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Cultura Pop

Várias coisas que você já sabia sobre “Dirty mind”, do Prince

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Várias coisas que você já sabia sobre "Dirty mind", do Prince

Ele só pensava naquilo. Se em For you (1978) e Prince (1979), Prince já chocava a audiência com músicas como Sexy dancer e Soft and wet, bem vindo ao maravilhoso mundo da sacanagem e da liberdade. Dirty mind (1980), o terceiro disco, fazia odes à pornografia e ao sexo em canções como a faixa-título e Do it all night. Falava sobre festas que nunca terminavam em Party, sobre sexo oral em Head, sobre sexo a três em When you are mine e sobre (uau) tesão incestuoso no roquinho meio Queen-meio Pretenders Sister. Ademais, só para não ficar em definitivo no assunto “sexo”, Prince ainda tecia comentários sobre racismo e liberdade em Uptown.

Por acaso, o terceiro disco de Prince (que durava econômicos trinta minutos) vinha numa hora boa, já que a Warner se animara bastante com as vendas dos dois primeiros álbuns. E aquele artista multitarefa, que tocava tudo em seus LPs, chamava bastante a atenção da crítica. Mas se Dirty mind precisava deixar a gravadora feliz, havia uma tarefa mais difícil ainda para o álbum: satisfazer os critérios e o controle artístico do próprio Prince.

Várias coisas que você já sabia sobre "Dirty mind", do Prince

Em Dirty mind, o pós-disco dos dois álbuns anteriores voltava repaginado, com cara new wave, vocais simplificados (já incluindo os falsetes influenciados tanto por Stevie Wonder quanto pelos Beach Boys, que caracterizariam o cantor até o fim da vida) e muitos sintetizadores. Aliás, não era só isso: Prince voltava disposto a botar para quebrar nas paradas de rock, e inverter o caminho traçado por artistas como Rolling Stones e Queen (que foram do rock aos sons dançantes ou à disco music e derivados).

Morto em 2016, Prince gravou tantos discos memoráveis que uma discussão sobre “melhor disco” dele pode facilmente acabar em briga. Mas Dirty mind tem lá seus pontos: é um disco extremamente provocador e pioneiro, e ainda por cima está completando 40 anos essa semana (saiu em 8 de outubro de 1980). E vai aí nosso relatório sobre ele. Leia ouvindo o disco.

PARECIA QUE NÃO IA DAR. Inicialmente, nem mesmo a Warner punha tanta fé assim no taco de Dirty mind, e o disco não se revelou de cara um grande sucesso. Prince chegou a lembrar que o disco “teve vendas mínimas” assim que chegou nas lojas e as rádios também não caíram dentro com voracidade – até mesmo pelo medo de tocar músicas com letras tão cara-de-pau. O livro Prince FAQ: All that’s left to know about the Purple Reign, de Arthur Lizie, informa que se tratou do índice mais baixo de Prince nas paradas até Rainbow children (2000).

DEMOS. Essa descrença da Warner em Dirty mind veio, em parte, do fato do terceiro disco de Prince ter iniciado basicamente com demos que o cantor tinha guardadas. Prince resolveu mostrar as fitinhas para os executivos da gravadora, mas eles receberam o material de nariz torcido. “Eles disseram: ‘O som tá legal, mas não temos certeza sobre as canções. Não podemos colocar isso nas rádios, não é parecido com seu disco anterior’. Eu respondi: ‘Mas é parecido comigo'”, contou.

ORIGENS. A mistura musical de Dirty mind vinha de experiências recentes de Prince. Para começar o cantor havia aberto shows de seu rival Rick James, durante a turnê do álbum Prince (1979). Rick, considerado um grande inovador do funk, estava fazendo um baita sucesso com seu terceiro disco, Fire it up (1979) e com letras sacanas e cheias de conversa mole, como as de Love gun e Lovin in you is a pleasure. Em um período no qual a disco music ia sumindo das paradas e a new wave virava o garoto novo da escola, era um feito e tanto.

