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Cinema

“O segundo rosto”: o filme perturbador de Rock Hudson

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"O segundo rosto": o filme perturbador de Rock Hudson

Seconds, filme de 1966 com Rock Hudson no papel principal, e que no Brasil passou como O segundo rosto, relaciona-se com a história do rock de maneira BEM bizarra. Enquanto preparava o abortado Smile, dos Beach Boys, Brian Wilson foi ao cinema assistir ao filme. Chegou atrasado à sessão de cinema, ouviu um “entre, Sr. Wilson” (que era um diálogo com o personagem de Hudson, Tony Wilson, no filme) e achou que alguém na tela grande estava tentando se comunicar com ele.

"O segundo rosto": o filme perturbador de Rock Hudson

Pior ainda: Brian Wilson – que relatou o caso num papo com a revista psicodélica Cheetah – passou a desenvolver problemas sérios por causa do filme. Começou a achar que o roteiro (baseado no livro Seconds, de David Ely) era inspirado na sua vida, que o produtor Phil Spector estava por trás do filme e que tudo tinha sido armado para trolar Wilson… Por fim, Brian decidiu abortar Smile (sim, uma coisa estava ligada a outra) e ficou sem ir ao cinema até 1982 (!), quando foi ver ET, o Extra-terrestre.

"O segundo rosto": o filme perturbador de Rock Hudson

Por acaso, sim dá para ver alguma semelhança entre a imagem de Hudson no filme e… os olhos de botão de David Bowie no clipe de Lazarus (nem Bowie nem o diretor Bo Johan Renck já falaram sobre uma possível influência de O segundo rosto no clipe).

Dirigido por John Frankeinheimer, O segundo rosto era um ET na carreira de Hudson, repleta até aquele momento de comédias românticas. Era um thriller de ficção científica com toques de psicodelia, sobre um cara de meia idade, Arthur Hamilton (John Randolph) cujo casamento começa a desmoronar. Ele é abordado por uma sociedade secreta que lhe propõe uma mudança de personalidade. Hamilton passa por uma cirurgia plástica e ressurge como Tony Wilson (Hudson), a identidade de um sujeito que morreu recentemente. Como não existe almoço grátis, Hamilton/Wilson deve obedecer a algumas regras, e é entregue a uma comunidade de pessoas “renascidas”.

O segundo rosto não surgiu na vida de Rock Hudson só por decisões artísticas. O ator mantinha uma relação pessoal e empresarial havia anos com o manager Henry Wilson, proativo em conseguir muito dinheiro para seu contratado, mas incapaz de tirá-lo do cercado dos filmes românticos. Decidiu mandar Henry passear, tomar ele mesmo as rédeas de sua carreira e buscar um papel mais desafiador.

Inicialmente, O segundo rosto quase ganhou Kirk Douglas no papel principal. Quando Frankeinheimer summiu a direção, já pensou em Laurence Olivier para fazer o papel principal. A Paramount não contou moedinhas e exigiu o famosíssimo Hudson como Tony Wilson.

Rock (que, como todo mundo hoje sabe, vivia altos dilemas pessoais por não poder assumir sua homossexualidade) acabou fazendo o personagem mais complexo de sua carreira. A elaboração do personagem também foi complexa: numa das cenas, na qual estava amarrado por tiras de couro a uma cama, chegou a arrancar uma das tiras com o braço, enquanto seu personagem se debatia.

Uma sequência célebre envolveu Hudson e a atriz Salome Jens, num festival de vinhos em que todos os personagens estavam pelados e mergulhados na bebida. Boa parte dessas cenas foram cortadas na edição final (porque, hum, poderiam chocar fãs mais sensíveis e românticas do galã Hudson) e havia não-atores no meio da turma. O que se comenta é que em dada altura Hudson encheu a cara de vinho de verdade, começou a chorar e não conseguiu mais filmar nada.

