Crítica
Ouvimos: Holger, “Más línguas”

- O Holger é uma banda de São Paulo, formada por Bernardo Rolla (voz, percussão, guitarra, baixo), Marcelo Altenfelder (guitarra, vocal), Pedro Bruno “Pepe” (baixo, vocal, percussão, teclado, guitarra), Marcelo Vogelaar “Tché” (vocal, guitarra) e Charles Tixier (bateria). Más línguas é o quinto disco deles.
- O álbum foi feito durante três anos e algumas etapas: uma delas incluiu o isolamento dos integrantes em Ilhabela, o município-arquipélago em São Paulo, que deu nome ao segundo álbum do grupo. Más línguas tem produção de Gabriel Guerra (o Guerrinha) e Charles Tixier (baterista da banda). Entre as participações, tem Lucas Gonçalves (Maglore) na produção da faixa Estilo.
A banda paulistana Holger faz parte de uma geração de grupos que vieram da mistura musical e se acostumaram com ela, como linguagem criativa – nada a ver com as separações entre “rock brasileiro” e “MPB” que havia em décadas anteriores, ou mesmo com a divisão entre música “popularesca” e “de elite”. Tanto que desde o disco Ilhabela (2012) o grupo tem influências de axé music, de sons bem mais pop do que o normal ouvido e tocado pelas bandas de rock, e faz mesclas envolvendo sons solares e indie pop. Não é uma banda de “rock” na prática, é uma banda que trafega entre uma musicalidade mais aberta e uma certa legitimidade indie. Diferentemente de projetos mais comerciais que, às vezes, têm informações musicais análogas (é só ligar o rádio que dá pra esbarrar com vários artistas “solares”, trafegando em ondas como a do folk adolescente, por exemplo).
Dessa vez o Holger volta com um disco, Más línguas, mais discreto, influenciado pelo reggae – estilo musical que surge como uma espécie de “recado” em diversas canções, como Remota e Inverno. Sem fazer muita força, dá para achar referências bem claras, em termos de produção e arranjo, do rock britânico dos anos 1980. Ele aparece inserido nas linhas de baixo e em timbres de guitarra, como o da latinesca Escada (que abre o disco) e nos teclados de músicas como Vida orgânica, lembrando bandas como Orchestral Manoeuvres In The Dark e o New Order da época de Low life (1985). Tem um excelente tecno-samba-rock na afetuosa Domingo de sol, também, além de uma balada soul viajante e repleta de efeitos, Olimpo, que dá a sensação real de estar distante das “más notícias do país”, citadas na letra. Já o pop pós-punk Estilo, levado adiante pelas linhas de baixo e pelo diálogo com a bateria, é a faixa que gruda no ouvido.
Gravadora: Balaclava Records
Nota: 8
Foto: Rodrigo Bueno/Divulgação
Crítica
Ouvimos: Slick Rick – “Victory”

RESENHA: Slick Rick lança Victory, disco curto e afiado, com beats secos, histórias ácidas, críticas sociais e o charme narrativo que marcou sua estreia.
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Rapper, cantor e produtor, Slick Rick gravou pouco, não é um nome extremamente famoso do rap, mas tem um poder de influência enorme – The great adventures of Slick Rick (1988), primeiro álbum, unia beats, zoeira e narrativas que batiam no ouvido mais em tom de crônica do que de rap.
Era mais ou menos, e pessimamente mal comparando, quando Gabriel O Pensador surgiu com seu disco de estreia (1993). A narrativa do “meu nome é fulano e eu faço isso e aquilo” era acrescida de conselhos, histórias infantis levadas para o mundo adulto, parábolas e uma série de outros elementos que poderiam ser lidos além de apenas escutados ou dançados.
De lá para cá foram poucos discos e Victory é o quinto álbum de Rick – um disco visual (confira abaixo) de menos de meia hora, e em que o beat e as histórias chegam na frente. As melodias são riffs e sons combinados que dão uma estrutura quase elementar para as músicas, sem a festa de samples de discos de Kendrick Lamar (que herdou muito da veia de storyteller de Rick) e Snoop Dogg. O repertório evoca o boombap clássico do rap.
- Ouvimos: Snoop Dogg – Iz it a crime?
- Ouvimos: Stefanie – Bunmi
- Ouvimos: Will Smith – Based on a true story
- Ouvimos: Lil Wayne – Tha Carter VI
Slick, vale dizer, é um sujeito que em 1988 lançou Treat her like a prostitute, música que “aconselhava” os homens, de maneira não muito equilibrada ou sensata, sobre temas como sexo casual, casamento e namoro sério. Ou seja: não espere muito equilbrio em Victory, e o lance de Slick é universidade das ruas, mesmo quando fala de temas supostamente introspectivos (Stress, com vocal ágil sobre bateria e um riff de baixo) e conflitos de geração na música feita por artistas negros (a sinuosa Foreign).
Às vezes, incomoda que Slick mantenha um certo tom de tiozão do rap. Angelic, com batida soul e design melódico simples, traz mais conflitos com os novos tempos na letra – enquanto I did that, rappeada a cappella, com barulhos de mar no fundo, lembra às novas gerações quem é ele. A experiência quase sempre ajuda: Cuz I’m here, lembrando o clássico televisivo Soul train, conta histórias de atividade na noite. A vinheta Mother Teresa é uma oração hip hop com versos certeiros e lembranças da dureza (“fizemos tanto por tanto tempo com tão pouco / que agora estamos qualificados para fazer qualquer coisa / com nada”).
Slick Rick margeia também a psicodelia na dance track Come on let’s go, e o romantismo reggae do lovers rock em Landlord – cuja letra, nada romântica, é dedicada aos usurários de Nova York (e curiosamente, vê o universo dos aluguéis pelo ponto de vista de quem cobra por eles). A trilha básica de Documents, por sua vez, emoldura uma história de detetive, em que Slick é mandado para recuperar documentos importantes. No fim das contas, até o que parece bem estranho em Victory (e tem MUITAS coisas bem esquisitas ali) vale como história.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Mass Appeal Records / 7 Wallace
Lançamento: 13 de junho de 2025
Crítica
Ouvimos: Steve Queralt – “Swallow”

