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Crítica

Ouvimos: Raquel – “Não incendiei a casa por milagre”

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Ouvimos: Raquel - "Não incendiei a casa por milagre"

RESENHA: Raquel estreia solo com Não incendiei a casa por milagre, disco direto que mistura rock, blues e jazz, com ecos de Gal Costa Rita Lee e Ney Matogrosso.

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Raquel Virgínia, revelada na banda As Bahias, mudou o nome artístico e hoje assina só Raquel – e estreia com o álbum solo Não incendiei a casa por milagre. Um disco direto, curto (passa por EP, com menos de meia hora e sete faixas) e que, mesmo tendo sido inspirado por Recanto, álbum primordialmente eletrônico de Gal Costa (produzido por Caetano e Moreno Veloso em 2011), é basicamente um disco de rock com pés no blues e no jazz.

Há outras referências também: o cineasta Pedro Almodovar inspirou a capa do disco, e é citado numa faixa. É Jogador de futebol, indie pop blues com herança de Ney Matogrosso, que cita “beijos almodovarianos”, numa letra que narra um caso escondido, adornada por uma boa guitarra e por um programação de bateria lo-fi, rudimentar. A faixa-título, destacando o vocal rouco de Raquel, é um blues rock com design sonoro perturbador, com baixo à frente, guitarra ágil, alguns ruídos, e lembranças tanto de Rita Lee quanto de Secos & Molhados.

Com produção justamente de Moreno Veloso e participações de Pedro Sá (guitarra), Eduardo Manso (programações), Bruno Di Lullo (baixo) e Domenico Lancellotti (bateria) – os dois últimos presentes na ficha técnica de Recanto, assim como Moreno – a estreia de Raquel traz outras duas referências fortes a Gal Costa. Monopólio, com guitarra estilingando, soa como se tivesse sido feita para a cantora de Baby, mas vem com perspectiva lo-fi. E ela também relê Autotune autoerótico, canção de psicodelia eletrônica feita por Caetano e gravada por Gal em Recanto.

Ao vivo, por sua vez, é um bolero que lembra Sergio Sampaio, tem referências a programas de auditório dos anos 1990 e fala sobre relacionamentos secretos e carregados de preconceitos (“os beijos nas travestis são dados nos esconderijos becos”). Carne dos meus versos é um blues que traz lembranças de infância e de desprotção, e Vidinha, musica pouco conhecida de Rita Lee e Roberto de Carvalho, encerra o disco com ar meio grunge, mais pesado e tribal.

Texto: Ricardo Schott.

Nota: 9
Gravadora: Almaviva Music
Lançamento: 30 de maio de 2025.

Crítica

Ouvimos: Wisp – “If not winter”

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Wisp (codinome de Natalie Yu) estreia com If not winter: shoegaze doce e distorcido, entre Cocteau Twins, partículas de metal e detalhes de produção pop.

RESENHA: Wisp (codinome de Natalie Yu) estreia com If not winter: shoegaze doce e distorcido, entre Cocteau Twins, partículas de metal e detalhes de produção pop.

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Depois do samba-canção, do choro-canção e do samba-rock, vem aí outro estilo musical de duas palavras: a balada shoegaze. Vem aí, aliás, não: já veio. If not winter, primeiro álbum de Wisp – codinome usado pela compositora Natalie Yu, norte-americana de origem tailandesa e taiwanesa – é formado basicamente pela união desses dois elementos, em canções com vocais doces, distorções, guitarras que ora parecem um paredão, ora soam como se desaparecessem no ar. E letras que passeiam pelo romantismo, pela saudade, pelo desespero, pela frieza – vários tipos de sentimentos.

O estilo ao qual Natalie se dedica, na verdade, já existe há um tempinho: lá pelo começo do século 21, algumas bandas que faziam sons lentos, com vocais doces e design musical perturbador e distorcido, começaram a usar o termo “nu-gaze” para definir seu trabalho. Não é exatamente uma denominação de longo alcance, mas ela existe. Wisp tem muito desse ferramental nu-gaze, mas não custa lembrar que If not winter é um disco repleto de produtores e co-autores, e que o conceito do disco foi bastante trabalhado, como se costuma fazer com discos pop.

A própria Natalie disse numa entrevista à newsletter Last Donut Of The Night que aprendeu bastante com os artistas com os quais vem trabalhando, “porque muitas dessas pessoas não fazem shoegaze ou rock alternativo” (o canadense Stint, um dos produtores de If not winter, tem no currículo trabalhos com Demi Lovato e Kesha, por exemplo). Acaba que faixas tranquilas e celestiais como Sword, Save me now, Breathe onto me, Black swan e Mesmerized dão uma boa mostra da maneira como as paredes de guitarra e os climas etéreos vêm sendo absorvidos pelo mercadão. É o que rola também no caso do Sunday (1994), um Cocteau Twins-Mazzy Star baixos teores que foi lançado recentemente pela Arista.

  • Ouvimos: Florence Road – Fall back (EP)
  • Ouvimos: Thistle – It’s nice to see you, stranger (EP)
  • Ouvimos: Idos de Março – Unfamiliar (EP)

Vamos ao que interessa: as músicas de If not winter são boas? São, mas é um primeiro álbum, que mexe num conceito que possivelmente ainda está em desenvolvimento – parece haver apego a uma fórmula que se repete em várias músicas, por exemplo. Natalie comanda uma sonoridade que parece vir do céu, e que soa aparentada tanto de Cocteau Twins quanto de Evanescence e Deftones. Fica a curiosidade por uma “versão da diretora” de seu próprio álbum: o quanto canções como Get back to me e o folk triste da faixa-título soariam mais perturbadoras sem tantos cozinheiros mexendo o caldo?

