Cultura Pop
Músicas do 11 de setembro: descubra agora

Em crítica musical, volta e meia aparece algum crítico espertinho usando o termo “11 de setembro” para definir aquele momento em que a carreira de determinado artista chegou na baixa total. Ou quando é algum momento de ruína em que, a partir daí, nada mais será a mesma coisa.
O período mais recente da carreira de Britney Spears, em que a cantora passa por uma montanha de problemas pessoais, pode ser considerado um 11 de setembro. A época em que dois dos Titãs foram presos com heroína e a vida útil do disco Televisão (1985) chegou ao fim, foi um belo 11 de setembro para a banda – retrocedido após o disco Cabeça dinossauro (1986). Já a famosa partida Brasil 1–7 Alemanha, na Copa de 2014, foi mais do que um 11 de setembro para a seleção brasileira. Aqui no Brasil, você pode substituir o “11 de setembro” por “7 a 1” que, para bom entendedor, dá quase no mesmo.
Já o 11 de setembro de verdade aconteceu em 2001, e representou o ataque às torres gêmeas do complexo empresarial do World Trade Center, em Nova York. A tragédia completa 20 anos em poucos dias e você vai ter chances de sobra para ler a respeito disso em vários jornais (assim esperamos). Por enquanto, vale dizer que ele afetou bastante o mundo da música: inspirou canções, impediu shows, fez com que artistas modificassem clipes que estavam prontos para serem lançados, etc. Pega aí alguns exemplos.
A ZICA DO EXPLOSIONS IN THE SKY. Uma das bandas mais afetadas com o 11 de setembro foi esse grupo de post-rock do Texas, de nome significativo. Uma semana antes do ataque, dia 4 de setembro, o grupo lançou seu segundo disco, que trazia um anjo iluminado por um avião na capa, e cujo título era (pode acreditar) Those who tell the truth shall die, those who tell the truth shall live forever (nada menos que “os que falam a verdade devem morrer, os que falam a verdade devem viver para sempre”).
Por causa disso, o grupo teve que dividir seu tempo entre trabalhar o álbum e gastar saliva explicando que não tinham nada a ver com os ataques (!), e que o conceito do disco já estava pronto há um tempão. Para piorar um pouco, em plena turnê, o baixista Michael James decidiu pegar um avião portando uma guitarra com o adesivo “este avião cairá amanhã”. Foi detido na hora.
O ROLÊ DOS STROKES. O primeiro disco dos Strokes, Is this it, clássico indiscutível daqueles tempos, já estava preparadíssimo para lançamento em 25 de setembro nos EUA quando a banda achou que deveria tirar New York City cops da edição americana. Os Strokes viram a ação dos policiais no 11 de setembro e acharam que não pegaria bem lançar uma canção que falava que os tiras da capital “não são muito espertos”. When it started saiu no lugar.
O IMPACTO NO INDIE ROCK. Além dos Strokes, outras bandas da época sentiram o drama do 11 de setembro. Só que o transformaram em música. O Arcade Fire, no disco Neon bible (2007), apareceu com Antichrist television blues. O … And You Will Know Us By The Trail Of Dead (aliás que nome!) fez em 2005 Words apart, que trazia a infame frase “como eles riem enquanto jogamos as cinzas das Torres Gêmeas” na letra. Em 2007, o Bloc Party lançou Hunting for witches, cuja letra falava sobre a reação da mídia aos ataques. “E sobre como a mídia usa o medo para controlar as pessoas”, disse o cantor Kele Orekeke.
A DEPRÊ DO BIBLECODESUNDAY. Uma das canções mais mortalmente tristes a respeito do 11 de setembro é The boys of Queens, da banda londrina BibleCodeSunday, que costuma ser definida como folk ou “rock celta”. A letra, narrada em primeira pessoa, conta os dramas de um soldado que vem de uma família irlandesa da região do Queens, e que perdeu praticamente todos os parentes do sexo masculino no ataque – justamente porque sua família é cheia de bombeiros.
A ZONA DO STAR FUCKING HIPPIES. Banda anarco-punk de Nova York – e considerada um supergrupo do punk por incluir integrantes de outras bandas notáveis – o Star Fucking Hippies decidiu mexer em vespeiro com 9/11 was (An inside joke), (“o onze de setembro era uma piada interna”), lançada no disco Until we’re dead (2008, selo Fat Wreck Chords), e que esspalhava brasa para o então prefeito de Nova York, Rudolph Giuliani, em versos como “Giuliani fez o conserto/auxiliado pela máfia/pela força aérea e pela CIA”.
