Cultura Pop
Ave Sangria: baú dos anos 1970 aberto no novo disco

Dizem por aí que se você lembra dos anos 1960 e 1970, é porque não esteve lá. Marco Polo, vocalista do Ave Sangria, clássica banda de rock nordestina dos anos 1970, bateu um papo com o POP FANTASMA e citou exatamente essa frase. De qualquer jeito, muita coisa da época ficou nas memórias dele, de Paulo Rafael (guitarra solo) e Almir de Oliveira (guitarra), os três remanescentes do grupo. O repertório de Vendavais, segundo álbum do Ave Sangria (o primeiro, epônimo, havia saído em 1974), foi todo composto nos anos 1970 e ficou guardado nas cabeças dos músicos durante todo esse tempo.
Formado originalmente por Marco Polo (vocal), Ivinho (guitarra solo), Paulo Rafael (guitarra base), Almir de Oliveira (baixo), Agrício “Juliano” Noya (percussão) e Israel Semente (bateria), o grupo começou com o nome de Tamarineira Village – era uma referência ao bairro no qual ficava um hospital psiquiátrico conhecido no Recife. Conseguiram sair do circuito recifense e gravaram um primeiro disco pela Continental, mas a censura dos anos 1970 acabou atrapalhando o grupo. Seguidores de uma mistura de referências que incluía Led Zeppelin e Jackson do Pandeiro, os roqueiros estouraram justamente com um samba, Seu Waldir, que narrava a história de amor e desilusão de uma pessoa pelo personagem-título.
O problema é que a música, que já tocava no rádio, era cantada justamente por Marco Polo. A canção acabou censurada e o disco foi recolhido das lojas. O grupo achou mais seguro encerrar atividades. Marco foi se dedicar ao jornalismo, profissão que já tinha antes da banda, e os outros integrantes foram tocar com Alceu Valença – boa parte do Ave Sangria pode ser ouvida em Vivo!, disco ao vivo de Alceu lançado em 1976. Paulo Rafael, você deve saber, é guitarrista de Alceu até hoje.
Batemos um papo com Marco para lembrar histórias do grupo e saber um pouco da gravação do disco novo. Sabe aquelas lendas de que os músicos andavam armados com peixeiras e se beijavam na boca no palco? Lê aí que tem tudo explicado.
POP FANTASMA: O repertório do novo disco foi quase todo feito nos anos 1970. Ele estava guardado como? Nas memórias de vocês?
MARCO POLO (AVE SANGRIA): Tava na memória. Nenhum de nós deixou de fazer música. A gente se dedicou a outras atividades para sobreviver, mas continuamos fazendo pequenos shows. O repertório estava vívido na nossa cabeça e nunca morreu. A ditadura nos censurou mas não nos destruiu. É isso que a gente quer demonstrar.
Tem músicas que estavam censuradas? Não, porque a maioria delas não chegou nem a ser apresentada em shows. Só teve uma que foi censurada, Dia a dia, porque a censura achou que ela falava de posições sexuais. Depois de meia hora discutindo, convenci a censura de que se tratava de uma música feminista, que falava do homem por cima, a mulher por baixo, a mulher por cima, depois os dois iguais… (risos). Bom, tinha as duas coisas.
Você já trabalhava como jornalista antes do Ave Sangria gravar? Já, comecei até muito cedo, com 18 anos. Eu fiz muita coisa: já fui artesão, trabalhei na Feira Hippie de Ipanema, vendia bolsas, cintos, tapetes. Depois fui tradutor de livros de bang bang, aquelas edições que vendiam em bancas de jornal. Fui jornalista free lancer da editora Bloch, na Fatos e Fotos. Trabalhei na Fair play, acho que foi a primeira revista masculina que teve no Brasil. E fiz shows também. Fiz Projeto Pixinguinha, fiz um show de abertura para a Nara Leão no Teatro do Parque no Recife, uma turnê com Belchior por vários estados…
Isso já solo? Sim, como artista solo. Passei com ele por Rio de Janeiro, Salvador, Ilhéus, Recife, Maceió, Fortaleza. A partir de 2008 houve uma redescoberta do nosso trabalho através da internet. Os jovens começaram a descobrir o trabalho do Ave Sangria e começaram a querer shows da gente, Em 2008 a prefeitura do Recife convidou a gente para fazer um show no Pátio São Pedro, e a partir daí… Em 2014 conseguimos reunir a banda para um show comemorativo de 40 anos do nosso show de despedida, no Teatro Santa Isabel. Na verdade os sobreviventes da banda, que éramos eu, Paulo Rafael, Almir e Ivinho (que morreria em 2015). Daí já pulou para a ideia de fazermos o nosso disco novo, que foi gravado em 2018 no Rio de Janeiro.