Jason Wood, diretor de um complexo teatral em Manchester que exibiu O segundo rosto faz um tempinho, disse certa vez que acha que o filme é uma metáfora para a própria vida pessoal de Rock Hudson, já que ele mantinha sua sexualidade em segredo. “Ele tinha aquela sensação de ser estranho para si mesmo e desconfortável em sua própria pele”, contou ele, enfatizando que se tratava de um filme extremamente sombrio para quem estava acostumado com o ator. “O filme apresenta uma visão muito pessimista da vida e da sociedade, e isso deve ter sido muito desagradável no lançamento. Também sinto que aqueles que admiravam Rock Hudson por suas comédias podem ter ficado chocados”.

O segundo rosto marcou bastante a carreira de Hudson – que depois disso, voltaria a virar ator de filmes românticos e comédias, e até faria um faroeste ao lado de John Wayne, Jamais foram vencidos (1969). Também se dedicaria a fazer séries. Morreu em 1985, por complicações do vírus HIV. Tido como seu melhor desempenho, O segundo rosto já esteve inteiro no YouTube e depois sumiu. Hoje, dá pra ver apenas algumas sequências. Se você não se incomodar de ver tudo picado antes de baixar o filme todo por aí (ou tentar achar o DVD), pega aí o começo e o fim do longa (com a tal em que Hudson arranca a tal tira de couro do braço). Começo e fim, por sinal, bastante perturbadores.

https://www.youtube.com/watch?v=ou-W7cyievU

Por sinal, tá pra sair cinebiografia de Rock Hudson. Leia aqui.

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Urgente!: Cinema pop – “Onda nova” de volta, Milton na telona

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Urgente!: Cinema pop – "Onda nova" de volta, Milton na telona

Por muito tempo, Onda nova (1983), filme dirigido por Ícaro Martins e José Antonio Garcia – e censurado pelo governo militar –, foi jogado no balaio das pornochanchadas e produções de sacanagem.

Fácil entender o motivo: recheado de cenas de sexo e nudez, o longa funciona como uma espécie de Malhação Múltipla Escolha subversivo, acompanhando o dia a dia de uma turma jovem e nada comportada – o Gayvotas Futebol Clube, time de futebol formado só por garotas, e que promovia eventos bem avançadinhos, como o jogo entre mulheres e homens vestidos de mulher. Por acaso, Onda nova foi financiado por uma produtora da Boca do Lixo (meca da pornochanchada paulistana) e acabou atropelado pela nova onda (sem trocadilho) de filmes extremamente explícitos.

O elenco é um espetáculo à parte. Além de Carla Camuratti, Tânia Alves, Vera Zimmermann e Regina Casé, aparecem figuras como Osmar Santos, Casagrande e até Caetano Veloso – que protagoniza uma cena soft porn tão bizarra quanto hilária. Durante anos, o filme sobreviveu em sessões televisivas da madrugada, mas agora ressurge restaurado e remasterizado em 4K, estreando pela primeira vez no circuito comercial brasileiro nesta quinta-feira (27).

Meu conselho? Esqueça tudo o que você já ouviu sobre Onda nova (ou qualquer lembrança de sessões anteriores). Entre de cabeça nessa comédia pop carregada de referências roqueiras da época, um cruzamento entre provocação punk e ressaca hippie. O filme abre com Carla Camuratti e Vera Zimmermann empunhando sprays de tinta para pixar os créditos, mostra Tânia Alves cantando na noite com visual sadomasoquista, segue com momentos dignos de um musical glam – cortesia da cantora Cida Moreyra, que brilha em várias cenas – e trata com surpreendente modernidade temas como maconha, cultura queer, relacionamentos sáficos, mulheres no poder, amores fluidos e, claro, futebol feminino.

Se fosse um disco, Onda nova seria daqueles para ouvir no volume máximo, prestando atenção em cada detalhe e referência. A trilha sonora passeia entre o boogie oitentista e o synthpop, com faixas de Michael Jackson e Rita Lee brotando em alguns momentos. E o que já era provocação nos anos 1980 agora ressurge como registro de uma juventude que chutava o balde sem medo. Vá assistir correndo.

*****

Milton Bituca Nascimento, de Flavia Moraes, que estreou na última semana, segue outro caminho: o da reverência, mesmo que seja um filme documental. Durante dois anos, Flavia seguiu Milton de perto e produziu um retrato que, mais do que um relato biográfico, é uma celebração. E uma hagiografia, aquela coisa das produções que parecem falar de santos encarnados.

