Crítica
Ouvimos: Pavement, “Cautionary tales: Jukebox classiques”

- Cautionary tales: Jukebox classiques é o novo box retrospectivo do Pavement, com músicas dos lançamentos da banda em 7 polegadas, além de algumas outras coisas, como as versões alternativas das faixas Black out e Extradition, lançadas em 2006 para quem fez a pré-encomenda da nova versão do disco Wowee zowee (1995).
- A caixa já está disponível nas plataformas – mas em formato físico, Cautionary tales sai apenas no dia 12 de julho. O pacote inclui reproduções dos singles originais de 7″ e um livreto de 24 páginas.
Blur, Cate Le Bon, Parquet Courts, Nirvana, Weezer, Super Furry Animals, The Coral e até o R.E.M. Todas essas bandas/artistas, em algum momento da carreira, foram comparadíssimas a um verdadeiro gigante do indie rock, o Pavement. Ou se deixaram deliberadamente influenciar pela banda criada pelos guitarristas e vocalistas Stephen Malkmus e Scott Kannberg. Um grupo que, vindo da Califórnia, estava mais para projetinho lo-fi e barulhento vindo de Nova York ou de algum canto ensimesmado de Seattle, embora fizesse sentido no cenário de um estado norte-americano bastante diversificado.
No caso do Nirvana, passou para a história o quanto a música do Pavement inspirou a composição de In utero (1993), último álbum do trio liderado por Kurt Cobain. Dando uma ouvida nas primeiras faixas desse Cautionary tales: Jukebox classiques, caixa (por enquanto apenas virtual) reunindo todo o material de 7 polegadas lançado pelo grupo, fica evidente que sem o ruído berrado dos dois primeiros EPs do Pavement, Slay tracks: 1933 – 1969 (1989) e Demolition plot J-7 (1990), porradas do álbum do Nirvana como Scentless apprentice não teriam sido feitas.
As onze faixas desses dois EPs (incluindo pérolas como Box elder e You’re killing me!) perfazem a primeiríssima fase da carreira do Pavement, uma banda que, por ter vindo de uma cidade pequena na Califórnia (Stockton), parecia se sentir mais à vontade para zoar tudo o que via de longe, e ainda falar do dia a dia de seus conterrâneos nas letras. O próprio grupo não parecia perceber o quanto seu som, apesar de focar no ruído, era sociável – caíram até nas graças do DJ inglês John Peel, que descobriu a banda e passou a divulgá-la.
Slanted and enchanted, álbum de estreia (1992), provocou inveja em boa parte dos grandes nomes do rock da época, Kurt Cobain incluso: era porrada musical elaborada, com uma ou outra canção com tendência a grudar no ouvido – Summer babe, incluída no box, era desse disco, e Cautionary tales resgata também lados B como Baptist blackstick e raridades como Sue me Jack, rock suingado e elegante para os padrões do grupo na época.
De Crooked rain, crooked rain (1994, o segundo disco) em diante, o Pavement ficaria mais elegante, inclusive. Traria barulhos incluídos de modo dosado, em meio a canções mais formais, influenciadas por country, power pop, Beach Boys, Neil Young. A banda juvenil dos primeiros EPs estava se tornando um The Cure bem mais indie, um Television dos anos 1990 ou quem sabe um Grateful Dead da mesma década – misterioso, cultuado e com um séquito de fãs.
Essa história é contada por intermédio de músicas que fizeram o grupo ganhar um número bem grande de fãs no Brasil, como Cut your hair e a bela e quase radiofônica Gold soundz. Ou Range life, canção que, em sua letra, espalhava brasa para Smashing Pumpkins (“eles não têm nenhuma função, e eu não entendo uma palavra do que eles dizem”) e Stone Temple Pilots (“eles não merecem nada mais do que eu”). Billy Corgan, dos Pumpkins, agarrou ódio do Pavement por causa disso – já se recusou a dividir palco com eles em festivais.
