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Cultura Pop

Videoclipers: quando a produção de clipes vira estilo de vida

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Videoclipers: quando a produção de clipes vira estilo de vida

A ideia não é só fazer clipes: é criar um novo estilo de vida para a turma que trabalha com vídeos. O casal Diana Boccara e Leo Longo (que mantém a empresa Couple Of Things) já havia criado o programa Around the world in 80 music videos, que está sendo exibido pelo canal Bis e traz clipes realizados em vários países, com artistas locais. Dessa vez, com o projeto Videoclipers, Diana e Leo fizeram o mesmo durante três meses, só que no Brasil.

A trabalheira do casal resultou em 16 clipes feitos em plano sequência. Os primeiros da série já estão no canal da empresa. Trazem Alceu Valença pelas ruas do Centro Histórico de Olinda (PE) cantando a música Nas asas de um passarinho, o cantor Barro soltando a voz em Cavalo marinho, Dona Onete cantando Carimbó arrepiado e Felipe Cordeiro, com a própria Dona Onete, em Onde é que eu vou parar. O casal lança clipe novo toda quarta-feira, e o roteiro de Diana e Leo incluiu Recife, Belém, Goiânia, Belo Horizonte, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre. Além do clipe, rola sempre um making of.

Os dois projetos envolveram muita coragem (a dupla vendeu tudo o que tinha para sair viajando pelo mundo e fazer clipes para o Around the world) e muito nomadismo. Leo e Diana também aprenderam que existem outras formas de captar recursos (e outros recursos, e maneiras de se pagar por eles, por que não?) e realizaram tudo de maneira bastante inovadora. Tanto no modo de trabalhar, quanto na maneira de encarar assuntos de suma importância como monetização.

Como aqui no POP FANTASMA a gente bate um papo com a turma que está tentando criar coisas novas para reportar e mostrar cultura pop (fora os eventuais novos negócios que surgem na área), batemos um papo com Leo Longo e ele contou para a gente o que está por trás do Videoclipers e o que vem por aí. Confira.

POP FANTASMA: Como surgiu a ideia de montar o Videoclipers? Vocês sentiam falta de um projeto de clipes que não estivesse necessariamente atrelado ao “lançamos uma música nova, vamos fazer um clipe” e trouxesse um conceito por trás? Qual foi a motivação?
LEO LONGO: Foi a saudade de poder vivenciar relações de trabalho e colaboração em torno da arte, sem serem norteadas ou promovidas pela presença do dinheiro, que nos fez criar o Videoclipers. Entre 2015 e 2016, filmamos Around the world in 80 music videos. Foi a primeira vez que uma equipe viajou o mundo pra filmar uma série de videoclipes oficiais – atualmente a série é exibida nos canais BIS e Multishow com o título em português, e está na íntegra em nosso canal.

Naquela oportunidade, por não termos tido sucesso na captação de recursos financeiros, acabamos bancando quase a totalidade do projeto, salvas algumas parcerias com marcas. Mas aquilo era suficiente para bancar nosso custo de vida, não mais do que isso. Não pra bancar a produção de 80 clipes pelo mundo. Nossa solução pra falta de investimento foi entender que nem tudo na vida é a troca baseada no dinheiro.

Nos voltamos então pro conceito da colaboração sem vínculo no dinheiro mas sim com vínculo na troca de experiências e na interconexão de habilidades e talentos. Tudo mundo tem ou sabe algo que pode oferecer e sempre tem alguém que precisa do que você tem pra dar. Descobrimos que existe um mundo paralelo, bastante maduro e sedimentado, ao mundo no qual tudo é pago. Então, finalizando a resposta, foi assim que vivenciamos as experiências colaborativas mais intensas que já havíamos vivido. E entre 2016 e 2018, começamos a sentir falta de poder vivenciar isso. E a solução foi voltar pra estrada.

Todos os clipes que filmamos em nossos projetos, inclusive Videoclipers, são de músicas inéditas e do atual álbum de trabalho dos artistas. A gente gosta de estar conectado com a cena atual e, de alguma forma, até ser um recorte do que está acontecendo da música brasileira neste momento. A única exceção foi com Alceu Valença, isso porque ele e sua equipe queriam muito dar um clipe à música Nas asas de um passarinho. Ela foi lançada em 2002 mas teve uma releitura em 2014, no álbum Amigo da arte, que a gente adora. E por isso, topamos.