RICK JAMES – “LOVIN’ YOU IS A PLEASURE”

RICK PISTOLA. O astro Rick James havia, segundo o próprio contou algumas vezes, topado que Prince abrisse seus shows porque haviam lhe falado que o novato era fã de seu trabalho. Acabou, na lembrança do próprio Rick, se irritando, já que Prince mal lhe dirigia a palavra. James jura que o cantor fazia péssimos shows de abertura, ficava imóvel no palco e chegou a ser vaiado.

RICK PISTOLA 2. O astro principal do show acabaria ficando mais puto da vida ainda com Prince. Acusou o futuro cantor de Purple rain de roubar seus truques de palco, como o ato de virar o microfone. Diz que Prince via atentamente seus shows para copiar tudo, em detalhes. Os dois chegaram a partir para o confronto algumas vezes: James contava que chegou a agarrar Prince pelo pescoço numa festa e a “enfiar conhaque garganta abaixo dele” (oi?).

CIDADEZINHA. Ao final da turnê com James, Prince retornou para Minnesotta, mas não para a populosa Minneapolis, onde nasceu. Foi se meter numa cidade turística, próxima e bem menor, Wayzata, onde montou um estúdio de 16 canais, pago pela Warner. Foi de lá que saíram as demos de Dirty mind que a Warner achou que não renderiam. Prince admitiu depois que a gravadora nem sabia o que ele estava fazendo.

ALIÁS E A PROPÓSITO, na ficha técnica de Dirty mind, o ouvinte fica sabendo que o disco foi gravado em “somewhere in Uptown”, e mais nada.

EU FIZ TUDO. Prince, além de cantar, compor, arranjar, produzir e tocar de tudo um pouco em Dirty mind, ainda por cima autogravava-se a si mesmo no estúdio, já que também foi o técnico de som do disco. Só que assinou a tarefa como Jamie Starr. Era um pseudônimo que ele depois adotaria como engenheiro de som e produtor de discos de artistas vindo de suas bandas. Entre eles, Apollonia 6, Sheila E. e The Time.

EU FIZ (QUASE) TUDO. Prince não “tocou todos os instrumentos” em Dirty mind, como costuma ser dito por aí. Algumas participações superespeciais do álbum estão listadas no encarte: o tecladista Doctor Fink tocou sintetizadores em Head e Dirty mind. Lisa Coleman fez vocais em Head. A contracapa no entanto omite algumas parcerias. Fink coescreveu Dirty mind e Morris Day, vocalista de Prince, coescreveu Party up.

ALIÁS E A PROPÓSITO. Morris deixou a falta de crédito para lá, desde que o patrão Prince produzisse o disco de estreia de sua banda The Time. O músico produziu o disco The Time, em 1981, mas… assinou como Jamie Starr.

FORA DO LP. No meio da tour de Dirty mind, em 1981, Prince lançava pela primeira vez um single que não estava presente num LP seu. Era Gotta stop (Messin’ about), que acabou incluída no repertório da tour, e foi lançada apenas para o mercado britânico. Nos EUA, apareceu como lado B do single Let’s work, naquele mesmo ano.

“GOTTA STOP (MESSIN’ ABOUT)”

CORTARAM. Na Filipinas, Dirty mind, a música, ganhou uma versão single editada, com alguns segundos a menos.

ALIÁS, E NO BRASIL? O segundo disco de Prince, epônimo, foi lançado aqui em 1980. Mas a Warner local não se animou a fazer o mesmo com Dirty mind, que só chegou às lojas brasileiras em 1990. For you saiu quase junto com Dirty mind por aqui nesse ano.

