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Cultura Pop

Sinal de Alerta: a abertura de novela mais punk da televisão brasileira

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Sinal de Alerta: a abertura de novela mais perturbadora da televisão brasileira

Exibida pela Globo entre 1978 e 1979, a novela Sinal de alerta mexeu em vespeiros um tanto complexos para a época.

Até aquele período, o tema “ecologia” aparecia em uma música ou outra do Roberto Carlos – isso para ficar nos produtos populares do Brasil. Não havia nem sequer um partido verde no país (o PV data de 1985). E temas como “poluição” e “meio ambiente” só apareciam mesmo em reportagens de telejornal, que davam ao grande público a sensação de que aquilo tudo era numa galáxia distante daqui.

Agora volte para o começo dos anos 1970 e analise o fato de que o cardápio do “milagre brasileiro” (e do governo militar) incluía arrocho geral em operários e fábricas trabalhando ininterruptamente. Nesse cenário, a Globo pôs no horário experimental das 22h uma trama (escrita por Dias Gomes) que falava da poluição das grandes cidades, da fumaça das chaminés das fábricas e da prepotência dos capitães de indústria. Por sinal, personificados em Tião Borges, o dono da poluidora fábrica de inseticidas Ferlitit e personagem de Paulo Gracindo.

Os fãs de aberturas de novelas e de trilhas sonoras também ganhavam uma surpresa com Sinal de alerta. Nas chamadas das novas tramas, era comum que a emissora apresentasse o elenco ao som da música da abertura – que era sempre um lançamento. Quem visse os comerciais da futura novela, com a demonstração do elenco, ouviria Salve o verde, balanço que Jorge Ben havia composto para o Quarteto Em Cy cantar. Uma outra inovação da novela já vinha nas chamadas: o nome Sinal de alerta não aparecia, apenas a máscara contra gases que simbolizava a trama.

No LP da trilha nacional, Salve o verde ocupava exatamente o local destinado às músicas de abertura nos antigos LPs (se você nunca tinha reparado, elas sempre encerravam o lado A). Mas na abertura, a Globo optou por não usar trilha e utilizar um som que mais parecia uma versão folhetinesca de Revolution 9, dos Beatles, com vários ruídos colados. E várias imagens que misturavam desenhos, fotos e uso de modelos.

Pode ter passado despercebido para muita gente, mas a abertura de Sinal de alerta levava para a TV brasileira algo parecido com o estilo gráfico das animações de Terry Gilliam para o Monty Phyton’s flying circus.

O velho slogan televisivo do “no ar, mais um campeão de audiência!” não funcionou para Sinal de alerta. A novela foi bastante criticada, não gerou muito Ibope e deixou o horário das 22h parado por alguns anos.

Com as greves do ABC paulista dobrando a esquina, a Globo insistiu em ambientar a história de Sinal de alerta no Rio. Isso pode ter servido para tranquilizar a censura, mas cortou parte do realismo da trama. Dias Gomes, não custa lembrar, havia se inspirado no dia a dia insalubre de um bairro de São Paulo para escrever o texto. Por sinal, a novela nem sequer revelava o nome do bairro carioca onde ficava a fábrica, “para não desvalorizá-lo” (dizia o autor a O Globo em 31 de julho de 1978).

Sinal de Alerta: a abertura de novela mais perturbadora da televisão brasileira

Várias imagens da abertura

A abertura de Sinal de alerta hoje, no entanto, é bastante lembrada – mais recentemente, por causa do YouTube, que a imortalizou. E marcou época por levar experimentação e uma arte quase punk à TV brasileira. O POP FANTASMA decidiu procurar os três criadores da abertura, Hans Donner, Rudi Böhm e Sergio Liuzzi, e reconstruir a história do trabalho.

