demos and early recordings, com as primeiras gravações que fez usando o codinome. Cru, novo disco do Apeles, sai agora com a mesma disposição para apresentar algo novo. O músico gravou o disco ao vivo durante uma única tarde, no estúdio White Noise, em Los Angeles – e fez todos os registros apenas com voz, guitarra e eco.
Por sinal, bastante eco: todo o repertório parece ter sido gravado numa garagem abandonada, ou numa igreja. Em Cru, Eduardo revisita canções antigas do Apeles, abrindo com a balada abolerada de Vermelha, Ele prossegue com a experimentação de Clérigo e A alegria dos dias dorme no calor dos seus braços, e adere de vez ao clima sombrio na balada Socorro.
Cru também tem um lado meio sixties, meio brega em Vesania I (Cabo horn), e vai para um lado rocker, que chega a lembrar Creedence Clearwater Revival, em Desconocidos. Vibes ligadas a bandas como Smiths surgem em Lábios mentem à distância e Pax, patz, paz. Em alguns momentos, dá para perceber que o esquema de voz-e-guitarra impõe limitações de arranjo, especialmente em faixas com elementos parecidos. Por outro lado, no final, Cru (I rise in pieces), traz uma espécie de lado oculto do projeto, com clima fantasmagórico na voz e na guitarra.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Balaclava
Lançamento: 12 de agosto de 2025.
Crítica
Ouvimos: A Terra Vai Se Tornar Um Planeta Inabitável – “Ident II dades” (EP)

RESENHA: A Terra Vai Se Tornar Um Planeta Inabitável mistura shoegaze, punk triste e dream pop em EP sombrio e intenso sobre fugas, superações e sonhos.
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Banda paulista cujo nome volta e meia é confundido com o de outro grupo (E A Terra Nunca Me Pareceu Tão Distante), o A Terra Vai Se Tornar Um Planeta Inabitável vai além de nomenclaturas como “shoegaze” e “lo-fi” no novo EP, Ident II dades. Em faixas como Espaço/tempo, o som deles chega a lembrar o de formações hoje esquecidas, como o Kafka, pela união de ruídos, psicodelia e de instrumental quase espacial, levado pela guitarra.
Tempo/espaço, a continuação, tem mais cara de punk triste, ou de emo em tons bem mais sombrios, com microfonias. Distante abre com guitarra de textura quase eletrônica, e um som perto do punk, com peso e intensidade. As letras e os recados do disco são voltados para coisas deixadas para trás, fugas, superações e sonhos bem estranhos, como na vinheta falada de 94 (“entre uma fuga e outra você vai consegui se divertir”) e na trama slowcore de Santana 1994.
No final, Excursionista selvagem é mais ensolarada que o restante do disco, trazendo muito do dream pop dos anos 1980, mas sem deixar de lado a beleza sombria que marca o som da banda. Ouça como quem invade um ensaio do grupo.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Selo Quituts
Lançamento: 6 de junho de 2025
- Ouvimos: Ethel Cain – Willoughby Tucker, I’ll always love you
- Ouvimos: Vitor Brauer – Tréinquinumpára 06: Porto Velho
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