Crítica
Ouvimos: Vagabon, “Sorry I haven’t called”

- Laetitia Tamko, verdadeiro nome de Vagabon, é uma cantora nascida em 1992 na República dos Camarões, e que mora em Nova York desde os 13 anos. Sorry I haven’t called é seu terceiro álbum, com produção dela e do americano de origem iraniana Rostam.
- O disco é dedicado a um parceiro que morreu em 2021, Eric Littmann. Ela explica que não se trata de um álbum triste. “Assim que me dei permissão para fazer um disco cheio de vida e energia, percebi que esse era o objetivo deste álbum. No meio de todas essas coisas difíceis, virou um disco por causa da vitalidade que essas músicas tinham”, explica.
Vagabon tinha se encontrado no indie rock caseiro em seu primeiro disco, o rascunhado Infinite worlds (2017), mas depois descobriu que as possibilidades eram maiores. Desde o segundo álbum, Vagabon (2019), que seu som tem mais a ver com o indie-pop, e com sons produzidos eletronicamente. Sorry I haven’t called vai fundo nessa fórmula, unindo sonoridades que beiram o r&b e arranjos minimalistas, nos quais o design sonoro é mais importante do que qualquer outro detalhe, e afrobeats surgem de maneira discreta, quase como molduras. O universo da cantora em seu terceiro disco consegue ser introspectivo e extrovertido ao mesmo tempo, na combinação de melodias e letras.
É o que se ouve na combinação de beats, teclados discretos e intervenções de baixo de Made out with your best friend e Carpenter, na dançante e etérea You know how, e numa canção tristonha e boa de pista, Passing me by – a melhor do disco, soando como uma música de Tracy Chapman energizada. Ou em Do your worst, com camadas de beats (numa onda quase drum’n bass) e sintetizadores, num resultado que soa quase tão visual quanto auditivo. Um material que, se rolar numa festa, provavelmente vai ser curtido em alto volume, sob o efeito de substâncias.
A voz de Laetitia Tamko (nome verdadeiro da cantora) soa clara, doce e confessional – o que já diz muito sobre as letras de Sorry I haven’t called. É basicamente um disco sobre cascas de banana relacionais, situações que não dá pra saber se é azar ou sorte (pelo menos naquele momento) e aquele lado da vida para o qual nunca mandaram fazer manual de instruções. A faixa de abertura, Can I talk my shit? é autoexplicativa, repleta de desabafos, experiências cagadas com drogas e sexo ruim (“fiquei chapada demais para isso/estou navegando em uma onda muito baixa/nunca me encontrei através da fumaça”). Do your worst, mais do que falar de um relacionamento tóxico, fala de um namoro reconhecidamente ruim (“não gosto de mim mesma quando estou com você”). Já Anti-fuck é isso mesmo: um relacionamento que praticamente não existe.
Gravadora: Nonesuch
Nota: 8
Foto: Reprodução da capa do álbum
Crítica
Ouvimos: Pélico – “A universa me sorriu – Minhas canções com Ronaldo Bastos”

RESENHA: Em A universa me sorriu, Pélico e Ronaldo Bastos unem lirismo e pop, misturando folk-MPB, bossa e ecos dos anos 1970 e 1980.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 10
Gravadora: Solov / YB Music
Lançamento: 26 de setembro de 2025
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Aldir Blanc foi o letrista de canções de lirismo e enfrentamento, como O mestre-sala dos mares, e de sambas-crônica como Incompatibilidade de gênios – ambas com seu maior parceiro, João Bosco. Também mandou bala num lado pop hoje pouco lembrado, compondo canções com o Roupa Nova (Coração pirata e o tema da novela A viagem) e escrevendo um rap para a abertura da novela Quatro por quatro (Picadinho de macho, com Tavito, gravada por Sandra Sá).
Letristas, de modo geral, têm esse ecletismo e essa versatilidade – e com Ronaldo Bastos não é diferente. O niteroiense compôs bastante com Milton Nascimento, mas também usou bastante seu lirismo a favor da música pop, escrevendo canções com Lulu Santos (Um certo alguém), Celso Fonseca (Sorte, hit de Gal Costa e Caetano Veloso) e Ed Wilson (Chuva de prata, gravada por Gal). Muita gente não notou, mas Ronaldo foi também produtor de João Penca e Seus Miquinhos Amestrados – cuidou de discos como Okay my gay (1986) e escreveu com eles músicas como Romance em alto-mar.
- Ouvimos: Jup do Bairro – Juízo final
Daí que A universa me sorriu, disco do paulistano Pélico, que traz dez canções feitas por ele com Ronaldo, acaba encapsulando todos esses lados do letrista de clássicos como Trem azul, lado a lado com a musicalidade delicada do cantor e compositor. Pélico investe num som que, em linhas gerais, é folk-MPB, com melodias sensíveis e direcionamento pop. É o que rola em músicas como a alegre faixa-título (que faz referência a Nada será como antes, de Ronaldo e Milton), a bossa-folk Infinito blue – além da vibe contemplativa e saudosa de faixas como Marinar e o folk agridoce e imagético de O amor ficou. A canção de amanhecer Luz da manhã, no final do álbum, guia o disco para a tradição do pop brasileiro adulto (Dalto, Marina Lima, Flavio Venturini).
Tem coisas em A universa me sorriu que, se tivessem sido feitas lá pelos anos 1970 e 1980, teriam endereço certíssimo – a alegre e amorosa Sua mãe tinha razão, escrita com um terceiro parceiro (Leo Pereda), já poderia ter sido gravada por Gal Costa. Faixas como Louva-a-deus e É melhor assim – esta, uma espécie de ska abolerado feito pela dupla ao lado de Otto, com Marisa Orth nos vocais ao lado de Pélico – têm muito de Paralamas do Sucesso e Rita Lee. E o relacionamento de Ronaldo com o rock brasileiro desencanado dos anos 1980 dá as caras em Sem parar, canção sessentista de tom beatle, com Silvia Machete dividindo os vocais. Não perca.
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Crítica
Ouvimos: Winter – “Adult Romantix”