Praticamente as mesmas perguntas foram feitas aos três. Böhm e Liuzzi responderam por escrito e Hans enviou um áudio por intermédio de seu assessor de imprensa. Optamos por contar tudo como uma história oral, com os temas envolvidos e tudo o que foi falado/escrito.

O COMEÇO

SERGIO LIUZZI. Entrei na Globo como assistente de cenografia. Havia trancado a Faculdade de Arquitetura na ilha do Fundão. Soube que dois alemães estavam preparando uma grande mudança na identidade visual da televisão. Conheci o Hans através do designer Nilton Nunes que já trabalhava na Globo há alguns anos. Fizemos a abertura de uma novela de época (das seis) que teve boa aceitação. A área que o Nilton trabalhava transferiu-se para o prédio recém-inaugurado numa sala ao lado do Hans. A partir daí, com o tempo nos aproximamos e tornei-me seu assistente.

RUDI BÖHM. Para encurtar a longa história, caso contrário, seria uma novela, eu trabalhava, neste época de 1972, como designer de televisão austríaca sob a direção de Erich Sokol. Ele era um excelente designer e fantástico chargista da Playboy e depois da Kronenzeitung em Viena.

Hans e eu nos conhecemos em Viena. Logo depois ele voltou do Brasil pela primeira vez. Como ele não sabia nada de animação e eu já trabalhava com desenhos animados e filmes de animação, ele me convidou para animar seus primeiros logotipos na Globo.

Ele voou de volta ao Rio com este primeiro filme de 35 mm, que foi em 1973. Pouco depois, em 1974, a Globo me convidou para uma consulta e logo depois mandou um contrato de trabalho como diretor de arte. Nossa área de trabalho foi dividida em duas divisões. O logotipo e o design corporativo era com o Hans e, mais tarde, com a ajuda de Sergio. E a minha parte estava o design em movimento. Nisso, Nilton Nunes, que era um editor de vídeo, foi um importante ajudante. Também naquela época, tínhamos ajuda de Cissa Guimarães. Era nossa estagiária.

Além de aberturas de novelas, que eram produzidas em cinema, minha área era a criação das chamadas, pré-censuras, vinhetas, inter-programas e aberturas para séries de TV. A primeira abertura da novela Bravo foi em 1975, depois veio Estúpido cupido (1976), Espelho mágico, Nina (1977), O pulo do gato, Dancin days, Sinal de alerta (1978). Depois Pecado rasgado, Marrom glacé, Malu mulher, Plantão de polícia, Carga pesada (tudo em 1979), e todas as vinhetas da programação.

Nessa época, no Fantástico, fui produzido por Guga, irmão do Boni, na Blimp Filmes, de São Paulo. E ainda todos os jornais, como Jornal Nacional, Jornal Hoje, Jornal da Globo, Globo Repórter, Carnaval, etc.

No começo, não havia nenhuma câmera de animação tipo Oxberry no Brasil. Então eu voei de outubro a janeiro para Nova York e Los Angeles, onde criei e produzi o jogo das vinhetas anuais, em estúdios de cinema. E o resto do ano o meu tempo foi preenchido com produção de aberturas. O restante foi feito em vídeo com Nilton, Hans e Sergio.

HANS DONNER. Olha, difícil de imaginar que alguém me pergunte de um trabalho feito há 400 anos… Porque é assim que eu me sinto. Nas primeiras décadas, daquele ano de 1978, cada ano contava como dez. Depois cada ano virou 20, 30 em termos de contagem de tempo. Mas óbvio que eu me lembro de todos esses projetos, porque foram o início, literalmente, de mexer com a sensação e a emoção de todos os brasileiros.

Foi uma das aberturas que ficaram na memória, muitas pessoas devem se lembrar de Sinal de alerta. E naquele mesmo ano de 1978, eu preparei uma mulher saindo da banana (na abertura do humorístico O planeta dos homens). Hoje, nas minhas palestras, eu resumo e destaco os trabalhos mais impactantes, e com certeza a Wilma Dias (modelo da abertura) saindo da banana faz parte dessa seleção de dez ou doze aberturas que fazem as pessoas viajarem no tempo.