Lados B dessa época, como a vinheta instrumental Kneeling bus, com bateria desencontrada e tom dado por riffs de guitarra e solos de piano elétrico, são as boas descobertas da caixa. Daí para diante, o Pavement já fazia parte do cenário indie oscilando entre canções contemplativas e melodias que sequestravam a atenção – além de letras que os fãs, antes de tudo, gostavam de discutir. I love Perth, referência à maior cidade da Austrália Ocidental, faz os fãs australianos da banda debaterem em fóruns na internet até hoje.
A referência irônica à psicodelia californiana de Gangsters and pranksters também despertou a atenção de muita gente. Unseen power of the picket fence, feita pela banda para aparecer na coletânea No alternative (1993), é cara de pau: a música pinta um retrato bem estranho do R.E.M., a ponto de muita gente se perguntar até hoje se ninguém da banda ficou ofendido ou grilado com versos como “o cantor tinha cabelo comprido/o baterista sabia como se restringir/o cara do baixo tinha os movimentos certos/o guitarrista não era nenhum santo”, em meio a referências a discos e músicas do quarteto (“Time after time era a música que eu tinha como menos favorita”, cantam).
O slacker rock (sinônimo de rock blasé e garageiro) do Pavement foi se tornando cada vez mais palatável e de longo alcance à medida que novos álbuns surgiam: o esquisito Wowee zowee (1995), o ultra-trabalhado Brighten the corners (1997) e finalmente o controverso Terror twilight (1999) – este, produzido por Nigel Godrich (Radiohead), que tentou colocar o espírito livre do Pavement numa redoma, embora a banda tenha soado fora de tempo e espaço como sempre, em Spit on a stranger e Carrot rope, além do B side Harness your hopes, tudo isso presente em Cautionary tales. Uma história bem legal de ouvir, e de contar.
Nota: 10
Gravadora: Matador.
Crítica
Ouvimos: Zara Larsson – “Midnight sun”

RESENHA: Zara Larsson lança Midnight sun, disco pop dançante e divertido, com batidões de funk, hyperpop e ecos dos anos 1990.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Sommer House/Epic
Lançamento: 26 de setembro de 2025
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Lá fora, muita gente se referiu a Midnight sun, quinto álbum da sueca Zara Larsson, como um disco “vibrante” e como uma enorme mudança em sua carreira de poucos discos (1, o primeirão, saiu em 2014). Faz sentido: em termos de (vá lá) persona pop, Zara entrega canções de pop eletrônico hipnótico com letras “de boa”. Por mais que até haja experimentações sonoras aqui e ali, o conceito parece ser apenas o de fazer música para dançar, diversão sem culpa e nada mais do que isso.
Midnight sun, aliás, tem um clima que soa mais rueiro do que propriamente noturno. Ainda que ela faça a crônica da diversão dance da Europa em Eurosummer – que na real é uma dance music barata com aquele velho riff de gaiteiro já surgido em várias outras faixas dançantes – chamam mais atenção os batidões de funk em músicas como The ambition e Hot & sexy. Essa última, por sinal, uma boa recordação da dance music dos anos 1990, com vocal rápido e beat acelerado. Blue moon e a faixa-título chamam a atenção pela felicidade pop de arena, Crush é dance music feliz – e tudo isso desce bem. Já Girl’s girl tem um beat meio latino que soa meio banal, o que acaba desvalorizando uma letra que fala sobre relacionamentos confusos e desejos mais confusos ainda.
- Ouvimos: Taylor Swift – The life of a showgirl
Um momento bem legal em Midnight sun é Pretty ugly, música na qual Zara se esforça para convencer todo mundo da sua vontade de sair pelas ruas arrumando encrenca e subindo nas mesas em festas. Mas faz isso unindo batidões herdados da house music e clima de cheerleader, algo que Gwen Stefani fazia há anos e hoje não faz mais. Puss puss, que encerra o álbum, é hyperpop para explicar para todo mundo o que é hyperpop: refrão que você tem certeza que cita alguma coisa (mas você não se recorda o que é), pop que não precisa de muito para viciar o/a ouvinte, uma verdadeira chuva de detalhes sonoros que provavelmente vão colocá-la na lista de melhores canções pop de 2025 de muita gente.
