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Cultura Pop

Dez histórias por trás de discos e músicas do Steely Dan

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Reverenciadíssima por músicos de jazz e de rock, a dupla norte-americana Steely Dan vinha prosseguindo em turnês sem uma de suas metades, o cantor, guitarrista e baixista Walter Becker. Donald Fagen, tecladista e também cantor, esteve ausente dos shows mais recentes, em festivais em Nova York e Los Angeles, em julho – Fagen, quando perguntado, dizia que o amigo “estava se recuperando de uma cirurgia”. Quem pôde ver em ação a dupla, que passou vários anos sem fazer shows – e outros tantos anos separada -, que guarde sua lembranças, já que Becker infelizmente morreu neste domingo (3), aos 67. Mesmo com a partida de Becker (que além do SD teve também uma carreira solo bem bacana), o grupo permanece na estrada. Em outubro apresentam-se em Dublin (Irlanda) e Londres (Inglaterra), tendo como convidados especiais os Doobie Brothers.

No Brasil, um músico que sentiu bastante a partida de Becker foi Ed Motta, que sempre foi um dos maiores fãs do Steely Dan. Lá fora, o baixista Thundercat também foi outro que publicou post falando do colega.

Em homenagem a Becker, curta aí dez histórias por trás de discos e músicas do grupo.


NA DITADURA Can’t buy a thrill, primeiro disco do Steely Dan (1972), teve a capa acima (esq.) lançada na Espanha. A censura do país então comandado pelo ditador Francisco Franco achou a fotomontagem da capa original (acima, à dir.) lasciva demais e obrigou a gravadora a substituir a imagem por uma foto da banda tocando ao vivo. A ideia original do grupo era usar uma imagem do filme Irma la douce, de Billy Wilder (1963), mas não daria certo por causa do copyright altíssimo.

HITS Can’t but a thrill, aliás, é o disco de dois hits do Steely Dan que com certeza você conhece: Do it again e Reelin’ in the years. A primeira é uma das principais a serem lembradas até hoje pelos fãs da banda. Incrivelmente, o single dela saiu pouco depois do álbum. Na época, nem a banda, nem o produtor Gary Katz acreditavam tanto assim no potencial dela, apesar de ser a música preferida de Fagen no disco. “Só que fizemos a música como uma balada e ela conta uma história”, chegou a afirmar Fagen.

DEU CONFUSÃO Pouco antes do lançamento do segundo compacto extraído de Can’t buy a thrill (justamente Reelin’ in the years), surgiu um boato muito forte de que o Steely Dan teria que trocar de nome, por causa da banda Steelye Span, criada em 1969 pelo ex-baixista do Fairport Convention, Ashley Hutchings, e oriunda da cena folk-progressiva britânica. Saiu uma nota sobre isso na revista Sounds, mas nada se confirmou.

24 CORDAS Countdown to ecstasy (1973), segundo disco da banda, tinha quatro guitarristas, alternando-se ou dividindo algumas músicas: Jeff “Skunk” Baxter, Denny Dias (ambos integrantes “oficiais” do Steely Dan por aqueles tempos), Ben Benay e Rick Derringer (convidados). Walter Becker fazia questão de diferenciar o grupo do som que se fazia na época, em entrevistas. “Não somos uma guitar band, da mesma maneira que os Rolling Stones são. A maioria das nossas músicas nasce no piano e traz mudanças de acorde mais sofisticadas do que a maioria das bandas de rock fazem”. Sem tanto êxito comercial no cenário, o grupo costumava abrir shows para bandas como Slade e Uriah Heep – e normalmente Fagen e Becker saíam bem irritados do palco.

QUE DROGA É ESSA? My old school, single tragicômico e agridoce de Countdown… fala de uma história da adolescência de Fagen e Becker, quando eles foram pegos com suas namoradas numa batida policial para encontrar drogas numa festa, na escola em que estudavam. A letra cita uma das plantas consideradas como mais venenosas no mundo (oleandro, que já foi usado até em infusões abortivas), e já teve gente interpretando isso como uma referência disfarçada à maconha.

FLAPAMBA Se você nunca ouviu falar desse instrumento – uma variação meio “muda” da marimba – é ele que abre Rikki don’t lose that number, outro hit do Steely Dan que possivelmente você já andou ouvindo. A música foi o primeiro single de Pretzel logic, terceiro disco da banda (1974).