A narração de Fernanda Montenegro dá um tom solene – e, enfim, logo no começo, fica a impressão de um enorme comercial narrado por ela, como os daquele famoso banco que não patrocina o Pop Fantasma. Aos poucos, vemos cenas da última turnê, reações de fãs, amigos contando histórias. Marcio Borges lê matérias do New York Times sobre Milton, para ele. Wagner Tiso chora. Quincy Jones sorri ao falar dele. Mano Brown solta uma pérola: Milton o ensinou a escutar. E Chico Buarque assiste ao famigerado momento do programa Chico & Caetano em que se emociona ao vê-lo cantar O que será – um vídeo que virou meme recentemente.

Isso tudo é bastante emocionante, assim como as cenas em que a letra da canção Morro velho é recitada por Djavan, Criolo e Mano Brown – reforçando a carga revolucionária da música, que usava a imagem das antigas fazendas mineiras para falar de racismo e capitalismo. Mas, no fim, o que fica de Milton Bituca Nascimento é a certeza de que Milton precisava ser menos mitificado e mais contado em detalhes. Vale ver, e a música dele é mito por si só, mas a sensação é a de que faltou algo.

Por acaso, recentemente, Luiz Melodia – No coração do Brasil, de Alessandra Dorgan, investiu fundo em imagens raras do cantor, em que a história é contada através da música, sem nenhum detalhe do tipo “quem produziu o disco tal”. Mas o homem Luiz Melodia está ali, exposto em entrevistas, músicas, escolhas pessoais e atitudes no palco e fora dele. Quem não viu, veja correndo –  caso ainda esteja em cartaz.

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Urgente!: Filme “Máquina do tempo” leva a música de Bowie e Dylan para a Segunda Guerra

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Urgente!: Filme "Máquina do tempo" leva a música de Bowie e Dylan para a Segunda Guerra

Descobertas de antigos rolos de filme, assim como cartas nunca enviadas e jamais lidas, costumam render bons filmes e livros — ou, pelo menos, são um ótimo ponto de partida. É essa premissa que guia Máquina do tempo (Lola, no título original), estreia do irlandês Andrew Legge na direção. A ficção científica, ambientada em 1941, acompanha as irmãs órfãs Martha (Stefanie Martini) e Thomasina (Emma Appleton), e chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (13), dois anos após sua realização.

As duas criam uma máquina do tempo — a Lola do título original, batizada em homenagem à mãe — capaz de interceptar imagens do futuro. O material que elas conseguem captar é todo registrado em 16mm por uma câmera Bolex, dando origem aos tais rolos de filme.

E, bom, rolo mesmo (no sentido mais problemático da palavra) começa quando o exército britânico, em plena Segunda Guerra Mundial, descobre a invenção e passa a usá-la contra as tropas alemãs. A princípio, a estratégia funciona, mas logo começa a sair do controle. As manipulações temporais geram consequências inesperadas, enquanto as personalidades das irmãs vão se revelando e causando conflitos.

Com apenas 80 minutos de duração e filmado em 16 mm (com lentes originais dos anos 1930!), Máquina do tempo pode soar confuso em algumas passagens. Não apenas pelas idas e vindas temporais, mas também pelo visual em preto e branco, valorizando sombras e vozes que quase se tornam personagens da história. Em alguns momentos, é um filme que exige atenção.

O longa também tem apelo para quem gosta de cruzar cultura pop com história. Martha e Thomasina ficam fascinadas ao ver David Bowie cantando Space oddity (o clipe brota na máquina delas), tornam-se fãs de Bob Dylan, adiantam a subcultura mod em alguns anos (visualmente, inclusive) e coadjuvam um arranjo de big band para o futuro hit You really got me, dos Kinks, que elas também conseguem “ouvir” na máquina. Um detalhe curioso: a própria Emma Appleton operou a câmera em cenas em que sua personagem Thomasina se filma (“para deixar as linhas dos olhos perfeitas”, segundo revelou o diretor ao site Hotpress).

