Connect with us

Crítica

Ouvimos: Teenage Fanclub, “Nothing lasts forever”

Published

on

Ouvimos: Teenage Fanclub, "Nothing lasts forever"
  • Nothing lasts forever é o décimo-terceiro disco da banda escocesa Teenage Fanclub. O álbum foi gravado em agosto de 2022 no Rockfield Studio, no País de Gales (com vocais e retoques finais gravados na casa de Raymond McGinley em Glasgow), e é o segundo do grupo desde a saída do baixista/vocalista Gerard Love. 
  • A atual formação tem os antigos Norman Blake (voz, guitarra), Raymond McGinley (voz, guitarra) e Francis Macdonald (bateria e vocais), presentes no grupo desde 1989, ao lado de Dave McGowan (teclados e guitarra, esteve na banda de 2004 a 2018 e voltou em 2019) e Euros Childs (teclados, programações, vocais, entrou em 2019).
  • Blake diz que o conceito do disco tem a ver com um momento da banda, e em especial com um momento dele, já que ele está totalmente recuperado do fim de seu último casamento – o término, ele diz ter inspirado bastante o disco anterior da banda, Endless arcade (2021). “Foi catártico escrever essas músicas (do disco anterior). Essas novas músicas refletem como estou me sentindo agora, saindo desse período”, diz. “Elas são bastante otimistas, há uma aceitação de uma situação e toda a experiência isso vem com essa aceitação.

Certa vez, quando foi perguntado sobre o que achava do Natal, Erasmo Carlos disse que a data lhe dava um espécie de “alegria triste”. “Diferentemente do Carnaval, que me dá uma alegria alegre”, afirmou, lembrando de quem não tem a felicidade de passar um Natal ao lado da família, ou com comida na mesa. Ou com o coração aquecido, de alguma forma.

Treze discos, algumas mudanças de formação, e uma proximidade musical tanto com o punk quanto com o bittersweet dos anos 1970, deram à banda escocesa Teenage Fanclub essa mesma aura de “alegria triste” a qual o Tremendão se referiu. Ainda que discos como Bandwagonesque (1991) unam clássicos do romantismo à moda do Big Star com uma e outra zoação juvenil, cada disco do grupo é um seleção diferente de canções sobre como somos afetados pelo mundo, pelas coisas, as pessoas que passam pela vida. E o tempo que vai levando coisas e trazendo novidades.

Se o termo “maduro” ficou um tanto vulgarizado na hora de descrever mudanças de rota no trabalho de artistas, lá vinha o Teenage Fanclub em 1991 cantando sobre talismãs, signos do zodíaco e forças desconhecidas no hit Star sign, mescla ruidosa de Wire e The Byrds (“já vi tudo antes/em um tempo essas coisas vão mudar”, cantavam eles). Um conceito que dependia, e muito, de uma visão madura – ainda que fosse preciso um enorme esforço para tanto. E é disso que trata um disco como Nothing lasts forever, o mais recente deles, cujo título já é autoexplicativo. Quem sobrou vivo da pandemia e dos descalabros dos últimos anos, sabe que “o passado é uma terra desconhecida”, como diz a letra da bela Foreign land, que abre o disco combinando ruído e melodia, e desembocando em tramas vocais como as dos Byrds/Crosby, Stills, Nash & Young. Quem superou desencontros e ruínas pessoais em meio a pandemia, idem.

O álbum novo do Teenage Fanclub é bastante reflexivo – vai numa linha um pouco diferente do meio depressivo Endless arcade (2021), o anterior, mas sem abandonar a tristeza. As letras refletem o lado pessoal da banda no pós-pandemia, com separações conjugais, recomeços e reencontros. É o disco de faixas como Tired of being alone e I left a light on, que confortam como uma lembrança antiga ou uma esperança no futuro. Ou a crônica da partida na estradeira Back to the light. Ou os sete belos minutos de I will love you, uma canção que une a descoberta de um novo amor e a passagem do tempo (“você veio até mim com o coração aberto/você não sabe o que significa para mim”). Justamente a faixa que encerra o álbum, servindo de batedor para tempos de descoberta. E um hino de tranquilidade e superação em relação ao passado.