A GRITARIA DOS PROTESTOS. Não foram só os Star Fucking Hippies que decidiram ir além do que a mídia noticiava e protestar (em alto e bom som) no onze de setembro. O Minstry (veja lá quem!) pregou que “senhores, os convocamos para informá-los de que vamos derrubar o governo dos Estados Unidos/vocês ainda acham que o combustível de aviação derrubou o World Trade Center?” em Lies lies lies, que chegou a ser indicada para o Grammy na categoria “melhor performance de metal”. O rapper americano-indiano Heems lançou em 2015, uns bons anos depois do atentado, Flag shopping, sobre o racismo intensificado pelo onze de setembro.
O TRAMPO DE BRUCE SPRINGSTEEN. Andando de carro na rua, depois dos ataques, Bruce Springsteen teve a surpresa de ver um cidadão no carro ao lado abaixar a janela do veículo e gritar para ele: “Precisamos de você agora!”. Nasceu assim The rising, disco lançado em 30 de julho de 2002, cujo tema era o 11 de setembro. O repertório tinha canções como My city of ruins, Lonesome day, Mary’s place, Waitin’ on a sunny day e misturava canções novas com outras feitas antes de 11 de setembro de 2001. Foi direto para o 1º lugar do paradão da Billboard.
A ENCRENCA DAS RÁDIOS. Boa parte das rádios americanas parou de transmitir música para, 24 horas por dia, dar informações sobre onde conseguir ajuda, depoimentos de vítimas e outros assuntos afins. O Clear Channel, que comandava várias rádios no país (e hoje atende pelo nome de iHeart Media) fez um index de canções a serem evitadas para não darem gatilhos. A lista ia de Highway to hell, do AC/DC, a Aeroplane, do Red Hot Chili Peppers.
A ENCRENCA DOS CLIPES. No dia 11 de setembro, a banda alemã Rammstein iria estrear um clipe novo, Ich will. Estaria tudo bem se… o clipe, que mostrava os integrantes do grupo assaltando um banco, não trouxesse imagens de um bandido metido a homem-bomba. O vídeo foi lançado mas a continuidade dele na telinha foi abortada por motivos óbvios. Outro vídeo que sofreu por causa dos ataques foi o de Stay together for the kids, do Blink-182. A banda e o diretor Samuel Bayer tinham colocado uma destruição de prédio no vídeo e regravaram cenas para que tudo não ficasse parecido demais com o ataque às torres.
CONFUSÃO NA MÚSICA CLÁSSICA. Sabia que há uma série de composições de autores eruditos modernos que se inspiraram nos ataques às torres gêmeas? O minimalista Steve Reich fez WTC 9/11, John Corigliano fez One sweet morning no aniversário de dez anos dos ataques, o compositor e maestro John Adams fez On the transmigration of souls. Já o americano Michael Gordon fez The sad park para o Kronos Quartet tocar, usando gravações de comentários de colegas de escola de seu filho gravadas num sampler.
SUCESSO INESPERADO. Depois da tragédia, a cantora americana Kristy Jackson lançou um single, Little did she know (She’d kissed a hero). A canção, que falava sobre a tragédia do ponto de vista de um ocupante do voo 93, sequestrado por terroristas, fez tanto sucesso nas rádios americanas que, anos depois, Kristy se animou a compilar num livro os mais de 5 mil e-mails que recebeu por conta da música. O livro tem o mesmo nome da canção, complementado pelo subtítulo: Histórias em primeira pessoa sobre o 11 de setembro, e a canção que inspirou todas elas. Segundo um site da cantora que está fora do ar (mas está no Archive.org), ela rejeitou um contrato com uma gravadora grande e preferiu continuar independente, e não cobrava quando apresentava a música em eventos.
TEVE MICHAEL NA PARADA. Michael Jackson, no mesmo ano em que lançou seu último disco, Invincible, foi convidado a fazer uma canção em benefício das famílias dos sobreviventes da tragédia. Acabou fazendo um recapeamento numa canção inédita e antiga, What more can I give, feita nos anos 1990, após uma reunião com o Presidente da África do Sul Nelson Mandela. A música foi quase “não-lançada”: rolou um clipe com um time de artistas, a canção ficou disponível para download, mas o single, perdido em meio a brigas de Michael com a Sony, não foi lançado. Detalhe: a capa do CD físico seria feita por Romero Britto.