RESENHA: Estreia solo de Steve Queralt (Ride) mergulha no progressivo espacial, com guitarras pesadas, climas melancólicos e ecos de pós-punk e ambient saturado.
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A estreia solo de Steve Queralt, baixista do Ride, tem a ver com o som de sua banda, ainda que seja completamente diferente. Mesmo que o Ride seja considerado um dos bastiões do shoegaze, eles sempre buscaram trocar figurinhas com outros estilos do rock – tanto que os ruídos e as paredes de guitarra respondem por apenas uma parte do escopo do grupo.
Swallow é um disco de rock progressivo e espacial mergulhado na sujeira sonora, com sons melancólicos e imersivos que já se iniciam na primeira faixa, Mission creep – cujo roteiro inclui uma narração que vem pelo rádio, e um clima de voo sideral. A segunda faixa, Lonely town, com os vocais de Emma Anderson (ex-Lush) parte para o pós-punk do espaço, lembrando The Cure e New Order, mas com tom viajante e sons ecoando como uma massa sonhadora de guitarra e teclados, engolida por efeitos no final.
- Ouvimos: Ride – Interplay
- Ouvimos: Everyone Says Hi – Everyone Says Hi
- Ouvimos: Andy Bell – Pinball wanderer
O começo de Swiss Air, também com Emma nos vocais, chega a ameaçar algo próximo do nu-metal, por causa da guitarra da abertura – mas logo os teclados e guitarras caminham para algo progressivo e pesado, que enfim caminha para uma parede guitarrística próxima do estilo do Ride. Há também sons mais meditativos ainda no quase post-rock de High teens e A Porsche shaped hole (esta, soa como um redemoinho em alguns momentos), nos mares tempestuosos de Motor boats.
Essa onda meditativa surge combinada com guitarras distorcidas e pesadas em I don’t know how to sing, e em duas faixas que têm o estilo de produção de Brian Eno, só que voltadas para climas mais saturados, Messengers e 1988 – dois sons que flutuam até desmanchar.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Sonic Cathedral
Lançamento: 13 de junho de 2025.
Crítica
Ouvimos: Echo Upstairs – “Estranhos lugares para os olhos”

RESENHA: Álbum do Echo Upstairs traz noise, psicodelia e folk distorcido, com climas que vão do sombrio ao meditativo e emanações sonoras bem inusitadas.
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O Echo Upstairs é um supergrupo indie e experimental, que já lançou faixas feitas remotamente e terminadas num iPhone, e estreou com o EP Il mondo (2023, resenhado aqui). O álbum de estreia, Estranhos lugares para os olhos, traz formação mudada. Ana Zumpano (guitarra, vocais, poemas, sintetizadores, loops e viola caipira) e Bigu Medine (contrabaixo, vocais, organelle e guitarra) ganham a companhia de Beeau Gomez (guitarra e contrabaixo) e João Casaes (bateria, piano, organelle e mellotron), e o som torna-se um caminho que vai sendo percorrido e descoberto aos poucos.
Estranhos lugares abre com o paredão instrumental de Beautiful noise, avisando ao/à ouvinte que a matéria-prima da banda é o barulho. Vai para o caminho da canção ruidosa em Correspondência e alterna com os rangidos e sombras de Cavalgo marinho, cujo ritmo vai surgindo após algumas experimentações. Já Green quartz é mais tranquila, quase um folk ligado na tomada, e cheio de distorções – ou uma valsa shoegaze.
Várias surpresas começam a aparecer a partir daí, como a balada Ficou pra trás – que por trás dos efeitos, dos ecos e das vibrações, mostra um toque disfarçado de soul e de progressões setentistas. Músicas como Sono leve e a declamada Despedida lembram a paixão do Som Imaginário e dos músicos do Clube da Esquina por guitarras saturadas, enquanto Forbidden abre com uma guitarra fuzz que lembra o início de I wanna be your dog, dos Stooges – mas ganha logo tom meditativo e psicodélico.
Três lados diferentes do Echo Upstairs surgem unidos em músicas como Voo em falso, Facilitar e a faixa-título, que trazem ruídos, vibes sombrias e clima meditativo. Uma equação que em Estranhos lugares para os olhos nem sempre aparece equilibrada (o que provavelmente é uma intenção da banda), mas rende boas surpresas.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Midsummer Madness
Lançamento: 11 de junho de 2025.
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