Cultura Pop
Lucio Mauro Filho num papo sobre música (Novos Baianos em especial) e TV

Lucio Mauro Filho é ator e guitarrista. Aliás, tem se envolvido cada vez mais com a música, que sempre foi uma paixão, e de certa forma, uma segunda ocupação. Teve uma banda na adolescência “que tocava basicamente Jimi Hendrix, The Doors e Led Zeppelin”, como diz. Já fez trabalhos como DJ, participou da primeira edição da batalha musical de astros Popstar (Globo), aderiu às lives musicais até mesmo antes da pandemia.
Os fãs já estão acostumados à ver Lucio à frente da banda Lucio Mauro & Filhos, todo sábado no Caldeirão, comandado por Marcos Mion. No mesmo dia da semana, além disso, o ator pode ser visto também na Escolinha do Professor Raimundo, fazendo o personagem Aldemar Vigário (que durante vários anos foi interpretado por seu pai, Lucio Mauro) e na novela Quanto mais vida melhor, no papel do advogado Cardoso. Mas quem estiver pelo Rio, neste sábado (5), ainda pode ver Lucio ao lado de Pedro Baby, mais uma vez, como músico. Os dois fazem às 19h o show A lei natural dos encontros, no Bosque Bar (na Gávea, Zona Sul do Rio).

Divulgação/Nando Chagas
A apresentação é uma desculpa para os dois revisitarem o repertório dos Novos Baianos – e para quem não lembra, no espetáculo Novos Baianos, o musical, que chegou aos palcos em 2020, Lucio fazia o roteiro e Pedro (filho de Baby do Brasil e Pepeu Gomes, e guitarrista) fazia a direção musical. O show do Bosque teve uma estreia em dezembro retorna agora quinzenalmente, para não atropelar as gravações – e Lucio diz ao Pop Fantasma que o show vai incluir também repertório de outros artistas que têm conexões com a música do grupo que há 50 anos lançava o clássico disco Acabou chorare. E quem quiser se encontrar com o lado DJ de Pedro, até que a situação da variante Ômicron melhore, tem as playlists que ele faz e divulga em seu instagram.
(foto lá de cima: João Cotta/Globo/Divulgação)
Como foi quando vocês estrearam o show e mostraram os sucessos dos Novos Baianos para a plateia?
Foi muito especial. A gente interrompeu a temporada do espetáculo dos Novos Baianos, onde começou nossa parceria, em pleno voo. A gente tinha acabado de fazer São Paulo e Rio, sucesso estrondoso. Depois íamos fazer festival de Curitiba, íamos para Salvador, as perspectivas eram lindas. Veio essa tragédia aí da pandemia. E pra nós foi muito frustrante, porque levantar um espetáculo desses, com essa quantidade de equipamentos, de artistas envolvidos… É tudo muito caro.
E foi tudo sem lei de incentivo (rindo), porque elas foram demonizadas. É carro e arriscado, se é um sucesso, maravilha. Se não é, é perigosíssimo. A gente estava num céu de brigadeiro, fazendo sucesso, lotando as casas. E veio a pandemia e com isso, uma ducha congelante, que bateu em toda a classe. Quando os espaços começaram a reabrir, pra peça voltar, não tem jeito. Tem que refazer o projeto, captar, tem que ter agenda, agenda de todo mundo, quem vai poder fazer, quem não vai pode fazer. Não é um espetáculo que “ah, dá pra levantar semana que vem”. E aí aquele gostinho de relembrar aquela alegria, e ao mesmo tempo, estando eu envolvido com a música por causa do meu trabalho no Caldeirão… E aí numa dessas conversas com Pedro, ele disse: “Vamos levar um som, então, nós mesmos?”.
Imagina, já seria algo pra me inspirar pra caramba. Nosso trabalho no musical foi muito intenso, mas lá eu era autor e ele era diretor musical. Ainda não tínhamos experimentado brincar de música os dois juntos. E como é que podia eu não estar levando um som com ele? (rindo) Falei então: “Vamos inventar logo um show, e aí a gente tem aquele motivo pra ensinar, se encontrar e tal”. Procuramos o Leo, que é amigo de todos nós e tem o Bosque. Nossa prerrogativa era que fosse um espaço ao ar livre, que não fosse um lugar fechado. Foi tudo em duas semanas no fim do ano, e foi um esforço coletivo.