A transformação do Teenage Fanclub em quase uma banda mainstream agridoce dos anos 1970 – diferentemente do tom mais alternativo de álbuns dos anos 1990 – denota posicionamento musical. A imagem fantasmagórica da capa do novo álbum vem como as ondas e o “abrigo seguro” da letra de Blue, de Joni Mitchell. Como muita coisa que o Teenage Fanclub lançou nos últimos anos, Nothing lasts forever é um disco que pede um entendimento especial, e mais do que tudo, um momento especial para ser ouvido.

Gravadora: Merge Records
Nota: 9

Foto: Reprodução da capa do álbum

Crítica

Ouvimos: The Weeknd, “Hurry up tomorrow”

Published

on

Ouvimos: The Weeknd, "Hurry up tomorrow"
  • Hurry up tomorrow é o sexto álbum de estúdio de The Weeknd, codinome do cantor e compositor Abel Tesfaye. O disco encerra uma trilogia em que os discos anteriores seriam a chegada ao inferno e ao purgatório – e este representaria o paraíso.
  • O álbum representa seu suposto ato final como The Weeknd, personagem considerado autodestrutivo. Não está certo ainda se ele vai usar o nome verdadeiro daqui para a frente. “Quando é o momento certo para sair, se não no seu auge? Quando você entender demais quem eu sou, então é hora de mudar”, afirmou à Variety.
  • Além do álbum, Hurry up vai gerar um filme, previsto para maio, com o próprio The Weeknd no elenco, além de atores como Jenna Ortega e Barry Keoghan

Muita gente torce o nariz para as pessoas que assistem a filmes extensos como se fossem séries. Você sabe como é: a pessoa senta na frente da TV (ou do computador) para conferir produções de três horas, como Oppenheimer e O irlandês – mas volta e meia aperta a tecla pause e vai lavar louça, atender o telefone, ver mensagens no WhatsApp, ou simplesmente interrompe o filme depois de 60 minutos e deixa o restante para os próximos dias. Em tempos de excesso de oferta no streaming, prender a atenção do público tornou-se um desafio constante – e não apenas no cinema.

Por acaso, Hurry up tomorrow, disco novo de Abel Tesfaye, cantor e compositor conhecido como The Weeknd, tem a duração de um filme. 84 minutos (tempo que Hurry up exige dos ouvintes) é pouco tempo para um longa-metragem, mas é um tempo consideravelmente grande para um álbum. Ainda mais para um álbum em que o cantor impõe poucos momentos de respiro a seus fãs. É uma duração bem menor que a de Mellon Collie and the Infinite Sadness, dos Smashing Pumpkins, disco que muita gente também considera um abuso da atenção dos fãs.

Por outro lado, vale informar que o novo de The Weeknd tem mais cara de filme ou série. Um filme ou uma série autoficcionais, em que o personagem principal flerta com o sofrimento e com a autodestruição, e em que The Weeknd recorre a samples e efeitos de som para sonorizar a morbidez, o sentimento de finitude e a procura da espiritualidade como substitutos para um amor que se mandou. Numa análise mais aprofundada, Hurry up tomorrow dá um bom protesto contra o star system e as exigências do universo pop. Boa parte do disco surgiu após a noite em que o estresse e a tensão fizeram com que ele perdesse a voz em pleno show (foi em 3 de setembro de 2022), e ele já havia anunciado que pretendia matar o nome artístico.

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.

Talvez nem seja por acaso que o álbum comece com uma referência a uma das mais ilustres vítimas do showbusiness: Wake me up é popzão no estilo de Thriller, de Michael Jackson, pegando até um pouco das referências sinistras do original. É seguida pelo pop industrial de Cry for me, que depois se torna um r&b com batidão de baile funk, emoldurando uma letra sobre pé na bunda, desprezo, ghosting e finitude. E não é coincidência que depois surja uma vinheta autoexplicativa, I can’t fucking sing (“não consigo cantar porra nenhuma”), referência à noite em que The Weeknd ficou mudo no palco. A capa do álbum, por sua vez, dá margem para dúvidas: The Weeknd pode estar suando em bicas no palco, ou no meio de uma crise de ansiedade.

