Crítica
Ouvimos: Varanda, “Beirada”

- Beirada é o álbum de estreia da banda mineira (de Juiz de Fora) Varanda. O álbum foi pré-produzido pela banda e produzido e gravado por Paulo Emmery, que se dividiu entre Juiz de Fora e Rio de Janeiro para completar o disco.
- O Varanda é formado por Amélia do Carmo (voz), Mario Lorenzi (guitarra), Bernardo Merhy (bateria) e Augusto Vargas (baixo). Manu Julian (Pelados) canta em Cê mexe comigo.
- Amélia, além de cantora, é designer, poeta (tem o livro Breve viagem ao mercado publicado pela editora Patuá) e publica vídeos gastronômicos sob o codinome @ameliajanta. O canal Sempre Um Papo tem uma entrevista com ela sobre música e literatura. Ela é também autora da capa do álbum.
Várias definições diferentes já foram dadas para o som do Varanda. Aqui vai outra: MPB bastante sensível feita com base em indie rock e shoegaze. Beirada, o primeiro álbum, soa como algo que vai sendo descoberto aos poucos, da dureza dos sons que lembram bandas como Pixies e Talking Heads (na abertura com P.Q.P.Q e Barcos no mar) a sons mais calmos e próximos do acústico (no final, há o cruzamento de ruídos e romantismo de Desce já e Relâmpagos, e a balada Não tem hora).
O Varanda mistura informações musicais do pós-punk, do indie nacional dos anos 1990 e de um lirismo próximo da canção brasileira, sempre inserindo surpresas nas melodias e nas letras. O single Vida pacata é um power pop com desenho musical próximo das canções mais grudentas dos anos 1960, embora o baixo à frente dê uma cara bem anos 1990 para a música – com uma letra boa, que fala de um relacionamento ruim usando metáforas de futebol de colégio (“você marcou um gol/e isolou a bola”).
Cama de vento, por sua vez, parte de um blues na tradição do rock brasileiro oitentista até chegar a um rock ruidoso em compasso ternário. Topo dos prédios, por sua vez, é uma balada sonhadora e urbana, com andamento de canção brasileira dos anos 1960 e 1970. É uma das faixas de Beirada nas quais fica mais clara uma característica dos vocais de Amélia do Carmo: quando você pensa que a voz dela vai se despedaçar, ela volta com mais força ainda.
Um lado retropicalista surge em Cê mexe comigo, um samba discreto. E também em Tempo, música com pegada que mistura Jorge Ben, Arnaldo Antunes e Mutantes. E na ciranda-samba Bahia e aviões, uma música de 2024 que lembra uma dessas canções nacionais dos anos 1960/1970 que passam anos na obscuridade e são reveladas na investida de algum DJ aos sebos. Ouça tudo em alto volume.
Nota: 9
Gravadora: Independente
Lançamento: 29 de agosto de 2024.
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Crítica
Ouvimos: Sleigh Bells, “Bunky Becky Birthday Boy”

Se você tem idade para ter curtido em tempo real grupos como No Doubt e Republica (banda punk-technopop que se destacou nos anos 1990, liderada pela vocalista Saffron), talvez se sinta meio entediado/entediada com o som do Sleigh Bells, dupla de indie pop punk ruidoso que lançou um disco excelente em 2010 – a estreia Treats – e depois foi seguindo.
O Paramore, que já tinha alguns anos de carreira discográfica na frente do Sleigh Bells, também tem lá suas parecências com o som de Alexis Krauss (voz) e Derek Miller (voz e instrumentos), os dois do SB. Conforme o tempo foi passando, a dupla foi aderindo a um flow musical entre o hip hop e o emo, com o eletrônico lá do lado. Fizeram bastante barulho em Bitter rivals (2013), assumiram o pop de vez em Jessica Rabbit (2016) e vai por aí. Já Bunky Becky Birthday Boy, o sexto álbum, soa como um relato das fases diferentes da dupla formada por Alexis Krauss (voz) e Derek Miller (voz e instrumentos).
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Lado ruim primeiro: Bunky Becky tem algumas (poucas, felizmente) características meio ultrapassadas ou irritantes. Uma delas: é um disco que parece ter sido feito para bombar numa Alexa, ou numa caixa acústica daquelas que as pessoas levam para a praia, com canções que brigam com o botão de volume. Outra coisa meio aborrecida são os vocais em estilo “grito de torcida” que surgem justamente no primeiro single, Bunky pop, feito em homenagem ao falecido cãozinho de Alexis.
Passado o susto inicial, as boas impressões chegam junto: o Sleigh Bells faz variações na melodia e adota tons dissonantes que lembram bandas como The Cardigans – isso aparece na própria Bunky pop e também em faixas como o emo pop rock Roxette Ric e no pop com perspectiva lounge Hi someday. Badly é um hard rock oitentão com estileira indie pop – parece uma mistura de Republica com AC/DC.
Já Wanna start a band e Blasted shadow trazem o SB incorrendo pelo hyperpop que tem marcado várias músicas deles. É o lado em que o Sleigh Bells se dá melhor, assim como no power pop Real special cool thing, que evoca Bangles. Uma questão a ser resolvida pela dupla em próximos discos é como equilibrar todos esses lados – algo que rolou em alguns discos anteriores e especialmente, na estreia.
Nota: 7
Gravadora: Mom + Pop
Lançamento: 4 de abril de 2018.
Crítica
Ouvimos: Basement Tracks, “Midnight show”

