Crítica
Ouvimos: Queens Of The Stone Age, “In times New Roman…”

- In times New Roman é o oitavo disco da banda norte-americana Queens Of The Stone Age e o terceiro pela Matador Records. É o primeiro disco após o divórcio tumultuado do cantor Josh Homme, e das acusações de abuso (que deram em enorme batalha judicial).
- Entrevistando o vocalista Josh Homme, o New Musical Express contabilizou que ele teve onze mortes de pessoas próximas nos últimos sete anos – incluindo um ex-companheiro de QOTSA, Mark Lanegan. As dores não fizeram Homme querer fazer um disco imediatamente, ele contou. “Se o seu telhado está inundando, você não diz: ‘Deveríamos fazer um registro sobre isso!’ Você tem que parar de se afogar em uma enchente”, disse.
- Homme define o disco como “um álbum sobre aceitação”, e conta que o título vem daquelas velhas imagens que as pessoas fazem, comparando a queda de velhos mitos (ou hábitos, ou vícios de pensamento) com a queda do império romano. “Não há problema em reconhecer que Roma está queimando e o Titanic está afundando. Ao lidar com o conceito de aceitação, você deve reconhecer a realidade”, diz.
- Formação do QOTSA hoje: Josh Homme (voz, guitarra), Troy Van Leeuwen (guitarra, lap steel, teclado, backing vocals), Michael Shuman (baixo, teclado, backing vocals), Dean Fertita (teclados, guitarra, percussão, backing vocals) e Jon Theodore (bateria, percussão)
Desde Era vulgaris (2007), o Queens 0f The Stone Age não lançava um disco que poderia ser classificado como “bom” de verdade. Na real, o grupo liderado por Josh Homme sempre contou com a implicância de muita gente, que via na banda um fruto típico da era do CD, com discos repletos de faixas puláveis. Além de um marketing pautado por shows bacanas, clima de confraternização de malucos não-beleza e perigo à vista, mas não muito além disso. Tudo injustiça com um grupo que já fez os excelentes Rated R (2000) e Lullabies to paralyze (2005).
Os revezes fizeram com que o novo disco, In times New Roman, acabasse adicionando mais histórias na pauta. Abusando da encucação e da interpretação, dá pra atravessar os quase 48 minutos buscando relações das letras com os fatos recentes da vida do cantor. Incluídos aí seu divórcio de Brody Dalle (tema de Papier machine), o comportamento violento que culminou na agressão de uma fotógrafa no palco (Emotion sickness não fala diretamente disso mas o possível subtexto tá aí) e papos que indicam que, seja lá o que houve nas internas, Homme buscou aconselhamento (o verso “eu não notei o peso das correntes até elas serem cortadas de mim/como eu as arrastei por tanto tempo?” em Made to parade). Entrevistas recentes sobre diagnóstico de câncer, mortes de amigos e problemas íntimos deram ao disco um ar de storytelling de redenção pessoal – algo que sempre encontra público, sendo legítimo ou não (vale apontar).
O disco é bom, sim, como o grupo não fazia há alguns anos. Musicalmente, voltou o charme que fazia com que o QOTSA tivesse algum parentesco com ninguém menos que Iggy Pop (com quem por sinal Josh Homme colaborou). Isso culminou numa mescla que inclui palhetadas simples e certeiras (Paper machete, Obscenery e quase todo o disco), algum experimentalismo (o arranjo criativo de Time & place, construída sobre um riff de três notas que funciona como um relógio) e uma certa vontade de soar meio parecido com David Bowie nos anos 1980 (Carnavoyeur, a melhor do disco).
Se o Queens um dia já pôde ser definido como o encontro de duas bandas originalmente durangas e futuramente muito bem sucedidas de Birmingham (Black Sabbath e Duran Duran), a boa fase voltou. Tudo encerrado com um blues-rock amargo de nove minutos, Straight jacket flitting, que já convida o ouvinte logo no início, e cuja letra parece unir em imagens tudo o que Homme viveu nos últimos anos. Na visão dele.
Gravadora: Matador
Nota: 9
Crítica
Ouvimos: Danny Brown – “Stardust”