Mesmo com os evidentes excessos (talvez você se pegue ouvindo em capítulos) e com a ingenuidade de alguns versos, Hurry up tomorrow é um álbum ambicioso, cinematográfico e cheio de reviravoltas. The Weeknd usa samplers das trilhas de Eraserhead (feita pelo próprio diretor David Lynch) a Scarface (de Giorgio Moroder) e, só na primeira parte do álbum, já atravessa o funk carioca na razoável São Paulo (com Anitta), flerta com o tecnopop na boa Open hearts e mergulha no pop adulto dos anos 1980 na ótima Opening night.

Um momento impactante surge no soul melancólico e gelado de Baptized in fear, onde The Weeknd narra, na primeira pessoa, um ataque de pânico seguido de morte acidental numa banheira, e insere notas de redenção pessoal (“tentando lembrar tudo que meu pastor disse/tentando consertar meus erros, meus arrependimentos preenchendo minha cabeça/todas as vezes que eu escapei da morte/não pode ser assim que termina, não”). Given up to me é uma baladinha r&b voadora, com teclados que vão içando a sonoridade. Big sleep, com os tais samples de Giorgio Moroder, é tecno oitentista.

Entre as surpresas do disco, tem a gospel Give me mercy, que antes de se tornar um synth pop modernizado, abre com um riff de teclado estranhamente progressivo. Take me back to LA é um curioso yacht rock, ou pelo menos um som nostálgico, vindo direto da mesma confluência pop + rock + synths que gerou Valerie, hit oitentista de Stevie Winwood. Já The abyss, com uma apagadinha Lana del Rey, abre no mesmo clima nostálgico e dramático-à-beça das canções dela, e ganha vários segmentos diferentes, para contar a história do abismo pessoal no qual The Weeknd se meteu após o fim de um amor, com versos que dizem tudo: “Deixe-me fechar meus olhos com dignidade/vamos acabar com tudo, o mundo não está muito atrás/então, qual o sentido de ficar?”.

Já o fim do disco traz a faixa-título, uma balada bacaninha lembrando Prince, com um réquiem pra lá de estranho na letra (“estou preparado para o fim/queime-me com sua luz/não me restam mais lutas para vencer”). O tema dos “dilemas da fama” – a solidão sob os holofotes, a ilusão do dinheiro e do sucesso, o peso de ser visto, mas não enxergado – funciona bem quando há um público verdadeiramente envolvido com a jornada emocional do artista. E The Weeknd tem essa base fiel. Hurry up tomorrow entrega tudo o que esses fãs esperam: excessos, confissões e um mergulho profundo nas sombras do artista. Ainda assim, mesmo os mais devotos vão estranhar (e muito) o tom mórbido que permeia o disco. E provavelmente muitos vão se sentir duelando com o lado cansativo de um álbum audacioso.

Nota: 7,5
Gravadora: XO Music/Republic
Lançamento: 31 de janeiro de 2025

Continue Reading

Crítica

Ouvimos: Ela Minus, “DÍA”

Published

on

Ouvimos: Ela Minus, "DÍA"
  • DÍA é o segundo álbum do Ela Minus, projeto da artista colombiana Gabriela Jimeno. O release do disco conta que DÍA é um álbum sobre “se tornar”, com canções que perguntam “para onde iremos a partir daqui, muito depois de termos sido traumatizados, mas muito antes de nos acharmos traumatizados para sempre”.
  • O álbum foi feito após uma jornada que incluiu passagens por vários lugares – incluindo uma série de apartamentos alugados e quartos de hotel pela América do Norte e Europa.
  • Jimeno contou ao New Musical Express que ao escutar as primeiras gravações que fez para o disco, descartou muita coisa, “porque eu ouvia todas essas coisas nas faixas: barulho, inseguranças e tentando obter aprovação”. Procurou fazer uma espécie de acerto de contas pessoal, em que percebeu que tinha dado pouca atenção às letras em seu primeiro álbum.

Gabriela Jimeno, a mente criativa por trás do projeto Ela Minus, vai bem além do synth pop. Formada na prestigiada Berklee, ela não apenas domina os sintetizadores, mas entende a fundo as técnicas por trás da construção de melodias e atmosferas sonoras. E não para por aí: seu talento a levou a trabalhar diretamente na fabricação de synths — chegando até a montar um especialmente para Jack White.

