Crítica
Ouvimos: Ride, “Interplay”

- Interplay é o sétimo álbum da banda britânica Ride, que reaparece com a formação de sempre: Mark Gardener (voz, guitarra), Andy Bell (voz, guitarra solo, teclados), Steve Queralt (baixo) e Laurence “Loz” Colbert (bateria). A produção foi feita pela banda com Richie Kennedy.
- O Ride começou em 1988 levantando a bandeira do shoegaze e da neo-psicodelia, com discos como Nowhere (1990), o primeiro e até hoje o melhor do grupo. Em 1996, diferenças musicais levaram ao fim da banda. Nessa época, Andy Bell foi tocar no Oasis, ficando lá até o fim. O Ride retornou em 2014 e voltou a gravar em 2017.
- Em entrevista recente, Mark Gardener diz esperar atrair um público jovem para o disco novo da banda. “Ouço muitas músicas novas e reajo mais a elas do que a ouvir discos antigos de várias maneiras. É uma reação ao sentimento de que há muitas bandas novas surgindo. E se não estivermos realmente dispostas a jogar o jogo, eles vão nos dar um soco no bolso”, diz.
O retorno da banda britânica Ride tem sido digno e cheio de lançamentos interessantes. Weather diaries, de 2017, e This is not a safe place, de 2019, são os dois primeiros álbuns de “volta”. E mostraram facetas bem diferentes daquela banda que parecia entender os anos 1990 como uma revisão (ou recriação) dos anos 1960. O quarteto não voltou abraçado com fórmulas antigas de shoegaze. Em Weather, especialmente, trabalharam com uma noção clássica de pós-punk viajante, que rendeu canções boas como Charm assault. E a fase nova acrescenta muita coisa a uma carreira que tem clássicos como Vapour trail, Seagull e Leave them all behind.
O Ride nunca teve nada de mão beijada. A proposta neo-psicodélica da banda não era tão comercial quanto parecia, o brit-pop dobrava a esquina, a gravadora do quarteto (Creation) era a mesma da nova sensação do rock, o Oasis. O grupo forçou a barra para tentar parecer um pouco mais próximo do que rolava no rock da época. Carnival of light, terceiro disco da banda (1994), era essa tentativa meio torta, com canções boas e outros momentos entediantes. Já o surpreendentemente bom Tarantula (1996), disco seguinte, encerrava a história (por ora) transformando o Ride num quase Black Crowes pré-punk. A crítica na época achou ridículo.
Interplay, o disco novo, antes de tudo, transforma o Ride numa nova banda. Em algumas faixas, o grupo caminha entre o shoegaze, a psicodelia e uma noção de composição e arranjo herdada do synth pop, em músicas como Peace sign, Last frontier (esta, bastante influenciada pelo New Order), na celestial Yesterday is just a song e na programadinha (e bela) Monaco. É uma cara até mais pop do grupo, vamos dizer assim, mas o lado dream pop ruidoso está garantido por músicas como Light in the quiet room – com seis minutos, dos quais metade é tomada por bases crescentes de guitarras e batidas quase industriais.
O lado mais quietinho e sonhador que deu Vapour trail ao mundo ressurge na balada Last night I went somewhere to dream e no folk sinistro Stay free. Além disso, tem Midnight rider e Portland rocks, ambas soando como um Jesus & Mary Chain com boa produção, e o tom misterioso da quilométrica Essaouira. Ouça correndo.
Nota: 8,5
Gravadora: Wichita.
Crítica
Ouvimos: Gabriel Ventura – “Pra me lembrar de insistir”

