Crítica
Ouvimos: Peter Perrett, “The cleansing”

- The cleansing é o terceiro disco solo do cantor e compositor londrino Peter Perrett, consagrado como vocalista da banda punk The Only Ones. Sua carreira solo começou em 2017 com o disco How the west was won.
- No disco, Peter trabalha com seus filhos Jamie Perrett (guitarra e produção) e Peter Jr (baixo), e ainda tem colaboração de nomes como Johnny Marr, Bobby Gillespie e Carlos O’Connell (Fontaines DC).
- Em entrevistas, Peter diz que sua principal influência como cantor foi Bob Dylan. “O som de sua voz parecia que ele estava falando comigo em vez de apenas cantar notas. Seu jogo de palavras inteligente e suas letras o diferenciavam de qualquer outra pessoa. Antes disso, eu curtia The Kinks, The Yardbirds, Small Faces, mas havia algo na voz de Dylan. Sempre fui atraído por vozes individuais únicas que soam como se estivessem dizendo a verdade”, contou aqui.
- Vale citar que The Only Ones ainda existem. A banda se reagrupou em 2023 com três integrantes originais: Peter Perrett (voz), John Perry (guitarra) e Alan Mair (baixo). Mike Kellie, o baterista original, morreu em 2017.
Peter Perrett se consagrou como vocalista do The Only Ones, banda punk britânica que tinha relacionamentos com eras bem anteriores ao punk – Mike Kellie, o baterista, tocou na formação psicodélica Spooky Tooth, e Alan Mair, o baixista, tocou durante os anos 1960 nos Beatstalkers, os “Beatles escoceses”, que se apresentaram até no Ready! Steady! Go!. Não por acaso, Perrett fez de seu novo disco, o duplo (no vinil) The cleansing, uma homenagem ao rock novaiorquino dos anos 1970. Há várias outras referências no álbum, mas muita coisa dele lembra Ramones, Lou Reed, Velvet Underground. E muitas faixas cairiam com perfeição na voz de Johnny Thunders.
The cleansing está mais para um disco romântico e bravio do que para um álbum somente punk. Peter lembra um misto de Sex Pistols, Chuck Berry e The Who na poderosa Back in the hole, por exemplo. Mas pega em fios de altíssima tensão em faixas como My secret taliban wife e Kill a Franco spy. Recuperado de vários problemas de saúde vindos dos vícios que acumulou, Peter ri da própria morte em Do not resuscitate e I wanna go with dignity, e estabelece que The cleansing é um disco de humor sombrio, antes de tudo – e mostra no timbre de sua própria voz, e nas letras do álbum, o resultado de anos de vivência nas coisas boas e ruins, no que faz bem e mal.
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Musicalmente, no geral, é um disco punk feito por quem tem idade para ter curtido Ramones no começo, e para ter ouvido Elvis Presley, Roy Orbison e Eddie Cochran na infância em tempo real. É o clima de faixas como I wanna go with dignity, Disinfectant (esta, com partículas de clima gótico) e Survival mode. Essa sonoridade é alternada com algumas lentinhas, como All that time (uma canção com piano e cordas), Feast for sore eyes e They’re for you. Ou com o clima de rock britânico anos 1980 de Mixed up Confucius.
O lado roqueiro das antigas de Peter convive no disco com um lado ruidoso, na cola de Lou Reed e Velvet Underground – como em Fountain of you, balada que cairia bem na voz de Nico, e Woman gone bad, ou Do not resuscitate. Já a faixa-título abre em clima eletrônico, quase como se fosse uma canção produzida por Brian Eno, até ganhar uma cara punk. Mesmo sendo um disco, às vezes, exagerado na quantidade de faixas – algumas poderiam ter sido deixadas para singles – The cleansing é uma viagem rocker no melhor dos sentidos.
Nota: 9
Gravadora: Domino
Crítica
Ouvimos: Julian Lennon – “Because…” (EP)

RESENHA: Julian Lennon revisita fitas antigas, ecoa o pai John em clima de reclusão e entrega um EP que soa como uma epifania para beatlemaníacos.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Music From Another Room
Lançamento: 22 de agosto de 2025
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“Quanto mais velho fico, mais me inspiro no meu pai”, disse recentemente à Rolling Stone ninguém menos que Julian Lennon, filho do beatle John, morto há 45 anos. Um pai que ele conheceu mais pela distância do que pela proximidade – quando Lennon casou-se com Yoko Ono, a vida do cantor passou ser outra, e aos 62 anos, Julian “conviveu” mais com seu pai morto do que vivo (ele tinha 17 anos naquele dezembro de 1980). Mas que, de qualquer jeito, é uma fonte de inspiração sólida pelos valores preconizados nas letras e entrevistas, pelo humor ácido, e pela musicalidade igualmente ácida.
Daí que este EP Because… pegou Julian num momento de reclusão, quase como os que seu pai costumava viver em Nova York na segunda metade dos anos 1970. Julian viu seu disco Jude (2022) ganhar uma recepção bem fria, e tinha decidido focar em trabalhos como fotógrafo e escritor. O EP surgiu de várias fitas antigas (algumas dos anos 1980) encontradas no porão do escritório de seu ex-empresário. Julian decidiu mexer em três delas, optou por deixar os vocais como estavam e gravou apenas algumas novas trilhas de instrumentos. I won’t give up, a quarta faixa, foi feita há dez anos com a colaboração do então iniciante Andrew Watt.
- Ouvimos: Paul McCartney e Wings – One hand clapping
Because… é praticamente uma epifania: se John Lennon estivesse vivo e decidisse gravar apenas EPs, como Ringo fez há poucos anos, talvez soasse dessa forma. Com uma voz idêntica à do pai, Julian une a vibe de John e guitarra-bateria a la The Police na faixa-título (que inclui até um “o karma vai te pegar!”), chupa detahes de I am the walrus em I hope, canta com vocais reverberando (como o pai) em Keep on searching, e faz lembrar tanto o piano de Imagine quanto o dedilhado de Dear Prudence em I won’t give up.
O EP de Julian vale uma nota para beatlemaníacos e do antigo trabalho do cantor (como o disco Valotte, de 1984). Vale dizer que, se John transformou letras enigmáticas como Strawberry Fields forever em “obras abertas”, você pode extrair de um tudo das letras de Because…: será que o rancor da faixa-título é dedicado a Yoko, com quem ele diz não se encontrar desde 2016? Ou às situações que viveu/não-viveu ao lado do pai? Já I won’t give up pode ser mesmo uma vontade de não desistir da música – embora ela tenha dito que a música é sobre não desistir do amor.
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Crítica
Ouvimos: Harmada – “Os fugitivos”