Se você achava possível esperar facilidades musicais da parte dela, se enganou, claro. Gabriela é mestra em contar histórias a partir do design musical, e seu repertório é repleto de partes 2, 3 e 4. Quase todas as faixas de DÍA, seu segundo álbum, ameaçam alguma coisa no começo, até que vão ganhando outras caras musicais. Abrir monte, a faixa que (por acaso) abre o álbum, inicia com barulhos que lembram o som de um LP cheio de estática. Passam-se alguns minutos e o teclado sinistro da abertura descamba num synth-blues experimental, que depois ganha uma cara quase drum’n bass.

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.

Uma tendência de DÍA é guiar o timão para o synth pop mágico – ou abrir com ele, para só então chegar a outros lugares musicais. Broken, por exemplo, vai desenvolvendo-se como uma house celestial. QQQQ tem começo ambient, ganhando aparência dançante logo depois. Já Onwards abre como um drum’n bass e torna-se uma house music selvagem e rápida, e distorcida – os sons finais têm uma cara de videogame que também surge no riff de teclado do synth pop pesado Upwards. Por sua vez, I want to be better mergulha em uma sonoridade etérea, com teclados gélidos e uma voz envolta em eco, criando uma atmosfera de puro dream pop. A faixa soa como um hino de amadurecimento, em versos sinceros como: “eu quero ser melhor/eu pensei que era melhor/mas parece que continuo agindo como uma criança”.

Por sinal, as letras em tom íntimo e pessoal, repletas de mensagens e questionamentos pessoais, são outra inclinação séria do álbum. Como em Broken, em que ela fala sobre crescimento e vulnerabilidade: “Mãe, eu fui uma tola/eu os deixei entrar/mesmo quando você disse para não ouvir/fui até o inferno e voltei rindo o caminho todo/agora estou quebrada”. O synth pop pesado de Upwards traz a frase “minha mente continua mentindo para mim” repetida várias vezes. Tudo isso reflete o processo de criação do disco, marcado por momentos de profunda reflexão durante viagens a lugares como o deserto de Mojave, na Califórnia.

Na reta final do álbum, a surpresa: Combat (“combate”) surge como um inesperado respiro, trazendo um clima leve, orientalista e quase meditativo, que em outros tempos poderia até ser classificado como new age. E assim, com suavidade e contemplação, chegam ao fim tanto o disco quanto a jornada sonora e pessoal que o inspirou.

Nota: 8,5
Gravadora: Domino Recordings
Lançamento: 17 de janeiro de 2025.

Continue Reading

Crítica

Ouvimos: Nia Nadurata, “Still living with my parents”

Published

on

Ouvimos: Nia Nadurata, "Still living with my parents"

O termo “nova promessa do (pop, rock, samba, da MPB)” não deve ser usado em vão, claro. Mas olha que Nia Nadurata, uma jovem cantora canadense, bem que merece essa definição. Ainda com poucas resenhas em sites de música pop (e menos de seis mil seguidores no Instagram, ainda), ela ainda está sendo descoberta bem aos poucos. Se você procurar bem, encontra até o perfil de Nia no Linkedin, onde ela oferece serviços de compositora por encomenda – uma fase mais antiga dela.

Still living with my parents, primeiro EP de Nia, soa quase como uma demo caprichada, com seis faixas focando na voz, no violão e no tom pop das canções – boa parte das músicas começa com a voz dela e uma base simples. Entre o folk, rock, o r&b e até um ligeiro samba-rock (a ótima Boo hoo), Nia reclama de ter tido seus looks e estilo pessoal roubados por um ex-amor (Practice), fala para alguém abrir bem o olho (I think I like your girlfriend, dream pop com ênfase no “pop”, e cordas de disco music) e chora as lembranças cagadas de um relacionamento que acabou (Souvenirs).

Em outros momentos, como Can we not!, o som dela ganha uma baita cara de pop-rock dançante dos anos 1990 – aliás quem lembra de cantoras da época, como Meredith Brooks e Natalie Imbruglia, vai encontrar em Nia uma contrapartida mais variada e juvenil do som delas. Ainda é cedo para saber até onde Nia pode chegar, mas uma coisa é certa: vale a pena ficar de olho nela desde já.

Nota: 8
Gravadora: Independente
Lançamento: 3 de janeiro de 2025.

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.

Continue Reading
Advertisement

Trending