A CAPA, CLARO. Não entende inglês e ficou por fora dos temas das letras de um disco chamado “mente poluída”? Bom, o lay out do álbum não poderia ser mais claro, com Prince de casaco, tanguinha, sem camisa, olhando desafiadoramente para a câmera. A foto de Dirty mind foi feita por Allen Beaulieu, fotógrafo de Minneapolis que se tornaria grande amigo de Prince. Pouco antes do disco, Allen fotografara um desfile chamado Save the blackness, em que pessoas negras apareciam vestidas com roupas negras sobre fundo negro. Aliás, ele fez as fotos em preto e branco. Prince viu as imagens, achou seu nome no cartaz e ligou para ele oferecendo o trabalho.

ENTREVISTA COM ALLEN BEAULIUEU

A CAPA (2). Aquilo que aparece no fundo da foto, por trás de Prince – e se é que você já não reconheceu – são as molas de uma cama. O cantor disse a Allen que fazia questão de ser fotografado numa cama, e apareceu deitado numa das fotos do disco. O fotógrafo fez todas as imagens sozinho, sem nenhum assistente. Anos depois, quando foi fazer imagens para a Rolling Stone, Allen ficou orgulhoso ao ouvir de um colega de redação: “Vi Prince antes de ouvir o som dele”.

ALIÁS E A PROPÓSITO, tem out takes das fotos espalhados pela web, além de uma imagem colorida, que acabou vazando para um pôster do disco.

Várias coisas que você já sabia sobre "Dirty mind", do Prince

A CRÍTICA GOSTOU. Só sendo completamente surdo para não perceber o quanto Dirty mind era um puta disco e o quanto era um álbum inovador, claro. E não custa dizer que a crítica gostou bastante do LP. Robert Christgau comparou Prince a Jim Morrison e John Lennon, e ainda arrematou com uma frase lapidar: “Mick Jagger deveria recolher seu pau e ir para casa”. Na Rolling Stone, Ken Tucker dizia que Prince era um romântico ingênuo nos dois primeiros discos, mas finalmente estava à solta nas sacanagens e na música.

OS SHOWS. A turnê Dirty mind foi de 4 de dezembro de 1980 a 6 de abril de 1981. A banda incluía Bobby Z (bateria), Dez Dickerson (guitarra), Lisa Coleman (teclados), André Cymone (baixo) e Matt Fink (teclados), além de Prince na voz e guitarra. O look do cantor durante o giro incluía desde cópias do visual da capa do disco (cabendo ainda leggings pretas, botas de cano longo e salto alto) até sobretudos e coletes com franjas. O repertório incluía tudo de Dirty mind, acrescido dos hits dos dois primeiros discos. Gotta stop (Messin’ about), inédita que fazia sucesso nos shows, virou single.

QUE É ISSO, RAPAZ? Na turnê, Prince queria usar calças de spandex – tecido colante, geralmente usado em roupas de ginástica e que era tendência na época. Mas queria dispensar o uso de cuecas ao colocar as tais calças. Seus empresários não gostaram muito da ideia e Prince acabou desistindo de dar uma de homem-berinjela nos palcos.

ALIÁS E A PROPÓSITO, ainda que Prince tocasse praticamente tudo em Dirty mind, a banda de palco aparecia numa foto do disco.

Várias coisas que você já sabia sobre "Dirty mind", do Prince

CONTROVÉRSIA. O sucesso de Dirty mind e de outros discos bem explícitos de Prince acendeu uma luz vermelha para vários setores conservadores dos EUA. Pastores televisivos apresentavam o disco como “mau exemplo”. Mas o álbum surfou uma onda bem interessante nos Estados Unidos, numa época em que Ronald Reagan ainda não era o presidente e não havia tanto espaço para o fundamentalismo religioso no dia a dia do país. Aliás, a mira do Parents Music Resource Center, criado na metade dos anos 1980, estava apontada mais para discos subsequentes de Prince, como Purple rain (1984), do hit onanista Darling Nikki.

E JÁ QUE VOCÊ CHEGOU ATÉ AQUI, pega aí o clipe original de Dirty mind. Aliás, curta, entre outras coisas, o visual do tecladista gozador Dr. Fink, que anos antes da pandemia do coronavírus já passava o tempo todo de máscara cirúrgica.

