Destaque
POP FANTASMA apresenta Plebe Rude e Afonso Nigro, “P… da vida”

Plebe Rude e Dominó não poderiam ser mais antagônicos no pop-rock nacional dos anos 1980 – a primeira, uma banda punk, a segunda uma boy band. Mas o protesto acabou unindo os dois grupos: em 1987 o Dominó fez (bastante) sucesso com uma canção inflamada, P… da vida, que a Plebe releu no finzinho de 2020, com a participação de Afonso Nigro (do grupo do hit Manequim) como cantor convidado.
Aliás, tem outro detalhe que une Afonso e Philippe Seabra, vocalista da Plebe. “Sempre falavam por aí que eu e o Afonso éramos parecidos, a ponto de me pararem uma vez para pedir o seu autógrafo”, brinca o cantor de Proteção. As duas bandas também participaram de uma gincana no Programa Raul Gil em 1987 (por sinal o ano de P… da vida), na qual a Plebe, então lançando o disco Nunca fomos tão brasileiros, acabou cantando o “pegue seu banquinho e saia de mansinho”.
“O Philippe me contou essa história de que confundiam a gente antes de eu ir lá colocar a voz, quando a gente estava num restaurante em Brasília. Ele até brincou: ‘Agora vamos ser separados no nascimento!'”, conta Afonso, cuja voz, em P… da vida, pode ser escutada hoje em várias rádios rock. “A Veja até falou que é um dueto improvável”, brinca.
FAZ TEMPO
Afonso e Philippe já se conhecem há dez anos, desde quando o cantor da Plebe participou de um evento da produtora do ex-Dominó, em Fortaleza. E P… da vida na voz dos dois também já vem de alguns anos: a música foi gravada em 2015 e ficou arquivada, até ser terminada ano passado.
“Sempre gostei da música e foi uma coisa notavelmente ousada para um grupo ‘montado’ (ainda mais pelo Gugu) ter uma letra de fortíssimo cunho social”, recorda o cantor da Plebe, que releu a canção num clima parecido com o de 1901, hit da banda francesa Phoenix. “Todo ano o Afonso me ligava perguntando se iríamos lançá-la, mas como produtor, eu não estava conseguindo encaixá-lo no repertório da Plebe. Só que quando começou a pandemia, Afonso me mandou um zapzap dizendo, ‘tá na hora, não?’ E topei na hora. Finalizei a música e o resto é história – e algumas instâncias de harakiri de alguns plebeus”.
LETRA
Se você nunca ouviu a canção ou leu a letra, P… da vida (o nome é esse mesmo, sem o “tô”) era quase tão assertiva quanto Desordem, dos Titãs, lançada no mesmo ano de 1987. A música do Dominó falava de preconceito “de cor, de raça, de sujeito” e de temas circunscritos ao nada saudoso governo José Sarney, como cruzado (moeda nacional da época) e gatilho salarial (correção automática dos salários caso a inflação atingisse 20% ao mês em 1986, o que fatalmente rolou).
“Fica bem claro em que década ela foi feita, não daria para mudar a letra. E o mais importante é ela falar de política, de preconceito, de ‘jogos de dados combinados na Nações Unidas’, que estão pondo fogo no planeta”, relata Afonso, que já era fã da Plebe na época da música e sempre foi bem roqueiro.
“O Dominó gravou até o All the young dudes, do David Bowie como Dono de mim. Eu adoro essa versão, foi uma das músicas em que eu acho que cantei melhor (você já leu sobre isso no POP FANTASMA). Gravamos Cat Stevens, Beatles”, recorda. “Em 1989, 1990, eu já estava bem cabeludo. Teve um momento em que eu acabei destruindo a banda, porque eu fiquei tão roqueiro que montei uma banda em que o guitarrista era o Kiko Loureiro e o batera era o Cuca Teixeira. Me aproximei muito do Edu Ardanuy e do Wander Taffo (ambos guitarristas) depois. Ficou quase impossível continuar no Dominó depois disso”.
Philippe diz que a letra de P… da vida é como as da Plebe Rude, “que não envelhecem porque o Brasil não muda”, conta. “E olha que ridículo, a nossa geração parece ter mesmo jogado a toalha em termos de letras. As bandas que ainda estão na ativa simplesmente regurgitam os velhos sucessos, sem conseguir fazer nada novo, impactante. Tivemos que resgatar um sucesso pop, da banda mais pop da história do pop brasileiro, para mostrar que é possível sim ter apelo e mensagem ao mesmo tempo”, enfatiza.