Como foi fazer os últimos shows com o Ivinho? Ele fez o show do Santa Isabel e fez outro com a gente no Festival Psicodália em Santa Catarina. E logo depois infelizmente, morreu. Pelo menos ele voltou para a banda antes disso e teve o prazer imenso de ser ovacionado como o grande guitarrista que ele era. O povo adorava o Ivinho, ele era a estrela maior da banda.
Ele não vinha tocando antes disso, né? Sim, tava meio parado. Ele teve problemas, tomou muitas drogas, isso deixou o Ivinho meio perturbado, com lesões cerebrais sérias. Ele bebia muito também. Só quando conseguimos frear um pouco isso, ele voltou a produzir satisfatoriamente, voltou a tocar de forma genial. Mas estava muito lesionado em termos de saúde.
Vocês chegaram a tocar no Paebiru, o disco do Zé Ramalho e do Lula Côrtes? Não, não… Eu sou um dos poucos que não participaram daquele disco. Aliás, nem entendo o motivo, já que todo mundo participou. Eu não lembro em que circunstâncias isso aconteceu, até porque eu era amigo tanto de Zé Ramalho quanto de Lula Côrtes. Mas não sei o que houve. Como dizem por aí: se você viveu bem aquela época e lembra de tudo, é porque não viveu, não é mesmo? (risos).
Nesse período, mais ou menos, vocês entraram na Continental. Como vocês entraram na gravadora? Bom, o Secos & Molhados tinha estourado, vendido acho que um milhão de discos, e rendeu uma grana preta. As gravadoras principalmente a Continental, que era uma das raras gravadoras 100% brasileiras, descobriram que rock dava grana, dava lucro. Eles enviaram olheiros para o país todo, para ver se tinha uma banda com potencial para estourar. O olheiro deles que veio aqui nos descobriu, viu que a gente lotava os teatros, as praças onde a gente se apresentava. Nos indicou e assinamos o contrato.
Tinha muita lenda em torno de vocês, que vocês se beijavam na boca no palco, etc. Isso é verdade? A gente tinha consciência de que precisávamos questionar o status quo. Gostávamos de provocar. Eu usava batom, sempre usei. Hoje não uso mais, mas na época, usava por pura provocação mesmo. Teve um show em que nosso baterista, o Israel – ele era um cara muito emotivo – viu que a gente tinha tocado tão bem uma música, que pulou da bateria e me deu um selinho (risos). Isso deixou todo mundo chocado! E eu gostei: “Vamos continuar a fazer isso aí!” (risos). Era para chocar, tinha esse sentido de provocação, de ir contra ao que se chamava de quadrado, a coisa reacionária. Que está de volta hoje em dia, né? É uma coincidência incrível: surgimos na ditadura e voltamos não numa ditadura, mas num período extremamente direitista, conservador, reacionário.
É, o ciclo se repetiu… É ridículo mas é verdade.
