Crítica
Ouvimos: Young Knives, “Landfill”

- Landfill é o sexto álbum do grupo britânico Young Knives, formado por Henry Dartnall (voz, guitarra) e Thomas Bonsu-Dartnall (voz, baixo, teclados).
- Em 2020, a Vice incluiu She’s attracted to, música dos Young Knives, numa lista controversa que apontava “as 50 melhores músicas indie de aterro sanitário de todos os tempos” (ou seja: “The Top 50 greatest landfill indie songs of all time”). A afronta ficou na cabeça da dupla, até que Henry e Thomas decidiram dar a seu disco o nome Landfill.
- “Perguntei: ‘por que estamos nessa briga para escolher o nome?'”, disse Henry aqui. “O disco fala de coisas que são bem transitórias. Quero dizer que está tudo apenas no final. É como a refeição legal que você come se transformar em merda quatro horas depois”, brincou.
Um tempo atrás, Maria Bethânia disse que quando Adriana Calcanhotto trancava-se num estúdio para gravar um disco, “as gravadoras deviam ficar loucas”, por causa do tom criativo e ousado que ela impunha a seus álbuns. Bom, provavelmente a banda britânica Young Knives não causa o mesmo efeito nas majors da Europa e dos Estados Unidos, mas se em algum momento o som não-identificável deles cair nas mãos de uma turma pop, pode acabar influenciando muita gente.
Isso porque Landfill, disco novo do grupo, chega a ser viciante. Você pode ficar sem escutar o álbum por alguns meses ou até esquecê-lo – na primeira vez que ouvir, vai ficar querendo acompanhar o disco como se fosse uma série, com vários episódios, plot twists e situações que você nem imagina que podem acontecer. O disco soa como um conto espacial dividido em vários movimentos, partindo do chamber rock de A memory of venom, com piano circular, sintetizador leve, além de bateria e efeitos de percussão dando um ar de caixa de guerra no fim da faixa.
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Ugly house tem riff quase elástico de guitarra, bateria com bastante eco, e ritmo quebrado como num pós-hardcore – só que, assim como a próxima faixa, Cause & effect, há referências de jazz e psicodelia em meio aos sons estilingados de guitarra e baixo e aos vocais distorcidos. A letra dessa última faixa é um primor de zoação anti-algoritmos, com frases como “você tem que desejar muito mais, tem que ser uma solução/não, foda-se, não há nada, vamos ficar mais bêbados”, “existe um creme que você pode obter para isso, coloque-o na sua lista de desejos/(aprendizado cem por cento)/mas não pesquise no Google, não se você não quiser que apareça no seu histórico” – encerrando com o nome da faixa sendo dito em meio à frase “eu realmente gosto da parte em que você canta o nome da música no refrão”.
Na parte inicial de Landfill, os Young Knives ainda conseguem soar como um The Fall com certo tino pop (o sombrio guitar rock The people from the second way), e inserir uma canção com tags de psicodelia e pós-punk (Dissolution). O plot twist surge quando aparece No sound, que parece uma bossa-samba de Jorge Ben relida por Sergio Mendes, só que em tom fantasmagórico, sujo e ruidoso. Vocais doídos e um clima que lembra tanto Van Morrison quanto Serge Gainsbourg dão as caras em Your car has arrived. Climas assustadores e espaciais que lembram Mutantes e Sun Ra são a tônica de Gone, gone completely gone, um conto sombrio sobre o desaparecimento do povo de uma localidade, aberto como um blues em compasso ternário, e encerrado com morte súbita.
No fim do álbum, uma espécie de minisssuíte, Love the knifes, abre em clima amedrontador, prossegue como um Burt Bacharach punk, e atira o/a ouvinte numa torrente de ruídos que lembra o som da banda alemã Faust. Fresh meat encerra tudo, abrindo como uma balada tranquila em tons de jazz, e partindo para um ambient ruidoso e espacial, que lembra bandas pouco lembradas dos anos 1960, como Fifty Foot Hose e The United States Of America.
Nota: 8,5
Gravadora: Gadzook
Lançamento: 24 de janeiro de 2025
Crítica
Ouvimos: Babymetal – “Metal forth”