TECNOLOGIA NA TV, ANOS 1970

HANS DONNER. Era nítido para onde o mundo estava caminhando quando usamos aquelas imagens na abertura. O Rudi era um gênio, dominava uma máquina que custava 500 mil dólares e que a Globo comprou imediatamente quando eu pedi. E ainda tínhamos um assistente como o Sergio.

SERGIO LIUZZI. Até meados dos anos 1980, a computação gráfica dava seus primeiros passos. As abertura das novelas, telejornais e programas eram feitas em vídeo, de forma bastante rudimentar, ou em animação – Sinal de alerta – numa truca operada pelo Rudi, que a Globo alugava. A truca fazia as animações quadro a quadro em película, um processo demorado e extremamente complexo, porém com infinitos recursos.

RUDI BÖHM. A abertura de Sinal de alerta foi o primeiro trabalho e, de alguma forma, o único (na época não havia computador) onde eu combinava muitas técnicas. O material básico era fotografia de stop-motion e filmagens de time-lapse em fotografia.

O personagem principal era Claudinho, meu assistente de São Paulo na época. Aliás, um personagem maravilhoso.

O trabalho fotográfico e o material básico de filme ao vivo foram produzidos pela Lynxfilm. Lá tinha a única câmera de time-lapse do América do Sul. O material fotográfico foi inflado em Cibacrome (transparências), e depois composto com máscaras de Kodalith (papel fotográfico).

Só tinha uma câmera de animação (Oxberry) no Brasil. Era de Josef Reindl, um checo. A empresa chamava se Truca, na Rua Abolição, Bela Vista, que possuía a primeira câmera de animação inglesa, uma Nilson-Hardell. A imagem ao vivo foi combinada com o material stop motion na imagem aérea. No final, combinamos o material pré-trucado com as máscaras no banco óptico. E essa máquina chamava-se truca.

Hoje em dia tudo soa um pouco chinês, mas era um trabalho emocionante de quebra-cabeça que exigia muita paciência e perseverança.

Depois que meu storyboard foi aceito por Boni e pelo diretor Walter Avancini, o que aconteceu imediatamente, mudei-me para o Hotel Jaraguá, São Paulo, na Rua Martins Fontes. E comecei a produção. Carlito Maia, que trabalhava para a Globo na época, foi uma grande ajuda. Além de fazer uma maravilhosa introdução à culinária italiana em São Paulo!

Lembro-me de uma visita do Boni, dois, três dias antes do término do trabalho para ver a abertura na moviola. Ninguém havia visto esse trabalho antes.

Em um domingo chuvoso, a ponte aérea foi fechada. Eu voei para o Rio com um jato particular e o material entrou segunda-feira no ar.

HANS DONNER. Eu me lembro daquela cena em que quis mostrar a poluição da Lagoa Rodrigo de Freitas. Puxei aquele “pano de lama” na frente da câmera para inserir naquela cena porque na época planejava-se concretar a Lagoa e construir prédios, o que graças a Deus não aconteceu. A poluição virou de fato o que estávamos mostrando naquela época.

NADA DE MÚSICA-TEMA, SÓ RUÍDOS

RUDI BÖHM. Desde o início do meu trabalho como animador, sempre fiz meu próprio som para meus filmes. Para mim, não havia outra opção e Boni tinha 100% de confiança no meu trabalho. E imediatamente concordou com essa versão.

HANS DONNER. Foi incrível descobrir que um cara como o Boni permitiria que usássemos apenas uma máscara sem colocar escrito “sinal de alerta”. O Boni foi impressionante: aceitou que não colocássemos música, como em todas as novelas. Só ruídos. Isso já era uma loucura.

