Crítica
Ouvimos: Maximo Park, “Stream of life”

- Stream of life é o oitavo disco da banda britânica de indie rock Maximo Park, que tem hoje em sua formação Paul Smith (vocais), Duncan Lloyd (guitarra, piano, bacing vocals) e Tom English (bateria). Ben Allen e Burke Reid produziram o álbum.
- O nome do álbum foi criado por Paul Smith, inspirado no livro Água viva, de Clarice Lispector. “Ele foi inspirado tanto por seu estilo de fluxo de consciência quanto pela forma como promove a reflexão sobre os mecanismos internos da mente das pessoas. Levanta a questão do por que elas fazem o que fazem, mesmo quando pode parecer contra-intuitivo para o observador externo. Existe um fluxo interno em cada indivíduo – um fluxo de vida”, diz o texto de lançamento.
- “Sempre tentamos documentar o mundo ao nosso redor em cada fase de nossas vidas, enquanto sutilmente avançamos a música a cada vez – este álbum continua essa missão. Foi ótimo estar de volta ao estúdio após gravar remotamente na última vez. Trabalhar com Ben em Atlanta, e Burke em Byker, foi tão estimulante quanto sempre foi, e acho que capturamos essa energia. Tematicamente, o álbum aborda paixão, política e privilégio, entre outros tópicos”, diz Smith.
Tem algo no Maximo Park que lembra seriamente uma época perdida no coração e na mente de cada fã de rock dos anos 1980 – ainda que o grupo britânico tenha se juntado no enigmático ano 2000. Basicamente o som do trio tem a ver com uma época em que tinha-se certeza de que ia surgir de algum canto obscuro (geralmente da Inglaterra) aquela banda cuja melodia batia com o que você sentia, e cujas letras falavam apenas sobre o que realmente fazia sentido. Aquela coisa da “sua” banda – que não deixava de ser sua nem mesmo que os discos vendessem milhões de cópias.
O Maximo Park vem atravessando suas duas décadas e uns quebrados de existência dessa forma – num universo indie em que surge uma mania a cada hora, e fãs de rock passam mais tempo decretando a morte do estilo do que conhecendo bandas novas, os oito discos deles ainda são belezas a serem descobertas por muita gente. O grupo de Paul Smith foi se reinventando a partir de letras políticas, arranjos mais eletrônicos (em momentos do disco Too much information, de 2017), mas manteve o cuidado com as melodias e a atenção para o que parece realmente importar, em termos de letras. Tanto que Stream of life faz o Maximo Park voltar trilhado num corredor existencialista e repleto de questionamentos sobre vida e dia a dia.
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Esse universo surge em músicas cantaroláveis e esperançosas como Favourite songs (“diga-me suas canções favoritas/eu te contarei as minhas e vamos cantar juntos”) e The end can be as good as the start – essa, dos versos espertinhos “na galeria você disse: ‘casa comigo?’/esqueça o patriarcado/e eu disse: ‘ei, não é romântico’/exceto pelo até que a morte nos separe (…)/mas o fim pode ser tão bom quanto o começo”. Um lado acústico, mais melancólico, aparece em Armchair view e na faixa-título, aquela inspirada num conto de Clarice Lispector (e igualmente inspirada numa mescla de R.E.M. e Prefab Sprout).
Mas o principal do Maximo Park são canções fundamentadas em riffs e melodias simples, que aludem tanto ao rock britânico dos anos 1980 quanto ao dos anos 1960, ou a banda como R.E.M.. É o que rola no power pop Quiz show clue, na emocionada I knew that you’d say that, e na contagiante Doppelganger eyes. De surpreender, são os vocais da convidada Vanessa Briscoe Hay, cantora da veterana banda pós-punk norte-americana Pylon, na pegajosa e celestial Dormant ‘til explosion. E a certeza de que o lugar do Maximo Park é, com louvor, na mesma gaveta de lembranças onde moram bandas como The La’s, The Church (esta, ainda na ativa e com um disco novo lançado neste ano), XTC, The Sundays e outros grupos dos quais sempre haverá alguém recordando.
Nota: 9
Gravadora: Lower Third
Crítica
Ouvimos: Home Is Where – “Hunting season”