RESENHA: Em Metal forth, o Babymetal mistura peso e pop: nu-metal, j-pop, rap e até soul, provando maturidade após 15 anos de carreira.
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Babymetal é heavy metal para não-metaleiros, você poderia dizer. Nem tanto, né? É um banda que vem da cultura asiática de criação de ídolos, é formada por meninas (que já são mulheres) e gerenciada por uma agência poderosa – a Amuse, que tem até escola de música. Mas dá pra dizer, sem medo de errar, que muita gente foi apresentada ao universo do som pesado por causa delas. Até porque o Babymetal é esperto o suficiente para agregar mumunhas pop, e estilos como r&b e rap, a um universo conhecido pelo radicalismo.
Você piscou o olho e o Babymetal já tem quinze anos, várias turnês e, curiosamente, um número de discos bem pequeno. Metal forth é o quarto álbum e funciona bem para metaleiros de ouvidos abertos e sem preconceitos. Dando um passeio pelas faixas: Ratatata tem ar de j-pop e k-pop, e une som pesado, rap e dance music. Song 3 é uma porrada que une vocais guturais (da parte dos convidados do Slaughter To Prevail) e vozes meio Alvin e os Esquilos. From me to you, na abertura, herda sonoridades do metal alternativo e da música pop – é som rápido, pesado, eletronificado.
Entre as surpresas de Metal forth, tem Sunset kiss, que deixa o Babymetal com uma cara de Spice Girls trabalhadas no couro e no preto. E My kiss, um nu-metal cuja introdução ameça uma chupada em Ratamahatta (hit do Sepultura com participação de Carlinhos Brown). Tom Morello põe energia em Metal!!!, que também traz emanações de Sepultura, mas une som pesado e soul. Já White flame, no final, aponta para vários lados: j-pop, emo, punk… encerrando com um solo de guitarra final que lembra Queen.
Quem ouvir Metal forth de mente aberta, vai descobrir que, com o tempo, o Babymetal foi se tornando um projeto bastante equilibrado – as integrantes cresceram e o mundo ao redor delas mudou bastante.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Capitol
Lançamento: 8 de agosto de 2025
Crítica
Ouvimos: Deb and The Mentals – “Old news” (EP)

RESENHA: Deb and The Mentals volta às raízes em Old news: punk, grunge e new wave com peso, energia e nostalgia.
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Com uma formação nova que traz Fi (NX Zero), na guitarra, Deb and The Mentals decidiu voltar ao começo num EP de nome sintomático, Old news. Deb Babilônia adota novamente as letras em inglês nas cinco faixas do disco – e a banda corresponde com um som voltado para uma confluência entre punk, grunge e new wave. A faixa de abertura Together again une anos 1980 e 1990, soando como Ramones na fase Mondo bizarro (1992). Suck me in, com um pouco mais de peso, tem muito de bandas como Generation X. A noventista To erase vai para a pequena área do punk + metal, com peso e intensidade.
O “lado B” de Old news tem um hardcore rápido, cavalar e acelerado, Burn it down, fechado com microfonias. Tem também a música mais bonita do disco, Runaway, união de punk e rock britânico oitentista, chegando a lembrar Smiths. Dying spark, por sua vez, chama atenção pela boa marcação de baixo e bateria, e pela linha do tempo sonora que vai dos anos 1970 aos 1990.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Algohits
Lançamento: 13 de agosto de 2025
- Ouvimos: Paira – EP01 (EP)
- Ouvimos: A Terra Vai Se Tornar Um Planeta Inabitável – Ident II dades (EP)
- Ouvimos: akaStefani e Elvi – Acabou a humanidade
Crítica
Ouvimos: Klisman – “CHTC”

RESENHA: Em CHTC, Klisman transforma o Centro Histórico de Salvador em rap visceral, misturando trap, afropop e relatos de vida dura.
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CHTC, título do disco de estreia do rapper baiano Klisman, é uma sigla para “Centro Histórico tá como?” – e uma lembrança do coração de Salvador, um conjunto de pontos turísticos que explicam a história da capital baiana (Pelourinho, Elevador Lacerda, Mercado Modelo), além de um entorno de dez bairros. Klisman cresceu por lá e levou tudo para seu som, que une mumunhas do trap, e um certo elemento de perigo vindo do rap, além de erros e acertos pessoais. O som une beats de trap, afropop e vibes latinas.
Klisman fala da vida como ela se apresentou não apenas para ele, mas para vários amigos seus. Reparação histórica entra na mente dos que são tidos como vilões, em versos como “se eu roubo esse gringo é reparação histórica / visão de cria não pega na ótica” e “poucos sabem o dilema que eu vivo / do tipo: como vender drogas e ser um bom filho? / como tirar vidas e criar meu filho?”. Caminho certo cria imagens musicais para retratar um dia a dia que exige posicionamento rápido (“são escolhas que mudam o caminho de casa”), o mesmo rolando na ameaça sonora de 25kg e na sagacidade de Proibido branco. O próximo é rap lento e climático que une ódio e tiração de onda.
Para quem for ouvir CHTC, o conselho é tentar entender tudo como um filme e não sair julgando: Klisman entrega todas as contradições de quem cresceu numa realidade bem distante do que a classe média enxerga como normal – e o normal ali são leis bem estranhas. Em Praia da Preguiça, aberta com sample de violão e flautas, e Pixadão de guerra, sonhos misturam-se com alfinetadas em trappers famosos e realidades de trincheira (“a emoção de ver o alemão sangrar / é a mesma de ver o irmão prosperar”). Ainda sou o mesmo vai para vários lados da violência urbana: “quantas mãe vai ter que chorar? / ele poderia ter um Grammy / mas ele tá na boca portando uma Glock”.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 9
Gravadora: Nadamal
Lançamento: 22 de maio de 2025.
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