Crítica
Ouvimos: Snoop Dogg – “Iz it a crime?”

RESENHA: Snoop Dogg lança Iz it a crime?, disco reflexivo e polêmico, em meio a elogios a Trump, bravatas e críticas à cobrança por coerência.
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“Não tenho nada além de amor e respeito por Donald Trump”, disse (pode acreditar) Snoop Dogg recentemente numa entrevista. O elogio ao presidente norte-americano veio pouco depois do rapper se envolver numa baita polêmica ao fazer um set de 30 minutos como DJ durante a posse do chefe de estado.
A aparição de Snoop por lá fez com que o rapper perdesse mais de 500 mil seguidores nas redes sociais e tivesse que ouvir xingamentos como “traidor!”, etc – coisas do tipo. Snoop Dogg, vale lembrar, é um excelente vendedor e é o tipo do artista que, sem lançar disco, consegue gerar assunto para a mídia – e não necessariamente a aptidão para vender está associada com as melhores decisões políticas. Nem mesmo o talento artístico está. No Brasil, talvez quem sabe, ele estivesse vendendo jogo do tigrinho.
Daí que provavelmente o próprio Snoop deve se espantar com cobranças de “coerência”, “justiça”, etc, num jogo que em várias músicas de seu repertório, ele ja define como sendo absolutamente injusto – e que seja lá o que for feito, o que importa é estar o mais longe possível do fracasso. Mais do que o apoio a Trump, o espantoso é que muita gente nunca tenha percebido isso.
Iz it a crime?, um disco muito mais coeso e interessante que o anterior Missionary (que a gente já resenhou por aqui), e que sai lado a lado com um filme (veja lá embaixo), mergulha nessa vibe com ainda mais intensidade. É Snoop Dogg vestindo a pele do tiozão rapper gente boa — aquele que aconselha os mais novos, troca ideias com os parceiros e relembra os velhos tempos. Faixas como Unsung heroes, com seu clima psicodélico e afrolatino (graças ao sample de órgão e à percussão envolvente), reforçam essa pegada, asseverando que sobrevivência é mais importante que qualquer outra coisa.
Versos dessa faixa, como “nunca deixe a treta do rap afetar seus negócios”, “a vida é um jogo de espadas, é melhor ficar com um trunfo / você não está acostumado com a cozinha do inferno, cai fora”, parecem dedicados a quem o julgou por tocar na posse de Trump. A vinheta de abertura, Intro, é direta: “primeiro você ganha dinheiro, aí você ganha o poder, aí você ganha respeito”.
Entre temas espinhosos e lembranças do passado, Snoop e sua turma vão do r&b moderninho ao samples de soul antigo. E constroem um disco que, musicalmente falando, tem bastante chão. É o que rola em faixas como a quase balada Joy, o soul voador Sophisticated crippin’ (“só um arrependimento / eu nunca consegui dizer adeus ao 2pac”), a trilha de suspense de Keep it moving, o clima de Bonnie e Clyde da biqueira de Can’t get enough (dueto com Jane Handcock) e o acid bass de Shutyobitchassup. Já Let me love you, lá pro final, é um r&b nostálgico de respeito.
A tradicional sensação de que um disco de 60 min poderia ter uns 40 – comum a vários álbuns de Snoop – bate ponto no som de boy band Spot, com Pharell Williams, repleto de versos bizarros comparando mulheres e cachorros. E também num estranho indie pop, Cold summer, e em Live life, tão autobiográfica e cheia de positividade e conselhos, que chega a lembrar Will Smith.
Snoop não parece lá muito preocupado com a opinião de ninguém, e perguntar “isso é um crime?” parece a melhor maneira de sair pela tangente na polêmica de Trump. Mas a dualidade crime-arte – por sinal vivida igualmente hoje em dia no Brasil – é bem embalada musicalmente.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Death Row / Gemma
Lançamento: 15 de maio de 2025.
Crítica
Ouvimos: Why Bother? – “Case studies”

RESENHA: Em Case studies, o Why Bother? mistura punk, garage e psicodelia suja em faixas que soam como pesadelos gravados numa garagem assombrada.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Feel It Records
Lançamento: 3 de outubro de 2025
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Quarteto de Mason City, Iowa, o Why Bother? não faz jus ao nome: ouvir o som deles lá pela madrugada pode cortar o sono de qualquer ser humano. Isso porque basicamente Terry (voz, synth, mellotron), Speck (guitarra, vocais), Pamela (baixo) e Paul (bateria) fazem punk e garage rock de terror, com inspirações mais do que evidentes em The Damned, Ramones e na primeiríssima fase de Alice Cooper – o disco de estreia de Alice, Pretties for you (1969), é bastante citado ao longo da audição desse Case studies, novo álbum do grupo.
- Ouvimos: Intercourse – How I fell in love with the void
Se o papo é meter medo, o Why Bother? vai em frente: o disco novo, segundo a própria banda, foi inspirado em experiências fora do corpo e projeção astral. “Você encontrará essas pistas inseridas nas gravações? Talvez…”, confundem os quatro. Seja como for, o grupo se comporta como uma banda de garagem dos anos 1960 que teve seu som enfiado numa garrafa e jogado no mar, logo na faixa de abertura, Helen’s father (Has no heart) e na vira-lata There she was.
Na sequência, eles invadem a área do punk setentista + garage rock em In between the distance, I take back e na parede de ecos e ruídos de Destruction by design. Já Feeding the birds parece gravada perto de uma ribanceira, com direito a ruídos aterradores de pássaros no final. O Why Bother? também cai dentro da psicodelia suja, entre Alice Cooper e Pink Floyd, na tribal e hipnótica Still remain/Back in sleep paralysis, que tem seis minutos. E faz praticamente só barulho em The past makes me sasd / Behold! The great war of 12 realms.
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Crítica
Ouvimos: Sunn O))) – “Eternity’s pillars b/w Raise the chalice & Reverential” (EP)