Videoclipers: quando a produção de clipes vira estilo de vida
Na gravação do clipe de Alceu Valença (foto: Lumos Estúdio)

Cá pra nós, como fãs, qualquer oportunidade de trabalhar num set com Alceu já seria mágico por si só. Acho que tanto ele quanto nós sabíamos exatamente o que deveria ser feito neste clipe, sabe?! Então, bastaram 25 minutos pra pensar no que faríamos e filmar dois takes.

Já que você falou no Around the world…, o que essa experiência, que era mais complexa ainda do que o Videoclipers (que é realizado no Brasil) ensinou a vocês? Aprendemos que as dificuldades de realizar projetos como o nosso são as mesmas em quase todos os lugares. E também, que a alegria de produzir arte e colaborar com pessoas é a mesma em todo mundo. Ficamos muito amigos de pessoas que trabalharam com a gente em Portugal, Russia, Egito e México, por exemplo, igualmente como no Brasil. Mesmo com as dificuldades iniciais que o idioma ou a cultura local pode trazer, quando estivemos com pessoas dispostas, tudo aconteceu de maneira coesa, leve e feliz.

Também acho que ter feito nosso primeiro projeto autoral e independente pelo mundo, ao invés do Brasil, nos trouxe uma metodologia de trabalho muito dinâmica e eficiente. Obviamente, muitas destas técnicas a gente está aplicando agora nas filmagens de Videoclipers, como por exemplo como otimizar tempo na busca por uma locação, ou como conseguir convidar pessoas a participar das nossas gravações, etc. Ter trabalhado em tantas condições diferentes nos 22 países pelos quais passamos, trouxe essa versatilidade pro nosso processo.

E de onde tiraram coragem para realizar o Around the world? Qual foi o gatilho para isso? Que difícil essa pergunta! As vezes a gente acha mesmo que teve coragem, mas na época nos pareceu tão natural que lembro que parecia algo que precisava ser feito, sabe?! Mas pensa só, a gente ficou 7 meses gestando o projeto, pensando em todos os detalhes enquanto em paralelo a gente tentava grana pra fazer. Depois deste período, e sem os recursos que precisávamos, tomar a atitude de vender tudo o que tínhamos e investir todas nossas economias não foi um ato de coragem. Foi um ato de respeito e amor pelo que mais gostamos de fazer da vida, que é filmar histórias e fazer arte com nossas câmeras. O contrário disso seria negligenciar o que queríamos.

E o gatilho foi quando, ainda quando trabalhávamos na indústria da TV (eu estava dirigindo uma série para o History Channel e Diana produzindo uma série no Discovery Channel), decidimos passar as férias numa roadtrip pelo sul dos Estados Unidos. Fomos conhecer as cidades mais importantes pro nascimento dos estilos musicais mais populares do mundo, como jazz, rock, soul, folk, blues, etc. Visitamos Nashville, Memphis, Clarksdale, cidades nas margens do rio Mississippi, New Orleans, entre outras. Quando voltamos dessa viagem, estávamos carentes daquele movimento, de conhecer pessoas, de contar histórias e, principalmente, de fazer tudo isso em função da música. Foi assim que começamos a criar Around the world.

Videoclipers: quando a produção de clipes vira estilo de vida
Gravando com Barro (foto: Lumos Estúdio)

Aliás, o que aprenderam com a busca por patrocínio dos projetos? Repetiriam ou não repetiriam algo que fizeram? Aprendemos que ninguém vai confiar mais no seu projeto do que você mesmo. E se em algum momento você titubeia, todos titubeiam juntos. Ninguém vai levantar por você todos os dias e ninguém vai se arriscar por você. Se você acredita numa ideia que inventou, é só você que pode botá-la de pé. E tem sido assim nos últimos cinco anos, nos quatro projetos que já filmamos. Dois estão no ar e outros dois esperando um oportunidade. É assim que levamos nosso lifestyle com a Couple of Things. Nunca conseguimos recursos pra financiar um projeto antes de filmá-lo. Ou somos péssimos vendedores ou é muito azar (risos). Ao menos, depois de filmados a gente consegue algum retorno. Poderia dizer que é sorte, mas a gente se dedica muito pra fazer as coisas acontecerem.

