Crítica
Ouvimos: Godspeed You! Black Emperor, “NO TITLE AS OF 13 FEBRUARY 2024 28.340 DEAD”

- NO TITLE AS OF 13 FEBRUARY 2024 28.340 DEAD é o oitavo álbum de estúdio da banda canadense de post rock Godspeed You! Black Emperor, cuja formação atual tem dez integrantes oficiais – incluindo dois integrantes responsáveis por projeções em 16mm nos shows.
- O título do álbum refere-se ao número relatado de mortes de palestinos por ataques israelenses entre 7 de outubro de 2023 e 13 de fevereiro de 2024 durante a invasão israelense de Gaza – números fornecidos pelo Ministério da Saúde de Gaza.
- “Sem título = Quais gestos fazem sentido enquanto pequenos corpos caem? Qual contexto? Que melodia quebrada? E então uma contagem e uma data para marcar um ponto na linha, o processo negativo, a pilha crescente”, afirmou a banda a respeito do nome do álbum.
Experimental a ponto de incluir em sua formação integrantes responsáveis por projeções de filmes nos shows – sem falar nos nomes enigmáticos dos seus álbuns – o Godspeed You! Black Emperor é bastante direto em seu novo disco, a partir do título SEM TÍTULO ATÉ 13 DE FEVEREIRO DE 2024 28.340 MORTOS. O repertório soa como o design musical dos resultados da guerra, com instrumentais melancólicos, paredes e rajadas sonoras, sons que vão surgindo devagar como uma visão desfocada que você demora até perceber do que se trata. Por conta disso, a musicalidade do Black Emperor nunca soou tão imagética, como se uma música valesse mais do que mil fotografias.
Fica estranho falar em “disco acessível” no caso de uma banda de post-rock, mas NO TITLE merece a denominação por ser mais um documento do que um álbum simples. O grupo já lançou discos em que parecia estar querendo soar como um passo além do Pink Floyd de discos como A saucerful of secrets (1968). No álbum novo, tudo parece equilibrado entre ruído, imagem musical, alguns progressivismos, sons orquestrais e sons aterrorizantes.
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A faixa que dá mais sensação de terror desnorteante é Pale spectator takes photographs, onze minutos que abrem com barulhos semelhantes aos de músicos clássicos afinando seus instrumentos, prosseguem com notas de guitarra, riffs de baixo e percussões, e crescem até o final “progressivo” – algo que lembra um King Crimson returbinado no século 21. No mesmo estilo, vem a sensação de paz e de horror de Baby’s in a thundercloud.
Tons musicais que lembram terras arrasadas e a descoberta de que há muito por reconstruir no mundo aparecem nas ondas sonoras de Sun is a hole sun is vapors, Raindrops cast in lead e o ambient curto Broken spires are dead kapital. Já Grey rubble – Green shots encerra o disco como se todo o filme musical de NO TITLE fosse repassado na cara do ouvinte.
Nota: 8,5
Gravadora: Constellation
Crítica
Ouvimos: The Wants – “Bastard”

RESENHA: Cinco anos após o debut, o The Wants lança Bastard: um pós-punk sombrio, eletrônico e emocional, marcado por perdas e uma vibe densa e melancólica.
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Trio de Nova York, o The Wants uniu design musical pós-punk e amor pelas criações ruidosas em seu disco de estreia, Container (2020). Cinco anos depois, sai o segundo álbum, Bastard, mais equilibrado na dicotomia barulho-melodia. Madison Velding-VanDam, Jason Gates e Yasmeen Night não apresentam nada tão perfeitamente audível quanto o quase-hit Fear my society, single do primeiro álbum – até hoje a melhor faixa da banda. Mas o disco novo tem alma e sombra, e se alimenta de ambas.
Bastard não tem um DNA feliz. Madison, o vocalista, viu seu pai morrer no finalzinho dos trabalhos em Container – ele partiu após vários anos de abusos com drogas e álcool. Assim que Container saiu, veio a pandemia, e todo o trabalho imaginado para o debute foi por água abaixo. As tais sombras tomam conta de todo o repertório do novo álbum, margeando o lado deprê de New Order e Depeche Mode em Void meets concrete, lembrando o Joy Division do começo (só que mais eletrônico e arrumadinho) em Data tumor, e partindo para o clima tribal e meio psicodélico de bandas como Siouxsie and The Banshees e Killing Joke em 87 gas.
- Temos episódios sobre New Order, Depeche Mode, Sparks e Japan em nosso podcast.
Até ai você já percebeu que The Wants voltou com a cara do pós-punk na época em que o estilo se esforçava para parecer mais insociável. A onda continua firme e forte no som deprê e gélido de Disposable man (lembrando The sound e Killing Joke, com silêncios nos vocais e intervalos nos riffs de guitarra), na vibe afro-punk de All comes at once – com sons rangendo no fim – e no quase post-rock de Too tight. Já Feelin alright concentra todo o desnorteio do disco, enquanto Explosions abre quase zoeira, com synth lembrando Sparks e Japan – até fazer jus ao título aos poucos.
No meio de Bastard, uma música que pode apontar um outro caminho para o grupo é a balada sombria Cruel – uma canção triste e em tom ambient, como se descrevesse um cenário de solidão. E que reforça a ideia de que o novo álbum do The Wants é um mergulho sem volta nas dores que o mundo real insiste em não calar.
Texto: Ricardo Schott.
Nota: 9
Gravadora: STTT
Lançamento: 13 de junho de 2025.
Crítica
Ouvimos: Pip Blom – “Grip” (EP)