E como tá sendo escolher o repertório, já que Novos Baianos é esse universo todo?
Na verdade, o que acontece é o seguinte: a ideia é cada vez mais tocar de tudo. Os Novos Baianos foram estratégicos porque eram as músicas que a gente já estava trabalhando por causa do espetáculo. Eram um porto seguro para a gente começar um projeto musical com esse tempo exíguo, tão curto, e com os protocolos. A gente queria inventar um negócio que demandasse no máximo dois ensaios de estúdio para não ficar enfurnando todo mundo. Tem uma série de coisas que você tem que botar na balança na hora de estrear um projeto como esse. A gente quis ir dando um passo de cada vez, não estávamos com as condições ideais para iniciar um projeto já com um super repertório vasto, que todo mundo ia ter que ensaiar, estudar.
Nesse sentido, a gente sabia que as músicas vinham no automático. É uma homenagem ao que nos uniu. Mas também aproveitamos para fazer um set de Jorge Ben, já que nós somos discípulos dele. Tivemos a oportunidade de tocar um Tim Maia, e apontamos para novidades que a gente quer vir trazendo a cada show. Mas respeitando aquela proposta de uma festa, muito mais do que um show, de ficar de exibicionismo, queremos simular quase o DJ com a banda, no que diz respeito ao flow da pista. É uma coisa que a gente curte, eu tenho meu trabalho de DJ há muito tempo. Tenho essa cabeça do bpm, de você pensar na noite, num crescendo. Foi fundamental para pensar no show, que é uma festa-show, onde não tem tantas interrupções, tanto papo. A ideia é que as pessoas realmente dancem e curtam como numa festa.
Você falou do Jorge Ben, ele tem um ponto de ligação com Novos Baianos que é o Dadi, que foi baixista dele e da banda… Surge a ideia de juntar a música de um artista com a do outro, no show?
Sim, claro! E quando a gente está ensaiando, a gente fica muito atento a isso, aos tons, às canções que combinam, muitas combinam. Da mesma maneira, canções de Marisa Monte, Tribalistas… Se a gente for ver são artistas complementares. Todo mundo bebe um pouco no Jorge Ben, que foi um cara fundamental pra nossa história, ele começa a mistura do samba com o rock, que depois os Novos Baianos vão lá e dão um passo a frente, trazem o choro a bossa nova, João Gilberto. E Marisa Monte é discípula dos dois. Quando você vai fazer o que eu chamo de dramaturgia da noite (rindo) é uma história que se conta. A gente toca Barato total, de Gal Costa, e Pepeu Gomes foi guitarrista dela, aí casa com Baby e vai pros Novos Baianos. São universos complementares. Se o cara for mais leigo, vai dançar, curtir o show, mas o cara mais antenado em música tem outras possibilidades…
É toda uma história que está sendo contada ali, da música popular brasileira de verão, certo?
Exatamente. Tocamos inclusive coisas do repertório solo do Pepeu. Tocamos canções de Baby do Brasil. De uma certa maneira nada ali está desencaixado, ou é aleatório. É uma história a ser contada todas as noites. A gente quer sempre diversificar, toda vez que tiver a festa, trazer uma novidade, e até músicas atuais que estejam antenadas com aquilo. Nada nos impede de trazer um arrocha, um piseiro… De certa maneira o que tá acontecendo, a eletrificação do forró é um fenômeno que você vai de Luiz Gonzaga a Barões da Pisadinha.
A música nordestina acaba tendo uma influência muito grande no nosso pensar musical. Ambos somos filhos de nordestinos. Minha mãe é baiana, meu pai é paraense. Pedro é filho de Pepeu e da Baby, que é a niteroiense mais baiana do planeta (rindo). Todo esse universo, de Alceu Valença, Geraldo Azevedo, Daniela Mercury, Carlinhos Brown, a gente orbita. A gente vai pinçando, vendo como a pista reage.
E como tá sendo ter um espaço semanal pra mostrar seu trabalho como músico, no Caldeirão?