O Videoclipers é “tentativa de causar rupturas e reflexões sobre a forma como trabalhamos e geramos conteúdo cultural”, como vocês dizem. No que vocês creem que o mercado de geração de conteúdo precisa ser modificado? Um grande problema é que, de modo geral, muita gente tem dificuldade de monetizar conteúdo gerado na web… Não só o mercado de geração de conteúdo, mas sinto que em qualquer tipo de trabalho ou produção laboral, o “monetizar” vem antes do “produzir”. E, pior do que isso, o “ter” vem antes do “ser”. Aí a gente já começa o jogo da vida perdendo de goleada.

No YouTube, a gente não monetiza os clipes e making ofs de Videoclipers. Preferimos abrir mão da monetização ali por uma série de razões. Mas já estamos negociando o licenciamento da série com um canal de TV. É assim que a gente espera ter o dinheiro que investimos de volta.

Achamos, e nosso estilo de vida prova isso, que muitas trocas e experiências não são vivenciadas quando colocamos muito peso sob o aspecto monetário. Criamos uma rede muito mais integrada, colaborativa e lúcida nos cinco anos fazendo projetos sem grana do que em 15 anos trabalhando em canais e produtoras como assalariados. O dinheiro nos trouxe muitas coisas. A falta dele nos trouxe liberdade pra decidir se precisamos dele e quando precisamos dele. Parece conversa de auto-ajuda, mas é que quando a gente se dá conta disso, começamos a entender que temos uma vida inflada. Aos poucos, a gente se acostuma a achar que precisamos ter sempre mais e que é necessário pagar por tudo que queremos e receber por tudo que produzimos. Isso não é verdade. Inclusive, o mundo tecnológico permite que seja justamente ao contrário.

Videoclipers: quando a produção de clipes vira estilo de vida
Com Dona Onete e equipe no estúdio (foto: Ju Vasconcelos)

É possível viver e trabalhar explorando muitas plataformas e metodologias colaborativas, aprendendo novas habilidades de graça e se conectando com pessoas certas. E quando se adota esse estilo de vida, tendo a consciência de que precisamos de muito menos, entendemos que nem tudo precisa ser monetizado e que é possível ser “pago” de mil e uma maneiras distintas.

Só pra dar um exemplo, todo mundo precisa comer. E comida, quando se mora numa cidade, você consegue no supermercado ou no restaurante. Durante o Videoclipers, trocamos refeição e compras por conteúdo. Reduzimos o custo de vida pagando com nosso trabalho e, o mais legal, nos conectamos com donos de restaurantes e mercados, criando relações afetivas com todos. Fizemos isso com moradia também. Então, o problema não é que as pessoas têm dificuldade de monetizar conteúdo, mas sim dificuldade de ser criativo pra não depender apenas da monetização de conteúdo.

Videoclipers: quando a produção de clipes vira estilo de vida
Com Felipe Cordeiro (foto: Ju Vasconcelos)

Pode citar um exemplo de como funcionou isso na prática? Durante as filmagens do Videoclipers, Recife foi a cidade que mais passamos tempo, por conta daquela esticada que demos pra conseguir filmar com o Alceu. Ao todo, foram 19 dias (o normal foi 10 dias por cidade pra filmar dois clipes). E como ficamos mais tempo lá, decidimos estabelecer três tipos de parceria: com o Airbnb pra ter acomodação, com um empório de comida que ficava no nosso bairro (Empório Pura Vida) e também com restaurantes (Motche Restô e Flô de Jambo). Entramos em contato com todos eles bem antes de ir pra Recife, oferecendo menção deles em nossas redes sociais e também produzindo fotos pra eles postarem em suas redes sociais. Dessa forma, o custo de vida nosso caiu cerca de 70%. Em nosso Instagram tem várias fotos dessas, referente a essas parcerias. Tentamos o mesmo com Uber e passagem aérea, mas não conseguimos.