RIKKI A música é mais uma recordação de escola da banda, de quando Donald Fagen dividiu os bancos escolares com a escritora novaiorquina Rikki Ducornet. Rikki lembra que os dois se encontraram numa festa e, apesar de ela ser casada e ainda por cima estar grávida, o músico deu em cima dela e lhe passou seu telefone, mas a paquera não foi adiante. Na época, Fagen e Becker tocaam numa banda chamada Leather Canary, que teve um rodízio de bateristas – um deles era o ator Chevy Chase (e o exigente Fagen costumava dizer que ele tocava muito bem).

https://www.youtube.com/watch?v=zv-tjDsdduc

NA DELES O Steely Dan era classificado como “rock recluso” numa matéria da Newsweek para divulgar o disco Katy lied, em 23 de agosto de 1976 – na época, a banda tinha parado completamente de dar shows e estava focada apenas na produção de discos. Katy, lançado em março de 1975, era o primeiro disco que trazia Fagen e Becker como, de fato, os únicos integrantes do grupo – todos os outros, mesmo colaboradores de primeira hora, como Denny Dias, eram “convidados”. O grupo original havia se desfeito justamente porque a dupla de frente desistira das turnês.

JAZZÃO Há quarenta anos, no começo da era do punk, o Steely Dan fazia seu mergulho mais radical no jazz. O disco Aja foi puxado por um single de mais de seis minutos, Deacon blues, e envolveu uma série de músicos topo de linha na gravação, já que o material preparado pela dupla exigia que todos soubessem ler partituras. Na época, com a compra do selo ABC pela MCA, a banda quase resolveu ir para a Warner. Em entrevistas, o grupo costumava ironizar, dizendo que a decisão de ir para a Warner veio pelo fato de a empresa produzir os desenhos dos personagens Pernalonga e Patolino. “Nós vamos nos ramificar e começar a comercializar o nome Steely Dan. Vamos colocar nosso nome em tudo o que pudermos. Dessa forma, podemos nos tornar reais capitalistas. É o que resta para nós”, disse Walter Becker (a tal mudança para a Warner não aconteceu porque a MCA convenceu-os de que não seria adequado largar uma gravadora que tinha todo o seu catálogo).

DOCUMENTÁRIO Aja, o disco, ganhou um documentário da série Classic albums. A mudança da dupla de Nova York para Los Angeles e as diferenças entre as duas regiões deram o tom do disco, gravado por um time de músicos de ambas as áreas. “Quando começamos em Nova York, os bateristas apareciam com uma caixa e os pratos, uns pedais e as baquetas. Em Los Angeles, quando fomos para lá, eles apareciam trazendo um caminhão com dois caras, e eles montavam uma bateria enorme. E o cara ainda tinha mais duas baterias daquelas, porque ele precisava fazer show no dia seguinte”, contou Becker. “Mas os músicos de Nova York tinham um estilo e se entregavam nas suas performances de uma forma que não acontecia na Costa Oeste”. Olha o doc aí, com legendas em português (e quase toda a turma que participou do álbum tocando as músicas do LP).

R.I.P. Walter Becker

Fontes: Steely Dan – Reelin’ in the years, de Brian Sweet, The Steely Dan file, de Stephen Vincent Orourke, Steely dan reader (site)

Foto abre: Kotivalo/Wikimedia Commons

Cultura Pop

Urgente!: E não é que o Radiohead voltou mesmo?

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O Radiohead (Foto: Tom Sheehan/Divulgação).

Viralizações de Tik Tok são bem misteriosas e duvidosas. Diria, inclusive, que bem mais misteriosas do que as festas regadas a cocaína, prostitutas de Los Angeles e malas de dólares que embalavam os nada dourados tempos da payola (jabá) nos Estados Unidos. Mas o fato é que o Radiohead – que, você deve saber, acaba de anunciar a primeira turnê em sete anos – conseguiu há alguns dias seu primeiro sucesso no Billboard Hot 100 em mais de uma década por causa da plataforma de vídeos. Let down, faixa do mitológico disco Ok computer (1997), viralizou por lá, e chegou ao 91º lugar da parada

A canção, de uma tristeza abissal, já tinha “voltado” em 2022 ao aparecer no episódio final da primeira temporada da série The bear – mas como o Tik Tok é “a” plataforma hoje para um número bem grande de pessoas, esse foi o estouro definitivo. Como turnês de grandes proporções nunca são marcadas de uma hora pra outra, nada deve ter acontecido por acaso. E tá aí o grupo de Thom Yorke anunciando a nova tour, que até o momento só incluirá vinte shows em cinco cidades europeias (Madri, Bolonha, Londres, Copenhague e Berlim) em novembro e dezembro.