CANCELADO!! Numa época em que a palavra servia só para indicar eventos que não aconteceriam, rolaram vários cancelamentos por causa do ataque. O broadcasting do Grammy Latino foi suspenso, o primeiro show pela internet de Sting (transmitido da Itália) foi resumido a uma só canção (sintomaticamente Fragile) e o Blink-182, que iria começar uma turnê pela Europa para divulgar o disco Take off your pants and jackets, desistiu do giro.
DISCOS DE ONZE DE SETEMBRO. Quem lançou disco nessa data, claro, corria o risco real de passar em branco. Detalhe que muita gente lançou disco nesse dia. Bob Dylan soltou Love and theft, Mariah Carey mandou para as lojas a trilha do filme Glitter – O brilho de uma estrela, Ben Folds soltou o (excelente) disco solo Rockin’ the suburbs e (pasmem) o Slayer desovou o significativo God hates us all. Já Silver side up, um dos maiores sucessos do Nickelback (o do hit How you remind me), saiu também nesse mesmo dia.
TAMBÉM SAÍRAM EM ONZE DE SETEMBRO. The blueprint, sexto disco de Jay-Z, saiu em em 11 de setembro de 2001 (por sinal revelando o trabalho de um produtor chamado Kanye West). The glow pt.2, da banda de indie folk The Microphones, também. Uncivilization, do Biohazard, idem. O prêmio “disco que muita gente não sabe nem que existe” vai para Tomcats screaming outside, único disco solo do líder do Tears For Fears, Roland Orzabal, cuja edição americana chegou às lojas dos EUA neste dia.
O 11 DE SETEMBRO DE WILLIAM BASINSKI. O compositor experimental americano William Basinski encontrou em agosto de 2001 várias fitas antigas que havia guardado, algumas delas se desfazendo completamente. Ficava ouvindo os K7s com amigos. Teve a ideia de gravar loops com as fitas se desintegrando, o que começou a fazer.
Até que em 11 de setembro, William viu da janela do seu apartamento a derrubada das torres gêmeas – justamente no dia em que ele teria que ir ao World Trade Center fazer uma entrevista de emprego (!). Ele levou o gravador com as fitas para o terraço, fez vídeos e fotos do ataque e, usando as fitas, fez a série de discos The disintegration loops, quatro álbuns lançados após 2002. As imagens que ele clicou foram parar nas capas dos álbuns. A foto lá de cima é da capa do primeiro disco da série.
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Cultura Pop
Urgente!: E não é que o Radiohead voltou mesmo?

Viralizações de Tik Tok são bem misteriosas e duvidosas. Diria, inclusive, que bem mais misteriosas do que as festas regadas a cocaína, prostitutas de Los Angeles e malas de dólares que embalavam os nada dourados tempos da payola (jabá) nos Estados Unidos. Mas o fato é que o Radiohead – que, você deve saber, acaba de anunciar a primeira turnê em sete anos – conseguiu há alguns dias seu primeiro sucesso no Billboard Hot 100 em mais de uma década por causa da plataforma de vídeos. Let down, faixa do mitológico disco Ok computer (1997), viralizou por lá, e chegou ao 91º lugar da parada
A canção, de uma tristeza abissal, já tinha “voltado” em 2022 ao aparecer no episódio final da primeira temporada da série The bear – mas como o Tik Tok é “a” plataforma hoje para um número bem grande de pessoas, esse foi o estouro definitivo. Como turnês de grandes proporções nunca são marcadas de uma hora pra outra, nada deve ter acontecido por acaso. E tá aí o grupo de Thom Yorke anunciando a nova tour, que até o momento só incluirá vinte shows em cinco cidades europeias (Madri, Bolonha, Londres, Copenhague e Berlim) em novembro e dezembro.
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O batera Phillip Selway reforçou que, por enquanto, são esses aí os shows marcados e pronto. “Mas quem sabe aonde tudo isso vai dar?”, diz o músico. Phillip revela também que a vontade de rever os fãs veio dos ensaios que a banda fez no ano passado – e que já haviam sido revelados em uma entrevista pelo baixista Colin Greenwood.