Tem aquela lenda de que vocês, quando foram gravar o primeiro disco no estúdio Haway, foram armados com peixeiras. Aconteceu de verdade? Olha, o Ivinho usava peixeira. Ele era bem machão, e era casado com uma mulher muito bonita. O gerente do estúdio começou a dar em cima da mulher dele e ele ameaçou o cara: “Para de dar em cima da minha mulher, senão eu vou te furar, seu filho da puta!” (risos)
Quando vocês perceberam que a atitude era tão importante quanto a música? Bom, até a década de 1960, o jovem não tinha vez nem tinha voz. Quando ele dava uma opinião, escutava que tinha que ouvir os mais velhod, que eles é que sabiam o que era melhor… Só que a partir dessa década, no mundo inteiro, apesar de não haver celular nem internet, houve união entre todos os jovens do mundo. Eles começaram a se rebelar contra isso . Houve protestos nos Estados Unidos contra a Guerra do Vietnã, que era uma guerra criada pelos velhos, mas os jovens é que foram pro front morrer. E principalmente teve a eclosão do maio de 1968 na França, quando os estudantes foram para as ruas e quebraram o pau com a polícia, para mudar tudo. Tinha os slogans da época: “é proibido proibir”, “seja realista, exija o impossível”. E eu sempre fui um cara rebelde a vida toda, tinha esse temperamento. O temperamento junto com a consciência gerou essa atitude da gente, de que rock não era somente música, era atitude. A descoberta dos jovens pelo nosso trabalho veio por causa disso. Eu falo até que as letras do disco novo são antigas mas são atemporais, falam de rebeldia, de liberdade.
Afinal como foi trabalhar com o Marcio Antonucci, um cara da Jovem Guarda, como produtor do primeiro disco de vocês? O Marcio não entendia pica nenhuma de rock´n roll. Mas era uma pessoa muito gente fina, legal, aberta. Ele dizia: “Ué, vocês têm certeza que vão querer gravar essa música aqui?” E gente: “Temos!”. A gente tinha diálogo. O som do disco ficou muito polido, muito limpo, a gente queria um som mais visceral, mais próximo do que a gente fazia no palco. E a gente não podia gravar nenhuma música com mais de dois minutos, porque não tocava no rádio. Graças à qualidade das letras, das interpretações e dos arranjos, conseguimos fazer um bom disco, mas não era o que a gente queria. O Marcio atrapalhou mas não atrapalhou muito. Ele cedeu muito, se abriu, tentou entender a gente. Eu mesmo tinha uma relação boa com ele. Não foi algo traumático. Mas a gente gravou tudo em cinco dias e eu botei todas as vozes num dia só!
O Haway, por sinal, era um dos estúdios mais usados do Rio naquela época. Chegaram a ver alguém famoso lá? Sim. Teve um dia em que o Zé Rodrix esteve lá para pegar um teclado que tinha esquecido lá, ouviu uma música nossa e perguntou se poderia colocar um teclado nela. Era Cidade grande. Ele colocou um órgão lá, sem cobrar nada e ficou lindo.
Quais eram as referências musicais de vocês? Daqui do Brasil eram Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro – que por sinal estaria completando cem anos. Lá fora, Beatles, Led Zeppelin, Jimi Hendrix, Rolling Stones. Os discos chegavam atrasados ao Brasil, a gente tinha que conversar com marinheiros americanos e comprar deles. Ou trocar por calças jeans (risos). Tem ainda o detalhe que aqui no Recife não existia nada. Era uma pasmaceira total. Ninguém tomava conhecimento do que acontecia lá fora.
Como era arrumar LSD no Recife naquela época? Cara, não tinha nem ácido, era maconha mesmo. Ácido, só fui tomar em São Paulo depois. Agora, a maconha era boa, a gente até chamava de massa. A do Rio era ruim, era chamada de palha. A maconha do Recife era a chamada manga-rosa, que o pessoal enterrava na terra com mel de cana e deixava ficar lá um tempo. Era muito doido, muito forte.
Tem uma história de que vocês pediram uma indenização. Como foi isso? Pedimos, mas com esse governo novo, não tem nem chance, né? A gente nem pediu tanto isso, nem estávamos interessados na grana, mas na questão moral. Achávamos que a gente merecia ser ressarcido, pela interrupção da nossa carreira.
Isso aconteceu porque o primeiro disco de vocês foi tirado das lojas, por causa de Seu Waldir, não foi? Depois o disco foi relançado sem a música, não? Sim, mas aí não adiantou nada, porque essa era justamente a música que estava tocando no rádio.
