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Crítica

Ouvimos: Ryan Adams, “Star sign”, “Heatwave”, “Sword & stone”, “Prisoners (live), “1985”

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Ouvimos: Ryan Adams, "Star sign", "Heatwave", "Sword & stone", "Prisoners (live), "1985"
  • Sword & stone, Star sign, o ao vivo Prisoners (Live), Heatwave e 1985 são os cinco primeiros discos do norte-americano Ryan Adams (lançados no mesmo dia, 1º de janeiro de 2024) lançados após uma série de álbuns que incluiu regravações de discos de Bruce Springsteen (Nebraska), Bob Dylan (Blood on the tracks) e Oasis (a regravação foi intitulada apenas Morning glory, sem o “What’s the story?”). 
  • Cada disco tem sua peculiaridade e todos foram lançados de surpresa. O pacote inclui nada menos que 77 canções.

Defender Ryan Adams, não dá para negar, é lugar de privilégio – o cantor foi bastante denunciado por abusos e assédios e admitiu ter tido atos bem bizarros com sua ex-esposa, com sua ex-noiva e com mulheres com as quais tinha relacionamento profissional. Por mais que Ryan seja um bom cantor, um compositor excelente e prolífico, e tenha uma discografia pra lá de correta, o lugar hoje é de quase-simonalização: menções à nova tetralogia do cantor surgiram nas redes sociais acompanhadas quase sempre da frase “não é aquele cara que foi acusado disso e daquilo?”.

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Quem se dispuser a passar por cima disso tudo (ou a passar pano, vá lá), vai descobrir em Sword & stone, Star sign, o ao vivo Prisoners (Live), Heatwave e 1985 cinco boas maneiras de começar 2024 – e cinco excelentes mostras de que o lugar de Adams está bem guardado na prateleira dos exóticos do pop-rock. Ou pelo menos dos que buscam o exotismo como melhor maneira de se expressar musicalmente, ainda que no fundo tudo resuma a canções. Adams é roqueiro demais para ser considerado alternativo, alternativo demais para tocar em rádios rock, o “alternativo” dele nada tem a ver com as paradas norte-americanas de rock alternativo (nas quais já surgiram hits de Goo Goo Dolls e Nickelback), seu lado punk soa estranho demais para ser colocado ao lado do “punk” feito hoje em dia. E, mais do que um músico inovador e cheio de personalidade, Adams parece mais com aquele cara que sente prazer em invadir um espaço e não agir como os frequentadores agiriam – um comportamento que pode render ofensas, chacota ou desprezo.

Os discos mostram lados diferentes da história de Adams, desde o começo, Dos cinco discos, o menos interessante é o ao vivo Prisoners, trazendo versões ao vivo do material do disco Prisoner, de 2017. Star sign é o mais voltado para o country rock, e para a construção de canções introspectivas – Speeding car se localiza entre REM e Teenage Fanclub, Tomorrow never comes tem uma onda meio anos 1980, meio Neil Young, Darkness leva melancolia e escuridão ao dia a dia da Califórnia. Heatwave e Sword and stone soam como um disco duplo, apontando para rock clássico, punk-glam, power pop solar, e sons herdados tanto de Byrds quanto de Smiths (como em Mercy), ou de uma mescla de Badfinger e Nirvana (Angel).

1985, o melhor da leva, é o lado punk de Adams, com 35 minutos divididos em 29 (!) faixas curtas, algumas de 20 segundos. O critério parecer ter sido focar na criação de canções, ainda que tenham menos de um minuto – há pouca encheção de linguiça, não há vinhetas apenas barulhentas ou desnecessárias, as referências são Hüsker Dü, Black Flag, Wire e até o começo do Cure. É o disco no qual Ryan detalha os tropeços, trevas, fantasmas e depressões dos últimos anos, em músicas como Dark places, Waste of time, Lose control, What the fuck e outras. Retoma uma velha mania do cantor, a de lançar discos com títulos trazendo anos da década de 80 (já houve um EP de hardcore chamado 1984 e uma regravação audaciosa faixa por faixa do 1989 de Taylor Swift) e parece mergulhar em sombras que já estão aí há bastante tempo. Soa também como aquelas pessoas que invadem redes sociais fazendo comentários desconfortáveis e encerram o post com um inocente #pas. Um abraço no caos que talvez tenha trazido serenidade ao não lá muito sereno Ryan Adams.