“Depois de uma pausa de sete anos, foi muito bom tocar as músicas novamente e nos reconectar com uma identidade musical que se arraigou profundamente em nós cinco. Também nos deu vontade de fazer alguns shows juntos, então esperamos que vocês possam comparecer a um dos próximos shows”, disse candidamente (esperamos é a palavra certa – a briga de faca pelos ingressos, que serão vendidos a partir do dia 12 para os fãs que se inscreverem no site radiohead.com entre sexta, dia 5, e domingo, dia 7, promete derramar litros de sangue).
Enfim, o que não falta por trás desse retorno aí são meandros, reentrâncias e cavidades. O Radiohead, por sua vez, investiu no lado “quando eu voltar não direi nada, mas haverá sinais”. Em 13 de março, dia do trigésimo aniversário do segundo disco da banda, The bends, o site Pitchfork noticiou que a banda havia montado uma empresa de responsabilidade limitada, chamada RHEUK25 LLP. – sinal de que provavelmente alguma novidade estava a caminho. Poucos dias depois, um leilão beneficente em Los Angeles sorteou quatro tíquetes para “um show do Radiohead a sua escolha”. Muita gente levou na brincadeira, mas algumas fontes confirmaram que o grupo tinha reservado datas em casa de shows da Europa.
Depois disso – você provavelmente viu – surgiram panfletos anunciando supostos shows do grupo em Londres, Copenhague, Berlim e Madri, ainda sem nada oficialmente confirmado, até que tudo virou “oficial”. Pouco antes disso, dia 13 de agosto, saiu um disco ao vivo do Radiohead, Hail to the thief – Live recordings 2003-2009 (resenhado pela gente aqui). Com isso, possivelmente, os fãs até esqueceram a antipatia que Thom Yorke causou em 2024, ao abandonar o palco na Austrália, quando foi perguntado por um fã sobre a guerra entre Israel e Palestina.
O site Stereogum não se fez de rogado e, quando a turnê ainda não estava oficialmente anunciada (mas havia sinais) chegou a perguntar num texto: “E aí, será que eles vão tocar Let down?”. No último show da banda, em 1º de agosto de 2018 (dado no Wells Fargo Center, Filadélfia), ela era a nona música, logo antes da hipnotizante Everything in its right place. Seja como for, já que bandas como Talking Heads e R.E.M. não parecem interessadas em retornos, a volta do Radiohead era o quentinho no coração que o mercado de shows, sempre interessado em turnês nostálgicas, andava precisando. Que vão ser vários showzaços e que muitas caixas de lenços serão usadas, ninguém duvida.
Texto: Ricardo Schott – Foto: Tom Sheehan/Divulgação
Cultura Pop
Urgente!: E agora sem o Ozzy?

Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre. Tudo começou com uma banda, o Black Sabbath, que já era um verdadeiro errado que deu certo – um ET musical que fazia som pesado quando mal havia o termo “heavy metal” e que falava de terror na ressaca do sonho hippie. E prosseguiu com a lenda de um sujeito que gravou álbuns clássicos como Blizzard of Ozz (1980), Diary of a madman (1981) e No more tears (1991) – eram quase como filmes.
Ozzy pode ser definido como um cara de sorte – e também como um cara que abusou MUITO da sorte, mas pula essa parte. A depender daqueles progressivos anos 1970, não havia muito o que explicasse o futuro de Ozzy Osbourne na música. Em várias entrevistas, Ozzy já disse que não sabia tocar nenhum instrumento quando começou – na verdade nunca nem chegou a aprender a tocar nada. Tinha a seu favor uma baita voz (mesmo não ganhando reconhecimento algum da crítica por isso, Ozzy sempre foi um grande cantor), um baita carisma, ouvido musical e a disposição para encarnar o estranho e o inesperado no palco em todos os shows que fazia.
Imortalizada em livros como a autobiografia Eu sou Ozzy, a história de Ozzy Osbourne é um daqueles momentos em que a realidade pode ser mais desafiadora que a ficção. Afinal, quem poderia imaginar que um garoto da classe trabalhadora britânica se tornaria o que se tornou? Talvez tenha sido até por causa das dificuldades, que também moveram vários futuros rockstars ingleses da época – ou pelo fato de que o rock e a música pop do fim dos anos 1960 ainda eram quase mato, universos a serem desbravados, com poucos parâmetros. Seja como for, se hoje há artistas de rock que se dedicam a discos e a projetos que parecem ter saído da cabeça de algum roteirista bastante criativo, Ozzy teve muita culpa nisso.
