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Cultura Pop

Livro analisa Nick Hornby e descobre o que é uma tal de “vida pop”

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Capa do livro Vida pop: representações e reconhecimentos da cultura pop em ficções de Nick Hornby, de Thiago Pereira Alberto

Jornalista e doutor em Comunicação Social pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Thiago Pereira Alberto adoraria ter entrevistado o escritor inglês Nick Hornby, autor de livros como Alta fidelidade, para a dissertação de mestrado que deu origem ao livro Vida pop: representações e reconhecimentos da cultura pop em ficções de Nick Hornby (Ed. Appris). Não deu, até porque Hornby realmente é um tipinho difícil. Mas não foi preciso: estudando a obra dele, Thiago produziu um trabalho importantíssimo para quem escuta muito falar de “cultura pop” mas não tem uma compreensão 360 graus do assunto.

O pesquisador foi aos primórdios da produção pop em artes plásticas, revisitou temas importantes na música e na mídia, e tratou de investigar o que é que forma um tal “sujeito pop” (sujeito, no caso, a programas de TV, discos, artistas, novelas, séries, livros, reality shows). Além de investigar a tal vida pop do título – que é habitada intensamente por Hornby e seus personagens – e uma certa “popeza”, que envolve produtos, pessoas e fãs de pop.

Batemos um papo com Thiago, cujo livro é produto do Laboratório de Pesquisa em Culturas Urbanas e Tecnologias (LabCult),  grupo que reúne pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense. Você pode comprar o livro dele aqui.

Fala-se muito em cultura pop, mas é um termo que permanece como uma coisa que todo mundo “sabe” o que é, embora nem todo mundo saiba de verdade. Como você vê o fato de ter, no seu livro, conseguido fazer um mapa que explica a cultura pop para quem usa o termo, mas tem mais intuição do que conhecimento a respeito dele?

Acho que tem a ver com a escolha, no livro, de propor uma possível perspectiva histórica para o termo pop e em um segundo momento, modular este termo nas muitas possibilidades das visões sobre culturas contemporâneas. O que implica em pensar a ideia de pop com as subjetividades pós-coloniais, cosmopolitas, urbanas, digitais, em suas possibilidades estéticas e artísticas, etc.

Pensando nessa leitura superampla, de certa maneira sugiro “ler” o pop menos como suas ‘causas’ (músicas, filmes, séries, etc.) e mais como seus “efeitos”; de que maneira nossa fruição ou consumo da cultura pop mapeia nossos modos de vida e nossas formas de “ver” e “ler” o mundo. A ideia de “sujeites pop”, que proponho no livro, a partir da representação destes em obras de Hornby, tem a ver com isso.

Sobre esse ótimo apontamento que você fez sobre “intuição x conhecimento”, putz, ele define o que talvez tenha sido minha interrogação inicial, a primeira “coceira” investigativa de minha pesquisa no mestrado (no qual o livro é baseado): afinal do que falamos quando falamos de pop? Não acredito que tenha conseguido responder a isso, mas talvez possa acreditar que contribuí com algumas possibilidades de percurso para essa questão…

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Qual a importância que Nick Hornby tem para você?

Pensando e assumindo meu lugar em determinados marcadores de classe, no sentido de ter acesso à autores como Hornby ainda muito jovem, penso que ele é um narrador importante de certos aspectos da vida contemporânea, e um ótimo romancista, dono de uma bibliografia que muito me agrada como leitor.

Pessoalmente, ele faz parte da minha formação como sujeito pop: Alta fidelidade, em especial, se posiciona na minha estante afetiva-subjetiva em um lugar próximo à MTV, ao baixo e à guitarra, ao desejo pelo jornalismo cultural, à descoberta de cenas musicais em Belo Horizonte, à fissura adolescente por descobrir novos discos e filmes, etc. Como aponto no livro, as representações de Hornby de uma vida pop e seus habitantes ecoaram em mim e em muitos dos meus próximos: reconhecemos seus personagens, enredos, dilemas, sua literatura, enfim, como parte de e em nós. O que entendo como um grande mérito do próprio fazer literário proposto por ele.