E outro exemplo legal foi em Porto Alegre, a antepenúltima cidade que visitamos pelo Videoclipers. A gente queria muito filmar um dos clipes lá – com a banda Dingo Bells – no Vila Flores, um espaço cultural que é co-working, galeria e várias outras coisas. Era o lugar perfeito pra ideia que tivemos.

Só que o lugar tinha um custo de locação muito alto e jamais poderíamos pagar por ele, até mesmo porque nossa ideia é tentar filmar os clipes sem gastar nada. Faz parte do nosso desafio. E conversando com os proprietários do espaço, oferecemos a troca: a gente grava nosso clipe aí e em contra-partida fazemos uma palestra pra comunidade que frequenta o Vila Flores. E eles toparam. Como a gente tem algumas palestras já montadas (ja que ja participamos de TEDx, do SXSW, e de outros festivais de criatividade), e gostamos muito de dividir nossas experiências com outros, pra gente foi muito legal.

Então essas são provas de que, com criatividade e trabalho, tem muitas maneiras de estabelecer trocas e ganhos.

No que acham que os projetos de vocês podem inspirar pessoas? A ideia é de fato criar um mercado diferente para a turma de vídeo? O objetivo não é fazer com que as pessoas achem os clipes legais. A gente espera mesmo é que as pessoas possam hackear a forma como a gente vive, que permite viver fazendo o que gostamos. Mas não temos nenhuma pretensão de inspirar pessoas, só mesmo ser case de um estilo de vida que dá certo também, assim como muitos outros.

(foto destaque: Lumos Estudio)

Cultura Pop

Urgente!: E agora sem o Ozzy?

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Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre.

Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre. Tudo começou com uma banda, o Black Sabbath, que já era um verdadeiro errado que deu certo – um ET musical que fazia som pesado quando mal havia o termo “heavy metal” e que falava de terror na ressaca do sonho hippie. E prosseguiu com a lenda de um sujeito que gravou álbuns clássicos como Blizzard of Ozz (1980), Diary of a madman (1981) e No more tears (1991) – eram quase como filmes.

Ozzy pode ser definido como um cara de sorte – e também como um cara que abusou MUITO da sorte, mas pula essa parte. A depender daqueles progressivos anos 1970, não havia muito o que explicasse o futuro de Ozzy Osbourne na música. Em várias entrevistas, Ozzy já disse que não sabia tocar nenhum instrumento quando começou – na verdade nunca nem chegou a aprender a tocar nada. Tinha a seu favor uma baita voz (mesmo não ganhando reconhecimento algum da crítica por isso, Ozzy sempre foi um grande cantor), um baita carisma, ouvido musical e a disposição para encarnar o estranho e o inesperado no palco em todos os shows que fazia.

Imortalizada em livros como a autobiografia Eu sou Ozzy, a história de Ozzy Osbourne é um daqueles momentos em que a realidade pode ser mais desafiadora que a ficção. Afinal, quem poderia imaginar que um garoto da classe trabalhadora britânica se tornaria o que se tornou? Talvez tenha sido até por causa das dificuldades, que também moveram vários futuros rockstars ingleses da época – ou pelo fato de que o rock e a música pop do fim dos anos 1960 ainda eram quase mato, universos a serem desbravados, com poucos parâmetros. Seja como for, se hoje há artistas de rock que se dedicam a discos e a projetos que parecem ter saído da cabeça de algum roteirista bastante criativo, Ozzy teve muita culpa nisso.

Fora as vezes que o vi no palco, estive frente a frente com Ozzy apenas uma vez, numa coletiva de imprensa do Black Sabbath – da qual Tony Iommi não participou, por estar se recuperando de uma cirurgia (havia tido um câncer). Seja lá o que Ozzy pensasse da vida ou de si próprio, me chamou a atenção o clima de quase aconchego da sala de entrevistas (acho que era no hotel Fasano): um lugar pequeno, com ele e Geezer Butler (baixista) bem próximos dos repórteres. Que por sinal não eram inúmeros.