RESENHA: O EP Grip, do trio holandês Pip Blom, aposta no punk eletrônico e synth pop lo-fi, com letras confessionais e beats dançantes à la anos 1990.
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Trio holandês que começou brilhando no indie rock, o Pip Blom – batizado com o nome de sua vocalista e baixista – já vinha se aproximando do synthpop, por um viés mais independente, em lançamentos anteriores. Welcome break (2021), o segundo álbum, era puramente marcado por essa sonoridade. Grip, um EP de entressafra, traz Pip, Tender Blom e Darek Mercks lidando com punk eletrônico e bedroom pop – aliás, o disco foi realmente gravado num estúdio caseiro.
Essa combinação de dança e sujeira marca ponto em Temporary love, faixa de abertura – som eletrônico, marcado por programações intermitentes, com riff saturado e teclados cintilantes. Também surge em Upside down, eletrorock com cara de anos 1990 e som quase de videogame em algumas passagens. Já Drift ameaça um reggaezinho eletrônico no estilo de All that she wants, do Ace Of Base (!), mas com texturas a mais e climaa hipnotizante.
Partindo para o fim, tem a house music sinuosa, com efeitos de guitarra e clima igualmente anos 1990, de Ring. E o rock eletrônico de seis minutos de Someday, com ecos dos Cardigans do álbum Gran turismo (1988). Já as letras continuam confessionais e ganham um clima mais melodramático em Ring, que fala sobre amor obsessivo – e tem lá um “hitting me”, no sentido de “me telefone, faça contato comigo”, que faz vir logo à mente Baby hit me one more time, da Britney Spears.
Já Upside down fala sobre relacionamentos tóxicos. Temporary love, idem – só que do estranho ponto de vista de alguém que não se incomoda com os abusos: “ele quer ver o mundo, ele foi embora sem mim / por favor, me dê mais uma noite (…) / eu quero ver o mundo de dentro do seu bolso”. Eita.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 11 de junho de 2025.
Crítica
Ouvimos: Spiderman Pterodactyl – “Shore leaves” (EP)

RESENHA: Spiderman Pterodactyl, no EP Shore leaves, mistura pós-punk e ambient com elegância dark e vocais à la Bryan Ferry.
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Vindo do Canadá, o Spiderman Pterodactyl já está quarto EP (dois deles são de remixes). E em Shore leaves, novo lançamento, faz pós-punk com tom dark e esparso – não chega a ser darkwave, por habitar sombras bem menos intensas que as visitadas pelas bandas desse estilo.
Na primeira parte do EP, Drive safe tem certo balanço na bateria, além de uma mistura de elegância e tristeza que mistura Joy Division e Roxy Music. Go away, na sequência, tem clima de psicodelia fúnebre, com ruídos e batida seca. Já The item soa como um dia que vai levantando devagar, entre efeitos, programações e guitarras – ganhando clima urbano e contemplativo depois.
Na segunda metade do disco, o eletro-rock leve e marítimo de Les marées grises – com vocais quase falados, em francês – seguido pelo ambient desértico de Acjhab e pelo clima belo, gelado e imagético, com guitarra slide e teclados, de The whale. Destaque para os vocais de Antoine Cathala, repletos de ambiência, e com uma vibe que lembra discretamente a de Bryan Ferry.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 23 de maio de 2025.
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