Lançamentos
Radar: Pelos, MC Karlos, She Is Dead, Caxtrinho, Ingrime, Afrika Gumbe, Lan

No Radar nacional de hoje, MC Karlos diz que o rock morreu. Bom, não morreu, mas Karlos tem vários argumentos na letra de seu funk melody O rock morreu (graças a deus) – o tipo de som para roqueiros de mente aberta. E mente aberta, você talvez saiba, é nossa zona de conforto, já que aqui cabem o punk do She Is Dead, o som etéreo do Pelos, a lembrança de Almir Guineto na voz de Caxtrinho, e muito mais. Ouça com volume alto e janelas abertas.
Texto: Ricardo Schott – Foto (Pelos): Daisy Serena/Divulgação
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
- E assine a newsletter do Pop Fantasma para receber todos os nossos posts por e-mail e não perder nada.
- Mais Radar aqui.
PELOS, “SANTELMO”. Já ouviu falar do fenômeno do fogo de Santelmo? É uma descarga elétrica que aparece para navegadores durante viagens e que simboliza um sinal de boa sorte – e que na música nova da banda mineira Pelos, Santelmo, surge para simbolizar temas como fugas, passagens, travessias pessoais.
Robert Frank, cantor do grupo (e também guitarrista e pianista da banda), é um velho conhecido de quem assistiu à série Hit Parade (Canal Brasil) – ele era o Missiê Jack, o espertíssimo dono de gravadora do seriado. Em Santelmo, uma faixa introspectiva e bela, sua voz soa como a de Milton Nascimento, mas sempre equilibrado entre o dream pop e o Clube da Esquina. O álbum do Pelos, Noturnas, sai em breve.
MC KARLOS feat ERIK SKRATCH, “O ROCK MORREU (GRAÇAS A DEUS)”. “Eu sabia que o som da guitarra elétrica, atrás dele tinha um monte de lixo de rock americano pronto para desembarcar no Brasil. Não era um Zappa não, nem Zeppelin, era outra coisa”. A frase do compositor e jornalista Chico de Assis dita no documentário Uma noite em 67 recorda a época da Passeata Contra a Guitarra Elétrica (é, teve isso), da qual ele participou em 1967.
Pois bem: o rapper e ex-roqueiro sul-matogrossense MC Karlos sampleia a declaração de Chico na abertura do ousado e polêmico funk melody O rock morreu (Graças a deus), que zoa impiedosamente a babaquice e o conservadorismo hoje associados ao estilo. “A guitarra já virou peça de museu / instrumento falocêntrico, heteronormativo / trilha sonora do imperialismo (…) / antes oprimido, agora opressor / de revolucionário a conservador”, rappeia. Um som para roqueiros que sabem rir de si próprios.
SHE IS DEAD, “US FOR US”. “Banda curitibana especializada em pesadelo”, como eles próprios afirmam, o She Is Dead volta com um som entre o punk e os elementos de psicodelia – chega a lembrar o começo do Primal Scream, quando a banda de Bobby Gillespie era chegada à onda jangle rock e a sons mais primitivos. Além disso, Us for us é uma música sobre força coletiva, sobre pessoas lutando não apenas pelo que é delas, mas pelo que é de todos.
A faixa é, diz a banda, o primeiro single de uma série de doze musicas gravadas em três dias no estúdio Xacra. Gustavo Slomp e Marcio D’Avila assinam a produção. E já tem clipe.
CAXTRINHO, “MÁFIA DA MIÇANGA”. Queda livre, primeiro álbum de Caxtrinho, foi lançado ano passado pelo selo QTV – e é o melhor disco nacional de 2024 de acordo com a curadoria de um certo site de música aí, não sei se vocês conhecem… Vindo da Baixada Fluminense, e dono de uma pegada sonora única – entre o samba e a noise music – ele foi um dos escolhidos para participar do projeto MPB Ano Zero, criação do jornalista Hugo Sukman, do produtor Marcelo Cabanas e do cantor Augusto Martins, com o apoio da gravadora Biscoito Fino.
Cada participante do MPB Ano Zero relê uma faixa clássica ou nova da MPB. A voz e o violão de Caxtrinho couberam como uma luva no samba Máfia da miçanga, de Almir Guineto e Luverci, gravado por Almir em seu segundo disco, A chave do perdão (1982). Vale muito a audição. Tem até mini-doc.
INGRIME, “UTOPIA”. Essa banda de Marília (SP) se coloca entre o pop, a MPB e o punk, experimentando um tom dançante e realista para seu novo single, Utopia – uma música sobre os desafios de seguir acreditando em dias melhores. Além da formação de quinteto, o grupo inseriu metais na canção, dando a ela uma certa proximidade com as fanfarras musicais, e um clima de festa. Gabriel Teixeira, vocalista do grupo, diz acreditar em Utopia como uma canção especial para abrir novos caminhos musicais para o Ingrime (“ela é um respiro”, conta).