SERGIO LIUZZI. De todas as aberturas que participei, com o Hans (a maior parte) e com o Rudi, Sinal de alerta foi a mais ousada, uma vez que o conteúdo tratava de um tema até então inédito nas telenovelas – problemas do cada vez mais acentuado desordenamento urbano que afetavam os moradores dos grandes centros.

O Rio de Janeiro desde o início dos anos 80, vinha num processo acelerado de  desconstrução. Estávamos no final dos anos 80, e as questões ligadas ao meio ambiente não tinham a relevância e exposição diária nos meios de comunicação que têm hoje. Não existia internet. A questão ambiental não era tema de primeira página. A Eco 92 (que participei de uma exposição coletiva no MAM) só aconteceria 12 anos depois. Lembro-me que uma ou duas cenas do roteiro da abertura foram retiradas a pedido da direção. A trilha sonora ficou perfeita, em total sintonia com as imagens.

INFLUÊNCIA DE TERRY GILLIAM E MONTY PHYTON. TEVE?

SERGIO LIUZZI. Tomei conhecimento do Monty Python muitos anos depois. Honestamente não é definitivamente a minha praia. Devo ter visto umas duas vezes.

RUDI BÖHM. Sempre fui um fã de Terry Gilliam, desde o início. Eu amei e amo seu senso de humor e sátira. Hans e Sergio tinham um visão mais acadêmica e laqueada de design, um pouco como uma camada de pomada brilhante para os cabelos.

HANS DONNER. As trucagens na Oxberry foram um pouco inspiradas neles sim, e nessa linha se fez vários trabalhos.

INFLUÊNCIA DE “REVOLUTION 9”, DOS BEATLES. TEVE?

SERGIO LIUZZI. Agradeço pela analogia com Revolution 9, dos Beatles, mas honestamente, nunca passou por minha cabeça tal referência e acho que tampouco pelo Hans ou pelo Rudi. É possível que tenha havido, mas de forma totalmente inconsciente. Afinal somos da geração Beatles e Rolling Stones.

RUDI BÖHM (perguntado sobre se concordava com a comparação com a música dos Beatles) Concordo sim. Para mim, a arte em movimento só funciona com o conceito. Esta é a única maneira de explicar algo para o público e, às vezes (?!), permitir uma mudança na sociedade. Por esse motivo, mais tarde, trabalhei em várias TVs públicas no Brasil, o que me trouxe uma grande satisfação.

REPERCUSSÃO NA GLOBO

SERGIO LIUZZI. As propostas sempre eram levadas pelo Hans para que o Boni aprovasse. Não me lembro de nenhum comentário desfavorável. Creio que a abertura, quando apresentada para aprovação, teve uma ou duas passagens retiradas, mas não fizeram uma grande diferença. O tema da novela, por si só, já levantava algumas questões polêmicas.

RUDI BÖHM. Como eu disse, exceto o Boni, ninguém viu o trabalho até um dia antes de ir ao ar. Tanto quanto me lembro, não houve queixa. Naquela época, a poluição era um (quase) problema para o futuro. Dias Gomes, um homem sábio, era um dos poucos a tocar nesse tendão de Aquiles.

Foi também a primeira novela cujo logotipo era um desenho e não uma rotulação.

GRAVANDO O SOM.

RUDI BÖHM. Gravamos os trechos de ruídos no estúdio da Rita Lee, no Leblon. Guto Graça Mello foi responsável pelo gerenciamento técnico. Depois trouxe o material para São Paulo via fita magnética de 17 1/2 e montei na Moviola as bandas sonoras. Depois misturamos e mixamos no Estúdio Álamo na Vila Madalena. Uma cópia em som óptico foi desenvolvida e uma redução para 16mm foi feita com o internegativo de 35mm. Naquela época, a Globo ainda não possuía um telecine de 35 mm que transferia o filme para o vídeo.