Já havia feito entrevistas internacionais antes mas nunca imaginei estar tão perto de uma lenda do rock que eu ouvia desde os doze anos. Fiz uma pergunta, ele respondeu, e eu, que sempre fiquei nervoso em entrevistas (imagina numa coletiva com o Black Sabbath!) voltei pra casa como se tivesse ido cobrir um buraco que apareceu numa rua no Centro. Não que não tenha me dedicado à pauta, mas era o Ozzy e eu estava… numa tranquilidade inimaginável.

Ozzy também já me deu uma entrevista por e-mail, em 2008, em que reafirmou sua adoração por Max Cavalera, disse que não tinha ideia se a série The Osbournes havia levado seu nome a um novo público, e reclamou da MTV, “que virou uma versão adulta da Nickelodeon”. Também disse que nunca diria nunca a seus então ex-companheiros do Black Sabbath (“nos falamos por telefone e quando as agendas permitem, nos encontramos”).

Nesse papo, Ozzy só se irritou quando fiz uma pergunta que envolvia o Iron Maiden, que tinha passado recentemente pelo Brasil, ou estaria vindo – não lembro mais. “Bom, não sei te responder, pergunta pro Iron Maiden!”, disse, em letras garrafais (todas as respostas foram em caixa alta). Lembro que ri sozinho e fui bater a matéria.

Até hoje só acredito que isso tudo aí aconteceu (e não é nada perto do que uns colegas viveram com Ozzy e o Black Sabbath) porque vi as matérias impressas. Mas acho que antes de tudo, consegui humanizar na minha mente um cara que eu ouvia desde criança. Ozzy era de carne e osso, respondia perguntas, tinha lá seus momentos de irritação e, enfim, mesmo tendo o fim que todo mundo vai ter, viveu bem mais do que muita gente. E mudou vidas.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Divulgação

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Crítica

Ouvimos: Justin Bieber – “Swag”

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Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

RESENHA: Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

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Justin Bieber opera hoje num universo de, vamos dizer assim, venda fácil e compreensão difícil. Ser um cantor branco de r&b significa basicamente que você vai ter que fazer shows, gravar discos e existir no show business, de modo geral, no limite da polêmica. Afinal, tanto r&b quanto rap são áreas de artistas negros, ligadas a um histórico que se estende ao soul, e a vivências pessoais – e o mundo mudou o suficiente para que o mercado quase entenda o peso de certas coisas.

Por quase entenda, leia-se que, na maioria dos casos, tudo pode ser resolvido por uns posts nas redes sociais e uma tour pelos lugares certos, com as pessoas corretas. Mas pra piorar um pouco, nos últimos tempos, Justin andava brotando mais no noticiário de fofoca do que nos cadernos de cultura. As notícias eram sobre cancelamentos de shows, brigas com a mulher Hailey, relacionamentos supostamente mais do que íntimos com o rapper P. Diddy e supostos abusos de substâncias.

E, bom, o que faz um astro como Justin Bieber numa hora dessas? Para calar a boca de uma renca de gente durante um bom tempo, ele simplesmente lança um disco novo do mais absoluto nada – e este disco é Swag, uma epopéia de quase uma hora, com 21 faixas. E antes de mais nada, Swag consegue colocar de vez Justin numa espécie de “espírito do tempo” pop no qual artistas como Taylor Swift, Rihanna, Beyoncé e Miley Cyrus já se encontram há um bom tempo.

Esse tal (hum) zeitgeist significa que tais artistas – seguindo uma linhagem que inclui de Beatles a Marvin Gaye – decidiram se libertar de amarras para fazerem o que bem entendem. Ou seja: discos de protesto, álbuns com design musical troncho, feats que os fãs vão estranhar, projetos com produtores pino-solto, singles com referências que o fã-clube vai ter que buscar no Google, lançamentos com fotos de divulgação distorcidas – ou capas no estilo meu-sobrinho-fez.