Cara, é um desafio absurdo, né? Eu sempre flertei com a música, acho que minha vida inteira. Ela sempre esteve ali presente, todo trabalho. Fiz musicais, fiz Mágico de Oz, participei do Popstar na televisão, cantando. Tenho meu show de bossa nova com Celso Fonseca, que é bossa nova e comédia. Fiz meu evento de bossa nova com o BossaCucaNova, no Copacabana Palace. A música estava sempre ali. Sempre fui metido a tocar meu violãozinho sarapinha (rindo), e de repente o que acontece é que isso ficou represado já lá da época do Popstar. Porque virou um grande treinamento pra mim, mesmo na correria que eu tava – eu estava fazendo a Escolinha e a Malhação. Mesmo assim eu aprendi absurdamente, meu produtor no Popstar era Marcelo Sussekind. Cada dia de estúdio com ele era uma universidade.
Eu estava pronto para acabando o programa, sair em turnê, e inclusive com a banda pronta. Porque os meus parceiros da minha banda no programa eram figuras espetaculares, apaixonantes. Só cheguei na final porque tive a ajuda desses monstros: Serginho Melo, que é batera do Lulu Santos, Artur de Palla, que é baixista do Djavan… Você sair em turnê com esse pessoal, não tem universidade que te entregue isso. Mas eu estava fazendo a Malhação, e na segunda precisei voltar a minha vida normal de funcionário da TV Globo (rindo). E minha mulher estava grávida, foi uma gravidez temporã que a gente teve. Então tive que abrir mão de, naquele momento, continuar a brincadeira com a música. Aquilo ficou represado, guardado para algum momento. Não foi nada que eu falasse: “pô, perdi uma chance”, porque minha vida é muito dinâmica. Continuei trabalhando com música de um jeito ou de outro.
Mas aí aconteceu esse fenômeno das lives da quarentena. A princípio parecia uma coisa mais por diversão, até porque eu já fazia lives anteriormente à quarentena tocando uma viola, que eu chamava de “roda de violão virtual do Lucinho”.
Sim, eu lembro…
Eu chegava de madrugada, tocava um violão, os amigos pediam música. Com o advento do confinamento, essas lives começaram a ser mais regulares, virou algo terapêutico… Daqui a pouco a Teresa Cristina, de quem eu já era amigo, começou a fazer. Eu frequentava a live dela, ela frequentava a minha, um dia ela me chamou pra cantar. Daqui a pouco um dia ela fala: “Você não quer fazer uma live inteira comigo, a gente fazendo uma batalha de música?”. Daqui a pouco a gente tava fazendo batalha das décadas, batalha do rock (rindo). Toquei de Elba Ramalho a Total eclipse of the heart (Bonnie Tyler), porque os temas das batalhas faziam com que eu tivesse que ensaiar para não fazer feio na hora da live.
Isso foi me dando uma cancha muito grande e as pessoas foram vendo que eu tocava um pouco de tudo, me arriscava. E um dos frequentadores assíduos das lives era o Boninho, que estava sempre ali, fazia um comentário e outro. Aí o povo enlouquecia, pedia vaga no BBB (rindo). O Boninho, que foi o diretor geral do Popstar, acho que de alguma maneira ele ficou: “Pô, olha aí o Lucinho, hein?”. Ficou comigo na gaveta, uma bola quicando na cara do gol. Quando veio o projeto do Caldeirão, veio esse fenômeno que começou com a ida do Faustão para a Band, e essa dança das cadeiras, o Lu (Luciano Huck) querendo ir para domingo… Aí tudo bem, resolveu um problema, mas abriu outro que era sábado, e o Mion veio e resolveu o problema. Quando foram preparar o programa do Mion, tinha que ter uma banda. “Mas que banda vai ser?”. E falaram: “Vamos chamar o Lucinho pra essa brincadeira”. Porque eu estava um pouco com essa expertise não só de tocar, e de cantar, mas também de produzir, por causa do espetáculo dos Novos Baianos. Testamos mais de 300 artistas, selecionamos essas figuras, dirigimos.