AFRIKA GUMBE, “A OBRIGAÇÃO DO DOM”. Soro energizado, disco novo do Afrika Gumbe – banda dos irmãos Marcelo e Marcos Lobato, o primeiro, ex-tecladista do Rappa – está vindo aí. O single mais recente a adiantar o álbum, A obrigação do dom, é um afropop de fôlego, que propõe uma reflexão sobre destino, propósito e o dever íntimo de honrar os próprios dons – mesmo que tudo pareça torcer contra. “Que não sejamos manés e que desfrutemos de toda luz e possibilidades que nossas portas nos oferecem”, filosofa Marcos, em bom carioquês.
LAN feat TARCIS, “DIVERSÃO”. Conhecido por fazer parte do duo Badzilla, Lan retorna com mais um single, com letra e vocal do rapper Tarcis. Dessa vez, o beat chega perto da house music, mais até do que do funk – e a letra tem vibe de rap e flow de palavra falada, de história contada naturalmente. A melodia de Diversão, por sua vez, une dance music, MPB e pop adulto. “A letra foi quase freestyle, a ideia veio muito rápida na cabeça. Eu e Lan conseguimos entender as ideias um do outro, por isso foi um processo tranquilo e divertido”, diz Tarcis.
Crítica
Ouvimos: Ethel Cain – “Willoughby Tucker, I’ll always love you”

RESENHA: Novo disco de Ethel Cain, sombrio e denso, une country, post-rock e climas sombrios para revelar as origens e histórias de sua estreia.
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
- E assine a newsletter do Pop Fantasma para receber todos os nossos posts por e-mail e não perder nada.
Por algum motivo particular, Perverts, segundo álbum de Ethel Cain, lançado no começo do ano (e resenhado pela gente aqui) costuma ser tratado pela própria artista como um “EP”, uma “gravação de estúdio” ou um “corpo de trabalho” – mesmo ultrapassando os 90 minutos. Trata-se de um disco perturbador, quase inaudível para muita gente e que desafia até mesmo quem realmente ama música experimental. Ainda que haja muita beleza nos sons angustiantes e aterrorizantes de faixas como Punish e Housofpsychoticwomn.
Willoughby Tucker, I’ll always love you, terceiro disco e – como Ethel deseja – segundo álbum, dá uma volta no tempo e inicia as histórias da estreia dela, Preacher’s daughter (2022), álbum sobre poder, religião, bullying, abusos e morte (da “filha do pastor” do título). Um espelho da sequência de Star wars, que abre no episódio IV, ou das origens da família Corleone em O poderoso chefão 2, alguém diria. O disco novo de Ethel tem lá seus ares de volta às origens para ela própria, já que traz a artista voltando a investir em algo próximo da noção de canções – e, mais do que em Perverts, ela combina climas sombrios e frutos musicais do Sul dos EUA.
Com duração igualmente longa – mais de 60 minutos – e temas densos e quilométricos, Willoughby Tucker (o nome representa um namorado que Ethel teve na adolescência, e sua eterna paixão) abre com uma balada grunge deprê e fantasmagórica, Janie. E segue com uma música que poderia sonorizar um passeio por uma mansão empoeirada e abandonada, Willoughby’s theme. Já Fuck me eyes, que vem depois, é um synthpop introspectivo e sensual, falando de uma garota sexy e decidida que consegue tudo o que quer – e que precisa deixar sua cidade.
O astral das letras de Ethel mudou em alguns momentos – poucos, aliás. A musicalidade do disco abarca referências country (violões, slide guitars, sons estradeiros) em faixas como Nettles e a pinkfloydiana Dust bowl – no caso dessa última, por sinal, a morbidez prevalece, já que a letra fala de um “garoto bonito consumido pela morte” e de pactos estranhos feitos na escola. A knock at the door, tema de voz, violão e eco, é um hino à ausência, com vocais que soam como lamentos.
Já faixas como Radio towers e Waco, Texas soam como post rock fantasmagórico, o tipo de bad trip que você vai querer acompanhar até o fim – no caso da última, são 15 minutos de Cain relatando uma história de amor, ódio, culpa, autodestruição e sentimentos ambivalentes (“eu prefiro morrer / do que ser qualquer coisa além de sua garota / eu nunca quis te machucar / mas de alguma forma, eu sabia que faria”).
Para ouvir Perverts, era preciso disposição para encarar as sombras – Willoughby Tucker, I’ll always love you, por sua vez, parece revelar as histórias por trás delas. No final, você sente que uma história foi sendo contada, por mais que deixe várias perguntas.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 9
Gravadora: Daughters of Cain/AWAL
Lançamento: 8 de agosto de 2025
Crítica
Ouvimos: Shearling – “Motherfucker, I am both: ‘amen’ and ‘hallelujah’ …”

RESENHA: Shearling lança Motherfucker, disco com uma única faixa de 62min que mistura metal, noise e hardcore em caos sonoro intenso e perturbador.
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
- E assine a newsletter do Pop Fantasma para receber todos os nossos posts por e-mail e não perder nada.