Nota: 8,5 (conjunto da obra)
Gravadora: PAX AM

Foto: Capa do álbum 1985

Crítica

Ouvimos: Bad Bunny, “Debí tirar más fotos”

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Benito Antonio Martinez Ocasio, o popular Bad Bunny, não veio ao mundo pop a passeio. Debí tirar más fotos, seu novo disco, é um passeio pela musicalidade e pela identidade portorriquenhas – e esfrega na cara do mercado fonográfico que ele não tem nenhuma vontade de soar mais “americano” (estadunidense, enfim) para bombar nas paradas.

Já era uma prerrogativa de Bad Bunny desde os primeiros tempos, até porque ele é um dos nomes mais conhecidos do rap de idioma hispânico, mas Debí, mergulhado no reggaeton e em sons caribenhos, é um disco de memórias e sensações. Nuevayol, uma referência à pronúncia hispânica de “Nova York”, traz BB requerendo sua posição de rei do pop, e homenageando a comunidade latina que vive na megalópole. Baile inolvidable, que parece uma trilha sonora, cita as diversões calientes de Porto Rico e traz alunos da Escuela Libre de Música Ernesto Ramos Antonini, de San Juan, tocando salsa. Weltita tem cara de samba-rap e narra uma proposta de date praiano, com as falas do homem (Bunny) e da mulher (Lóren, da banda portorriquenha Chuwi) na história.

Com duração de mais de uma hora, Debí soa irregular em alguns momentos, mas compensa no storytelling (cabendo momentos em que o discurso de Bad Bunny é interrompido para uma mudança rítmica ou a entrada de uma gravação) e na variedade. E em especial no lado mobilizado, definido pelo próprio Bad Bunny como sendo “uma carta a Porto Rico”. A bebaça e doidaralhaça Cafe com ron é pura variação rítmica, cabendo pelo menos três estilos caribenhos, e no fim, um house cubano.

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La mudanza é orgulho portorriquenho purinho (“fala pra ele que essa é a minha casa, onde nasceu minha avó/daqui ninguém me tira, eu não saio daqui”), com letra falada no início e destaque para a percussão (que ganha alguns segundos só dela no final). Lo que le paso a Hawaii é som marolado e cigano, com vocal grave, e letra pregando que não quer que Porto Rico torne-se mais dominada ainda pelos Estados Unidos. A romântica e praguejadora Bokete (que traz encartado na letra um protesto bizarríssimo contra os buracos nas ruas de Porto Rico) abre em clima meio psicodélico, graças a uma gravação de guitarra ao contrário, como num sampling invertido. Não falta diversão em Debi tirar más fotos, e não falta raiz musical.

No lado mais descontraído e menos mobilizado das letras, Debí é um disco que aponta para dois lados, er, complementares. Ou Bad Bunny encarna o fodão que apronta todas nas boates e ganha as gatas, ou ele está chorando pelos cantos – geralmente de arrependimento por alguma merda que fez. El club abre em clima de trap, falando de boates, mulherada, drogas, bebedeira, até que… “mas o que minha ex está fazendo?’. “Os caras acham que estou feliz/mas não, estou morto por dentro/a discoteca está cheia e ao mesmo tempo, vazia/porque meu bebê não está lá”, choraminga.

Se você acha que parou por aí, tem mais. Pitorro de coco, repleta de violões ciganos (e cujo título faz referência a um drinque popular em Porto Rico), é dor de corno etílica das boas. Turista, cheia de cordas e sons acústicos, é… Bom, haja sofrimento: “na minha vida você era turista/você só viu o melhor de mim e não o que eu sofri/você foi embora sem saber o motivo das minhas feridas” – embora o rapper esclareça que a letra fala também dos turistas que vão à Porto Rico e saem de lá sem conhecer os problemas locais. E tem a quase faixa-título, DTMF, um reggaeton que vira algo parecido com funk carioca logo depois, e que traz Bad Bunny chorando pitangas pelo leite derramado (é a do verso-meme “devia ter tirado mais fotos quando tinha você/devia ter te dado mais beijos e abraços quando pude”).

Nota: 8,5
Gravadora: Rimas.|
Lançamento: 5 de janeiro de 2025.