PRINCE – “DIRTY MIND”

Veja também no POP FANTASMA:
– Demos o mesmo tratamento a Physical graffiti (Led Zeppelin), a Substance (New Order), ao primeiro disco do Black Sabbath, a End of the century (Ramones), ao rooftop concert, dos Beatles, a London calling (Clash), a Fun house (Stooges), a New York (Lou Reed), aos primeiros shows de David Bowie no Brasil, a Electric ladyland (The Jimi Hendrix Experience) e a Pleased to meet me (Replacements).
– Demos uma mentidinha e oferecemos “coisas que você não sabe” ao falar de Rocket to Russia (Ramones) e Trompe le monde (Pixies).
– Mais Prince no POP FANTASMA aqui.

Cultura Pop

Urgente!: E agora sem o Ozzy?

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Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre.

Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre. Tudo começou com uma banda, o Black Sabbath, que já era um verdadeiro errado que deu certo – um ET musical que fazia som pesado quando mal havia o termo “heavy metal” e que falava de terror na ressaca do sonho hippie. E prosseguiu com a lenda de um sujeito que gravou álbuns clássicos como Blizzard of Ozz (1980), Diary of a madman (1981) e No more tears (1991) – eram quase como filmes.

Ozzy pode ser definido como um cara de sorte – e também como um cara que abusou MUITO da sorte, mas pula essa parte. A depender daqueles progressivos anos 1970, não havia muito o que explicasse o futuro de Ozzy Osbourne na música. Em várias entrevistas, Ozzy já disse que não sabia tocar nenhum instrumento quando começou – na verdade nunca nem chegou a aprender a tocar nada. Tinha a seu favor uma baita voz (mesmo não ganhando reconhecimento algum da crítica por isso, Ozzy sempre foi um grande cantor), um baita carisma, ouvido musical e a disposição para encarnar o estranho e o inesperado no palco em todos os shows que fazia.

Imortalizada em livros como a autobiografia Eu sou Ozzy, a história de Ozzy Osbourne é um daqueles momentos em que a realidade pode ser mais desafiadora que a ficção. Afinal, quem poderia imaginar que um garoto da classe trabalhadora britânica se tornaria o que se tornou? Talvez tenha sido até por causa das dificuldades, que também moveram vários futuros rockstars ingleses da época – ou pelo fato de que o rock e a música pop do fim dos anos 1960 ainda eram quase mato, universos a serem desbravados, com poucos parâmetros. Seja como for, se hoje há artistas de rock que se dedicam a discos e a projetos que parecem ter saído da cabeça de algum roteirista bastante criativo, Ozzy teve muita culpa nisso.

Fora as vezes que o vi no palco, estive frente a frente com Ozzy apenas uma vez, numa coletiva de imprensa do Black Sabbath – da qual Tony Iommi não participou, por estar se recuperando de uma cirurgia (havia tido um câncer). Seja lá o que Ozzy pensasse da vida ou de si próprio, me chamou a atenção o clima de quase aconchego da sala de entrevistas (acho que era no hotel Fasano): um lugar pequeno, com ele e Geezer Butler (baixista) bem próximos dos repórteres. Que por sinal não eram inúmeros.

Já havia feito entrevistas internacionais antes mas nunca imaginei estar tão perto de uma lenda do rock que eu ouvia desde os doze anos. Fiz uma pergunta, ele respondeu, e eu, que sempre fiquei nervoso em entrevistas (imagina numa coletiva com o Black Sabbath!) voltei pra casa como se tivesse ido cobrir um buraco que apareceu numa rua no Centro. Não que não tenha me dedicado à pauta, mas era o Ozzy e eu estava… numa tranquilidade inimaginável.