SERGIO LIUZZI. As músicas das aberturas já chegavam definidas. As trilhas sonoras eram comercializadas pela gravadora Som Livre, uma empresa do grupo Globo. Não sei se a trilha de Sinal de alerta, distribuída pela Som Livre, incluía os ruídos usados na abertura – creio que não (não, os ruídos ficaram apenas na abertura).

TRABALHO EM CONJUNTO

RUDI BÖHM. Hans e Sergio fizeram o logotipo. Nada mais.

SERGIO LIUZZI. O primeiro contato que tínhamos com as novelas era feito através de uma sinopse com uma ou duas páginas. Os textos chegavam em português, sem tradução. Em Sinal de alerta, fizemos um storyboard a partir de anotações das idéias e propostas de cada um. A partir da narrativa que criamos, o Rudi construiu as imagens na Oxberry (truca).

O PÚBLICO FICOU IMPACTADO?

SERGIO LIUZZI. Não dava tempo para ter esse tipo de avaliação, nem tampouco interesse. Nosso ritmo de trabalho era intenso.

RUDI BÖHM. Foi realmente a única e provavelmente a última abertura que teve uma mensagem para o público. Não era um papel de embrulho para um produto, como os outros.

É claro que a plateia ficou chocada, mas eles entenderam o conteúdo.

Naquela época, não havia um Bolsonaro, dizendo coisas estúpidas.

DEPOIS DE “SINAL DE ALERTA”.

HANS DONNER. Nem me pergunte onde estão o Rudi e o Sergio, são 40 anos. De vez em quando escuto que um deles virou fazendeiro, cuida de escolas no interior de São Paulo… Foram pessoas que fizeram parte dos primeiros trabalhos, usando o desespero dos sinais que estavam por vir, e que hoje estão vendo o quanto valeu alertar as pessoas. Alertá-las que elas iriam ser transportadas dentro de latas de sardinha, ou sendo empurradas, como no Japão é praxe. Ou tendo memória dos prédios sendo arrancados com guindaste.

SERGIO LIUZZI. No segundo ano de faculdade, desisti definitivamente da Arquitetura, e dei muita sorte de ter trabalhado com o Hans. Com ele aprendi que design é persistência e dedicação. Os três anos e meio que trabalhamos lado a lado me deram a base para que eu partisse para outras aventuras (no design gráfico). Tive um escritório de design por vinte anos. Pude, então, “passear” por diversos segmentos, atendendo clientes das mais diferentes áreas e conhecer outros ótimos designers. Foi um desafio, mas valeu a pena.

RUDI BOHM. Hoje, minha vida cotidiana tem muitas facetas.

Dirigir vídeos documentais, escrever livros, fazer fotos e pintar exposições, cozinhar, trabalhar na minha carpintaria e cuida da manutenção da Escola e da biblioteca de Associação Apecatu.

Manutenção significa telefone, hidráulica, eletricidade, cadeiras, mesas… Dá para se divertir! Dá para se divertir! Entre no site www.rudibohm.com.br e/ou www.apecatu.org.br para ver mais.

HANS DONNER. Se vocês me levaram de volta para 1978 e acharam que o Sinal de alerta foi uma premonição, respondo que o verdadeiro Sinal de alerta eu fiz em 1992.

Foi a abertura da novela Deus nos acuda, quando veio na minha cabeça mostrar como nosso país ia ser roubado. E representei tudo com uma lama invadindo uma festa de roubalheira milionária em Brasília, em que a lama estava vindo até a boca e ninguém estava nem aí. Infelizmente ela entrou na nossa boca e o Brasil foi roubado.

Coloquei nessa abertura um sinal de alerta, de um presidente que foi impichado por comprar Ferraris e Porsches. A CNN botou um jornalista na minha sala na Globo para falar dessa abertura. Era um sinal de que só deus pode ajudar a gente. Essa abertura deveria ter tido o subtítulo “sinal de alerta”, mas ninguém se tocou. Estamos no fundo do poço e nosso país foi roubado do mapa múndi. Foram imagens que entraram além da retina, mas não entraram no estômago, para que cuidassem mais do nosso país.

