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Crítica

Ouvimos: Flaira Ferro, “Afeto radical”

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Ouvimos: Flaira Ferro, “Afeto radical”

Com quatro álbuns na discografia, a pernambucana Flaira Ferro fez de Afeto radical uma carta de amor à MPB dos anos 1990. Aquela, que deu fama à diversidade de Chico Science, Lenine, Pedro Luis e Cássia Eller – alguns deles, nomes que vinham até de outros tempos.

O disco é também um manifesto por novos tempos e mudanças políticas e existenciais. Lenine, o próprio, solta a voz na faixa-título, pop recifense pesado e rápido cuja letra evoca “um quê de permissão / pra ser o que der na telha / um quê de permissão / pro afeto radical”. Irrelevar é soft MPB com percussão, piano Rhodes e clima quase gospel, com palmas e uma letra-oração que pede: “faça com que eu não caiba dentro da caixinha”.

O álbum de Flaira adota clima clássico de MPB nordestina nas violas de Sabe, no clima jazzístico e dançante de Dança da estrela, e no forró-rock de Os ânimos, com participação de Elba Ramalho – uma música que se torna um frevo agitado no final. Já Baleia é um forró marítimo e espacial, e Grão de dentro é MPB orquestral com tons de reggae.

Afeto radical também espalha brasa para a indústria alimentícia (“índústria do câncer escrota”) na MPB abolerada e pop de Refeição, para o anti-capitalismo e anti-despotismo no frevo Lacre e para o velho vício de “vencer na vida” no folk brasileiro Amigo, amigo. Afeto radical é um manifesto assertivo sobre como a vida poderia – e talvez precisasse – ser em 2025, com peso, propósito e som de chão.

Nota: 8,5
Gravadora: Tropical Gold
Lançamento: 28 de março de 2025.

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Crítica

Ouvimos: Damiano David – “Funny little fears”

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Ouvimos: Damiano David - "Funny little fears"

RESENHA: Damiano David estreia solo com Funny little tears, disco de pop dramático e sofisticado sobre fim de namoro, com ecos de Bowie, Prince e britpop noventista.

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A sorte sempre esteve do lado do Mäneskin – e nisso não vai nenhuma observação depreciatva a respeito do talento da banda. O futuro de uma banda italiana de rock, revelada pelo insopitável Eurovision, e com tendências a soar BEM dramática, seria no máximo continuar na Itália e fazer sucesso no mercado de lá.

Só que com talento, arte, e uma certa sacação de que os novos tempos pediriam mais mistério e emoção no rock, as coisas foram diferentes. Aliás, vale acrescentar que desde Rush (2023), primeiro verdadeiro disco internacional da banda, o Mäneskin tem a ajuda de vários produtores e coautores.

No caso de Funny little tears, estreia solo do vocalista da banda, Damiano David, não é diferente. Trata-se de um produto pop, extremamente bem acabado e colaborativo. E que tem uma turma animada ajudando a dar forma e função a um repertório construido basicamente de canções de corneira abissal, feitas quando um namoro do cantor chegou ao fim.

O esgotamento do namoro rendeu canções ultrapop como Voices, com lado soul dado pelo piano; um tecnopop com lado dramático herdado da canção popular italiana, Zombie lady; um indie pop emocional com emanações de Prince, The bruise, cantado com Suki Waterhouse; uma balada lacrimejante com herança do britpop, Sick of myself. Além de uma baita praga de madrinha rogada para a ex-namorada: Next summer, pop emocionadíssimo com lembranças de The bends, segundo disco do Radiohead (1995).

Já que Damiano vem de uma banda de glam rock, Funny little fears acerta lembrando Elton John em Angel, solta um baladão das antigas em Tangerine (com D4vd nos vocais), parte para evocações do tecnopop (Born with a broken heart) e manda bala num britpop “espacial”, Mars. Esta, uma música com ar vintage herdado justamente de David Bowie – e com letra reclamando que o rock morreu e por causa disso, está todo mundo indo pra Marte, mas “o diabo está na missão Apolo”. Por acaso, Funny little fears tem até um indie rock na cola de Strokes, Tango.