Ozzy também já me deu uma entrevista por e-mail, em 2008, em que reafirmou sua adoração por Max Cavalera, disse que não tinha ideia se a série The Osbournes havia levado seu nome a um novo público, e reclamou da MTV, “que virou uma versão adulta da Nickelodeon”. Também disse que nunca diria nunca a seus então ex-companheiros do Black Sabbath (“nos falamos por telefone e quando as agendas permitem, nos encontramos”).

Nesse papo, Ozzy só se irritou quando fiz uma pergunta que envolvia o Iron Maiden, que tinha passado recentemente pelo Brasil, ou estaria vindo – não lembro mais. “Bom, não sei te responder, pergunta pro Iron Maiden!”, disse, em letras garrafais (todas as respostas foram em caixa alta). Lembro que ri sozinho e fui bater a matéria.

Até hoje só acredito que isso tudo aí aconteceu (e não é nada perto do que uns colegas viveram com Ozzy e o Black Sabbath) porque vi as matérias impressas. Mas acho que antes de tudo, consegui humanizar na minha mente um cara que eu ouvia desde criança. Ozzy era de carne e osso, respondia perguntas, tinha lá seus momentos de irritação e, enfim, mesmo tendo o fim que todo mundo vai ter, viveu bem mais do que muita gente. E mudou vidas.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Divulgação

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Crítica

Ouvimos: Justin Bieber – “Swag”

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Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

RESENHA: Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

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Justin Bieber opera hoje num universo de, vamos dizer assim, venda fácil e compreensão difícil. Ser um cantor branco de r&b significa basicamente que você vai ter que fazer shows, gravar discos e existir no show business, de modo geral, no limite da polêmica. Afinal, tanto r&b quanto rap são áreas de artistas negros, ligadas a um histórico que se estende ao soul, e a vivências pessoais – e o mundo mudou o suficiente para que o mercado quase entenda o peso de certas coisas.

Por quase entenda, leia-se que, na maioria dos casos, tudo pode ser resolvido por uns posts nas redes sociais e uma tour pelos lugares certos, com as pessoas corretas. Mas pra piorar um pouco, nos últimos tempos, Justin andava brotando mais no noticiário de fofoca do que nos cadernos de cultura. As notícias eram sobre cancelamentos de shows, brigas com a mulher Hailey, relacionamentos supostamente mais do que íntimos com o rapper P. Diddy e supostos abusos de substâncias.

E, bom, o que faz um astro como Justin Bieber numa hora dessas? Para calar a boca de uma renca de gente durante um bom tempo, ele simplesmente lança um disco novo do mais absoluto nada – e este disco é Swag, uma epopéia de quase uma hora, com 21 faixas. E antes de mais nada, Swag consegue colocar de vez Justin numa espécie de “espírito do tempo” pop no qual artistas como Taylor Swift, Rihanna, Beyoncé e Miley Cyrus já se encontram há um bom tempo.

Esse tal (hum) zeitgeist significa que tais artistas – seguindo uma linhagem que inclui de Beatles a Marvin Gaye – decidiram se libertar de amarras para fazerem o que bem entendem. Ou seja: discos de protesto, álbuns com design musical troncho, feats que os fãs vão estranhar, projetos com produtores pino-solto, singles com referências que o fã-clube vai ter que buscar no Google, lançamentos com fotos de divulgação distorcidas – ou capas no estilo meu-sobrinho-fez.

De modo geral, são artistas que podem se dar ao luxo de perder alguns fãs, em nome de verem seus álbuns se tornarem (vá lá) pretensos barômetros do nosso tempo, ou pelo menos crônicas pessoais-autoficcionais. Alguns exemplos: Brat, de Charli XCX, trouxe a zoeira da noite de volta. Hit me hard and soft, de Billie Eilish, foi importante na onda de música sáfica. GNX, de Kendick Lamar, explora misérias existenciais e brigas no showbusiness. Vai por aí. Fazer disco com “desencucação” virou, mais do que nunca, coisa de roqueiro – aposto que você se divertiu muito com Cartoon darkness, de Amyl and The Sniffers, e ficou assustado/assustada com as teorias geradas por Brat.