PUTO DA VIDA
Pela primeira vez, Afonso esquece o “p… da vida” e solta “tô puto da vida” na letra da canção – lá pro final, mas solta.
“A primeira vez que eu falei ‘tô puto’, eu cheguei no estúdio do Philippe e ele só tinha gravado as guitarras, com bateria eletrônica. E eu cantei a letra com esse veneno aí, bem diferente da canção original do Dominó. Quando eu terminei de gravar, ele me falou: ‘Cara, você cantou com tanta vontade que me deu vontade de falar ‘tô puto da vida’. Eu respondi: ‘Então chega aqui, vamos falar!’. O Philippe estava na técnica e saiu pra ir cantar”, recorda. “Depois que entraram teclados, a guitarra do Clemente. Você vê o clipe e percebe até a diferença, porque foi tudo gravado em dias diferentes”.
NÃO VAI GRAVAR, NÃO
P… da vida é uma versão de um hit de 1984 do cantor italiano Lucio Dalla, Tutta la vita. O original, se você nunca ouviu, é um pop-rock que caberia tranquilamente na voz de Phil Collins (confira abaixo). Já a versão foi escrita por Edgard B. Poças, mesmo versionista dos hits da Turma do Balão Mágico e de vários outros hits do Dominó, como Companheiro. A canção de protesto deu bastante polêmica durante a produção do álbum de 1987 da boy band.
“Eu coloco o Edgard na categoria de gênio dos letristas do Brasil. Ele era o cara que fazia letras pra todo mundo, grandes sucessos do Dominó vieram dele. Fiquei sabendo nesse ano que em 1987, quando ele apresentou a música na CBS (hoje Sony, gravadora do Dominó) a gravadora não quis que ela entrasse no disco. E ele falou: ‘Eu acho que é importante uma boy band se posicionar. Se vocês não gravarem eu vou tirar as outras músicas do disco’. Ele fez o famoso truco 12 e a genialidade fez com que o Dominó mudasse de patamar”, conta Afonso, lembrando que o grupo passou a fazer programas de TV cantando ao vivo e ganhou até clipe no Fantástico.
TEVE CLIPE
Ainda assim, P… da vida não era a música de trabalho do álbum. “O single era Manequim, que foi lançada no Fantástico com um clipe com direção do Paulo Trevisan. Investiram uma fortuna no clipe, fizeram uma cidade cenográfica só para a gente gravar, foi gravado com grua, várias câmeras… Não existia isso em 1987, era como se fosse cinema”, conta. P… da vida, lembra Afonso, ganhou um clipe bem “mequetrefe, com investimento zero”. Só que a música virou o jogo. “Acabou provando que o Edgard estava certo: quando a música foi pro rádio, não conseguimos estourar mais nenhuma música, porque ela não parava de tocar. Começamos a tocar em rádios em que nunca nem tínhamos tocado”.
MUSICAL
A Plebe Rude estava com planos ambiciosos para 2020. O disco Evolução, vol. 1, lançado em 2019, ganharia sua parte 2, e o projeto se transformaria num musical, com direção de Jarbas Homem de Mello. Evolução, vol. 2 fica para o primeiro semestre de 2021 e a peça, que Philippe gostaria de ver transformada num filme, também sai esse ano se tudo der certo.
“O musical estava sendo montado, e o levante da verba para um megaespetáculo estava em andamento. Seria com quinze bailarinos/cantores com a banda em cena e de acordo com o Jarbas, ‘pessoas voando’. Mas, como o resto da humanidade, fomos abruptamente interrompidos, sem sequer conseguir lançar o volume 1 no Circo Voador. As passagens já estavam emitidas, uma pena. O volume dois teria sido em agosto passado junto com a nossa primeira ida a Europa para participar do Rebellion Festival na Inglaterra”, conta o vocalista, lembrando que a banda continuava a fazer shows e turnês.
“Estamos num país que não recompensa idealismo, então é claro que isso limita as coisas. Mas de vez em quando o punk consegue cutucar a ferida, como os punks em Belém no começo do ano do Festival Facada, com a imagem do Bozo que foi censurada. Ah, a gente morre de orgulho!”, recorda. Por sinal, em 2021 vem aí também biografia do Philippe Seabra, com 550 páginas. O livro está terminado desde fevereiro. “Mas com a pandemia, não teria como não incluir um capítulo extra sobre esse momento esdrúxulo da humanidade”, conta.