Na real, Funny little fears segue o mesmo esquema de pop adulto que discos de Harry Styles também seguem – aquele esquema de música “jovem” que em menos de um ano pode estar tocando numa light FM ao lado hits dos anos 1970 e 1980. Damiano escapa da pasteurização por ter uma baita cara própria. Com a vantagem de que tanto ele quanto seus colaboradores decidiram não reinventar a roda, mesmo quando a ideia é soar sofisticado e “psicodélico”, como na beatle-monkee Solitude (No one understands me), que encerra o disco a golpes de teremim e de teclados prestes a levantar voo (“ninguém me entende, a não ser eu mesmo / eles dizem que estou maluco, pode ser que estejam certos”, diz a letra).

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Sony Music
Lançamento: 16 de maio de 2025.

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Crítica

Ouvimos: Pic-Nic – “Volta”

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Ouvimos: Pic-Nic - "Volta"

RESENHA: Pic-Nic volta com Volta, seu primeiro disco de inéditas em 14 anos. Um disco que mistura indie pop atual, nostalgia 2000s e grooves funkeados com letras afiadas.

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Retornando com inéditas após um hiato que durou 14 anos, a banda carioca Pic-Nic vai certamente receber uma atenção inédita em sua carreira com o álbum Volta. Um disco que remexe nas lembranças do indie rock carioca, e sacode novamente a onda power pop que assolou o rock nacional independente no começo dos anos 2000. Mas que não se contenta com a nostalgia: o indie pop de 2025 é devidamente louvado na faixa de abertura Aniquilação, música com letra apocalíptica, groove na melodia e referências de disco music nas guitarras – além de uma narração meio entertainer, meio Barry White.

O mesmo clima toma conta de Essa fala, rock funkeado, com guitarra wah wah ocupando o canal esquerdo e arranjo marcado pela simplicidade – e o rap de Ramonzin, convidado da música. Aproveitando que a vocalista Guidi Vieira tem uma carreira paralela como cantora autoral de MPB, o Pic-Nic sofistica o som com tons entre o soft rock e a bossa em Pobre de mim – cuja letra faz um relato desses tempos de algoritmos e redes sociais (“pobre de mim que estou a par de tudo / eu nao queria saber do seu mundo / cada detalhe com riqueza / cada conquista nenhuma fraqueza”). Rola também pop-rock nacional clássico, solar, com cara oitentista, em Bem vindo.

Para os fãs da antiga, vale dizer que o passado do Pic-Nic ganha continuidade no punk pop com lembranças de Pixies de Gênio (Eu tenho a resposta) e no cruzamento de Pretenders e Paramore em I wanna be alone (com letra em inglês). Já a faixa-título é um folk abolerado e ensolarado, e a música mais pop e acessível do disco – o tipo da canção que uma gravadora grande, lá por 2002, 2003, iria insistir para ser a faixa de trabalho. Sorte que estamos em 2025 e o jogo (aparentemente) mudou, e virou.

  • Confira em disco e ao vivo – neste sábado (14), às 19h, o Pic-Nic vai se apresentar ao lado da banda Manco Capac na Livaria Baratos da Ribeiro, em Botafogo (Rio).

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Novevoltz Records/Bonde Music
Lançamento: 28 de maio de 2025.

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Ouvimos: Mild Horses – “Grime’s graves” (EP)

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Ouvimos: Mild Horses - "Grime's graves" (EP)

RESENHA: Mild Horses investe no krautrock ruidoso e eletrônico no EP Grime’s graves, com jazz, pop e progressivo.

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Matthew Leuw, o sujeito por trás do Mild Horses, é um músico britânico que trabalhou em projetos musicais definidos como noise-pop, art punk e lo-fi electro-pop. A área dele é a do ruído e das referências tão eletrônicas quanto perturbadoras – tanto que estilos como krautrock são citados como referências nesse Grime’s graves, EP que aponta para uma estileira kraftwerkiana, esparsa e frenética, e até para um certo lado progressivo, ainda que bastante dosado.

Mingus, Dingus, na abertura, tem algo de jazz na percussão (lembrando uma marimba) e muito de rock alemão setentista na argamassa – por sinal, esse clima jazz-eletrônico é uma constante nas quatro faixas do EP. YDKWYD é o lado quase pop do disco, com teclados cintilando e efeitos de cordas. Give me some time parece um britpop transformado em krautrock, com cordas, teclados voando e partículas rítmicas de reggae – e a música vai se tornando mais ruidosa na medida em que avança.

A faixa-título é a que soa mais progressiva, com batida marcial, baixo estilingando e sensação de vento varrendo tudo e tomando conta – como na trilha de um filme tão experimental quanto as músicas.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8
Gravadora: Independente
Lançamento: 9 de maio de 2025

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