Ainda que a cultura pop esteja presente, Máquina do tempo é, acima de tudo, um exercício de futurologia convincente, explorando uma futura escalada do fascismo na Inglaterra — que, no filme, chega até mesmo à música, com a criação de um popstar fascista.

A ideia faz sentido e nem é muito distante do que aconteceu de verdade: punks e pré-punks usavam suásticas para chocar os outros, Adolf Hitler quase figurou na capa de Sgt. Pepper’s, dos Beatles, Mick Jagger não se importou de ser fotografado pela “cineasta de Hitler” Leni Riefenstahl, artistas como Lou Reed e Iggy Pop registraram observações racistas em suas letras, e o próprio Bowie teve um flerte pra lá de mal explicado com a estética nazista. Mas o que rola em Máquina do tempo é bem na linha do “se vocês soubessem o que vai acontecer, ficariam enojados”. Pode se preparar.

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Ouvimos: Lady Gaga, “Harlequin”

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Ouvimos: Lady Gaga, “Harlequin”
  • Harlequin é um disco de “pop vintage”, voltado para peças musicais antigas ligadas ao jazz, lançado por Lady Gaga. É um disco que serve como complemento ao filme Coringa: Loucura a dois, no qual ela interpreta a personagem Harley Quinn.
  • Para a cantora, fazer o disco foi um sinal de que ela não havia terminado seu relacionamento com a personagem. “Quando terminamos o filme, eu não tinha terminado com ela. Porque eu não terminei com ela, eu fiz Harlequin”, disse. Por acaso, é o primeiro disco ligado ao jazz feito por ela sem a presença do cantor Tony Bennett (1926-2023), mas ela afirmou que o sentiu próximo durante toda a gravação.

Lady Gaga é o nome recente da música pop que conseguiu mais pontos na prova para “artista completo” (aquela coisa do dança, canta, compõe, sapateia, atua etc). E ainda fez isso mostrando para todo mundo que realmente sabe cantar, já que sua concepção de jazz, voltada para a magia das big bands, rendeu discos com Tony Bennett, vários shows, uma temporada em Las Vegas. Nos últimos tempos, ainda que Chromatica, seu último disco pop (2020) tenha rendido hits, quem não é 100% seguidor de Gaga tem tido até mais encontros com esse lado “adulto” da cantora.

A Gaga de Harlequin é a Stefani Joanne Germanotta (nome verdadeiro dela, você deve saber) que estudou piano e atuação na adolescência. E a cantora preparada para agradar ouvintes de jazz interessados em grandes canções, e que dispensam misturas com outros estilos. Uma turminha bem específica e, vá lá, potencialmente mais velha que a turma que é fã de hits como Poker face, ou das saladas rítmicas e sonoras que o jazz tem se tornado nos últimos anos.

O disco funciona como um complemento a ao filme Coringa: Loucura a dois da mesma forma que I’m breathless, álbum de Madonna de 1990, complementava o filme Dick Tracy. Mas é incrível que com sua aventura jazzística, Gaga soe com mais cara de “tá vendo? Mais um território conquistado!” do que acontecia no caso de Madonna.

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O repertório de Harlequin, mesmo extremamente bem cantado, soa mais como um souvenir do filme do que como um álbum original de Gaga, já que boa parte do repertório é de covers, e não necessariamente de músicas pouco conhecidas: Smile, Happy, World on a string, (They long to be) Close to you e If my friends could see me now já foram mais do que regravadas ao longo de vários anos e estão lá.

De inéditas, tem Folie à deux e Happy mistake, que inacreditavelmente soam como covers diante do restante. Vale dizer que Gaga e seu arranjador Michael Polansky deram uma de Carlos Imperial e ganharam créditos de co-autores pelo retrabalho em quatro das treze faixas – até mesmo no tradicional When the saints go marching in.

Michael Cragg, no periódico The Guardian, foi bem mais maldoso com o álbum do que ele merece, dizendo que “há um cheiro forte de banda de big band do The X Factor que é difícil mudar”. Mas é por aí. Tá longe de ser um disco ruim, mas ao mesmo tempo é mais uma brincadeirinha feita por uma cantora profissional do que um caminho a ser seguido.

Nota: 7
Gravadora: Interscope.

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