De modo geral, são artistas que podem se dar ao luxo de perder alguns fãs, em nome de verem seus álbuns se tornarem (vá lá) pretensos barômetros do nosso tempo, ou pelo menos crônicas pessoais-autoficcionais. Alguns exemplos: Brat, de Charli XCX, trouxe a zoeira da noite de volta. Hit me hard and soft, de Billie Eilish, foi importante na onda de música sáfica. GNX, de Kendick Lamar, explora misérias existenciais e brigas no showbusiness. Vai por aí. Fazer disco com “desencucação” virou, mais do que nunca, coisa de roqueiro – aposto que você se divertiu muito com Cartoon darkness, de Amyl and The Sniffers, e ficou assustado/assustada com as teorias geradas por Brat.

Se a essa altura do meu texto você já está prestes a desistir de ler, por eu ainda não ter dito se Swag vale seu tempo precioso, aqui vai: vale, e muito. Justin já vinha de uma tradição de álbuns ligadíssimos na atualidade – o melhor deles é Purpose, de 2015. Swag tem um subtexto de “libertação”, já que Bieber acaba de dar adeus a seu empresário de vários anos, Scooter Braun (um adeus que vai lhe custar mais de 30 milhões de dólares, por sinal). E traz o cantor investindo em climas lo-fi, sons texturizados, vibes derretidas e muita coisa que virou moda de uma hora para a outra.

O G1 disse que Swag é um disco chato. Eu discordo bastante, mas o The Guardian chegou perto da realidade ao dizer que as letras prejudicam o novo álbum – de fato, a poética de Swag tem a profundidade de um pires. Já musicalmente, a diversão é garantida até para quem nunca ouviu nada do cantor. Bieber e sua turma de produtores e parceiros transformam trap e sons lo-fi em pop adulto, em faixas muito bem feitas e bem acabadas, como All I can take, a estilingada Daisies, o bedroom pop Yukon e a viajante Go baby.

O design musical de Swag é minimalista, e boa parte das músicas têm aquele clima de desleixo estudado do indie pop atual. Things you do tem guitarras decalcadas do The Police e silêncios entre vozes e sons, Butterflies é uma gravação quase caseira que vai crescendo, e faixas como First place, Way it is, Sweet spot e Walking away unem synth pop, modernidades, sons derretidos e tentativas de emular Michael Jackson.

Dadz love, com o rapper Lil B, evoca Prince, com tecladeira dos anos 1980 e texturas de 2025. A vibe dos Rolling Stones, e das voltas do grupo britânico em torno do soul e do r&b, dáo as caras em Devotion e na vinheta Glory voice memo. Uma curiosidade é o trap da faixa-título, com participações de Cash Cobain e Eddie Benjamin, e um verso proscrito sobre cocaína (“seu corpo não precisa / de nenhuma linha prateada”) que aparentemente só o Spotify transcreveu.

Vale dizer que, tentando tomar de volta o controle da própria narrativa, Justin derrapa feíssimo ao decidir colocar em Swag três diálogos com o comediante negro norte-americano Druski. Num deles, o humorista diz a ele que “sua pele é branca, mas sua alma é negra, Justin” (o cantor só responde um “obrigado” desajeitado) – em outro, o assunto inclui paparazzi e redes sociais. No final, quem ouve o disco inteiro é “premiado” com a estranhíssima presença do cantor gospel Mavin Winans ocupando sozinho a última música – o cântico religioso Forgiveness.

Enfim, é Bieber buscando legitimidade para o autoperdão e para a própria carreira de cantor branco de r&b – e mandando recados de maneira tão desajeitada que Swag, um excelente disco, quase rola escada abaixo. Swag não resolve todas as questões em torno de Justin Bieber – mas quando acerta, lembra que, às vezes, é melhor fazer do que explicar.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Def Jam
Lançamento: 11 de julho de 2025

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Cultura Pop

Urgente!: Nova do Hot Chip, “DVD” do Oasis em Cardiff, The Rapture de volta com turnê

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Hot Chip (foto) anuncia coletânea e lança single e clipe. Fã produz vídeo do primeiro show do Oasis em Cardiff só com imagens feitas por fãs. The Rapture anuncia turnê pelos Estados Unidos e Canadá.