O batera Phillip Selway reforçou que, por enquanto, são esses aí os shows marcados e pronto. “Mas quem sabe aonde tudo isso vai dar?”, diz o músico. Phillip revela também que a vontade de rever os fãs veio dos ensaios que a banda fez no ano passado – e que já haviam sido revelados em uma entrevista pelo baixista Colin Greenwood.

“Depois de uma pausa de sete anos, foi muito bom tocar as músicas novamente e nos reconectar com uma identidade musical que se arraigou profundamente em nós cinco. Também nos deu vontade de fazer alguns shows juntos, então esperamos que vocês possam comparecer a um dos próximos shows”, disse candidamente (esperamos é a palavra certa – a briga de faca pelos ingressos, que serão vendidos a partir do dia 12 para os fãs que se inscreverem no site radiohead.com entre sexta, dia 5, e domingo, dia 7, promete derramar litros de sangue).

Enfim, o que não falta por trás desse retorno aí são meandros, reentrâncias e cavidades. O Radiohead, por sua vez, investiu no lado “quando eu voltar não direi nada, mas haverá sinais”. Em 13 de março, dia do trigésimo aniversário do segundo disco da banda, The bends, o site Pitchfork noticiou que a banda havia montado uma empresa de responsabilidade limitada, chamada RHEUK25 LLP. – sinal de que provavelmente alguma novidade estava a caminho. Poucos dias depois, um leilão beneficente em Los Angeles sorteou quatro tíquetes para “um show do Radiohead a sua escolha”. Muita gente levou na brincadeira, mas algumas fontes confirmaram que o grupo tinha reservado datas em casa de shows da Europa.

Depois disso – você provavelmente viu – surgiram panfletos anunciando supostos shows do grupo em Londres, Copenhague, Berlim e Madri, ainda sem nada oficialmente confirmado, até que tudo virou “oficial”. Pouco antes disso, dia 13 de agosto, saiu um disco ao vivo do Radiohead, Hail to the thief – Live recordings 2003-2009 (resenhado pela gente aqui). Com isso, possivelmente, os fãs até esqueceram a antipatia que Thom Yorke causou em 2024, ao abandonar o palco na Austrália, quando foi perguntado por um fã sobre a guerra entre Israel e Palestina.

O site Stereogum não se fez de rogado e, quando a turnê ainda não estava oficialmente anunciada (mas havia sinais) chegou a perguntar num texto: “E aí, será que eles vão tocar Let down?”. No último show da banda, em 1º de agosto de 2018 (dado no Wells Fargo Center, Filadélfia), ela era a nona música, logo antes da hipnotizante Everything in its right place. Seja como for, já que bandas como Talking Heads e R.E.M. não parecem interessadas em retornos, a volta do Radiohead era o quentinho no coração que o mercado de shows, sempre interessado em turnês nostálgicas, andava precisando. Que vão ser vários showzaços e que muitas caixas de lenços serão usadas, ninguém duvida.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Tom Sheehan/Divulgação

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Urgente!: E agora sem o Ozzy?

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Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre.

Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre. Tudo começou com uma banda, o Black Sabbath, que já era um verdadeiro errado que deu certo – um ET musical que fazia som pesado quando mal havia o termo “heavy metal” e que falava de terror na ressaca do sonho hippie. E prosseguiu com a lenda de um sujeito que gravou álbuns clássicos como Blizzard of Ozz (1980), Diary of a madman (1981) e No more tears (1991) – eram quase como filmes.

Ozzy pode ser definido como um cara de sorte – e também como um cara que abusou MUITO da sorte, mas pula essa parte. A depender daqueles progressivos anos 1970, não havia muito o que explicasse o futuro de Ozzy Osbourne na música. Em várias entrevistas, Ozzy já disse que não sabia tocar nenhum instrumento quando começou – na verdade nunca nem chegou a aprender a tocar nada. Tinha a seu favor uma baita voz (mesmo não ganhando reconhecimento algum da crítica por isso, Ozzy sempre foi um grande cantor), um baita carisma, ouvido musical e a disposição para encarnar o estranho e o inesperado no palco em todos os shows que fazia.