Thiago Pereira Alberto, autor do livro Vida pop: representações e reconhecimentos da cultura pop em ficções de Nick Hornby

Thiago Pereira Alberto, autor do livro Vida Pop

Você agradece a seus pais no livro, pelo pop passado. Na sua geração, você acha que tem sido mais incomum a figura do cara mais velho que despreza o pop?

Acho que temos duas questões, que podem ser conjugadas, aí. Uma delas é o etarismo: a questão da idade, historicamente, é tomada também como um conclamo por “seriedade” ou a afirmação por coisas menos efêmeras; marcas que podem ser tomadas como típicas do pop, ou da fruição e do consumo a ele. E entendo o pop no livro não como uma etiqueta ou um gênero musical ou fílmico: trato como um conjunto de representações, manifestações, advindas da cultura popular e da mídia e que abarcam toda série de expressões. Dito isso, penso que, talvez desde os nascidos pós- 1960, uma parcela desse grupo etário envelheceu com seus afetos pop, sem grandes crises de consciência em relação a isso.

Penso aqui, por exemplo e de forma bem objetiva, em pais de família que colecionam autoramas de suas juventudes e seguem fruindo isso; mães que curtem novos artistas nos shows com seus filhos ou não, etc. Desconfio que há uma geração acima dos 50, 60, que carrega consigo suas vivências pop e continuam a fruí-las, hoje. O que é um signo potente da permanência e da força de uma cultura pop. Já esse desprezo pelo pop, se bem entendi, me parece algo relativo às “guerras de fãs”, por exemplo, o “velho roqueiro” olhando com desconfiança e desprezo ao pop e as produções musicais contemporâneas. Acho que pode existir aí performances de gosto, como também creio que esse tipo de coisa possa exibir um viés extremamente conservador e negativamente nostálgico nos dias de hoje…mas isso abriria uma outra discussão. (não sei se entendi e respondi bem a essa questão)

Qual foi o pop que você aprendeu com a sua família?

Sou filho dos anos 1980 e de pais jovens, o que significa que minha criação pessoal e memórias sobre ela se conjuga com discos de MPB ou do rock do período; sessões de cinema assistindo filmes nos quais meus pais pareciam tão ou mais interessados neles do que eu, etc. Eles eram consumidores de cultura pop e incentivadores do meu acesso a esta cultura; seguramente isso foi formativo para mim como sujeito, um baita de um privilégio, creio.

Como você lida com a figura do cara que usa pop como palavrão, aquela coisa do “não vou ouvir isso porque é muito pop”, “isso é pop, não é rock”?

Particularmente, com muita preguiça e sem convicção alguma de que esse tipo de argumento vá me levar a algum lugar. Costumo dizer que me entendo, principalmente, como roqueiro, sim. Mas, definitivamente não ortodoxo. Sou filho do Queen (rs) minha banda-base, a primeira de todas e penso que a natureza híbrida e sem fronteiras de Mercury e cia pavimentaram muito da amplitude do meu gosto musical, dentro da ideia de música pop (o que inclui rock, rap soul, MPB, sertanejo etc etc etc).

Muitas vezes fala-se em novelas, Silvio Santos, Faustão, etc, como sendo exemplos de cultura pop nacional. Como você vê a “popeza”, digamos assim, desse tipo de atração?

O pop, assim como novelas, a TV, é também fruto do que poderíamos entender como um guarda-chuva mais amplo, que é a cultura popular midiática. E assim ambos se alimentam, se entendem, se transformam. Creio que esses ícones midiáticos, de grande apelo popular, podem se tornar exemplares de uma cultura pop através de uma recepção mais ou menos irônica, afetiva e…pop. De certa maneira, programas populares ou popularescos de TV, especialmente os mais antigos, frequentemente são alvo de um jogo que entendo como típico da cultura pop, que é elevar o kitsch (o chamado brega) ao status de algo relevantemente ‘presente’ em nossas vidas cotidianas e que portanto está ali, nos atravessa e pode ser assumido como parte de uma dimensão notável da cultura pop, mesmo que em sua “tosquice” e problemas mil de representação.