RESENHA: Stardust marca Danny Brown sóbrio, mergulhando no hyperpop para criar paisagens sonoras intensas, misturando rap outsider, pós-punk e experimentação.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 9
Gravadora: Warp
Lançamento: 7 de novembro de 2025
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Com uma carreira discográfica que surgiu nos anos 2000 (sua primeira mixtape, Hot soup, é de 2008), o rapper norte-americano Danny Brown geralmente é elogiado por sua disposição em inovar – que muitas vezes o coloca numa trincheira mais psicodélica e alternativa do rap, habitada também por Earl Sweatshirt e Tyler The Creator, e que igualmente já teve Kanye West como expoente.
Danny tem um álbum chamado Atrocity exhibition (o terceiro, de 2016), mesmo nome de uma música do Joy Division – e não por acaso, volta e meia detalhes do pós-punk emergem de seu som. Outro detalhe é que muitas vezes seus raps focam mais no lado outsider, da vida no desvio, do que propriamente em gangues, brigas ou pura ostentação. Distopias e papos de ficção científica também volta e meia aparecem nas letras dele – sempre com uma trilha sonora no mesmo clima.
E daí que Stardust, primeiro disco que Danny faz totalmente sóbrio – ele passou por um rehab em 2023 – traz o rapper cada vez mais comprometido com a construção de paisagens musicais, todas filtradas pela variedade do hyperpop. Ao lado dele, artistas de procedência bem curiosa, como o grupo experimental pop Frost Children, o criador de dubstep Underscores, o rapper-folktrônico Quadreca e gente inseparável do estilo hyperpop, como Jane Remover.
- Ouvimos: Tyler The Creator – Don’t tap the glass
- Ouvimos: Earl Sweatshirt – Live laugh love
- Ouvimos: Chiedu Oraka – Undeniable (EP)
Stardust quase sempre é tão dançante quanto Brat, de Charli XCX, mas é mais alternativo ainda, construindo pontes com gospel e soft rock (Book of Daniel, que parece construída em cima de uma música do 14 Bis ou do Roupa Nova), emo (Green light), house music (Flowers, um manifesto sobre o quanto ele se sente marginalizado pelo mercado fonográfico) e algo que parece ter sido construído em cima de um sample antigo de dance music, só que aceleradíssimo (Baby, responsável pelo lado mais romântico e sacaninha do disco).
O hyperpop geralmente é formado por referências quase cara de pau à música do passado – que muitas vezes soam distorcidas e encaixadas à força – e por climas “derretidos” em vocais (com autotune) e teclados. Um daqueles sons que só poderiam ter saído da mente de gente que passa o dia pensando em produções e mixagens. Danny começou a ficar mais próximo do estilo há algum tempo, e em Stardust, o hyperpop e seu primo digicore transformam músicas como Copycats, Whatever, Whatever the case e Starburst em experiências sonoras – com riffs de videogame, batidas quebradiças que lembram mais o pós-hardcore e sons de fita rodando rápido ao contrário como “melodia” para os beats. 1L0v3myL1f3! é quase um electrohardcore rap, com sons que desmancham no ouvido e vibe metálica.
As lembranças das experiências amargas ainda estão muito frescas – surgem em várias letras de Stardust e encerram o disco com a épica e intensa The end (de oito minutos) e All4U, cuja letra é um misto de declaração de amor ao rap e história de redenção após abusos e perdas. No geral, Stardust consegue soar curioso e interessante mesmo nos momentos em que você ouve e tem vontade de falar “oi?”.
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Crítica
Ouvimos: Vanna Blue – “JoyCry” (EP)

RESENHA: JoyCry, EP de Vanna Blue, mistura dream pop e pós-punk em faixas hipnóticas que alternam luz e sombra, com texturas cintilantes e certa agressividade.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Noon Records
Lançamento: 13 de novembro de 2025
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Com composição de repertório iniciada em 2019 – e com as trevas da pandemia, que rolou em 2020, ajudando a balizar músicas e letras – JoyCry, o EP de estreia da norte-americana Vanna Blue surge marcado pelo encontro entre dream pop e pós-punk. Mas surge também como o resultado do encontro entre alegrias e tristezas diárias, entre memórias ruins e boas, entre realidade e imaginação. Esse clima é absorvido por algumas faixas, como o pop vaporoso de Back and forth, que lembra o começo da fase eletrônica do Tame Impala – lembra também Angra dos Reis, sucesso da Legião Urbana.
- Ouvimos: Evvvie – How to swallow a lie (EP)
Tudo que surge no disco é filtrado por um clima meio hipnótico, até meio típico do dream pop, mas com uma certa agressividade que vem lá do fundo, como na mescla de The Cure e Cranberries de Pheromones (com guitarra bonita e melódica e vocal cheio de texturas) e FMHU, ou em Black and blue, cujos teclados e guitarras têm vibe mágica. Tides é dream pop com batida meio funkeada, numa estrutura musical que parece voar.
O disco tem também um momento ruidoso em Closer, faixa na qual algo meio sombrio vai surgindo aos poucos. Mas o principal de Vanna Blue e JoyCry é valorizar a cintilação sonora, em todas as faixas.
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Crítica
Ouvimos: Pipa – “Funk é matemática”

RESENHA: Funk é matemática vê Pipa explorar o funk à distância, misturando ambient, beats experimentais e viagens eletrônicas em movimentos cheios de atmosfera.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Independente
Lançamento: 1 de dezembro de 2025.
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Produtor e compositor, Pipa lançou seu disco Funk é matemática com a ideia de fazer uma declaração de amor ao estilo musical. “Ele é surpreendentemente complexo e desafiador de criar”, afirmou num texto publicado em seu Xwitter, afirmando também que logo percebeu o enorme espaço que teria para criar coisas novas, sem se prender a padrões.
- Ouvimos: MC Taya – Histeria agressiva 100% neurótica vol. 2 – Muito mais neurótico (EP)
O resultado é que Funk é matemática é basicamente um disco de ambient – um álbum que propõe uma visão à distância do funk, do que pode caber nele, do que existe entre uma batida e outra. Dividido quase todo em “movimentos”, ele insere climas voadores e viajantes como respiro para os beats (Primeiro movimento, Segundo movimento), cria representações gráficas em que beats, samples de voz e vibes lembrando o Azymuth chegam na frente (Terceiro movimento) e une batidões a climas misteriosos que lembram ArtHur Verocai e Toninho Horta (Quarto movimento).
O disco encerra com a viagem quase post-funk da faixa-título, que vai ganhando beats e clima de celebração tribal-tecnológica. Até lá, surgem momentos de beat forte e experimentação eletrônica (Quinto movimento), gravações de rua e vibes meditativas (Sexto movimento) e um jungle-funk leve (Sétimo movimento).
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