Na época tinha uma onda glam no ar, justamente por causa do Secos & Molhados. Como resolveram gravar essa música? Ela foi feita na verdade para ser gravada pela Marília Pêra. Ela estava fazendo uma peça, um musical, e teve um dia em que um produtor da Som Livre foi ver a peça e a convidou para gravar um disco. Eu namorava uma das atrizes da peça, a Marilia sabia que eu era compositor e me pediu uma música. Fiz Seu Waldir para ela dentro do espírito paródico do personagem que ela fazia na peça, que era uma comédia. Ela gostou muito da música, só que ela desistiu de gravar o disco e eu fiquei com aquela música na mochila, sem saber o que fazer com ela. Cheguei a pensar em chamar uma cantora para gravar, mas tem aquela coisa do machismo pernambucano que era e é ainda muito acirrado, e eu pensei: ‘Quer saber de uma coisa? Vou cantar essa música só pra peitar esse machismo’. E deu certo!
Você sofreu homofobia na época por causa disso? Olha, alguns amigos deixaram de falar comigo. Cheguei a ouvir: “Não sabia que o Marco Polo era viado, não!” (risos). Na minha família não aconteceu nada disso, sempre me aceitaram como eu era. Aliás eu nem sou homossexual, mas digo isso só pra estabelecer fronteiras. O que eu fiz foi só uma provocação.
Foto lá de cima: Divulgação/Flora Negri
Cultura Pop
Urgente!: O silêncio que Bruce Springsteen não quebrou

Tá aí o que muita gente queria: Bruce Springsteen vai lançar uma caixa com sete álbuns “perdidos”, nunca lançados oficialmente. O box vai se chamar Tracks II: The lost albums (é a continuidade de Tracks, caixa de 4 CDs lançada em 1998) e nasceu de uma limpeza que Bruce fez nos seus arquivos durante a pandemia. Pelo que se sabe até agora, o material inclui sobras das sessões de Born in the USA (1984) e gravações da fase eletrônica dele, no comecinho dos anos 1990 – inclusive um disco inteiro desse período, que nunca viu a luz do dia.
Essa notícia caiu nos sites na semana passada e trouxe de volta um detalhe que os fãs de Bruce já conhecem bem: ele tem muito material inédito guardado – e material bom. Em uma entrevista à Variety em 2017, ele mesmo comentou que sabia ter feito mais discos do que os que lançou, mas que havia motivos sérios para manter alguns deles nas gavetas.
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“Por que não lançamos esses discos? Não achei que fossem essenciais. Posso ter achado que eram bons, posso ter me divertido fazendo, e lançamos muitas dessas músicas em coleções de arquivo ao longo dos anos. Mas, durante toda a minha vida profissional, senti que liberava o que era essencial naquele momento. E, em troca, recebi uma definição muito precisa de quem eu era, o que eu queria fazer, sobre o que estava cantando”, disse na época (o link do papo tá aqui – é uma entrevista longa e bem legal).
Com o tempo, vários desses registros acabaram saindo em boxes e coletâneas. Um deles foi The ties that bind, um disco de pegada punk-power pop que seria lançado no Natal de 1979 – e que acabou virando uma espécie de esboço inicial do disco duplo The river, de 1980. Pelo menos saiu uma caixa em 2015 chamada The ties that bind: The River collection, com todo o material dessa época, inclusive o tal disco descartado (além de um material que formava quase um suposto disco de punk + power pop que teria sido abandonado).
Um texto publicado na newsletter do músico Giancarlo Rufatto recorda que Bruce infelizmente deixou de fora do novo box alguns álbuns que realmente mereciam ver a luz do dia. Um deles é um álbum solo (sem a E Street Band, enfim), com uma sonoridade country ’n soul, que foi gravado em 1981. Esse disco teria sido abandonado durante um período de depressão, que resultou em isolamento e na elaboração do disco cru Nebraska (1982), feito em casa com um gravador de quatro canais, só voz e violão.
Bruce até parece fazer referência a esse álbum perdido na entrevista da Variety. “Esse disco é influenciado pela música pop da Califórnia dos anos 70”, contou. “Glen Campbell, Jimmy Webb, Burt Bacharach, esse tipo de som. Não sei se as pessoas vão ouvir essas influências, mas era isso que eu tinha em mente. Isso me deu uma base pra criar, uma inspiração pra escrever. E também é um disco de cantor e compositor. Ele se conecta aos meus discos solo em termos de composição, mais Tunnel of love e Devils and dust, mas não é como eles. São apenas personagens diferentes vivendo suas vidas.”