Como você vê a cultura pop – e em especial, a absorção de cultura pop – aqui no Brasil?

A noção histórica de cultura pop que debato no livro possuí ressonâncias de época no Brasil: desde os anos 1950, somos atingidos, traduzimos, fagocitamos e criamos a nossa cultura pop, com seus modos e marcas típicas, na música, no cinema, nas mídias em geral.

Uma das questões que acho mais bonitas da questão pop na contemporaneidade, no caso da música, por exemplo, é aquilo que a pesquisadora Simone Pereira de Sá, minha orientadora querida, entende como “música pop periférica”, resultado (ou melhor, processo) de uma série de articulações que envolvem fundamentais marcadores de classe, raça, gênero, territorialidades e o contexto de produção e fruição da música pop na contemporaneidade, inevitavelmente atravessado pela ascensão dos circuitos locais e à margem das grandes gravadoras e o advento da cultura digital, com o barateamento de estúdios portáteis, troca de arquivos digitais pela Internet, etc.

Penso também no “consumo nerd” nas periferias, o que gera eventos sensacionais como o PerifaCon e rasgam de forma irreformável algumas concepções elitistas da fruição pop. Ou seja: pensar na cultura pop brasileira exige cada vez mais pensar em uma complexidade de fenômenos que, em suas particularidades e seus diálogos globais, encenam um cenário que entendo como muito rico e potente.

Cultura Pop

Urgente!: E não é que o Radiohead voltou mesmo?

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O Radiohead (Foto: Tom Sheehan/Divulgação).

Viralizações de Tik Tok são bem misteriosas e duvidosas. Diria, inclusive, que bem mais misteriosas do que as festas regadas a cocaína, prostitutas de Los Angeles e malas de dólares que embalavam os nada dourados tempos da payola (jabá) nos Estados Unidos. Mas o fato é que o Radiohead – que, você deve saber, acaba de anunciar a primeira turnê em sete anos – conseguiu há alguns dias seu primeiro sucesso no Billboard Hot 100 em mais de uma década por causa da plataforma de vídeos. Let down, faixa do mitológico disco Ok computer (1997), viralizou por lá, e chegou ao 91º lugar da parada

A canção, de uma tristeza abissal, já tinha “voltado” em 2022 ao aparecer no episódio final da primeira temporada da série The bear – mas como o Tik Tok é “a” plataforma hoje para um número bem grande de pessoas, esse foi o estouro definitivo. Como turnês de grandes proporções nunca são marcadas de uma hora pra outra, nada deve ter acontecido por acaso. E tá aí o grupo de Thom Yorke anunciando a nova tour, que até o momento só incluirá vinte shows em cinco cidades europeias (Madri, Bolonha, Londres, Copenhague e Berlim) em novembro e dezembro.

O batera Phillip Selway reforçou que, por enquanto, são esses aí os shows marcados e pronto. “Mas quem sabe aonde tudo isso vai dar?”, diz o músico. Phillip revela também que a vontade de rever os fãs veio dos ensaios que a banda fez no ano passado – e que já haviam sido revelados em uma entrevista pelo baixista Colin Greenwood.

“Depois de uma pausa de sete anos, foi muito bom tocar as músicas novamente e nos reconectar com uma identidade musical que se arraigou profundamente em nós cinco. Também nos deu vontade de fazer alguns shows juntos, então esperamos que vocês possam comparecer a um dos próximos shows”, disse candidamente (esperamos é a palavra certa – a briga de faca pelos ingressos, que serão vendidos a partir do dia 12 para os fãs que se inscreverem no site radiohead.com entre sexta, dia 5, e domingo, dia 7, promete derramar litros de sangue).