RESENHA: Em Adult romantix, Samira Winter mistura shoegaze, psicodelia e memórias entre LA e NY, criando um túnel de verões, amores e melancolia.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Winspear
Lançamento: 22 de agosto de 2025
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Nascida em Curitiba, Samira Winter mudou-se para Boston e, depois, para Los Angeles – e posteriormente para Nova York. Quando vivia em LA, começou a tramar o Winter, basicamente uma banda que transita entre o barulho do Idlewild e o clima celestial do Cocteau Twins. Mas Samira acrescenta ao som detalhes eletrônicos, referências que vão da psicodelia ao rock britânico oitentista, e um tom de conversa ao pé do ouvido, em que temas como amores que vem e vão, inseguranças e questões do passado vão surgindo nas letras.
No caso de Adult romantix, as mudanças de residência e o amadurecimento pessoal fizeram com que Samira criasse “um túnel de verões e memórias” em forma de disco, com influências assumidas de Sonic Youth e Elliott Smith, entre outros. Just like a flower investe num shoegaze brilhante e celestial, cuja letra pergunta: “o amor pode durar pra sempre”? Hide-a-lullaby, guitar rock com batida seca, une “defeitos” de gravação propositais a um clima de sonho e escapismo. Misery é um guitar rock delicado, que alude a esqueletos no armário (“conte-me todos os seus segredos e tudo que bota você para baixo”, diz a letra). A mórbida Sometimes I think about death, contraditoriamente, é um pós-punk dançante com vibe robótica.
- Ouvimos: Laufey – A matter of time
Recordações boas e doloridas surgem em faixas intensas como o shoegaze Like lovers do, a distorcida In my basement room (que lembra os primeiros ensaios de Samira no seu porão em Los Angeles, aos 20 e poucos anos) e a introspectiva e acústica The beach. O fim do disco insere mais detalhes de psicodelia em arranjos e composições, como no som viajante e circular de Candy #9, na parede de ecos de Running (na qual a voz é tão sussurrada que mal dá para entender a letra) e na parede sonora de Hollow, que abraça o/a ouvinte.
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Crítica
Ouvimos: Os Pecados Tropicais – “Os Pecados Tropicais”

RESENHA: Os Pecados Tropicais estreiam com um disco que mistura rock vintage, indie e blues, em canções sobre amor, solidão e vida cotidiana.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Kuarup
Lançamento: 18 de setembro de 2025
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A banda paulistana Os Pecados Tropicais, em seu primeiro álbum, manda muitíssimo bem nos momentos em que segue duas abordagens: 1) quando parece unir uma vibe roqueira das antigas (lembrando Rita Lee & Tutti Frutti e bandas de blues) com uma atmofera indie, associada a bandas como Arctic Monkeys e Franz Ferdinand; 2) quando usa temas amorosos para falar de coisas da vida e do dia a dia.
As duas coisas rolam em Absinto, um dos primeiros singles do disco, que une rock triste, vibrações a la White Stripes (só que com baixo à frente) e agilidade sonora para falar de loucura, solidão e quarentena da covid-19, em versos espertos como “comprei vários absintos para muitos absurdos” e “vou mantendo meu juízo enquanto dura essa merda”. E muito do mesmo clima surge em Eu te vi, pós-punk com clima jazz e ótimos vocais, e no indie sleaze roqueiraço de Não penso mais.
Luisa Dale (voz), Daniel Ferreira (baixo e guitarra) e Tomás Novaes (bateria e guitarra), os três integrantes do Pecados Tropicais na época da gravação – a guitarrista Nina Goulios chegou a tempo de participar da balada blues Revolta e está na banda desde então – também fazem no álbum uma espécie de glam rock de boteco, que surge no clima jazzístico da curta Bel, meu mel, na onda blues-rock de Cachaça, e nas duas partes da teatral Baby, baby. A bela Incêndios, no final, também tem dois momentos: varia da tristeza e calma da voz-e-violão ao indie rock dançante.
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