Fora as vezes que o vi no palco, estive frente a frente com Ozzy apenas uma vez, numa coletiva de imprensa do Black Sabbath – da qual Tony Iommi não participou, por estar se recuperando de uma cirurgia (havia tido um câncer). Seja lá o que Ozzy pensasse da vida ou de si próprio, me chamou a atenção o clima de quase aconchego da sala de entrevistas (acho que era no hotel Fasano): um lugar pequeno, com ele e Geezer Butler (baixista) bem próximos dos repórteres. Que por sinal não eram inúmeros.
Já havia feito entrevistas internacionais antes mas nunca imaginei estar tão perto de uma lenda do rock que eu ouvia desde os doze anos. Fiz uma pergunta, ele respondeu, e eu, que sempre fiquei nervoso em entrevistas (imagina numa coletiva com o Black Sabbath!) voltei pra casa como se tivesse ido cobrir um buraco que apareceu numa rua no Centro. Não que não tenha me dedicado à pauta, mas era o Ozzy e eu estava… numa tranquilidade inimaginável.
Ozzy também já me deu uma entrevista por e-mail, em 2008, em que reafirmou sua adoração por Max Cavalera, disse que não tinha ideia se a série The Osbournes havia levado seu nome a um novo público, e reclamou da MTV, “que virou uma versão adulta da Nickelodeon”. Também disse que nunca diria nunca a seus então ex-companheiros do Black Sabbath (“nos falamos por telefone e quando as agendas permitem, nos encontramos”).
Nesse papo, Ozzy só se irritou quando fiz uma pergunta que envolvia o Iron Maiden, que tinha passado recentemente pelo Brasil, ou estaria vindo – não lembro mais. “Bom, não sei te responder, pergunta pro Iron Maiden!”, disse, em letras garrafais (todas as respostas foram em caixa alta). Lembro que ri sozinho e fui bater a matéria.
Até hoje só acredito que isso tudo aí aconteceu (e não é nada perto do que uns colegas viveram com Ozzy e o Black Sabbath) porque vi as matérias impressas. Mas acho que antes de tudo, consegui humanizar na minha mente um cara que eu ouvia desde criança. Ozzy era de carne e osso, respondia perguntas, tinha lá seus momentos de irritação e, enfim, mesmo tendo o fim que todo mundo vai ter, viveu bem mais do que muita gente. E mudou vidas.
Texto: Ricardo Schott – Foto: Divulgação
Crítica
Ouvimos: Justin Bieber – “Swag”

RESENHA: Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.
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Justin Bieber opera hoje num universo de, vamos dizer assim, venda fácil e compreensão difícil. Ser um cantor branco de r&b significa basicamente que você vai ter que fazer shows, gravar discos e existir no show business, de modo geral, no limite da polêmica. Afinal, tanto r&b quanto rap são áreas de artistas negros, ligadas a um histórico que se estende ao soul, e a vivências pessoais – e o mundo mudou o suficiente para que o mercado quase entenda o peso de certas coisas.
Por quase entenda, leia-se que, na maioria dos casos, tudo pode ser resolvido por uns posts nas redes sociais e uma tour pelos lugares certos, com as pessoas corretas. Mas pra piorar um pouco, nos últimos tempos, Justin andava brotando mais no noticiário de fofoca do que nos cadernos de cultura. As notícias eram sobre cancelamentos de shows, brigas com a mulher Hailey, relacionamentos supostamente mais do que íntimos com o rapper P. Diddy e supostos abusos de substâncias.
E, bom, o que faz um astro como Justin Bieber numa hora dessas? Para calar a boca de uma renca de gente durante um bom tempo, ele simplesmente lança um disco novo do mais absoluto nada – e este disco é Swag, uma epopéia de quase uma hora, com 21 faixas. E antes de mais nada, Swag consegue colocar de vez Justin numa espécie de “espírito do tempo” pop no qual artistas como Taylor Swift, Rihanna, Beyoncé e Miley Cyrus já se encontram há um bom tempo.