Mais sobre Sinal de alerta aqui e aqui.
Aqui, o contexto político da novela.

Veja também no POP FANTASMA:
O grito: aquela novela perturbadora da Globo ganhou tese de doutorado

Cultura Pop

Urgente!: O silêncio que Bruce Springsteen não quebrou

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Urgente!: O silêncio que Bruce Springsteen não quebrou

Tá aí o que muita gente queria: Bruce Springsteen vai lançar uma caixa com sete álbuns “perdidos”, nunca lançados oficialmente. O box vai se chamar Tracks II: The lost albums (é a continuidade de Tracks, caixa de 4 CDs lançada em 1998) e nasceu de uma limpeza que Bruce fez nos seus arquivos durante a pandemia. Pelo que se sabe até agora, o material inclui sobras das sessões de Born in the USA (1984) e gravações da fase eletrônica dele, no comecinho dos anos 1990 – inclusive um disco inteiro desse período, que nunca viu a luz do dia.

Essa notícia caiu nos sites na semana passada e trouxe de volta um detalhe que os fãs de Bruce já conhecem bem: ele tem muito material inédito guardado – e material bom. Em uma entrevista à Variety em 2017, ele mesmo comentou que sabia ter feito mais discos do que os que lançou, mas que havia motivos sérios para manter alguns deles nas gavetas.

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“Por que não lançamos esses discos? Não achei que fossem essenciais. Posso ter achado que eram bons, posso ter me divertido fazendo, e lançamos muitas dessas músicas em coleções de arquivo ao longo dos anos. Mas, durante toda a minha vida profissional, senti que liberava o que era essencial naquele momento. E, em troca, recebi uma definição muito precisa de quem eu era, o que eu queria fazer, sobre o que estava cantando”, disse na época (o link do papo tá aqui – é uma entrevista longa e bem legal).

Com o tempo, vários desses registros acabaram saindo em boxes e coletâneas. Um deles foi The ties that bind, um disco de pegada punk-power pop que seria lançado no Natal de 1979 – e que acabou virando uma espécie de esboço inicial do disco duplo The river, de 1980. Pelo menos saiu uma caixa em 2015 chamada The ties that bind: The River collection, com todo o material dessa época, inclusive o tal disco descartado (além de um material que formava quase um suposto disco de punk + power pop que teria sido abandonado).

Um texto publicado na newsletter do músico Giancarlo Rufatto recorda que Bruce infelizmente deixou de fora do novo box alguns álbuns que realmente mereciam ver a luz do dia. Um deles é um álbum solo (sem a E Street Band, enfim), com uma sonoridade country ’n soul, que foi gravado em 1981. Esse disco teria sido abandonado durante um período de depressão, que resultou em isolamento e na elaboração do disco cru Nebraska (1982), feito em casa com um gravador de quatro canais, só voz e violão.

Bruce até parece fazer referência a esse álbum perdido na entrevista da Variety. “Esse disco é influenciado pela música pop da Califórnia dos anos 70”, contou. “Glen Campbell, Jimmy Webb, Burt Bacharach, esse tipo de som. Não sei se as pessoas vão ouvir essas influências, mas era isso que eu tinha em mente. Isso me deu uma base pra criar, uma inspiração pra escrever. E também é um disco de cantor e compositor. Ele se conecta aos meus discos solo em termos de composição, mais Tunnel of love e Devils and dust, mas não é como eles. São apenas personagens diferentes vivendo suas vidas.”

Outro material bastante esperado pelos fãs – e que também não está na caixa – é o Electric Nebraska, a tentativa de Bruce de gravar com a E Street Band as músicas que acabaram no Nebraska. Nem ele, nem o empresário Jon Landau, nem os co-produtores Steven Van Zandt e Chuck Plotkin gostaram do resultado, e as gravações foram trancadas a sete chaves. Nem em bootlegs esse material apareceu até hoje. Pra você ter ideia, Glory days, que só sairia no Born in the USA (1984), chegou a ser ensaiada e gravada junto.