Se a essa altura do meu texto você já está prestes a desistir de ler, por eu ainda não ter dito se Swag vale seu tempo precioso, aqui vai: vale, e muito. Justin já vinha de uma tradição de álbuns ligadíssimos na atualidade – o melhor deles é Purpose, de 2015. Swag tem um subtexto de “libertação”, já que Bieber acaba de dar adeus a seu empresário de vários anos, Scooter Braun (um adeus que vai lhe custar mais de 30 milhões de dólares, por sinal). E traz o cantor investindo em climas lo-fi, sons texturizados, vibes derretidas e muita coisa que virou moda de uma hora para a outra.

O G1 disse que Swag é um disco chato. Eu discordo bastante, mas o The Guardian chegou perto da realidade ao dizer que as letras prejudicam o novo álbum – de fato, a poética de Swag tem a profundidade de um pires. Já musicalmente, a diversão é garantida até para quem nunca ouviu nada do cantor. Bieber e sua turma de produtores e parceiros transformam trap e sons lo-fi em pop adulto, em faixas muito bem feitas e bem acabadas, como All I can take, a estilingada Daisies, o bedroom pop Yukon e a viajante Go baby.

O design musical de Swag é minimalista, e boa parte das músicas têm aquele clima de desleixo estudado do indie pop atual. Things you do tem guitarras decalcadas do The Police e silêncios entre vozes e sons, Butterflies é uma gravação quase caseira que vai crescendo, e faixas como First place, Way it is, Sweet spot e Walking away unem synth pop, modernidades, sons derretidos e tentativas de emular Michael Jackson.

Dadz love, com o rapper Lil B, evoca Prince, com tecladeira dos anos 1980 e texturas de 2025. A vibe dos Rolling Stones, e das voltas do grupo britânico em torno do soul e do r&b, dáo as caras em Devotion e na vinheta Glory voice memo. Uma curiosidade é o trap da faixa-título, com participações de Cash Cobain e Eddie Benjamin, e um verso proscrito sobre cocaína (“seu corpo não precisa / de nenhuma linha prateada”) que aparentemente só o Spotify transcreveu.

Vale dizer que, tentando tomar de volta o controle da própria narrativa, Justin derrapa feíssimo ao decidir colocar em Swag três diálogos com o comediante negro norte-americano Druski. Num deles, o humorista diz a ele que “sua pele é branca, mas sua alma é negra, Justin” (o cantor só responde um “obrigado” desajeitado) – em outro, o assunto inclui paparazzi e redes sociais. No final, quem ouve o disco inteiro é “premiado” com a estranhíssima presença do cantor gospel Mavin Winans ocupando sozinho a última música – o cântico religioso Forgiveness.

Enfim, é Bieber buscando legitimidade para o autoperdão e para a própria carreira de cantor branco de r&b – e mandando recados de maneira tão desajeitada que Swag, um excelente disco, quase rola escada abaixo. Swag não resolve todas as questões em torno de Justin Bieber – mas quando acerta, lembra que, às vezes, é melhor fazer do que explicar.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Def Jam
Lançamento: 11 de julho de 2025

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Cultura Pop

Urgente!: Nova do Hot Chip, “DVD” do Oasis em Cardiff, The Rapture de volta com turnê

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Hot Chip (foto) anuncia coletânea e lança single e clipe. Fã produz vídeo do primeiro show do Oasis em Cardiff só com imagens feitas por fãs. The Rapture anuncia turnê pelos Estados Unidos e Canadá.

RESUMO: Hot Chip (foto) anuncia coletânea e lança single e clipe. Fã produz vídeo do primeiro show do Oasis em Cardiff só com imagens feitas por fãs. The Rapture anuncia turnê pelos Estados Unidos e Canadá.

