Crítica
Ouvimos: Fantastic Negrito, “Son of a broken man”

- Son of a broken man é o oitavo disco do músico, cantor e compositor norte-americano Fantastic Negrito. O álbum é inteiramente inspirado no relacionamento disfuncional de Xavier Amin Dphrepaulezz (seu nome verdadeiro) com seu pai. No disco, Negrito faz vários vocais (dos principais aos backings) e toca guitarra, piano e percussão, além de fazer programações.
- “Quando eu tinha 12 anos, meu pai parou de falar comigo e me expulsou de casa. Eu nunca mais o vi e ele acabou morrendo enquanto eu estava em um orfanato. Este sou eu falando com ele e contando o que fiz da minha vida”, conta o músico.
- O álbum é o terceiro a sair pelo selo próprio de Negrito, Storefront Records.
A vida pregressa de Xavier Amin Dphrepaulezz, músico e cantor norte-americano hoje mais conhecido como Fantastic Negrito, não foi nada mole. Son of a broken man, disco inspirado no relacionamento pra lá de tóxico dele com seu pai, e mais focado ainda nas questões e problemas pessoais que enfrentou ao longo da vida, tem versos como “a primeira pessoa a me trair foi meu pai”, “alguém já agiu como se fosse seu amigo e te apunhalou pelas costas?”, “nós dois poderíamos nadar no rio de lágrimas que fiz tantos chorarem” e “mamãe me deixou/papai se foi/todos os meus amigos me abandonaram/agora estou sozinho”. Não são apenas figuras de linguagem, e não é uma zoação tipo a letra de Psicopata, do Capital Inicial, não. São histórias, são verdades cruas que tomam conta das faixas.
Mesmo assim, musicalmente, Son of a broken man está bem distante de ser um disco triste, já que une Prince, Motown, reis do soul e do funk em geral, e rock anos 1970 – não necessariamente nessa ordem. Runaway from you pode tocar numa festa, já que é um rockão setentista que lembra velhos pilhadores britânicos da música feita por artistas pretos (Led Zeppelin e Rod Stewart, em especial). E ainda por cima destaca uma guitarra distorcida que é a cara de Jack White. A brilhante I hope é soul-gospel de ótima categoria. Skirt é rock-soul vibrante acompanhado de palmas (tomando de volta o spiritual que o Queen assaltou para fazer We will rock you). Goddamn biscuit vem no estilo do Funkadelic, mas bem menos mal comportado. O gospel This little light of mine, que parece um tema de desenho animado groovie, junta referências de Rufus & Chaka Khan, Prince e Sly Stone.
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Tem mais outras curiosidades no disco. Uma delas é o soul-r&b My only friend is you, de clima pesado ameaçando um nu-metal (!). E Devil in my pocket, uma canção que mexe no legado de bandas como Status Quo e Grand Funk, e pega tudo o que as bandas inglesas de blues-rock pauleira andaram pilhando de antigos músicos de soul e blues. A pesada Crooked road faz o mesmo com o AC/DC e os Rolling Stones. Já a faixa-título, uma balada que encerra o disco, parece trazer um diálogo imaginário entre Negrito e seu pai, a ponto de não dar para saber quem é um e quem é o outro.
Liricamente, Son of a broken man é um disco para quem tem fraco por música forte. Musicalmente, é uma festa, uma sessão de repatriação musical e um álbum para ouvir na estrada, no dia a dia, na luta. Enfim, festa e luta, essas coisas.
Nota: 10
Gravadora: Storefront Records.
Crítica
Ouvimos: John Fogerty – “Legacy: The Creedence Clearwater Revival years (John’s version)”

RESENHA: John Fogerty, aos 80 anos, recupera direitos das músicas de sua ex-banda Creedence Clearwater Revival e relança vinte clássicos em versões idênticas às originais.
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Aos 80 anos, John Fogerty, ex-vocalista, guitarrista, compositor e déspota do Creedence Clearwater Revival, conseguiu ganhar finalmente todos os direitos sobre suas composições da época do grupo – sim, porque todos os hits autorais da banda foram compostos por ele. Para comemorar, o músico decidiu regravar 20 canções do CCR na base da “versão do John”.
Na prática, são substituições, e não versões. Em Legacy: The Creedence Clearwater Revival years (John’s version) Fogerty revisitou canções como Have you ever seen the rain, Born on the bayou, Proud Mary, Lodi, Who’ll stop the rain, Green river e Fortunate son em leituras quase 100% iguais aos originais – em timbres, arranjos, detalhes e até gritos e uivos. Facilita o fato da voz de John estar igualzinha a antigamente. Detalhe: até no Bandcamp as músicas novas estão – visão, o cara tem.
- Ouvimos: The Doobie Brothers – Walk this road
- Ouvimos: Faces – Faces at the BBC: Complete BBC concert and session recordings 1970-1973
Alguma diferença do original? Bom, Long as I can see the light teve uma pequena mudança de tom, Have you ever seen the rain teve mudanças discretas nas linhas vocais do refrão, e de modo geral todas as músicas ganharam mais peso na bateria e nas guitarras – mas praticamente tudo soa como os originais dos anos 1960 e 1970 remixados ou remasterizados.
De modo geral, não é um lançamento dos mais úteis para fãs antigos – serve mais como um demarcador de independência, já que John oferece aos fãs as versões gravadas por ele. O complicado é entender como se comportar diante de um lançamento que reembala o material oldies e apenas isso. Acaba tendo mais graça ouvir os antigos álbuns do Creedence.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7
Gravadora: Concord
Lançamento: 22 de agosto de 2025
Crítica
Ouvimos: Thistle. – “It’s nice to see you, stranger” (EP)