Enfim, o que não falta por trás desse retorno aí são meandros, reentrâncias e cavidades. O Radiohead, por sua vez, investiu no lado “quando eu voltar não direi nada, mas haverá sinais”. Em 13 de março, dia do trigésimo aniversário do segundo disco da banda, The bends, o site Pitchfork noticiou que a banda havia montado uma empresa de responsabilidade limitada, chamada RHEUK25 LLP. – sinal de que provavelmente alguma novidade estava a caminho. Poucos dias depois, um leilão beneficente em Los Angeles sorteou quatro tíquetes para “um show do Radiohead a sua escolha”. Muita gente levou na brincadeira, mas algumas fontes confirmaram que o grupo tinha reservado datas em casa de shows da Europa.

Depois disso – você provavelmente viu – surgiram panfletos anunciando supostos shows do grupo em Londres, Copenhague, Berlim e Madri, ainda sem nada oficialmente confirmado, até que tudo virou “oficial”. Pouco antes disso, dia 13 de agosto, saiu um disco ao vivo do Radiohead, Hail to the thief – Live recordings 2003-2009 (resenhado pela gente aqui). Com isso, possivelmente, os fãs até esqueceram a antipatia que Thom Yorke causou em 2024, ao abandonar o palco na Austrália, quando foi perguntado por um fã sobre a guerra entre Israel e Palestina.

O site Stereogum não se fez de rogado e, quando a turnê ainda não estava oficialmente anunciada (mas havia sinais) chegou a perguntar num texto: “E aí, será que eles vão tocar Let down?”. No último show da banda, em 1º de agosto de 2018 (dado no Wells Fargo Center, Filadélfia), ela era a nona música, logo antes da hipnotizante Everything in its right place. Seja como for, já que bandas como Talking Heads e R.E.M. não parecem interessadas em retornos, a volta do Radiohead era o quentinho no coração que o mercado de shows, sempre interessado em turnês nostálgicas, andava precisando. Que vão ser vários showzaços e que muitas caixas de lenços serão usadas, ninguém duvida.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Tom Sheehan/Divulgação

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Cultura Pop

Urgente!: E agora sem o Ozzy?

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Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre.

Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre. Tudo começou com uma banda, o Black Sabbath, que já era um verdadeiro errado que deu certo – um ET musical que fazia som pesado quando mal havia o termo “heavy metal” e que falava de terror na ressaca do sonho hippie. E prosseguiu com a lenda de um sujeito que gravou álbuns clássicos como Blizzard of Ozz (1980), Diary of a madman (1981) e No more tears (1991) – eram quase como filmes.

Ozzy pode ser definido como um cara de sorte – e também como um cara que abusou MUITO da sorte, mas pula essa parte. A depender daqueles progressivos anos 1970, não havia muito o que explicasse o futuro de Ozzy Osbourne na música. Em várias entrevistas, Ozzy já disse que não sabia tocar nenhum instrumento quando começou – na verdade nunca nem chegou a aprender a tocar nada. Tinha a seu favor uma baita voz (mesmo não ganhando reconhecimento algum da crítica por isso, Ozzy sempre foi um grande cantor), um baita carisma, ouvido musical e a disposição para encarnar o estranho e o inesperado no palco em todos os shows que fazia.

Imortalizada em livros como a autobiografia Eu sou Ozzy, a história de Ozzy Osbourne é um daqueles momentos em que a realidade pode ser mais desafiadora que a ficção. Afinal, quem poderia imaginar que um garoto da classe trabalhadora britânica se tornaria o que se tornou? Talvez tenha sido até por causa das dificuldades, que também moveram vários futuros rockstars ingleses da época – ou pelo fato de que o rock e a música pop do fim dos anos 1960 ainda eram quase mato, universos a serem desbravados, com poucos parâmetros. Seja como for, se hoje há artistas de rock que se dedicam a discos e a projetos que parecem ter saído da cabeça de algum roteirista bastante criativo, Ozzy teve muita culpa nisso.