Outro material bastante esperado pelos fãs – e que também não está na caixa – é o Electric Nebraska, a tentativa de Bruce de gravar com a E Street Band as músicas que acabaram no Nebraska. Nem ele, nem o empresário Jon Landau, nem os co-produtores Steven Van Zandt e Chuck Plotkin gostaram do resultado, e as gravações foram trancadas a sete chaves. Nem em bootlegs esse material apareceu até hoje. Pra você ter ideia, Glory days, que só sairia no Born in the USA (1984), chegou a ser ensaiada e gravada junto.
Quase todo mundo próximo a Bruce acredita que ele nunca vai lançar oficialmente essas gravações elétricas do Nebraska. Max Weinberg, baterista da E Street Band desde 1974 (com algumas pausas), confirmou a existência desse material em 2010, numa entrevista à Rolling Stone, e disse que adoraria ver tudo lançado.
“A E Street Band realmente gravou todo o Nebraska, e foi matador. Era tudo muito pesado. Por melhor que fosse, não era o que Bruce queria lançar. Existe um álbum completo do Nebraska, todas essas músicas estão prontas em algum lugar”, revelou. Bruce pode até guardar discos inteiros na gaveta, mas esse é um daqueles casos em que o silêncio guarda várias histórias – que podem render surpresas bem legais.
E ese aí é o lyric video de Rain in the river, uma das faixas programadas para Tracks II (a faixa sai num disco montado durante a elaboração do box, Perfect world).
Cultura Pop
Urgente!: Supergrass, Spielberg e um atalho recusado

Coisas que você descobre por acaso: numa conversa de WhatsApp com o amigo DJ Renato Lima, fiquei sabendo que, nos anos 1990, Steven Spielberg teve uma ideia bem louca. Ele queria reviver o espírito dos Monkees – não com uma nova versão da banda, como uma turma havia tentado sem sucesso nos anos 1980, mas com uma nova série de TV inspirada neles. E os escolhidos para isso? O Supergrass.
O trio britânico, que fez sucesso a reboque do britpop, estava em alta em 1995, quando lançou seu primeiro álbum, I should coco. Hits como Alright grudavam na mente, os vídeos eram cheios de energia, e Gaz Coombes, o vocalista, tinha cara de quem poderia muito bem ser um monkee da sua geração. Spielberg ouviu a banda por intermédio dos filhos, gostou e fez o convite.
Os ingleses foram até a Universal Studios para uma reunião com o diretor – com direito a recepção no rancho dele e papo sobre fase bem antigas da série televisiva Além da imaginação. O papo sobre a série, diz Coombes, foi proposital, porque a banda sacou logo onde aquilo poderia dar. “Talvez eu estivesse tentando antecipar a abordagem cafona que seria sugerida, tipo a banda morando junta como os Monkees”, contou Coombes à Louder, que publicou um texto sobre o assunto.
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A proposta era tentadora. Mas eles disseram não. “Foi lisonjeiro e muito legal, mas ficou óbvio para nós que não queríamos pegar esse atalho”, explicou o vocalista, afirmando ter pensado que aquilo poderia significar o fim do grupo. “Você pode acabar morrendo em um quarto de hotel ou algo assim, ou então a produção quer apenas um de nós para a próxima temporada. Foi muito engraçado, respeitosamente muito engraçado”.
O tempo passou. E agora, em 2025, I should coco completa 30 anos (mas já?). O Supergrass, que se separou no fim dos anos 2000, voltou para tocar o disco na íntegra e alguns hits em festivais como Glastonbury e Ilha de Wight.
Aqui, o trio no Glastonbury de 2022.
Foro: Keira Vallejo/Wikipedia
Crítica
Ouvimos: Lady Gaga, “Mayhem”

Tudo que é mais difícil de explicar, é mais complicado de entender – mesmo que as intenções sejam as melhores possíveis e haja um verniz cultural-intelectual robusto por trás. Isso vale até para desfiles de escolas de samba, quando a agremiação mais armada de referências bacanas e pesquisas exaustivas não vence, e ninguém entende o que aconteceu.