Esse tal (hum) zeitgeist significa que tais artistas – seguindo uma linhagem que inclui de Beatles a Marvin Gaye – decidiram se libertar de amarras para fazerem o que bem entendem. Ou seja: discos de protesto, álbuns com design musical troncho, feats que os fãs vão estranhar, projetos com produtores pino-solto, singles com referências que o fã-clube vai ter que buscar no Google, lançamentos com fotos de divulgação distorcidas – ou capas no estilo meu-sobrinho-fez.
De modo geral, são artistas que podem se dar ao luxo de perder alguns fãs, em nome de verem seus álbuns se tornarem (vá lá) pretensos barômetros do nosso tempo, ou pelo menos crônicas pessoais-autoficcionais. Alguns exemplos: Brat, de Charli XCX, trouxe a zoeira da noite de volta. Hit me hard and soft, de Billie Eilish, foi importante na onda de música sáfica. GNX, de Kendick Lamar, explora misérias existenciais e brigas no showbusiness. Vai por aí. Fazer disco com “desencucação” virou, mais do que nunca, coisa de roqueiro – aposto que você se divertiu muito com Cartoon darkness, de Amyl and The Sniffers, e ficou assustado/assustada com as teorias geradas por Brat.
Se a essa altura do meu texto você já está prestes a desistir de ler, por eu ainda não ter dito se Swag vale seu tempo precioso, aqui vai: vale, e muito. Justin já vinha de uma tradição de álbuns ligadíssimos na atualidade – o melhor deles é Purpose, de 2015. Swag tem um subtexto de “libertação”, já que Bieber acaba de dar adeus a seu empresário de vários anos, Scooter Braun (um adeus que vai lhe custar mais de 30 milhões de dólares, por sinal). E traz o cantor investindo em climas lo-fi, sons texturizados, vibes derretidas e muita coisa que virou moda de uma hora para a outra.
O G1 disse que Swag é um disco chato. Eu discordo bastante, mas o The Guardian chegou perto da realidade ao dizer que as letras prejudicam o novo álbum – de fato, a poética de Swag tem a profundidade de um pires. Já musicalmente, a diversão é garantida até para quem nunca ouviu nada do cantor. Bieber e sua turma de produtores e parceiros transformam trap e sons lo-fi em pop adulto, em faixas muito bem feitas e bem acabadas, como All I can take, a estilingada Daisies, o bedroom pop Yukon e a viajante Go baby.
O design musical de Swag é minimalista, e boa parte das músicas têm aquele clima de desleixo estudado do indie pop atual. Things you do tem guitarras decalcadas do The Police e silêncios entre vozes e sons, Butterflies é uma gravação quase caseira que vai crescendo, e faixas como First place, Way it is, Sweet spot e Walking away unem synth pop, modernidades, sons derretidos e tentativas de emular Michael Jackson.
Já Dadz love, com o rapper Lil B, evoca Prince, com tecladeira dos anos 1980 e texturas de 2025. A vibe dos Rolling Stones, e das voltas do grupo britânico em torno do soul e do r&b, dáo as caras em Devotion e na vinheta Glory voice memo. Uma curiosidade é o trap da faixa-título, com participações de Cash Cobain e Eddie Benjamin, e um verso proscrito sobre cocaína (“seu corpo não precisa / de nenhuma linha prateada”) que aparentemente só o Spotify transcreveu.
Vale dizer que, tentando tomar de volta o controle da própria narrativa, Justin derrapa feíssimo ao decidir colocar em Swag três diálogos com o comediante negro norte-americano Druski. Num deles, o humorista diz a ele que “sua pele é branca, mas sua alma é negra, Justin” (o cantor só responde um “obrigado” desajeitado) – em outro, o assunto inclui paparazzi e redes sociais. No final, quem ouve o disco inteiro é “premiado” com a estranhíssima presença do cantor gospel Mavin Winans ocupando sozinho a última música – o cântico religioso Forgiveness.
Enfim, é Bieber buscando legitimidade para o autoperdão e para a própria carreira de cantor branco de r&b – e mandando recados de maneira tão desajeitada que Swag, um excelente disco, quase rola escada abaixo. Swag não resolve todas as questões em torno de Justin Bieber – mas quando acerta, lembra que, às vezes, é melhor fazer do que explicar.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Def Jam
Lançamento: 11 de julho de 2025
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