Fora as vezes que o vi no palco, estive frente a frente com Ozzy apenas uma vez, numa coletiva de imprensa do Black Sabbath – da qual Tony Iommi não participou, por estar se recuperando de uma cirurgia (havia tido um câncer). Seja lá o que Ozzy pensasse da vida ou de si próprio, me chamou a atenção o clima de quase aconchego da sala de entrevistas (acho que era no hotel Fasano): um lugar pequeno, com ele e Geezer Butler (baixista) bem próximos dos repórteres. Que por sinal não eram inúmeros.

Já havia feito entrevistas internacionais antes mas nunca imaginei estar tão perto de uma lenda do rock que eu ouvia desde os doze anos. Fiz uma pergunta, ele respondeu, e eu, que sempre fiquei nervoso em entrevistas (imagina numa coletiva com o Black Sabbath!) voltei pra casa como se tivesse ido cobrir um buraco que apareceu numa rua no Centro. Não que não tenha me dedicado à pauta, mas era o Ozzy e eu estava… numa tranquilidade inimaginável.

Ozzy também já me deu uma entrevista por e-mail, em 2008, em que reafirmou sua adoração por Max Cavalera, disse que não tinha ideia se a série The Osbournes havia levado seu nome a um novo público, e reclamou da MTV, “que virou uma versão adulta da Nickelodeon”. Também disse que nunca diria nunca a seus então ex-companheiros do Black Sabbath (“nos falamos por telefone e quando as agendas permitem, nos encontramos”).

Nesse papo, Ozzy só se irritou quando fiz uma pergunta que envolvia o Iron Maiden, que tinha passado recentemente pelo Brasil, ou estaria vindo – não lembro mais. “Bom, não sei te responder, pergunta pro Iron Maiden!”, disse, em letras garrafais (todas as respostas foram em caixa alta). Lembro que ri sozinho e fui bater a matéria.

Até hoje só acredito que isso tudo aí aconteceu (e não é nada perto do que uns colegas viveram com Ozzy e o Black Sabbath) porque vi as matérias impressas. Mas acho que antes de tudo, consegui humanizar na minha mente um cara que eu ouvia desde criança. Ozzy era de carne e osso, respondia perguntas, tinha lá seus momentos de irritação e, enfim, mesmo tendo o fim que todo mundo vai ter, viveu bem mais do que muita gente. E mudou vidas.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Divulgação

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Crítica

Ouvimos: Justin Bieber – “Swag”

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Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

RESENHA: Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

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Justin Bieber opera hoje num universo de, vamos dizer assim, venda fácil e compreensão difícil. Ser um cantor branco de r&b significa basicamente que você vai ter que fazer shows, gravar discos e existir no show business, de modo geral, no limite da polêmica. Afinal, tanto r&b quanto rap são áreas de artistas negros, ligadas a um histórico que se estende ao soul, e a vivências pessoais – e o mundo mudou o suficiente para que o mercado quase entenda o peso de certas coisas.

Por quase entenda, leia-se que, na maioria dos casos, tudo pode ser resolvido por uns posts nas redes sociais e uma tour pelos lugares certos, com as pessoas corretas. Mas pra piorar um pouco, nos últimos tempos, Justin andava brotando mais no noticiário de fofoca do que nos cadernos de cultura. As notícias eram sobre cancelamentos de shows, brigas com a mulher Hailey, relacionamentos supostamente mais do que íntimos com o rapper P. Diddy e supostos abusos de substâncias.

E, bom, o que faz um astro como Justin Bieber numa hora dessas? Para calar a boca de uma renca de gente durante um bom tempo, ele simplesmente lança um disco novo do mais absoluto nada – e este disco é Swag, uma epopéia de quase uma hora, com 21 faixas. E antes de mais nada, Swag consegue colocar de vez Justin numa espécie de “espírito do tempo” pop no qual artistas como Taylor Swift, Rihanna, Beyoncé e Miley Cyrus já se encontram há um bom tempo.

Esse tal (hum) zeitgeist significa que tais artistas – seguindo uma linhagem que inclui de Beatles a Marvin Gaye – decidiram se libertar de amarras para fazerem o que bem entendem. Ou seja: discos de protesto, álbuns com design musical troncho, feats que os fãs vão estranhar, projetos com produtores pino-solto, singles com referências que o fã-clube vai ter que buscar no Google, lançamentos com fotos de divulgação distorcidas – ou capas no estilo meu-sobrinho-fez.