Texto: Ricardo Schott – Foto Hot Chip: Louise Mason/Divulgação

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Vai sair pela primeira vez uma coletânea do Hot Chip, Joy in repetition, prevista para 5 de setembro. Vale até a pergunta que muita gente já se fez: qual a importância de coletâneas nessa época de playlists e aplicativos de música com poucas infos? Bom, a importância de uma boa coletânea de hits é enorme, vale por uma setlist bem montada e pode contar uma história. E elas eram as playlist de duas décadas atrás.

No caso de Joy, ela traça o caminho do Hot Chip do tempo dos cachês baixos até a época em que jornais como The Guardian já estavam classificando Alexis Taylor, Joe Goddard, Owen Clarke, Al Doyle e Felix Martin como o maior grupo pop de seu tempo. E entre hits como Ready for the floor, I feel better e Look at where we are, ainda tem uma música nova de altíssimas proporções de grude: Devotion, já lançada em single, que é uma mescla de pop adulto, eletrônica psicodélica e futuro hit de pista, com clipe gravado no Japão.

Taylor rasga seda: Devotion é “uma celebração da devoção a este projeto coletivo”. E ele ainda faz um baita elogio ao colega Joe Goddard: “Penso no Joe como alguém parecido com o Brian Wilson, com uma dedicação enorme em descobrir como criar a música pop mais incrível possível”. Errado não está.

***

Alguém com (felizmente, não estamos julgando) muito tempo livre pegou varias imagens diferentes do primeiro show do Oasis em Cardiff, feitas por fãs da banda, e compilou um (digamos) DVD do show.

O registro tá o mais fiel possivel, apesar das imagens à distância e do som nem sempre maravilhoso – vale como um belo bootleg das antigas. Tem ate o som da fitinha de Fuckin in the bushes na abertura, e a voz do apresentador do show. Detalhe: quem botou o video no ar tentou se livrar de problemas avisando que o video nao é monetizado. Pode ser que não ganhe strike do YouTube. “É de um fã apenas para fãs”, avisa.

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E ainda Oasis: vale ler o texto de Liv Brandão, fera do jornalismo musical brasileiro recente, sobre como a setlist do show do Oasis não foi apenas uma setlist. Foi uma aula de storytelling daquelas – como numa (olha aí) coletânea daquelas que vinham com textos contextualizando tudo.

“Muito se falou da escolha das canções, que privilegia os dois primeiros álbuns, como se só eles importassem (…). Mas tão especial quanto a seleção das 24 músicas que compõem o set, idêntico nos dois dias, é a ordem em que elas aparecem, montada para contar a história de quando o Oasis foi a maior banda do mundo – justamente na época desses discos – e tudo o que aconteceu desde então”. Leia o restante na newsletter dela

***

Banda importante do dance punk dos anos 2000, The Rapture voltou, mas não há ainda nenhuma novidade a respeito de disco novo – nem de shows no Brasil, já avisamos. Na real, esse grupo novaiorquino já está de volta desde 2019, com o cantor Luke Jenner como único membro fixo, mas não havia retornado de fato. Fizeram alguns shows, mas pararam as atividades por conta da pandemia, e foi só. Dessa vez, o grupo tem uma turnê de verdade pela frente, que começa dia 16 de setembro no mitológico First Avenue, em Minneapolis, e passa por várias cidades dos EUA e Canadá até novembro.

“Anos atrás, quando me afastei da banda, eu precisava de tempo e espaço para reconstruir minha vida”, conta Jenner sobre a volta, sem comentar diretamente sobre as brigas intermináveis que a banda tinha lá por 2014. “Eu precisava consertar meu casamento, estar presente para meu filho e, por fim, trabalhar em mim mesmo. Esta turnê marca um novo capítulo para mim, moldado por tudo o que vivi e aprendi ao longo do caminho. Conquistei tudo o que esperava alcançar através da música e agora posso usá-la para ajudar qualquer pessoa que talvez precise, como eu precisei naquela época”.

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