Um dos grandes talentos do Boninho é enxergar o profissional que encaixa em cada lugar. Ao mesmo tempo é um cara do acolhimento, e descobriram que eu tinha uma relação de amizade com o Mion. E falaram: “Não, é o Lucinho que tem que estar ali!”. Porque o Mion merecia também ser acolhido, aquela estrela que vem de São Paulo, para aquele mundo da Globo. O Mion já era gigante independentemente disso. Mas ele chegou num lugar em que não tinha intimidade, e foi bacana ter um amigo para trocar, e eu já estou ali há vinte anos, trabalhei em todos os setores. E um programa de variedade trabalha com todos os setores: artistas, esportes… Já tinha essa expertise por ter trabalhado ali com teledramaturgia, comédia, variedades, com música, show. Foi o bom e velho estar certo, na hora certa. E preparado para um desafio, que é enorme!
Imagino…
Mesmo assim, estou tendo que correr muito atrás. Ali é programa, não pode parar. Eu tinha que estar preparado para me comunicar com a banda de uma forma muito dinâmica. Me comunicar com o Mion, ajudar, entender o projeto. De um lado a banda, do outro Boninho, a direção. É uma novidade. Mas isso é a síntese da minha carreira: eu estar desafiado, é uma coisa que eu procuro o tempo inteiro.
Eu passei 14 anos num lugar só, né, bicho? (faz referência à série A Grande Família) Isso é um perigo danado, você vai ficando numa zona de conforto perigosíssima. Enquanto dura é uma maravilha, mas quando acaba, pode te destroçar. Se você não estiver preparado psicologicamente e articulado para seguir em frente… Porque um sucesso desses não se repete. Tem gente que fica a vida inteira atrás de um sucesso desses e não experimenta uma vez sequer. E de repente você está ali experimentando aquilo e alimenta uma expectativa de que vai ser sempre assim, e não vai. Mas eu tinha um Marco Nanini, uma Marieta Severo, para alertar: “Isso que a gente tá vivendo é tipo um sonho, tá? Mas mantenhamos sempre o pé na realidade”. Esse meu pé na realidade é o tal do desafio.
Quando vem uma coisa que me tira da zona de conforto que me tira pra estudar. Sempre fui aquele estudante preguiçoso, precisava estar na recuperação, ou precisando da nota pra estudar… Aí eu brilhava (rindo).
Sei bem o que é isso…
Não é? Isso já era um indicativo na minha vida de que eu precisava de desafios, para me manter ativo, não subir no salto, achar que tá tudo ganho e não está. O próprio Boninho me colocou isso de forma muito clara: “Maninho, você tem todo o direito de dizer sim ou não para esse projeto, mas uma vez que você disse sim, já saiba: vai ser ralação!” (rindo). E eu disse sim de olho fechado, nem deixei ele terminar de dizer a frase. E você trabalhar numa equipe que você confia, que você admira as pessoas, é fundamental.
E lá tem uma equipe de profissionais com os quais eu venho trabalhando há vinte anos em diferentes produtos. Quando ele falou “a equipe é essa, é essa, essa”, eu: “eita, tá louco, tô em casa!”. É a importância das boas relações que a gente faz na vida, a vida vai lá e devolve, e te junta de novo com aquelas pessoas. E agora tem essa lua de mel linda com o Mion, já tínhamos trabalhado em projetos com participações pequenas e havia uma afinidade muito grande. Passamos agora cinco meses de muito afeto e profissionalismo. Já era fã dele, mas agora eu assisto de camarote. Fico ali naquele palquinho pensando em tudo, trabalhando em tudo, e ao mesmo tempo assistindo, e ele é um artista com muita ferramenta.
E sobre A Grande Família, como foi fazer parte de um programa de TV que as pessoas já tinham como garantido? Para muita gente, não havia semana sem A Grande Família…
É um fenômeno. Quando a gente decidiu terminar A Grande Família, mesmo assim teve que durar dois anos. Você tem que avisar pro mercado, tem que preparar o mercado. Você tá tirando um produto que agrega patrocinadores, tem os melhores patrocinadores. E que querem botar dinheiro naquilo, porque é um retorno garantido. É um assunto universal, que é família… Aí junta um assunto que gera um manancial de histórias praticamente inesgotável, grandes artistas da televisão, um nível de qualidade acima da média, grandes diretores, grandes produtores, grandes figurinistas… Todo mundo que passava por ali era top, de primeira.
É um momento raríssimo. Uma sorte também. Claro que não é só sorte, quanto mais a gente trabalha mais sortudo a gente fica. Mas eu acho que é o sonho de qualquer artista, profissional, em qualquer área, formar uma baita de uma equipe e passar um tempão no topo. Uma coisa é chegar ao topo, outra coisa é manter. É um troço delicado, que demanda muita conversa, muita luta, muito equilíbrio. Foi muito especial.