RESENHA: O Sunn O))) estreia na Sub Pop com o EP Eternity’s pillars b/w Raise the chalice & Reverential, três faixas longas e cerimoniais de drone e noise-rock espiritualizado.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Sub Pop
Lançamento: 14 de outubro de 2025
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Poderia ser só um single, mas o Sunn O))), trevoso como ele só, decidiu iniciar sua estadia na Sub Pop com um EP de três longas faixas. O grupo-dupla de Seattle, que faz som barulhento por vocação (metal, drone e noise-rock são nomeclaturas comuns quando se fala de seu som), abre Eternity’s pillars b/w Raise the chalice & Reverential com uma sinfonia de distorções e microfonias, orquestrada quase como se fossem vários violoncelos, na tal faixa Eternity’s pillars, de quase 14 minutos e poucas notas, ocupando todo o lado A. Ainda no “poderia”: poderia ser até um tema regido por um maestro e executado numa sala de concerto sombria, mas é noise-rock cerimonial e esfumaçado.
- Ouvimos: Snooper – Worldwide
Tem um lado jazz e espiritualista na primeira faixa do EP: Eternity’s pillar era o nome de um programa apresentado pela guru jazzística Alice Coltrane nos anos 1980, e que falava sobre viagens astrais, vida fora da matéria e outros assuntos afins – e o Sunn O))) conta que usou o nome (no plural) por causa da abordagem transcendental de Alice na música. Pouca coisa mais curtinhas (7 e 8 minutos, respectivamente), Raise the chalice e Reverential vão na mesma; homenageiam, respectivamente, o falecido vocalista de hardcore Ron Guardipee e “aqueles que vieram antes de nós com os fardos mais pesados”. Basicamente é a mesma sinfonia distorcida, com poucas variações, especial para quem gosta de ruído mântrico.
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Crítica
Ouvimos: Guitar – “We’re headed of the lake”

RESENHA: Segundo álbum do Guitar mistura slacker rock e grunge com ruído, lirismo caótico e ecos de Pavement, Sonic Youth e Guided by Voices.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Julia’s War
Lançamento: 10 de outubro de 2025
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Um tempo atrás entrevistamos o cantor e apresentador China, e ele contou que mudou de nome artístico para Chinaina porque, ao buscar suas próprias músicas nas plataformas digitais, esbarrava em montes de xarás. Agora imagine o que sobra para uma banda chamada… Guitar. Mas vá lá, abusando da sorte em tempos de duelo entre buscadores e IA, esse grupo norte-americano liderado por um multi-instrumentista chamado Saia Kuli pode acabar fazendo com o slacker rock algo próximo do que várias bandas andaram fazendo recentemente com o shoegaze.
We’re headed for the lake, segundo álbum do Guitar – e primeiro pelo selo Julia’s War – basicamente opera naquele encontro entre o slacker e o grunge, que fez com que o Pavement acabasse se tornando uma influência enorme do Nirvana no álbum In utero (1993). É rock com mumunhas folk e guitarrísticas, com faixas que provavelmente surgiram no violão como quaisquer outras, mas que ganham ruídos, efeitos, partes 1, 2 e 3, e vibe intensa.
- Ouvimos: Rocket – R is for rocket
Na abertura, A+ for the rotting team até tem uma bateria que só menciona o ritmo no começo – mas ganha peso na sequência. E descortina uma série de punk-rocks maníacos (Every day without fail, A toast to Tovarich), além de sons que aludem tanto a Pavement quanto a Sonic Youth e Beat Happening (Office clots, o falso folk de Pinwheel, a balada fake de Chance to win) e até coisas que lembram um emo selvagem, ou um power pop envolto em sombras. Este é o caso dos segmentos diferentes de Cornerland, das bases circulares de The chicks just showed up, e do noise rock de Pizza for everyone – ali, como em todo o álbum, tem muito também de Guides By Voices e até de Velvet Undeground.
As letras do Guitar, vale afirmar, são o tipo de poesia que você vai ficar lendo milhares de vezes tentando achar algum sentido – e cativam justamente por terem esse fluxo meio maluco de consciência. Vá lá que alguns títulos de músicas (como Office clots, “coágulos de escritório”) pedem algo mais sangrento, ou mais direto, e isso pode causar algumas decepções no decorrer do álbum. Parece em alguns momentos que Saia está contando uma história com começo, meio e fim que passa por todas as letras. E que consiste basicamente de ordens militares, ou de situações nas quais um ser humano desesperado tenta achar algum sentido. Loucura (quase) lúcida.
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