RESENHA: Harmada retorna após 14 anos com Os fugitivos, um disco maduro, noventista e denso, explorando fugas existenciais em faixas que vão do pós-punk ao rock britânico.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: 8-bics
Lançamento: 21 de outubro de 2025
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O Harmada, uma banda carioca, marcou época quando lançou o primeiro álbum, Música vulgar para corações surdos (2011), um disco bastante ouvido pela crítica, e que acabou dando também um público fiel para o grupo. De lá para cá, rolou um jejum de novos álbuns, embora a banda nunca houvesse acabado de verdade – chegaram a rolar alguns shows e participações em tributos. Mas como fazer música no Brasil nunca foi moleza, cada integrante precisou tratar da própria vida profissional.
- Ouvimos: Canacut – À mercê do tempo (EP)
Com Manoel Magalhães (guitarra e voz), Brynner Buçard (guitarra), Bernardo Corrêa (baixo), Rodrigo Garcia (bateria) e Pedro Henrique Lacerda (guitarra) na formação, o grupo retorna 14 anos depois com Os fugitivos, um disco – prometido já há alguns anos – mais tranquilo que a estreia, e com uma cara bem mais anos 1990 do que a vibe indie-rock anos 2000 de Música vulgar. Evocações do rock britânico de há 30/20 anos surgem em faixas como a balada blues Quando você chegar, a densa Destino, a balada ruidosa Iluminar e o guitar rock Piscina de crianças universais.
Nas letras de Os fugitivos, o grupo se inspira no livro Os prisioneiros, de Rubem Fonseca, para falar de fugas existenciais modernas. Por acaso, o Harmada volta investindo numa sonoridade bem mais moderna e eterna do que no primeiro álbum – tangenciando também um clima de balada MPBística em Em fuga e chegando perto da desolação pós-punk na explosiva Prisioneiro e na introspectiva A estrada, além do ambient ruidoso de Sonhar.
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Crítica
Ouvimos: 5 Seconds Of Summer – “Everyone’s a star”

RESENHA: Em Everyone’s a star, 5 Seconds Of Summer larga a indecisão e transforma o “em cima do muro” de discos passados em algo variado e interessante.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7,5
Gravadora: Republic
Lançamento: 14 de novembro de 2025.
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Nunca fui um grande fã dessa banda australiana que passou voando como o vento em seus 14 anos de carreira – na verdade, como um vento daqueles que levam bolas de feno de um lugar pro outro, até porque o que o 5 Seconds Of Summer mais fez foi variar a posição. Do punk-pop noventista ao emo, passando pela música eletrônica, pelo metal alternativo e pela pose de boy band, os discos dessa turma atiravam para todos os lados. Só que tudo parecia acontecer mais por indecisão do que por variações estéticas.
E aí sai Everyone’s a star, disco em que essa tal indecisão começa a ser revertida em prol de algo realmente mais variado – e bom de ouvir, vale dizer. Mas olha… Até que o disco tome jeito, o/a ouvinte precisa encarar um insatisfatório nu-metal (a faixa-título, cuja letra traz comentários sobre essa era de influencers e seres instagramáveis que todo mundo parece conhecer, menos você) e algo que lembra um Maroon 5 emo (a bisonha Not OK).
- Ouvimos: Yellowcard – Better days
Daí pra frente, o 5SOC se transforma num Big Special amigável em Telephone busy, tira uma onda do lado “boy band esquisitona” deles (em Boyband, que soa como um Information Society com peso) e une emo glam rock em No 1 obsession, com batida lembrando Rock’n roll (part 2), de Gary Glitter. A faceta do grupo que mais aparece no disco é o lado emo, que surge na contemplativa I’m scared I’ll never sleep again, na new wave oitentista Istillfeelthesame (a melhor do disco, dando a entender que bandas como Turnstile estão na playlist de trabalho deles) e até em duas tentativas de soar parecido com Strokes (a mais ou menos The rocks e a boa Sick of myself).
Everyone’s a star tem também um britpop brega (a chatinha Ghost, com virada de bateria copiada de Don’t look back in anger, do Oasis), uma espécie de shoegaze-emo (a legalzinha Jawbreaker, que fecha o álbum) e, que surpresa, uma ótima adesão à onda indie sleaze, do jeito deles (Evolve). Parece que se tinha alguém apertando os botões e manipulando a banda, ou mudou o manipulador, ou ele se mandou.
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