RESENHA: Thistle., da Inglaterra, une grunge e shoegaze em It’s nice to see you, stranger, EP coeso que ecoa Nirvana, Dinosaur Jr e My Bloody Valentine.
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Vindo de Northhampton, Inglaterra, o Thistle. (sim, existe um ponto após o nome do grupo) tem uma onda grunge + shoegaze séria no seu som – a ponto de, numa audição inicial, ser possível imaginar que a banda vem dos cafundós dos Estados Unidos. Num papo com a newsletter First Revival, eles citam o Nirvana como sua banda grunge favorita, e um dos integrantes diz não ter se entusiasmado especialmente com o shoegaze quando descobriu o estilo.
Um outro detalhe sobre o EP It’s nice to see you, stranger é que o grupo precisou de quase um ano para gravá-lo, já que cada integrante tem seu trabalho e ninguém pediu folgas. “Por isso é que ele é um EP, e não um álbum”, afirmam. Soa estranho descobrir isso, já que as cinco faixas do disco têm peso, coesão e emanações que vão de Nirvana e Dinosaur Jr a Idlewild e The Cure. Cobble/mind funde barulho, melodia e vocais doces, enterrados na música. A faixa-título volta aos anos 1990 e faz lembrar My Bloody Valentine e Sonic Youth. Fleur rouge abusa da beleza triste, com guitarras melódicas e passagens bem ruidosas, do meio para o fim.
No final, o Thistle. adere a um punk repleto de guitarras emparedadas e sensações turvas, em Holy hill, e faz a melhor fusão grungegaze do EP, com Wishing coin. Ouça.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Venn Records
Lançamento: 4 de julho de 2025.
- Ouvimos: Water From Your Eyes – It’s a beautiful place
- Ouvimos: Superchunk – Songs in the key of yikes
Crítica
Ouvimos: Camaelônica – “Eletrotropical”

RESENHA: Camaleônica mistura samba, rock, macumba e psicodelia em Eletrotropical, disco pesado e cheio de invocações.
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“Rock, macumba e samba”, trio de referências que embandeira o som do Camaleônica, pode querer dizer muita coisa – pode afirmar inclusive que a banda apenas revisita sons dos anos 1990 (Planet Hemp, Chico Science, O Rappa) e mais nada. Eletrotropical, primeiro disco de Felipe Dantas e Fernando Reis – os dois do grupo-dupla – faz qualquer ideia preconcebida cair por terra quando se percebe que a vocação do grupo é para um experimentalismo que faz tudo soar bem palpável e pesado no som deles.
A música de Felipe e Fernando soa mais como um retropicalismo pesado e turbinado, que une samba, umbanda e rock psicodélico na faixa-título, além de jazz, rock e afrosambas em Capoeira. Rola uma mescla de samba, reggae e grunge em Maravilhoso e Caprichoso. Nessa última, a percussão é forte e os tambores são tocados com raiva. E falando nisso, Língua e revolta é axé, MPB e ódio pulsando contra apagamentos históricos (“quem é você pra me dizer aqui / que eu não sou ninguém?”).
Muito de Eletrotropical são invocações – canções em que melodia, letra, percussão e indignação (e guitarras) unem-se quase numa mesma massa. No samba psicodélico e pesado de Boa noite, por exemplo, coaches, big techs e exploradores do trabalho alheio são cozidos no mesmo caldeirão a partir de raízes e histórias (“toda malandragem será perdoada/ tudo que delira, toda vadiagem”). Geral abre com vocal solitário pedindo “muita luz, saúde e axé pra geral”, e vai seguindo com tristeza herdada do blues, guitarras e percussões.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Fliperama Lab
Lançamento: 27 de junho de 2025.
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