Imortalizada em livros como a autobiografia Eu sou Ozzy, a história de Ozzy Osbourne é um daqueles momentos em que a realidade pode ser mais desafiadora que a ficção. Afinal, quem poderia imaginar que um garoto da classe trabalhadora britânica se tornaria o que se tornou? Talvez tenha sido até por causa das dificuldades, que também moveram vários futuros rockstars ingleses da época – ou pelo fato de que o rock e a música pop do fim dos anos 1960 ainda eram quase mato, universos a serem desbravados, com poucos parâmetros. Seja como for, se hoje há artistas de rock que se dedicam a discos e a projetos que parecem ter saído da cabeça de algum roteirista bastante criativo, Ozzy teve muita culpa nisso.

Fora as vezes que o vi no palco, estive frente a frente com Ozzy apenas uma vez, numa coletiva de imprensa do Black Sabbath – da qual Tony Iommi não participou, por estar se recuperando de uma cirurgia (havia tido um câncer). Seja lá o que Ozzy pensasse da vida ou de si próprio, me chamou a atenção o clima de quase aconchego da sala de entrevistas (acho que era no hotel Fasano): um lugar pequeno, com ele e Geezer Butler (baixista) bem próximos dos repórteres. Que por sinal não eram inúmeros.

Já havia feito entrevistas internacionais antes mas nunca imaginei estar tão perto de uma lenda do rock que eu ouvia desde os doze anos. Fiz uma pergunta, ele respondeu, e eu, que sempre fiquei nervoso em entrevistas (imagina numa coletiva com o Black Sabbath!) voltei pra casa como se tivesse ido cobrir um buraco que apareceu numa rua no Centro. Não que não tenha me dedicado à pauta, mas era o Ozzy e eu estava… numa tranquilidade inimaginável.

Ozzy também já me deu uma entrevista por e-mail, em 2008, em que reafirmou sua adoração por Max Cavalera, disse que não tinha ideia se a série The Osbournes havia levado seu nome a um novo público, e reclamou da MTV, “que virou uma versão adulta da Nickelodeon”. Também disse que nunca diria nunca a seus então ex-companheiros do Black Sabbath (“nos falamos por telefone e quando as agendas permitem, nos encontramos”).

Nesse papo, Ozzy só se irritou quando fiz uma pergunta que envolvia o Iron Maiden, que tinha passado recentemente pelo Brasil, ou estaria vindo – não lembro mais. “Bom, não sei te responder, pergunta pro Iron Maiden!”, disse, em letras garrafais (todas as respostas foram em caixa alta). Lembro que ri sozinho e fui bater a matéria.

Até hoje só acredito que isso tudo aí aconteceu (e não é nada perto do que uns colegas viveram com Ozzy e o Black Sabbath) porque vi as matérias impressas. Mas acho que antes de tudo, consegui humanizar na minha mente um cara que eu ouvia desde criança. Ozzy era de carne e osso, respondia perguntas, tinha lá seus momentos de irritação e, enfim, mesmo tendo o fim que todo mundo vai ter, viveu bem mais do que muita gente. E mudou vidas.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Divulgação

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Crítica

Ouvimos: Justin Bieber – “Swag”

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Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

RESENHA: Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

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Justin Bieber opera hoje num universo de, vamos dizer assim, venda fácil e compreensão difícil. Ser um cantor branco de r&b significa basicamente que você vai ter que fazer shows, gravar discos e existir no show business, de modo geral, no limite da polêmica. Afinal, tanto r&b quanto rap são áreas de artistas negros, ligadas a um histórico que se estende ao soul, e a vivências pessoais – e o mundo mudou o suficiente para que o mercado quase entenda o peso de certas coisas.

Por quase entenda, leia-se que, na maioria dos casos, tudo pode ser resolvido por uns posts nas redes sociais e uma tour pelos lugares certos, com as pessoas corretas. Mas pra piorar um pouco, nos últimos tempos, Justin andava brotando mais no noticiário de fofoca do que nos cadernos de cultura. As notícias eram sobre cancelamentos de shows, brigas com a mulher Hailey, relacionamentos supostamente mais do que íntimos com o rapper P. Diddy e supostos abusos de substâncias.

E, bom, o que faz um astro como Justin Bieber numa hora dessas? Para calar a boca de uma renca de gente durante um bom tempo, ele simplesmente lança um disco novo do mais absoluto nada – e este disco é Swag, uma epopéia de quase uma hora, com 21 faixas. E antes de mais nada, Swag consegue colocar de vez Justin numa espécie de “espírito do tempo” pop no qual artistas como Taylor Swift, Rihanna, Beyoncé e Miley Cyrus já se encontram há um bom tempo.