Um amigo anda dizendo que esse disco de estreia do Shearling, banda extremamente barulhenta de Los Angeles, é o melhor de 2025 desde Perverts, o perturbador álbum de Ethel Cain, lançado em janeiro. A verdade é que Motherfucker, I am both: “amen” and “hallelujah” … é mais do que apenas um disco perturbador. Ele provoca o mesmo efeito de assistir a vídeos de cirurgias arriscadas ou de lutas sanguinolentas de MMA, ou de acidentes em que ninguém sai vivo. Tudo graças aos ruídos, aos sustos (sem aviso prévio) e aos vocais no limite da rasgação de garganta.
Outro detalhe é que não se trata de um “disco”: Motherfucker é apenas uma única faixa, de 62 minutos (!), que você pode ouvir no Bandcamp e no YouTube do grupo, e também em aplicativos como o Deezer – sabe-se lá o motivo, a música estava no Spotify e pulou fora de lá. O disco também ganhou uma edição limitadíssima em CD, à venda no Bandcamp. E se você acha que não conhece o Shearling, talvez conheça o Sprain, banda de noise-rock da qual vêm os criadores do grupo, Alex Kent e Sylvie Simmons – o Sprain, vale completar, encerrou atividades após o segundo álbum, The lamb as effigy (2023).
E aí que Motherfucker é uma peça barulhenta una, feita de guitarra, baixo, bateria, gritos, metais (soprados na mesma onda jazz infernal de bandas como King Crimson) e efeitos sonoros, conseguidos com instrumentos exóticos como harmônio, autoharp e glockenspiel, além de “dulcimer martelado” e “serra cantante”. A letra reúne histórias animalescas e mumunhas bíblicas, em versos como “muitas vezes me pego pensando / o que exatamente pode passar pela cabeça de um cavalo?”, “vou enterrar você, Adão / vou subir na sua perna / e puxar para baixo sua pequena cueca alegre / e vou enterrar você a cinquenta mil pés no subsolo” e outros.
A música não tem parte calma, nem parte alegre: é porrada o tempo todo, dividindo-se em segmentos metal, hardcore, metal experimental, barulheira no estilo do Suicide, punk no estilo do Wire (das mais violentas do Wire, vale dizer) e um clima meio post-rock que surge aqui e ali. Ouça com tempo, disposição e volume alto – os vizinhos vão reclamar, mas isso pode ser bom.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Mishap Records
Lançamento: 1 de maio de 2025.
Crítica
Ouvimos: Luiz Bruno – “Lule e as Crianças Adultas ao vivo no espaço” (EP)

RESENHA: Luiz Bruno, o Lule, volta ao Brasil com EP ao vivo, misturando psicodelia, rock, jazz e humor em faixas lisérgicas e cheias de referências.
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
- E assine a newsletter do Pop Fantasma para receber todos os nossos posts por e-mail e não perder nada.
O músico e compositor gaúcho Luiz Bruno, o Lule, morou onze anos em Londres – lá, montou uma banda chamada The Adult Children e desenvolveu uma discografia de nove discos, um EP e um single que, por um bom tempo, ficou só no Bandcamp. Lule e as Crianças Adultas ao vivo no espaço é um EP que marca a volta de Luiz ao Brasil, e que resume o clima zoeiro e psicodélico das músicas de discos como Chicken dinner (2024) e Curtição suprema vols 1 e 2 (ambos de 2022).
Os fungos abre o disco com flautinhas, barulhos de pássaros – lembrando um Jethro Tull + Recordando O Vale Das Maçãs com senso de humor, com uma conversa naturalista, punk e pseudo gospel na letra. Jovens fumando vape no bus e Manteiga mental unem jazz rock a la Khruangbin, rock pauleira e psicodelia, como naquelas coisas que você só descobria fuçando as pastas “Brazilian Nuggets” do Soulseek. Eu me afundei na lama da culpa é lisérgica na letra e na melodia, unindo Who, Kinks e Mutantes.
No final, roncos a la In another land (Rolling Stones) e evocações de Kinks e Todd Rundgren em Acordo noiado. E os efeitos sonoros do soul psicodélico e espacial de We are actors in your cosmic play. Um som para voar.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Tal & Tal Records
Lançamento: 22 de julho de 2025
-
Cultura Pop5 anos ago
Lendas urbanas históricas 8: Setealém
-
Cultura Pop5 anos ago
Lendas urbanas históricas 2: Teletubbies
-
Notícias7 anos ago
Saiba como foi a Feira da Foda, em Portugal
-
Cinema8 anos ago
Will Reeve: o filho de Christopher Reeve é o super-herói de muita gente
-
Videos8 anos ago
Um médico tá ensinando como rejuvenescer dez anos
-
Cultura Pop9 anos ago
Barra pesada: treze fatos sobre Sid Vicious
-
Cultura Pop7 anos ago
Aquela vez em que Wagner Montes sofreu um acidente de triciclo e ganhou homenagem
-
Cultura Pop8 anos ago
Fórum da Ele Ela: afinal aquilo era verdade ou mentira?