Crítica
Ouvimos: Royal Blood, “Back to the water below”

- Formado pela dupla Mike Kerr (voz, baixo) e Ben Thatcher (bateria), o Royal Blood vem de Worthing, West Sussex, Inglaterra, e trilhou praticamente toda sua carreira no mainstream, gravando para a Warner. Back to the water below é o quarto álbum da banda.
- Pela primeira vez, o Royal Blood produz sozinho um disco seu – por sinal gravado no estúdio próprio da dupla. O disco inteiro foi tocado pelos dois, com exceção da entrada de Tom Hobden tocando viola e violino, e Ian Burdge tocando violoncelo. A equipe de trabalho também foi bastante reduzida, com um técnico de gravação, um de mixagem e seus assistentes.
- Kerr, autor das letras, disse ao New Musical Express que “existe um tema lírico entre as músicas. Pode acontecer com todas as músicas, mas é algo que vem de um lugar mentalmente angustiante”. Em Typhoons, o tema foi a batalha pela sobriedade de Ben.
O Royal Blood tem uma vantagem suprema sobre qualquer outra banda da época deles. Assim como acontecia com grupos como Soundgarden, Nirvana e os Strokes dos dois primeiros álbuns, você só consegue fazer qualquer tipo de apreciação sobre a música deles quando já foi pego totalmente pelo som que eles fazem. Isso acontece até mesmo antes de você gostar de verdade da música da dupla. Após escutar qualquer disco deles, você já decorou pelo menos dois refrãos, já curtiu uns dois ou três riffs e, em especial, já foi pego pela qualidade de gravação e pela produção – que sempre deixa o som alto e com peso. Só avalia depois.
Isso talvez estivesse mais pra um approach de pop perfeito do que de disco de rock, vamos dizer assim. Mas nem tanto, levando em conta um estilo musical que já foi definido como algo que deve entrar pelas vísceras (John Lennon enxergava rock dessa forma). É nessa onda que Mike Kerr e Ben Thatcher, os dois do RB, vêm trabalhando há alguns anos, e vem dando certo. Você pode até ter esquecido de colocar discos como How did we get so dark? (2017) e Typhoons (2021) em suas listas de melhores do ano – e a crítica musical não parece ter tido nenhum surto de adoração ao som deles, embora tenha tratado na maioria das vezes os discos da banda com interesse e justiça. Mas mesmo assim você tem grande probabilidade de ter sido pego em algum momento pela fórmula do grupo (uma mescla de garage rock, indie rock, metal, punk, power pop e blues, que consegue abrir mais possibilidades do que fechar leques).
Back to the water below é menos formulaico que todos os outros do grupo, e traz essa mescla em bom estado, apontando às vezes para uma espécie de Aerosmith indie (Shiner in the dark, os riffs de Triggers), para o pós-grunge tribal lembrando Queens Of The Stone Age (Mountains of midnight), ou trazendo baladas pesadas e psicodélicas (How many more times), ou incluindo um gospel pesado que lembra um encontro entre Rolling Stones, Black Sabbath e pós-punk anos 1980 (High waters). Ou impressionando com os mergulhos da banda ao piano (Pull me through e There goes my cool, essa a cara de John Lennon).
É um disco bem mais orgânico e menos eletrônico que Typhoons, que tinha canções que, mexe daqui e dali, poderiam ir parar no repertório do Depeche Mode. E foca no lado das baladas poderosas e um tanto psicodélicas, que podem abrir um precedente mais “pop” (digamos assim) para o grupo – confira o fechamento com Waves. Tem até The firing line, um baladão de piano, estradeiro, psicodélico, sem distorção (coisa rara na obra da dupla), e que poderia estar num disco do Skank (!) desde que rearranjada.
Gravadora: Warner
Nota: 8
Foto: Reprodução da capa do álbum
Crítica
Ouvimos: Julian Lennon – “Because…” (EP)

RESENHA: Julian Lennon revisita fitas antigas, ecoa o pai John em clima de reclusão e entrega um EP que soa como uma epifania para beatlemaníacos.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Music From Another Room
Lançamento: 22 de agosto de 2025
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“Quanto mais velho fico, mais me inspiro no meu pai”, disse recentemente à Rolling Stone ninguém menos que Julian Lennon, filho do beatle John, morto há 45 anos. Um pai que ele conheceu mais pela distância do que pela proximidade – quando Lennon casou-se com Yoko Ono, a vida do cantor passou ser outra, e aos 62 anos, Julian “conviveu” mais com seu pai morto do que vivo (ele tinha 17 anos naquele dezembro de 1980). Mas que, de qualquer jeito, é uma fonte de inspiração sólida pelos valores preconizados nas letras e entrevistas, pelo humor ácido, e pela musicalidade igualmente ácida.
Daí que este EP Because… pegou Julian num momento de reclusão, quase como os que seu pai costumava viver em Nova York na segunda metade dos anos 1970. Julian viu seu disco Jude (2022) ganhar uma recepção bem fria, e tinha decidido focar em trabalhos como fotógrafo e escritor. O EP surgiu de várias fitas antigas (algumas dos anos 1980) encontradas no porão do escritório de seu ex-empresário. Julian decidiu mexer em três delas, optou por deixar os vocais como estavam e gravou apenas algumas novas trilhas de instrumentos. I won’t give up, a quarta faixa, foi feita há dez anos com a colaboração do então iniciante Andrew Watt.
- Ouvimos: Paul McCartney e Wings – One hand clapping
Because… é praticamente uma epifania: se John Lennon estivesse vivo e decidisse gravar apenas EPs, como Ringo fez há poucos anos, talvez soasse dessa forma. Com uma voz idêntica à do pai, Julian une a vibe de John e guitarra-bateria a la The Police na faixa-título (que inclui até um “o karma vai te pegar!”), chupa detahes de I am the walrus em I hope, canta com vocais reverberando (como o pai) em Keep on searching, e faz lembrar tanto o piano de Imagine quanto o dedilhado de Dear Prudence em I won’t give up.
O EP de Julian vale uma nota para beatlemaníacos e do antigo trabalho do cantor (como o disco Valotte, de 1984). Vale dizer que, se John transformou letras enigmáticas como Strawberry Fields forever em “obras abertas”, você pode extrair de um tudo das letras de Because…: será que o rancor da faixa-título é dedicado a Yoko, com quem ele diz não se encontrar desde 2016? Ou às situações que viveu/não-viveu ao lado do pai? Já I won’t give up pode ser mesmo uma vontade de não desistir da música – embora ela tenha dito que a música é sobre não desistir do amor.
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Crítica
Ouvimos: Harmada – “Os fugitivos”