Em plena era do disco pop como manifesto conceitual, Zara Larsson decidiu fazer de Midnight sun um disco para divertir e dançar. Nem tudo dá certo nele, mas o que dá certo, dá muito certo.
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Crítica
Ouvimos: S.E.I.S.M.I.C. – “Ologism”

RESENHA: Em Ologism, o trio neozelandês S.E.I.S.M.I.C. faz stoner rock espacial que mistura Hawkwind, Sabbath, MC5 e psicodelia à la Doors.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 6 de outubro de 2025
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Banda cujo nome torna bastante difícil a tarefa de buscá-la nas plataformas digitais, o trio neozelandês S.E.I.S.M.I.C. faz um stoner rock espacial que paga tributo tanto a Hawkwind e Black Sabbath quanto a MC5. Ologism, novo álbum, abre bem rápido com a faixa-título, bem punk e curtinha – e ganha um aspecto de blues rock lascado com The demon, que vem em seguida, com alterações rítmicas em torno do estilo. M.A.C. é quase um Aerosmith + Queen espacial, com vocais bacanas e certa vibe de arena na sonoridade – sem deixar de lado o estilo comum do grupo.
Side quest, cercada por solos distorcidos e vocais bastante melódicos e sombrios, é o lado progressivo-hard do grupo, lembrando bandas como Masters Of Reality e Porcupine Tree. Sons garageiros e bastante pesados surgem em Brain rot e Magic seagull. Já Evil eye e Sands of time são invadidas por um clima psicodélico, que lembra The Doors e Steppenwolf. No final, X-ray vision retoma o corredor punk iniciado na abertura de Ologism.
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Crítica
Ouvimos: Beau Anderson – “Soundtrack of letting go” (EP)

RESENHA: Beau Anderson mistura stoner, metal alternativo e glam rock em um EP intenso, com peso, ironia e boas melodias.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 24 de outubro de 2025
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Ex-integrante de bandas como Seven Year Witch e The Twotakes , o norte-americano Beau Anderson consegue fazer uma mescla, digamos, sui generis em seu EP solo de estreia, Soundtrack of letting go. Boa parte do material une estilos como stoner rock, metal alternativo e… glam rock. A cada momento do disco um desses estilos para para a frente e os outros dois ficam como uma espécie de recado, de subtexto.
Fix it, na abertura, tem algo de stoner e de bandas como Suede no som. O clipe, excelente, mostra Beau caindo no papo de um vendedor televisivo esperto (interpretado por seu ex-colega de banda Aaron Langford) e acumula vários frascos de um cola-tudo supostamente milagroso chamado Fix It. Know by now, por sua vez, já vai para o lado do glam rock com pauleira, enquanto Standing still, aberta com um clima meio blues, meio garageiro, soa um pouco como um Audioslave menos pesado.
- Ouvimos: Bush – I beat loneliness
Dá para dizer que Beau tem em seu som muito do lado bom do Bush – e não só isso: climas lembrando Placebo e o já citado Suede vão surgindo, às vezes, em alguns segundos das faixas. As if é bem nessa onda, mas Beau tem um lado mais indie, até mais oitentista na abordagem de voz e de estrutura de composição e de arranjo – um lado, por sinal, que não deixa o som se transformar num pastiche de metal alternativo, ou algo do tipo.
Já Talk talk talk e 505 encerram Soundtrack of letting go focando em peso e guitarra, e unindo todos os elementos do disco em prol de um som intenso, com letras sufocantes (além da doideira de Fix it, Beau fala de morte, amores cagados, dores de cabeça do dia a dia, etc).
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