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Crítica

Ouvimos: Astrid Sonne, “Great doubt”

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Ouvimos: Astrid Sonne, “Great doubt”
  • Great doubt é o terceiro LP da cantora dinamarquesa Astrid Sonne. Todas as músicas foram compostas e produzidas por ela. Astrid tem formação clássica e toca viola, mas migrou para o reino da composição pop.
  • “As letras do álbum são esparsas, apenas destacando diferentes cenas ou estados emocionais do ser, deixando a música preencher as lacunas. No entanto, elas também formam um padrão de ambiguidade, consolidado pelo título do álbum, buscando respostas por meio da observação de como e o que você está perguntando, perguntas para o mundo, perguntas de amor”, diz o release do disco.

Great doubt é um disco de art pop, ponto. Se a gente for pensar num som experimental, e próximo do rock, Astrid Sonne segue a linha de grandes nomes como Brian Eno e Robert Fripp — artistas que misturavam música clássica, ambient, pop experimental, psicodelia e uma boa dose de experimentação sonora. É essa vibe que Astrid traz para o disco, conduzindo o ouvinte por diferentes atmosferas a cada música. Logo na abertura, com Light and heavy, ela combina flauta e cordas de forma hipnotizante.

O título da faixa não é por acaso: Astrid busca criar uma sensação de peso em sons que, à primeira vista, parecem flutuar. É o que acontece em Do you wanna, que começa com uma vibe eletrônica de rock e logo se transforma em um progressivo de piano e cordas. A mesma energia aparece em Give my all, com suas batidas r&b e o piano suave, e em Almost, que abre com sons de koto japonês e segue para um lugar espacial e romântico. Como cantora, Astrid tem um tom quase jazzístico, sempre introspectivo e sempre intenso, especialmente em faixas como Almost e na letra de Do you wanna?, que toca num tema bastante delicado de forma bem direta (“Você quer ter um bebê?/realmente não sei”, ela questiona e ela responde).

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Alguns momentos do álbum têm aquele toque “eletrônico” de décadas passadas. Staying here, por exemplo, tem um clima progressivo, quase como uma releitura do pop dos anos 70, e termina com uma pegada psicodélica. Everything is unreal lembra o Kraftwerk, mas com um toque mais orgânico — começa com uma batida sombria e segue com uma letra falada, até se transformar numa mistura de cordas e ritmos quase orientais. Boost, por sua vez, começa com uma onda de synths, bem misteriosa, e depois mergulha num r&b experimental, com um interlúdio ambient no meio.

No final, duas surpresas: Overture começa com um riff de violão bem acústico, e quando as cordas entram, lembra uma orquestra se aquecendo antes do show começar. E para fechar o disco, Say you love me traz uma mistura de jazz, bossa nova e dub, em tom levemente psicodélico.

Nota: 8
Gravadora: Escho
Lançamento: 26 de janeiro de 2024.

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Crítica

Ouvimos: Meat In Space, “Tangerine” (EP)

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Ouvimos: Meat In Space, “Tangerine” (EP)

O garage rock espacial dessa banda norte-americana deixa qualquer um feliz. Na verdade o Meat In Space é um projeto musical de um cara só – e o cara em questão é Shawn Stedman, um músico da Bay Area de San Francisco, que toca de tudo, e cujo leque de influências vai de Nirvana a Ty Segall, passando por grupos neo psicodélicos. “O EP de estreia, Tangerine, é um marco significativo para o Meat in Space, com todas as faixas gravadas em fita analógica, culminando em uma experiência sonora nostálgica e autêntica”, conta ele.

Tangerine começa logo com a faixa título – uma sujeira de garagem com vocais quase falados, lembrando realmente Kurt Cobain, ou Iggy Pop. A letra tem versos como “não importa de verdade/não importa de verdade em que planeta você está/adivinhe com limão/libere o veneno” (?). Chromium dioxide começa tão distorcida quanto uma canção do The Jesus and Mary Chain, e prossegue como um power pop aterrador e espacial, com letra fazendo referência à crueza da gravação em fita K7. Ruby tourmaline é uma canção folk sessentista, com balanço funkeado e quase cigano, lembrando bandas como Pretty Things ou até mesmo o Pink Floyd do final dos anos 1960 (a fase imediatamente pós-saída de Syd Barrett).

No final do disco, a viagem folk e distorcida, simultaneamente, da vinheta Hyperion harm. E o peso punk, quase em clima de interferência sonora, de Call the coroner. Vale adotar essa banda.

Nota: 8,5
Gravadora: Psychic Tooth Records
Lançamento: 7 de dezembro de 2024

  • E esse foi um som que chegou até o Pop Fantasma pelo nosso perfil no Groover – mande o seu som por lá!
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