Carnaval, injustiças e polêmicas à parte, o novo Mayhem foi prometido desde o início como um retorno à fase “grêmio recreativo” de Lady Gaga. E sim, ele entrega o que promete: Gaga revisita sua era inicial, piscando para os fãs das antigas, trazendo clima de sortilégio no refrão do single Abracadabra (que remete ao começo do icônico hit Bad romance), e mergulhando de cabeça em synthpop, house music, boogie, ítalo-disco, pós-disco, rock, punk (por que não?) e outros estilos. Todas essas coisas juntas formam a Lady Gaga de 2025.
Algo vinha se perdendo ou sendo deixado de lado na carreira de Lady Gaga há algum tempo, e algo que sempre foi essencial nela: a capacidade de usar sua música e sua persona para comentar o próprio pop. David Bowie fazia isso o tempo todo – e ele, que praticamente paira como um santo padroeiro sobre Mayhem, é uma influência evidente em Vanish into you, uma das faixas que melhor representam o disco. Aqui, Gaga entrega dance music com alma roqueira, um baixo irresistível e um batidão que evoca tanto a fase noventista de Bowie quanto o synthpop dos anos 1980.
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Mais coisas foram sendo deixadas de lado na carreira dela que… Bom, sao coisas quase tão difíceis de explicar quanto as razões que levaram Gaga a criar um álbum considerado “difícil” como Artpop (2013), enquanto simultaneamente mergulhava no jazz com Tony Bennett e preparava-se para abraçar o soft rock no formidável Joanne (2016), um disco autorreferente que talvez tenha deixado os fãs da primeira fase perdidos. Em outro tempo, Madonna parecia autorizada a mudar como quisesse, mas quando Gaga fazia o mesmo, deixava no ar notas de desencontro e confusionismo. O pop mudou, as décadas passaram, o público mudou – e todas as certezas evaporaram.
É nesse cenário que Mayhem equilibra as coisas, entregando um pop dançante, consciente e orgulhoso de sua essência, mas ao mesmo tempo sombrio e marginal. Há momentos de caos organizado, como em Disease e Perfect celebrity – esta última começa soando como Nine Inch Nails, mas, se você mexer daqui e dali, pode até enxergar um nu-metal na estrutura. Killah traz uma eletrônica suja, um refrão meio soul, meio rock que caberia num disco do Aerosmith, enquanto Zombieboy aposta no pós-disco punk, evocando terror e êxtase na pista (por acaso, Gaga chegou a dizer que o disco tem influências de Radiohead, e confirmou o NiN como referência).
Na reta final, o álbum se aventura por outros terrenos: How bad do U want me e Don’t call tonight flertam com o pop dinamarquês dos anos 90 (e são, por sinal, as únicas faixas pouco inspiradas do disco); The beast tem cara de trilha sonora de comercial de cerveja; e Lovedrug mergulha na indefectível tendência soft rock que surge hoje em dia em dez entre dez discos pop. Essa faixa soa como um híbrido entre Fleetwood Mac e Roxette – como se Gaga estivesse pensando também na programação das rádios adultas de 2035.
O desfecho de Mayhem chega como um presente para o ouvinte: Blade of grass é uma balada melancólica de violão e piano, que ecoa tanto a tristeza folk dos anos 70 quanto a melancolia do ABBA, crescendo em inquietação à medida que avança. E então, como quem perde um pouco o tom, o álbum termina com… Die with a smile, a já conhecida balada country-soul gravada em parceria com Bruno Mars, lançada há tempos como single. Dentro do contexto do disco, ela soa mais como um apêndice do que como um encerramento – uma nota de rodapé onde se esperava um ponto final. Nada que chegue a atrapalhar a certeza de que Lady Gaga conseguiu, mais do que retornar ao passado, unir quase todos os seus fãs em Mayhem.
Nota: 8,5
Gravadora: Interscope
Lançamento: 7 de março de 2025.
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