Quase todo mundo próximo a Bruce acredita que ele nunca vai lançar oficialmente essas gravações elétricas do Nebraska. Max Weinberg, baterista da E Street Band desde 1974 (com algumas pausas), confirmou a existência desse material em 2010, numa entrevista à Rolling Stone, e disse que adoraria ver tudo lançado.

“A E Street Band realmente gravou todo o Nebraska, e foi matador. Era tudo muito pesado. Por melhor que fosse, não era o que Bruce queria lançar. Existe um álbum completo do Nebraska, todas essas músicas estão prontas em algum lugar”, revelou. Bruce pode até guardar discos inteiros na gaveta, mas esse é um daqueles casos em que o silêncio guarda várias histórias – que podem render surpresas bem legais.

E ese aí é o lyric video de Rain in the river, uma das faixas programadas para Tracks II (a faixa sai num disco montado durante a elaboração do box, Perfect world).

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Cultura Pop

Urgente!: Supergrass, Spielberg e um atalho recusado

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Coisas que você descobre por acaso: numa conversa de WhatsApp com o amigo DJ Renato Lima, fiquei sabendo que, nos anos 1990, Steven Spielberg teve uma ideia bem louca. Ele queria reviver o espírito dos Monkees – não com uma nova versão da banda, como uma turma havia tentado sem sucesso nos anos 1980, mas com uma nova série de TV inspirada neles. E os escolhidos para isso? O Supergrass.

O trio britânico, que fez sucesso a reboque do britpop, estava em alta em 1995, quando lançou seu primeiro álbum, I should coco. Hits como Alright grudavam na mente, os vídeos eram cheios de energia, e Gaz Coombes, o vocalista, tinha cara de quem poderia muito bem ser um monkee da sua geração. Spielberg ouviu a banda por intermédio dos filhos, gostou e fez o convite.

Os ingleses foram até a Universal Studios para uma reunião com o diretor – com direito a recepção no rancho dele e papo sobre fase bem antigas da série televisiva Além da imaginação. O papo sobre a série, diz Coombes, foi proposital, porque a banda sacou logo onde aquilo poderia dar. “Talvez eu estivesse tentando antecipar a abordagem cafona que seria sugerida, tipo a banda morando junta como os Monkees”, contou Coombes à Louder, que publicou um texto sobre o assunto.

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A proposta era tentadora. Mas eles disseram não. “Foi lisonjeiro e muito legal, mas ficou óbvio para nós que não queríamos pegar esse atalho”, explicou o vocalista, afirmando ter pensado que aquilo poderia significar o fim do grupo. “Você pode acabar morrendo em um quarto de hotel ou algo assim, ou então a produção quer apenas um de nós para a próxima temporada. Foi muito engraçado, respeitosamente muito engraçado”.

O tempo passou. E agora, em 2025, I should coco completa 30 anos (mas já?). O Supergrass, que se separou no fim dos anos 2000, voltou para tocar o disco na íntegra e alguns hits em festivais como Glastonbury e Ilha de Wight.

Aqui, o trio no Glastonbury de 2022.

Foro: Keira Vallejo/Wikipedia

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Crítica

Ouvimos: Lady Gaga, “Mayhem”

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Ouvimos: Lady Gaga, “Mayhem”

Tudo que é mais difícil de explicar, é mais complicado de entender – mesmo que as intenções sejam as melhores possíveis e haja um verniz cultural-intelectual robusto por trás. Isso vale até para desfiles de escolas de samba, quando a agremiação mais armada de referências bacanas e pesquisas exaustivas não vence, e ninguém entende o que aconteceu.