Esse tal (hum) zeitgeist significa que tais artistas – seguindo uma linhagem que inclui de Beatles a Marvin Gaye – decidiram se libertar de amarras para fazerem o que bem entendem. Ou seja: discos de protesto, álbuns com design musical troncho, feats que os fãs vão estranhar, projetos com produtores pino-solto, singles com referências que o fã-clube vai ter que buscar no Google, lançamentos com fotos de divulgação distorcidas – ou capas no estilo meu-sobrinho-fez.

De modo geral, são artistas que podem se dar ao luxo de perder alguns fãs, em nome de verem seus álbuns se tornarem (vá lá) pretensos barômetros do nosso tempo, ou pelo menos crônicas pessoais-autoficcionais. Alguns exemplos: Brat, de Charli XCX, trouxe a zoeira da noite de volta. Hit me hard and soft, de Billie Eilish, foi importante na onda de música sáfica. GNX, de Kendick Lamar, explora misérias existenciais e brigas no showbusiness. Vai por aí. Fazer disco com “desencucação” virou, mais do que nunca, coisa de roqueiro – aposto que você se divertiu muito com Cartoon darkness, de Amyl and The Sniffers, e ficou assustado/assustada com as teorias geradas por Brat.

Se a essa altura do meu texto você já está prestes a desistir de ler, por eu ainda não ter dito se Swag vale seu tempo precioso, aqui vai: vale, e muito. Justin já vinha de uma tradição de álbuns ligadíssimos na atualidade – o melhor deles é Purpose, de 2015. Swag tem um subtexto de “libertação”, já que Bieber acaba de dar adeus a seu empresário de vários anos, Scooter Braun (um adeus que vai lhe custar mais de 30 milhões de dólares, por sinal). E traz o cantor investindo em climas lo-fi, sons texturizados, vibes derretidas e muita coisa que virou moda de uma hora para a outra.

O G1 disse que Swag é um disco chato. Eu discordo bastante, mas o The Guardian chegou perto da realidade ao dizer que as letras prejudicam o novo álbum – de fato, a poética de Swag tem a profundidade de um pires. Já musicalmente, a diversão é garantida até para quem nunca ouviu nada do cantor. Bieber e sua turma de produtores e parceiros transformam trap e sons lo-fi em pop adulto, em faixas muito bem feitas e bem acabadas, como All I can take, a estilingada Daisies, o bedroom pop Yukon e a viajante Go baby.

O design musical de Swag é minimalista, e boa parte das músicas têm aquele clima de desleixo estudado do indie pop atual. Things you do tem guitarras decalcadas do The Police e silêncios entre vozes e sons, Butterflies é uma gravação quase caseira que vai crescendo, e faixas como First place, Way it is, Sweet spot e Walking away unem synth pop, modernidades, sons derretidos e tentativas de emular Michael Jackson.

Dadz love, com o rapper Lil B, evoca Prince, com tecladeira dos anos 1980 e texturas de 2025. A vibe dos Rolling Stones, e das voltas do grupo britânico em torno do soul e do r&b, dáo as caras em Devotion e na vinheta Glory voice memo. Uma curiosidade é o trap da faixa-título, com participações de Cash Cobain e Eddie Benjamin, e um verso proscrito sobre cocaína (“seu corpo não precisa / de nenhuma linha prateada”) que aparentemente só o Spotify transcreveu.

Vale dizer que, tentando tomar de volta o controle da própria narrativa, Justin derrapa feíssimo ao decidir colocar em Swag três diálogos com o comediante negro norte-americano Druski. Num deles, o humorista diz a ele que “sua pele é branca, mas sua alma é negra, Justin” (o cantor só responde um “obrigado” desajeitado) – em outro, o assunto inclui paparazzi e redes sociais. No final, quem ouve o disco inteiro é “premiado” com a estranhíssima presença do cantor gospel Mavin Winans ocupando sozinho a última música – o cântico religioso Forgiveness.

Enfim, é Bieber buscando legitimidade para o autoperdão e para a própria carreira de cantor branco de r&b – e mandando recados de maneira tão desajeitada que Swag, um excelente disco, quase rola escada abaixo. Swag não resolve todas as questões em torno de Justin Bieber – mas quando acerta, lembra que, às vezes, é melhor fazer do que explicar.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Def Jam
Lançamento: 11 de julho de 2025

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