RESENHA: Gabriel Ventura mistura MPB, vibes grunge e climas experimentais em Pra me lembrar de insistir, disco ruidoso e inventivo feito pra ouvir com atenção.
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Músico fluminense, um dos fundadores da banda Ventre – que revelou também Larissa Conforto, do projeto musical Aiye, e Hugo Noguchi – Gabriel Ventura faz MPB com uma cara bem diversa em seu segundo disco solo, Pra me lembrar de insistir. Por mais que você consiga ver emanações de Milton Nascimento e até de Geraldo Azevedo no som de Gabriel, o principal ali é que se trata de um disco ruidoso, onde percussões e violões parecem ranger, e sons fantasmagóricos surgem por todo o lado.
Essa busca por um design sonoro menos formal acontece em todo o álbum – como em Lamber os dentes, no jazz silencioso de Acalento, na ambientação musical selvagem de Trovejar e no curioso drum’n bass orgânico de O que quiser de mim, que vai tendo modificações no ritmo e destaca justamente o som da bateria. O enfeite do não e do sim traz som percussivo e quase concretista, Toda canção soa quase esculpida em torno do violão – e muita coisa no álbum parece emanar uma MPB grunge, ou uma música brasileira que foi ouvir Caetano e Gil, mas não deixou de ouvir Velvet Underground e PJ Harvey.
Viagens sombrias aparecem também entre os rangidos de Cor de laranja, na estileira grunge-jazz-MPB de Fogos e na guitarra estilingada de Brusco. Pra me lembrar de insistir surge numa época em que fones são pequenos e plataformas achatam o som – mas soa como um disco da era do CD, em que havia aquela vontade de fotografar musicalmente o estúdio.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Balaclava
Lançamento: 6 de maio de 2025
Crítica
Ouvimos: Matthew Nowhere – “Crystal heights”

RESENHA: Matthew Nowhere homenageia os anos 1980 no álbum Crystal heights, com ecos de David Sylvian, Japan e Ultravox.
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Músico de San Francisco (CA), Matthew Nowhere não está muito preocupado em parecer inovador. Seu primeiro álbum, Crystal heights, é uma homenagem sincera à música dos anos 1980 e aos teclados da época. Também brinca com uma chuva de referências eletrônicas dos anos 1980, como o clima Jean Michel Jarre da vinheta Transmission, a evocação da fase tecnopop do Ultravox em Love is only what we are e da faixa-título, o clima sombrio e kraftwerkiano de Have you ever known, e a vibe de trilha de série do interlúdio Stellar enfoldment.
Crystal heights une várias vertentes tecladeiras da época, do mais pop ao mais experimental, passando pelo rock eletrônico. A elegância e o estilo de Transforming lembram David Sylvian e o Japan, enquanto Echoes still remain une climas tecnopop e ambient. Ruby shards tem violão e guitarra limpa, solar – remetendo ao disco Technique, do New Order (1989) – enquanto Everything’s true, mesmo com ritmo eletrônico demarcado, traz lembranças de Echo and The Bunnymen. Já Silver glass é uma curiosidade: uma espécie de tecnobrega cool, cuja melodia e arranjo lembram Peter Gabriel.
Persist3nce, no final do disco, é música eletrônica com pegada forte, mais próxima do hi-NRG, e clima de sonho darkwave dado pela participação da dupla de shoegaze voador Lunar Twin. Um momento em Crystal heights que traz memória e reinvenção misturadas.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Nowhere Sound
Lançamento: 23 de maio de 2025.
- Relembrando: Ultravox – Systems of romance (1978)
- A fase inicial do Ultravox no podcast do Pop Fantasma
- Ouvimos: Billy Nomates – Metalhorse
Crítica
Ouvimos: Krustáceos – “Bicho bruto” (EP)

RESENHA: Krustáceos estreia com o EP Bicho bruto, que mistura pós-punk, tecnopop e zoeira à la anos 1980 e 1990.
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Krustáceos é o codinome do produtor musical e trilheiro de cinema Pedro Sodré, e Bicho bruto é a estreia em EP do projeto. Um disco de seis faixas que faz um retorno bastante sincero não apenas na musicalidade dos anos 1980 como também no clima de vale-tudo musical e lírico da época. Boa parte do repertório, em letra e música, lembra direto Talking Heads e U2 – só que aí o U2 provocador do começo dos anos 1990, do disco Zooropa (1993). A faixa-título, que abre o disco, tem guitarra em tom funk e letra que inicia lembrando Numb, de Bono & cia.
Na sequência, o pós-punk e os teclados em vibe tecnopop de Kunk, a zoação com a onda de influencers na fantasmagórica Devora-me ou te decifro (“investe tempo em produção sem produzir o conhecimento”, diz a letra) e o tecnopop na cola da Orchestral Manoeuvres In The Dark – com ótima intervenção de metais no final – de E então as luzes… Já Amor aos litros tem algo de synthpop e algo de R.E.M,. e Não vai ser com medo tem jeito de hino pós-punk, mas com clima zoeiro.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Nous Music
Lançamento: 8 de maio de 2025
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