De modo geral, são artistas que podem se dar ao luxo de perder alguns fãs, em nome de verem seus álbuns se tornarem (vá lá) pretensos barômetros do nosso tempo, ou pelo menos crônicas pessoais-autoficcionais. Alguns exemplos: Brat, de Charli XCX, trouxe a zoeira da noite de volta. Hit me hard and soft, de Billie Eilish, foi importante na onda de música sáfica. GNX, de Kendick Lamar, explora misérias existenciais e brigas no showbusiness. Vai por aí. Fazer disco com “desencucação” virou, mais do que nunca, coisa de roqueiro – aposto que você se divertiu muito com Cartoon darkness, de Amyl and The Sniffers, e ficou assustado/assustada com as teorias geradas por Brat.

Se a essa altura do meu texto você já está prestes a desistir de ler, por eu ainda não ter dito se Swag vale seu tempo precioso, aqui vai: vale, e muito. Justin já vinha de uma tradição de álbuns ligadíssimos na atualidade – o melhor deles é Purpose, de 2015. Swag tem um subtexto de “libertação”, já que Bieber acaba de dar adeus a seu empresário de vários anos, Scooter Braun (um adeus que vai lhe custar mais de 30 milhões de dólares, por sinal). E traz o cantor investindo em climas lo-fi, sons texturizados, vibes derretidas e muita coisa que virou moda de uma hora para a outra.

O G1 disse que Swag é um disco chato. Eu discordo bastante, mas o The Guardian chegou perto da realidade ao dizer que as letras prejudicam o novo álbum – de fato, a poética de Swag tem a profundidade de um pires. Já musicalmente, a diversão é garantida até para quem nunca ouviu nada do cantor. Bieber e sua turma de produtores e parceiros transformam trap e sons lo-fi em pop adulto, em faixas muito bem feitas e bem acabadas, como All I can take, a estilingada Daisies, o bedroom pop Yukon e a viajante Go baby.

O design musical de Swag é minimalista, e boa parte das músicas têm aquele clima de desleixo estudado do indie pop atual. Things you do tem guitarras decalcadas do The Police e silêncios entre vozes e sons, Butterflies é uma gravação quase caseira que vai crescendo, e faixas como First place, Way it is, Sweet spot e Walking away unem synth pop, modernidades, sons derretidos e tentativas de emular Michael Jackson.

Dadz love, com o rapper Lil B, evoca Prince, com tecladeira dos anos 1980 e texturas de 2025. A vibe dos Rolling Stones, e das voltas do grupo britânico em torno do soul e do r&b, dáo as caras em Devotion e na vinheta Glory voice memo. Uma curiosidade é o trap da faixa-título, com participações de Cash Cobain e Eddie Benjamin, e um verso proscrito sobre cocaína (“seu corpo não precisa / de nenhuma linha prateada”) que aparentemente só o Spotify transcreveu.

Vale dizer que, tentando tomar de volta o controle da própria narrativa, Justin derrapa feíssimo ao decidir colocar em Swag três diálogos com o comediante negro norte-americano Druski. Num deles, o humorista diz a ele que “sua pele é branca, mas sua alma é negra, Justin” (o cantor só responde um “obrigado” desajeitado) – em outro, o assunto inclui paparazzi e redes sociais. No final, quem ouve o disco inteiro é “premiado” com a estranhíssima presença do cantor gospel Mavin Winans ocupando sozinho a última música – o cântico religioso Forgiveness.

Enfim, é Bieber buscando legitimidade para o autoperdão e para a própria carreira de cantor branco de r&b – e mandando recados de maneira tão desajeitada que Swag, um excelente disco, quase rola escada abaixo. Swag não resolve todas as questões em torno de Justin Bieber – mas quando acerta, lembra que, às vezes, é melhor fazer do que explicar.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Def Jam
Lançamento: 11 de julho de 2025

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