RESUMO: Hot Chip (foto) anuncia coletânea e lança single e clipe. Fã produz vídeo do primeiro show do Oasis em Cardiff só com imagens feitas por fãs. The Rapture anuncia turnê pelos Estados Unidos e Canadá.

Texto: Ricardo Schott – Foto Hot Chip: Louise Mason/Divulgação

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Vai sair pela primeira vez uma coletânea do Hot Chip, Joy in repetition, prevista para 5 de setembro. Vale até a pergunta que muita gente já se fez: qual a importância de coletâneas nessa época de playlists e aplicativos de música com poucas infos? Bom, a importância de uma boa coletânea de hits é enorme, vale por uma setlist bem montada e pode contar uma história. E elas eram as playlist de duas décadas atrás.

No caso de Joy, ela traça o caminho do Hot Chip do tempo dos cachês baixos até a época em que jornais como The Guardian já estavam classificando Alexis Taylor, Joe Goddard, Owen Clarke, Al Doyle e Felix Martin como o maior grupo pop de seu tempo. E entre hits como Ready for the floor, I feel better e Look at where we are, ainda tem uma música nova de altíssimas proporções de grude: Devotion, já lançada em single, que é uma mescla de pop adulto, eletrônica psicodélica e futuro hit de pista, com clipe gravado no Japão.

Taylor rasga seda: Devotion é “uma celebração da devoção a este projeto coletivo”. E ele ainda faz um baita elogio ao colega Joe Goddard: “Penso no Joe como alguém parecido com o Brian Wilson, com uma dedicação enorme em descobrir como criar a música pop mais incrível possível”. Errado não está.

***

Alguém com (felizmente, não estamos julgando) muito tempo livre pegou varias imagens diferentes do primeiro show do Oasis em Cardiff, feitas por fãs da banda, e compilou um (digamos) DVD do show.

O registro tá o mais fiel possivel, apesar das imagens à distância e do som nem sempre maravilhoso – vale como um belo bootleg das antigas. Tem ate o som da fitinha de Fuckin in the bushes na abertura, e a voz do apresentador do show. Detalhe: quem botou o video no ar tentou se livrar de problemas avisando que o video nao é monetizado. Pode ser que não ganhe strike do YouTube. “É de um fã apenas para fãs”, avisa.

***

E ainda Oasis: vale ler o texto de Liv Brandão, fera do jornalismo musical brasileiro recente, sobre como a setlist do show do Oasis não foi apenas uma setlist. Foi uma aula de storytelling daquelas – como numa (olha aí) coletânea daquelas que vinham com textos contextualizando tudo.

“Muito se falou da escolha das canções, que privilegia os dois primeiros álbuns, como se só eles importassem (…). Mas tão especial quanto a seleção das 24 músicas que compõem o set, idêntico nos dois dias, é a ordem em que elas aparecem, montada para contar a história de quando o Oasis foi a maior banda do mundo – justamente na época desses discos – e tudo o que aconteceu desde então”. Leia o restante na newsletter dela

***

Banda importante do dance punk dos anos 2000, The Rapture voltou, mas não há ainda nenhuma novidade a respeito de disco novo – nem de shows no Brasil, já avisamos. Na real, esse grupo novaiorquino já está de volta desde 2019, com o cantor Luke Jenner como único membro fixo, mas não havia retornado de fato. Fizeram alguns shows, mas pararam as atividades por conta da pandemia, e foi só. Dessa vez, o grupo tem uma turnê de verdade pela frente, que começa dia 16 de setembro no mitológico First Avenue, em Minneapolis, e passa por várias cidades dos EUA e Canadá até novembro.

“Anos atrás, quando me afastei da banda, eu precisava de tempo e espaço para reconstruir minha vida”, conta Jenner sobre a volta, sem comentar diretamente sobre as brigas intermináveis que a banda tinha lá por 2014. “Eu precisava consertar meu casamento, estar presente para meu filho e, por fim, trabalhar em mim mesmo. Esta turnê marca um novo capítulo para mim, moldado por tudo o que vivi e aprendi ao longo do caminho. Conquistei tudo o que esperava alcançar através da música e agora posso usá-la para ajudar qualquer pessoa que talvez precise, como eu precisei naquela época”.

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