Carnaval, injustiças e polêmicas à parte, o novo Mayhem foi prometido desde o início como um retorno à fase “grêmio recreativo” de Lady Gaga. E sim, ele entrega o que promete: Gaga revisita sua era inicial, piscando para os fãs das antigas, trazendo clima de sortilégio no refrão do single Abracadabra (que remete ao começo do icônico hit Bad romance), e mergulhando de cabeça em synthpop, house music, boogie, ítalo-disco, pós-disco, rock, punk (por que não?) e outros estilos. Todas essas coisas juntas formam a Lady Gaga de 2025.

Algo vinha se perdendo ou sendo deixado de lado na carreira de Lady Gaga há algum tempo, e algo que sempre foi essencial nela: a capacidade de usar sua música e sua persona para comentar o próprio pop. David Bowie fazia isso o tempo todo – e ele, que praticamente paira como um santo padroeiro sobre Mayhem, é uma influência evidente em Vanish into you, uma das faixas que melhor representam o disco. Aqui, Gaga entrega dance music com alma roqueira, um baixo irresistível e um batidão que evoca tanto a fase noventista de Bowie quanto o synthpop dos anos 1980.

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Mais coisas foram sendo deixadas de lado na carreira dela que… Bom, sao coisas quase tão difíceis de explicar quanto as razões que levaram Gaga a criar um álbum considerado “difícil” como Artpop (2013), enquanto simultaneamente mergulhava no jazz com Tony Bennett e preparava-se para abraçar o soft rock no formidável Joanne (2016), um disco autorreferente que talvez tenha deixado os fãs da primeira fase perdidos. Em outro tempo, Madonna parecia autorizada a mudar como quisesse, mas quando Gaga fazia o mesmo, deixava no ar notas de desencontro e confusionismo. O pop mudou, as décadas passaram, o público mudou – e todas as certezas evaporaram.

É nesse cenário que Mayhem equilibra as coisas, entregando um pop dançante, consciente e orgulhoso de sua essência, mas ao mesmo tempo sombrio e marginal. Há momentos de caos organizado, como em Disease e Perfect celebrity – esta última começa soando como Nine Inch Nails, mas, se você mexer daqui e dali, pode até enxergar um nu-metal na estrutura. Killah traz uma eletrônica suja, um refrão meio soul, meio rock que caberia num disco do Aerosmith, enquanto Zombieboy aposta no pós-disco punk, evocando terror e êxtase na pista (por acaso, Gaga chegou a dizer que o disco tem influências de Radiohead, e confirmou o NiN como referência).

Na reta final, o álbum se aventura por outros terrenos: How bad do U want me e Don’t call tonight flertam com o pop dinamarquês dos anos 90 (e são, por sinal, as únicas faixas pouco inspiradas do disco); The beast tem cara de trilha sonora de comercial de cerveja; e Lovedrug mergulha na indefectível tendência soft rock que surge hoje em dia em dez entre dez discos pop. Essa faixa soa como um híbrido entre Fleetwood Mac e Roxette – como se Gaga  estivesse pensando também na programação das rádios adultas de 2035.

O desfecho de Mayhem chega como um presente para o ouvinte: Blade of grass é uma balada melancólica de violão e piano, que ecoa tanto a tristeza folk dos anos 70 quanto a melancolia do ABBA, crescendo em inquietação à medida que avança. E então, como quem perde um pouco o tom, o álbum termina com… Die with a smile, a já conhecida balada country-soul gravada em parceria com Bruno Mars, lançada há tempos como single. Dentro do contexto do disco, ela soa mais como um apêndice do que como um encerramento – uma nota de rodapé onde se esperava um ponto final. Nada que chegue a atrapalhar a certeza de que Lady Gaga conseguiu, mais do que retornar ao passado, unir quase todos os seus fãs em Mayhem.

Nota: 8,5
Gravadora: Interscope
Lançamento: 7 de março de 2025.

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