LADO B
E como você viu lá em cima, o single de P… da vida tem um lado B, O gigante adormece, escrita por Philippe e gravada também com participação de Afonso. Na verdade, era para ser uma música adicionada a P… da vida, mas estava complicado conseguir a autorização do espólio de Dalla – o compositor italiano morreu em 2012. “Estava começando a demorar demais, então resolvemos desmembrar as canções. Para o Plebeu mais atento, O gigante adormece dá vazão a uma das faixas mais impactantes de Evolução Vol. 1, A mesma mensagem“, diz o vocalista.
Foto: Adriano Pasqua/Divulgação.
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Cultura Pop
Quando Suicide gravou… “Born in the USA”, do Bruce Springsteen

A way of life, disco de 1988 da dupla de música eletrônica Suicide, é tido como um disco, er, acessível. Acessível à moda de Martin Rev e Alan Vega, claro. O disco pelo menos podia ser colocado tranquilamente na prateleira dos artífices da darkwave e era bem mais audível do que o comum de um grupo que havia lançado a assustadora Frankie teardrop. O disco era produzido por Ric Ocasek, líder dos Cars (que já havia produzido o segundo disco deles, de 1981, Alan Vega/Martin Rev), e tinha até uma eletro-valsinha, Surrender, além de um estiloso misto de rockabilly e synthpop, Jukebox baby 96.
O que ninguém esperava era que a dupla tivesse feito nessa mesma época uma estranhíssima versão de… Born in the USA, de Bruce Springsteen. A faixa surge numa versão ao vivo, gravada num show de Vega e Rev em 1988, em Paris. A dupla nem sequer disfarçou que a ideia era fazer uma versão bem lascada – saca só o sintetizadorzinho da música, e a referência a músicas como Lucille, de Little Richard, e o tema When the saints go marching in, logo na abertura. A “versão” da faixa resume-se a quase nada além do título da canção. Parece um karaokê do demo (e é).
A versão poderia ser uma bela pirataria, mas vira oficial nesse mês: vai aparecer em uma reedição de A way of life, prevista para o dia 26. A edição de luxo estará disponível em vinil azul transparente com Born in the USA e em CD com quatro faixas bônus, além do formato digital. O material extra inclui versões ao vivo de Devastation e Cheree, bem como uma versão inicial de estúdio de Dominic Christ. O pesquisador Jared Artaud encontrou as faixas enquanto trabalhava no arquivo de Vega, após a morte do cantor em 2016.
E se você não sabia, vai aí a surpresa: Springsteen tá bem longe de ser um sujeito que diria “what?” ao ser informado da existência do Suicide. Pelo contrário: era fã da dupla e costumava dizer que a estreia do Suicide, o disco epônimo de 1977, era “um dos discos mais sensacionais que já ouvi”. Em 1980, o cantor esteve com a dupla e Vega descobriu que Springsteen era seu fã – e se surpreendeu.
“Ele estava gravando o disco The river (1980) e nós estávamos gravando nosso segundo álbum em Nova York. Então tivemos uma reunião de audição do nosso álbum. Havia três ou quatro figurões da nossa gravadora, e Bruce também estava lá. Depois que tocamos o álbum, houve um silêncio mortal… exceto por Bruce, que disse, ‘Isso foi ótimo pra caralho.’ Ele fazia questão de nos dizer o quanto nos amava”, contou em 2014 ao New York Post.
Mais: um texto do site Treblezine, a partir de audições da obra de Bruce e de entrevistas do Suicide, descobre: a dupla influenciou muito o sombrio disco Nebraska, tido como o “primeiro disco solo” (sem a E Street Band) de Springsteen (1982), basicamente um disco sobre crise, desemprego e gente à beira do desespero pela falta de oportunidades. Houve uma versão elétrica e pesada de Nebraska, mas Bruce quis lançar o disco acústico, de voz, violão e registros crus, e que de fato lembram o clima esparso do Suicide do primeiro disco.
Na dúvida, ouça State trooper, cujos uivos lembram bastante os gritos (sem aviso prévio) de Frankie teardrop. “Lembro-me de entrar na minha gravadora logo após o lançamento do meu disco”, disse Vega depois de ouvir State trooper pela primeira vez. “Eu pensei que era um dos meus álbuns que eu tinha esquecido. Mas era Bruce!”