O segundo álbum do quinteto mineiro Basement Tracks, Midnight show, vem de longe – quer dizer, se é que você já se acostumou com o fato de que a pandemia já completou meia década e que esse tempo passa num piscar de olhos. O disco foi feito em meio ao isolamento e ganhou acertos, mixagens e refações ao longo dos anos. Curiosamente, o clima do disco é bem menos sombrio e bem mais aberto, noturno – o que faz sentido levando em conta o título do álbum, que remete a trabalhos feitos madrugada adentro.
Há uma “coisa shoegaze” em algumas faixas do disco (como em Cold gold, a música de abertura), mas não é o principal de Midnight show, que investe num guitar rock dançante e, em alguns momentos, eletrônico. Dive, com participação de Amélia do Carmo (Varanda) lembra um R.E.M. noturno e tem certa energia de canção brasileira. Heavy dream tem guitarra base lembrando Smiths e vocais na cola do Jesus and Mary Chain. A cabisbaixa Neon mirror, com synth oitentista, acena para o lado deprê de Depeche Mode e Duran Duran.
Já Bree é uma cápsula do pop chique, com saxofone, clima dream pop dosado e lembranças de Prince, Sade, Duran Duran e INXS. Um clima que reside também em Honey (que lembra o Velvet Underground, mas em estilo menos antipop) e no balanço funkeado de Violet. Outros destaques são o instrumental MDNGHTSHW, com gravação cheia de defeitos especiais e beats que dão um aspecto sombreado na faixa. E o final com 20/20, remetendo ao Primal Scream de Screamadelica e ao Jesus and Mary Chain de Honey’s dead.
Nota: 8
Gravadora: Independente/Tratore
Lançamento: 3 de abril de 2025
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Crítica
Ouvimos: Eskröta, “Blasfêmea”

Estreando na Deck, a banda paulista Eskröta – Yasmin Amaral (vocal e guitarra), Tamyris Leopoldo (baixo e backing vocals) e Jhon França (bateria) – une punk, hardcore e death metal em faixas curtas e grossas (Blasfêmea tem onze músicas em menos de trinta minutos). Depois do rito de abertura –uma vinheta intitulada Rito, mesmo – somos levados a um universo de canções pesadas, ágeis e guturais cujas letras pedem para ser acompanhadas com encarte na mão.
Entre guitarras, percussões, ruídos de mata e um riff que brinca com Symptom of the universe (Black Sabbath), A bruxa prega que “existe uma bruxa que habita em mim”. Fogo, entre punk e metal, e Mantra, metal-hip hop com participação de MC Taya, batem fundo em temas como abuso, assédio e estupro (“quando senta um estuprador e ninguém levanta / são todos coniventes / repita como um mantra”). Sons agressivos entre o death metal e o hardcore surgem em Loser, +666, Misery e Fantasmas pt 2 (“não posso fingir que nada aconteceu / o gosto da angústia é maior que eu”).
O trio final de faixas do disco é mais guerrilheiro e, a seu modo, positivo. Entre guitarras e percussões de samba, LBR (Latina, brasileira, revolucionária) fala sobre o silenciamento das mulheres latino-americanas, e a melodia é a trilha sonora – pesadíssima – do protesto contra a repressão. O metal rap Mulheres combinam com sucesso e o metal luminoso de Quanto tempo, encerrando o disco, são hinos do fim da repressão e do apagamento.
Nota: 8,5
Gravadora: Deck
Lançamento: 11 de abril de 2025
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