RESENHA: Harmada retorna após 14 anos com Os fugitivos, um disco maduro, noventista e denso, explorando fugas existenciais em faixas que vão do pós-punk ao rock britânico.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: 8-bics
Lançamento: 21 de outubro de 2025
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O Harmada, uma banda carioca, marcou época quando lançou o primeiro álbum, Música vulgar para corações surdos (2011), um disco bastante ouvido pela crítica, e que acabou dando também um público fiel para o grupo. De lá para cá, rolou um jejum de novos álbuns, embora a banda nunca houvesse acabado de verdade – chegaram a rolar alguns shows e participações em tributos. Mas como fazer música no Brasil nunca foi moleza, cada integrante precisou tratar da própria vida profissional.
- Ouvimos: Canacut – À mercê do tempo (EP)
Com Manoel Magalhães (guitarra e voz), Brynner Buçard (guitarra), Bernardo Corrêa (baixo), Rodrigo Garcia (bateria) e Pedro Henrique Lacerda (guitarra) na formação, o grupo retorna 14 anos depois com Os fugitivos, um disco – prometido já há alguns anos – mais tranquilo que a estreia, e com uma cara bem mais anos 1990 do que a vibe indie-rock anos 2000 de Música vulgar. Evocações do rock britânico de há 30/20 anos surgem em faixas como a balada blues Quando você chegar, a densa Destino, a balada ruidosa Iluminar e o guitar rock Piscina de crianças universais.
Nas letras de Os fugitivos, o grupo se inspira no livro Os prisioneiros, de Rubem Fonseca, para falar de fugas existenciais modernas. Por acaso, o Harmada volta investindo numa sonoridade bem mais moderna e eterna do que no primeiro álbum – tangenciando também um clima de balada MPBística em Em fuga e chegando perto da desolação pós-punk na explosiva Prisioneiro e na introspectiva A estrada, além do ambient ruidoso de Sonhar.
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Crítica
Ouvimos: 5 Seconds Of Summer – “Everyone’s a star”

RESENHA: Em Everyone’s a star, 5 Seconds Of Summer larga a indecisão e transforma o “em cima do muro” de discos passados em algo variado e interessante.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7,5
Gravadora: Republic
Lançamento: 14 de novembro de 2025.
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Nunca fui um grande fã dessa banda australiana que passou voando como o vento em seus 14 anos de carreira – na verdade, como um vento daqueles que levam bolas de feno de um lugar pro outro, até porque o que o 5 Seconds Of Summer mais fez foi variar a posição. Do punk-pop noventista ao emo, passando pela música eletrônica, pelo metal alternativo e pela pose de boy band, os discos dessa turma atiravam para todos os lados. Só que tudo parecia acontecer mais por indecisão do que por variações estéticas.
E aí sai Everyone’s a star, disco em que essa tal indecisão começa a ser revertida em prol de algo realmente mais variado – e bom de ouvir, vale dizer. Mas olha… Até que o disco tome jeito, o/a ouvinte precisa encarar um insatisfatório nu-metal (a faixa-título, cuja letra traz comentários sobre essa era de influencers e seres instagramáveis que todo mundo parece conhecer, menos você) e algo que lembra um Maroon 5 emo (a bisonha Not OK).
- Ouvimos: Yellowcard – Better days
Daí pra frente, o 5SOC se transforma num Big Special amigável em Telephone busy, tira uma onda do lado “boy band esquisitona” deles (em Boyband, que soa como um Information Society com peso) e une emo glam rock em No 1 obsession, com batida lembrando Rock’n roll (part 2), de Gary Glitter. A faceta do grupo que mais aparece no disco é o lado emo, que surge na contemplativa I’m scared I’ll never sleep again, na new wave oitentista Istillfeelthesame (a melhor do disco, dando a entender que bandas como Turnstile estão na playlist de trabalho deles) e até em duas tentativas de soar parecido com Strokes (a mais ou menos The rocks e a boa Sick of myself).
Everyone’s a star tem também um britpop brega (a chatinha Ghost, com virada de bateria copiada de Don’t look back in anger, do Oasis), uma espécie de shoegaze-emo (a legalzinha Jawbreaker, que fecha o álbum) e, que surpresa, uma ótima adesão à onda indie sleaze, do jeito deles (Evolve). Parece que se tinha alguém apertando os botões e manipulando a banda, ou mudou o manipulador, ou ele se mandou.
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