Cultura Pop
No podcast do Pop Fantasma, a fase de transição do Metallica

A morte do baixista Cliff Burton, em 27 de setembro de 1986, desorientou muito o Metallica. Além do que aconteceu, teve a maneira como aconteceu: a banda dormia no ônibus de turnê, sofreu um acidente que assustou todo mundo, e quando o trio restante saiu do veículo, só restou encarar a realidade. A partir daquele momento, estavam não apenas sem o baixista, como também estavam sem o amigo Cliff, sem o cara que mais havia influenciado James Hetfield, Lars Ulrich e Kirk Hammett musicalmente, e sem a configuração que havia feito de Master of puppets (1986) o disco mais bem sucedido do grupo até então.
Hoje no Pop Fantasma Documento, a gente dá uma olhada em como ficou a vida do Metallica (banda que, você deve saber, está lançando disco novo, 72 seasons) num período em que o grupo foi do céu ao inferno em pouco tempo. O Metallica já era considerado uma banda de tamanho BEM grande (embora ainda não fosse o grupo multiplatinado e poderoso dos anos 1990) e, justamente por causa disso, teve que passar por cima dos problemas o mais rápido possível. E sobreviver, ainda que à custa justamente da estabilidade emocional de Jason Newsted, o substituto do insubstituível Cliff Burton…
Nomes novos que recomendamos e que complementam o podcast: Skull Koraptor e Manger Cadavre?
Estamos no Castbox, no Mixcloud, no Spotify, no Deezer e no Google Podcasts.
Edição, roteiro, narração, pesquisa: Ricardo Schott. Identidade visual: Aline Haluch. Trilha sonora: Leandro Souto Maior. Estamos aqui toda sexta-feira!
Destaque
Dan Spitz: metaleiro relojoeiro

Se você acompanha apenas superficialmente a carreira da banda de thrash metal Anthrax e sentia falta do guitarrista Dan Spitz, um dos fundadores, ele vai bem. O músico largou a banda em 1995, pouco antes do sétimo disco da banda, Stomp 442, lançado naquele ano. Voltaria depois, entre 2005 e 2007, mas entre as idas e as vindas, o guitarrista arrumou uma tarefa bem distante da música para fazer: ele se tornou relojoeiro (!).
A vida de Dan mudou bastante depois que o músico teve filhos em 1995, e começou a se questionar se queria mesmo aquela vida na estrada. “Fazíamos um álbum e fazíamos turnês por anos seguidos, e então começávamos o ciclo de novo – o tempo em casa não existia. É uma história que você vê em toda parte: tudo virou algo mundano e mais parecido com um trabalho. Eu precisava de uma pausa”, contou Spitz ao site Hodinkee.
>>> Veja também no POP FANTASMA: Rockpop: rock (do metal ao punk) na TV alemã
Na época, lembrou-se da infância, quando ficava sentado com seu avô, relojoeiro, desmontando relógios Patek Philippe, daqueles cheios de pecinhas, molas e motores. “Minha habilidade mecânica vem de minha formação não tradicional. Meu quarto parecia uma pequena estação da NASA crescendo – toneladas de coisas. Eu estava sempre construindo e desmontando coisas durante toda a minha vida. Eu sou um solucionador de problemas no que diz respeito a coisas mecânicas e eletrônicas”, recordou no tal papo.
Spitz acabou no Programa de Treinamento e Educação de Relojoeiros da Suíça, o WOSTEP, onde basicamente passou a não fazer mais nada a não ser mexer em relógios horrivelmente difíceis o dia inteiro, aprender novas técnicas e tentar alcançar os alunos mais rápidos e mais ágeis da instituição.
>>> Veja também no POP FANTASMA: Discos de 1991 #9: “Metallica”, Metallica
A música ainda estava no horizonte. Tanto que, trabalhando como relojoeiro em Genebra, pensou em largar tudo ao receber um telefonema do amigo Dave Mustaine (Megadeth) dizendo para ele esquecer aquela história e voltar para a música. Olhou para o lado e viu seu colega de bancada trabalhando num relógio super complexo e ouvindo Slayer.
O músico acha que existe uma correlação entre música e relojoaria. “Aprender a tocar uma guitarra de heavy metal é uma habilidade sem fim. É doloroso aprender. É isso que é legal. O mesmo para a relojoaria – é uma habilidade interminável de aprender”, conta ele. “Você tem que ser um artista para ser o melhor – seja na relojoaria ou na música. Você precisa fazer isso por amor”.
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