Complementando a vibe do álbum, Wisp oferece pelo menos uma canção em tom mais abertamente trevoso: a sombria e funérea Guide light, fechada com guitarras misteriosas e cheias de efeitos. E investe no ruído puramente noventista em Serpentine, canção com peso e beleza, e uma batida idêntica à de Perfeição, da Legião Urbana (e, epa, Natalie tem fãs à beça no Brasil, segundo ela própria disse no tal papo com o Last Donut).

Texto: Ricardo Schott

Nota: 7,5
Gravadora: Music Soup/Interscope
Lançamento: 1 de agosto de 2025

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Crítica

Ouvimos: Kerub – “Aphantasia”

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Kerub funde trance, ambient e experimentações em Aphantasia, disco hipnótico e existencial que ecoa Bowie, Ultravox e o apocalipse dançante.

RESENHA: Kerub funde trance, ambient e experimentações em Aphantasia, disco hipnótico e existencial que ecoa Bowie, Ultravox e o apocalipse dançante.

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“Sonhos são para aqueles que não os deixam de lado”, afirma o artista canadense Kerub em Dreams, canção eletrônica e hipnótica desse Aphantasia, seu segundo álbum. Um disco em que o envolvimento trance serve quase como um subtexto sonoro, com faixas que soam como fantasias musicais, repletas de efeitos, ecos, ambientações, experimentalismos.

Com raízes no conceito de Eterno Retorno de Nietzsche, e em sensações pessoais experimentadas quando mudou-se para Toronto, Kerub fez de Aphantasia um disco cujos lados mais acessíveis apontam para as fases mais vanguardistas de artistas conhecidos. O David Bowie da fase Berlim e o dos anos 1990 pairam sobre quase todo o disco, que ainda faz lembrar a primeira fase do Ultravox em faixas como Ankle monitor, Bottles (repleta de psicodelia nos vocais e teclados) e Calm. Essa última, um relato de depressões, perdas e constatações (“resiliência é um mito feito por nós / estaria eu com medo da mudança?”, se pergunta), em meio a noites mal-dormidas e tentativas de juntar os pedaços.

  • Ouvimos: Ethel Cain – Willoughby Tucker, I’ll always love you
  • Ouvimos: Lutalo – The academy (versão deluxe)
  • Ouvimos: Alex G – Headlights

Marathon é um ambient que chega a dar nervoso – o barulho de alguém respirando forte após correr uma maratona – note o título, enfim – é o “som de fundo” em alguns momentos). Cicadas é drum’n bass com interferências nos vocais e climas perturbadores. Acid rain soa como um time-lapse do fim do mundo – ganha uma cara dançante depois, mas é um baile no apocalipse. Atavism tem algo que não encaixa totalmente – seria a delicadeza da melodia ou o peso da batida? Ou a combinação de ambos?

No final, Salivary glands e Airport traffic trazem mais sons hipnóticos. A primeira, funcionando como um tema dance; a última soando como uma brincadeira sonora etérea, quase um som de videogame, que até traz leveza para um disco em que eletrônica e existência andam de mãos dadas.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8
Gravadora: Kopi Records
Lançamento: 24 de julho de 2025.

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Crítica

Ouvimos: Astrofella – “Love ever young”

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Astrofella estreia com Love ever young: eletrônica gelada, krautrock sensível e pop espacial vindo de Istambul via Berlim.

RESENHA: Astrofella estreia com Love ever young: eletrônica gelada, krautrock sensível e pop espacial vindo de Istambul via Berlim.

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O Astrofella é uma banda secretíssima que vem de Istambul, mas que se baseou em Berlim. O som deles é autodefinido como “a personificação de um astronauta melodramático, falando consigo próprio em órbita”. Love ever young, primeiro disco deles, é uma surpresa bem curiosa, misturando tecladeira gélida, guitarras climáticas econômicas e ocasionalmente, percussões e beats variados – sempre apostando na viagem sonora eletrônica.

A Berlin vacation, faixa de abertura, vai subindo para o espaço com órgão, ruídos eletrônicos e guitarra com um só acorde. Segue com uma vibe de pop francês em Modern wedding, com guitarra e bateria patinantes, sintetizador kraftweriano e argamassa de krautrock sensível – e os vocais de Danae Palaka. For Charlotte tem batida afropop e sonoridade minimalista, com um teclado que cresce aos poucos. She just wants to disappear, com vocal feminino que remete a Nina Hagen, vai do meditativo ao tenso.

  • Ouvimos: Plonki – Kicking ate my heels (EP)
  • Ouvimos: Lau e Eu – Feroz comum silêncio entre nós…

Love ever young ainda tem climas mais apocalípticos e sombrios em Old times’ sake (canção de ritmo torto, quase jazzístico, e clima oriental) e na sintetizada Time. No Bandcamp, além das músicas, há ainda um vídeo mostrando como a capa de Love ever young, realizada de modo artesanal, foi feita.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8
Gravadora: Independente
Lançamento: 8 de agosto de 2025.

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