E ainda demos a sorte de viver aqueles anos pré-rede social. Nem sei como seria hoje em dia uma Grande Família com rede social, poderia ser um sucesso também, não dá para garantir. Mas digo isso porque quando as pessoas perguntam “o que você creditaria como um dos pilares do sucesso da Grande Família?”, eu acho que um dos pilares era o fato de que ninguém se expunha na mídia. A gente tinha um elenco em que não tinha ninguém que aparecia na Caras, que ficava mostrando a vida pessoal. A gente sempre foi muito preservado nesse lugar.
A gente não teve isso. Poderia ter, nem é uma crítica, mas o fato é que não tinha. No meu modo de enxergar, quanto mais a gente se interessa pelos personagens e menos pelo artista, mais longevidade vai ter um projeto de teledramaturgia. Quando a gente começa a se interessar mais pelo artista, ele fica mais interessante que o personagem. Então você não está querendo saber da obra, dos projetos dramatúrgicos. Quer saber mais o que o cara faz por fora. Como a gente não tinha isso, fica mais fácil preservar uma magia em torno dos personagens.
Só que mais uma vez, repito, não é uma crítica a quem gosta de se divulgar, de divulgar a vida. Hoje em dia isso é uma coisa que é dramaturgia também, já até mudou. Mas para aquela época em que A Grande Família aconteceu, a discrição daquele grupo foi com certeza um pilar para manter a magia durante tanto tempo.
Cultura Pop
Urgente!: O silêncio que Bruce Springsteen não quebrou

Tá aí o que muita gente queria: Bruce Springsteen vai lançar uma caixa com sete álbuns “perdidos”, nunca lançados oficialmente. O box vai se chamar Tracks II: The lost albums (é a continuidade de Tracks, caixa de 4 CDs lançada em 1998) e nasceu de uma limpeza que Bruce fez nos seus arquivos durante a pandemia. Pelo que se sabe até agora, o material inclui sobras das sessões de Born in the USA (1984) e gravações da fase eletrônica dele, no comecinho dos anos 1990 – inclusive um disco inteiro desse período, que nunca viu a luz do dia.
Essa notícia caiu nos sites na semana passada e trouxe de volta um detalhe que os fãs de Bruce já conhecem bem: ele tem muito material inédito guardado – e material bom. Em uma entrevista à Variety em 2017, ele mesmo comentou que sabia ter feito mais discos do que os que lançou, mas que havia motivos sérios para manter alguns deles nas gavetas.
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“Por que não lançamos esses discos? Não achei que fossem essenciais. Posso ter achado que eram bons, posso ter me divertido fazendo, e lançamos muitas dessas músicas em coleções de arquivo ao longo dos anos. Mas, durante toda a minha vida profissional, senti que liberava o que era essencial naquele momento. E, em troca, recebi uma definição muito precisa de quem eu era, o que eu queria fazer, sobre o que estava cantando”, disse na época (o link do papo tá aqui – é uma entrevista longa e bem legal).
Com o tempo, vários desses registros acabaram saindo em boxes e coletâneas. Um deles foi The ties that bind, um disco de pegada punk-power pop que seria lançado no Natal de 1979 – e que acabou virando uma espécie de esboço inicial do disco duplo The river, de 1980. Pelo menos saiu uma caixa em 2015 chamada The ties that bind: The River collection, com todo o material dessa época, inclusive o tal disco descartado (além de um material que formava quase um suposto disco de punk + power pop que teria sido abandonado).
Um texto publicado na newsletter do músico Giancarlo Rufatto recorda que Bruce infelizmente deixou de fora do novo box alguns álbuns que realmente mereciam ver a luz do dia. Um deles é um álbum solo (sem a E Street Band, enfim), com uma sonoridade country ’n soul, que foi gravado em 1981. Esse disco teria sido abandonado durante um período de depressão, que resultou em isolamento e na elaboração do disco cru Nebraska (1982), feito em casa com um gravador de quatro canais, só voz e violão.