RESENHA: No segundo disco, Hunting season, o Home Is Where troca o emo por um alt-country estranho e criativo, misturando Dylan, screamo e folk-punk em faixas imprevisíveis.
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O Home Is Where é uma banda emo – mas no segundo disco, Hunting season, eles decidiram que estava na hora de mudar tudo, ou quase tudo. O grupo volta fazendo um alt-country pra lá de esquisito, com referências que vão de Bob Dylan a Flying Burrito Brothers. Sendo que a ideia de Bea McDonald (voz, guitarra) parece inusitada demais para ser explicada em poucas palavras (“um disco que dá para ouvir num churrasco, mas que também dá para chorar”, disse).
Com essa migração sonora pouco usual, o Home Is Where se tornou algo entre Pixies, Sonic Youth, Neil Young e Cameron Winter, com vocal empostado lembrando um som entre Black Francis e Redson (Cólera). Reptile house é pós-punk folk, Migration patterns é blues-noise-rock, Artificial grass tem vibe ligeiramente funkeada e é o tipo de música que uma banda como Arctic Monkeys transformaria num hit – mas é mais esparsa, mais indie, e os vocais chegam perto do screamo.
Hunting season tem poucas coisas que são confusas demais para serem consideradas apenas inovadoras ou experimentais – Bike week, por exemplo, parece uma demo dos Smashing Pumpkins da época de Siamese dream (1993). Funcionando em perfeta união, tem o slacker rock country de Black metal mormon, o folk punk de Stand up special e uma balada country nostálgica com vibe ruidosa, a ótima Mechanical bull. Os melhores vocais do álbum estão na balada desolada Everyone won the lotto, enquanto Roll tide, mesmo assustando pela duração enorme (dez minutos!), vale bastante a ouvida.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7
Gravadora: Wax Bodega
Lançamento: 23 de maio de 2025.
Crítica
Ouvimos: Satanique Samba Trio – “Cursed brazilian beats Vol. 1” (EP)

RESENHA: Satanique Samba Trio mistura guitarrada, lambada, carimbó e jazz experimental em Cursed brazilian beats Vol. 1
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Como o Brasil insiste em não ouvir o Satanique Samba Trio, vale dizer que a banda brasiliense não é um trio e o som vai bem além do samba – é puramente jazz unido a ritmos brasileiros variados, com ambientação experimental e (só às vezes) sombria. O novo disco é Cursed brazilian beats vol. 1 – que apesar do nome, é o segundo lançamento de uma trilogia (em português: Batidas brasileiras amaldiçoadas).
Dessa vez, a banda caiu para cima de ritmos do Norte, como guitarrada, lambada e carimbó, transformando tudo em música instrumental brasileira ruidosa. O grupo faz lambada de videogame em Lambaphomet, faz som regional punk em Brazilian modulok e Sacrificial lambada, e um carimbó que parece ter sido feito pelos Residents em Azucrins. Já Tainted tropicana, ágil como um tema de telejornal, responde pelo lado “normal” do disco.
A surpresa é a presença, pela primeira vez, de uma música cantada num disco do SST: Aracnotobias tem letra e voz de Negro Leo – talvez por isso, é a faixa do grupo que mais soa próxima dos experimentalismos do selo carioca QTV.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Rebel Up Records
Lançamento: 21 de março de 2025.
Leia também:
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- Ouvimos: Negro Leo, Rela
- Ouvimos: Residents, Doctor Dark
- Relembrando: The Residents, Meet The Residents (1974)
Crítica
Ouvimos: Mugune – “Lua menor” (EP)

RESENHA: O Mugune faz psicodelia experimental e introspectiva no EP Lua menor, entre Mutantes e King Gizzard.
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Trio introspectivo musicalmente vindo da cidade de Torres (RS), o Mugune é uma banda experimental, psicodélica, com design musical esparso e “derretido”. O EP Lua menor abre com a balada psicodélica Capim limão, faixa de silêncios e sons, como se a música viesse lá de longe – teclados vão surgindo quase como um efeito, circulando sobre a música. Duna maior é uma espécie de valsa chill out, com clima fluido sobre o qual aparecem guitarras, baixo e bateria.
A segunda metade do EP surge em clima sessentista, lembrando Mutantes em Lua, e partindo para uma MPB experimental, com algo de dissonante na melodia, em Coração martelo – música em que guitarras e efeitos parecem surgir para confundir o ouvinte, com emanações também de bandas retrô-modernas como King Gizzard & The Lizard Wizard.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 17 de abril de 2025.
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