Bruce até parece fazer referência a esse álbum perdido na entrevista da Variety. “Esse disco é influenciado pela música pop da Califórnia dos anos 70”, contou. “Glen Campbell, Jimmy Webb, Burt Bacharach, esse tipo de som. Não sei se as pessoas vão ouvir essas influências, mas era isso que eu tinha em mente. Isso me deu uma base pra criar, uma inspiração pra escrever. E também é um disco de cantor e compositor. Ele se conecta aos meus discos solo em termos de composição, mais Tunnel of love e Devils and dust, mas não é como eles. São apenas personagens diferentes vivendo suas vidas.”
Outro material bastante esperado pelos fãs – e que também não está na caixa – é o Electric Nebraska, a tentativa de Bruce de gravar com a E Street Band as músicas que acabaram no Nebraska. Nem ele, nem o empresário Jon Landau, nem os co-produtores Steven Van Zandt e Chuck Plotkin gostaram do resultado, e as gravações foram trancadas a sete chaves. Nem em bootlegs esse material apareceu até hoje. Pra você ter ideia, Glory days, que só sairia no Born in the USA (1984), chegou a ser ensaiada e gravada junto.
Quase todo mundo próximo a Bruce acredita que ele nunca vai lançar oficialmente essas gravações elétricas do Nebraska. Max Weinberg, baterista da E Street Band desde 1974 (com algumas pausas), confirmou a existência desse material em 2010, numa entrevista à Rolling Stone, e disse que adoraria ver tudo lançado.
“A E Street Band realmente gravou todo o Nebraska, e foi matador. Era tudo muito pesado. Por melhor que fosse, não era o que Bruce queria lançar. Existe um álbum completo do Nebraska, todas essas músicas estão prontas em algum lugar”, revelou. Bruce pode até guardar discos inteiros na gaveta, mas esse é um daqueles casos em que o silêncio guarda várias histórias – que podem render surpresas bem legais.
E ese aí é o lyric video de Rain in the river, uma das faixas programadas para Tracks II (a faixa sai num disco montado durante a elaboração do box, Perfect world).
Cultura Pop
Urgente!: Supergrass, Spielberg e um atalho recusado

Coisas que você descobre por acaso: numa conversa de WhatsApp com o amigo DJ Renato Lima, fiquei sabendo que, nos anos 1990, Steven Spielberg teve uma ideia bem louca. Ele queria reviver o espírito dos Monkees – não com uma nova versão da banda, como uma turma havia tentado sem sucesso nos anos 1980, mas com uma nova série de TV inspirada neles. E os escolhidos para isso? O Supergrass.
O trio britânico, que fez sucesso a reboque do britpop, estava em alta em 1995, quando lançou seu primeiro álbum, I should coco. Hits como Alright grudavam na mente, os vídeos eram cheios de energia, e Gaz Coombes, o vocalista, tinha cara de quem poderia muito bem ser um monkee da sua geração. Spielberg ouviu a banda por intermédio dos filhos, gostou e fez o convite.
Os ingleses foram até a Universal Studios para uma reunião com o diretor – com direito a recepção no rancho dele e papo sobre fase bem antigas da série televisiva Além da imaginação. O papo sobre a série, diz Coombes, foi proposital, porque a banda sacou logo onde aquilo poderia dar. “Talvez eu estivesse tentando antecipar a abordagem cafona que seria sugerida, tipo a banda morando junta como os Monkees”, contou Coombes à Louder, que publicou um texto sobre o assunto.
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A proposta era tentadora. Mas eles disseram não. “Foi lisonjeiro e muito legal, mas ficou óbvio para nós que não queríamos pegar esse atalho”, explicou o vocalista, afirmando ter pensado que aquilo poderia significar o fim do grupo. “Você pode acabar morrendo em um quarto de hotel ou algo assim, ou então a produção quer apenas um de nós para a próxima temporada. Foi muito engraçado, respeitosamente muito engraçado”.
O tempo passou. E agora, em 2025, I should coco completa 30 anos (mas já?). O Supergrass, que se separou no fim dos anos 2000, voltou para tocar o disco na íntegra e alguns hits em festivais como Glastonbury e Ilha de Wight.
Aqui, o trio no Glastonbury de 2022.
Foro: Keira Vallejo/Wikipedia
Crítica
Ouvimos: Lady Gaga, “Mayhem”

Tudo que é mais difícil de explicar, é mais complicado de entender – mesmo que as intenções sejam as melhores possíveis e haja um verniz cultural-intelectual robusto por trás. Isso vale até para desfiles de escolas de samba, quando a agremiação mais armada de referências bacanas e pesquisas exaustivas não vence, e ninguém entende o que aconteceu.
Carnaval, injustiças e polêmicas à parte, o novo Mayhem foi prometido desde o início como um retorno à fase “grêmio recreativo” de Lady Gaga. E sim, ele entrega o que promete: Gaga revisita sua era inicial, piscando para os fãs das antigas, trazendo clima de sortilégio no refrão do single Abracadabra (que remete ao começo do icônico hit Bad romance), e mergulhando de cabeça em synthpop, house music, boogie, ítalo-disco, pós-disco, rock, punk (por que não?) e outros estilos. Todas essas coisas juntas formam a Lady Gaga de 2025.
Algo vinha se perdendo ou sendo deixado de lado na carreira de Lady Gaga há algum tempo, e algo que sempre foi essencial nela: a capacidade de usar sua música e sua persona para comentar o próprio pop. David Bowie fazia isso o tempo todo – e ele, que praticamente paira como um santo padroeiro sobre Mayhem, é uma influência evidente em Vanish into you, uma das faixas que melhor representam o disco. Aqui, Gaga entrega dance music com alma roqueira, um baixo irresistível e um batidão que evoca tanto a fase noventista de Bowie quanto o synthpop dos anos 1980.
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Mais coisas foram sendo deixadas de lado na carreira dela que… Bom, sao coisas quase tão difíceis de explicar quanto as razões que levaram Gaga a criar um álbum considerado “difícil” como Artpop (2013), enquanto simultaneamente mergulhava no jazz com Tony Bennett e preparava-se para abraçar o soft rock no formidável Joanne (2016), um disco autorreferente que talvez tenha deixado os fãs da primeira fase perdidos. Em outro tempo, Madonna parecia autorizada a mudar como quisesse, mas quando Gaga fazia o mesmo, deixava no ar notas de desencontro e confusionismo. O pop mudou, as décadas passaram, o público mudou – e todas as certezas evaporaram.
É nesse cenário que Mayhem equilibra as coisas, entregando um pop dançante, consciente e orgulhoso de sua essência, mas ao mesmo tempo sombrio e marginal. Há momentos de caos organizado, como em Disease e Perfect celebrity – esta última começa soando como Nine Inch Nails, mas, se você mexer daqui e dali, pode até enxergar um nu-metal na estrutura. Killah traz uma eletrônica suja, um refrão meio soul, meio rock que caberia num disco do Aerosmith, enquanto Zombieboy aposta no pós-disco punk, evocando terror e êxtase na pista (por acaso, Gaga chegou a dizer que o disco tem influências de Radiohead, e confirmou o NiN como referência).
Na reta final, o álbum se aventura por outros terrenos: How bad do U want me e Don’t call tonight flertam com o pop dinamarquês dos anos 90 (e são, por sinal, as únicas faixas pouco inspiradas do disco); The beast tem cara de trilha sonora de comercial de cerveja; e Lovedrug mergulha na indefectível tendência soft rock que surge hoje em dia em dez entre dez discos pop. Essa faixa soa como um híbrido entre Fleetwood Mac e Roxette – como se Gaga estivesse pensando também na programação das rádios adultas de 2035.
O desfecho de Mayhem chega como um presente para o ouvinte: Blade of grass é uma balada melancólica de violão e piano, que ecoa tanto a tristeza folk dos anos 70 quanto a melancolia do ABBA, crescendo em inquietação à medida que avança. E então, como quem perde um pouco o tom, o álbum termina com… Die with a smile, a já conhecida balada country-soul gravada em parceria com Bruno Mars, lançada há tempos como single. Dentro do contexto do disco, ela soa mais como um apêndice do que como um encerramento – uma nota de rodapé onde se esperava um ponto final. Nada que chegue a atrapalhar a certeza de que Lady Gaga conseguiu, mais do que retornar ao passado, unir quase todos os seus fãs em Mayhem.
Nota: 8,5
Gravadora: Interscope
Lançamento: 7 de março de 2025.
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