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Cultura Pop

Ariel Pink, em homenagem a Bobby Jameson

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Ariel Pinnk (E) e Bobby Jameson (D)

Nome recente da psicodelia, o americano Ariel Marcus Rosemberg, mais conhecido como Ariel Pink, é associado com um estilo que a revista Wire classificou como hypnagogic pop. São artistas que morrem de saudades de técnicas de gravação antiga, ou de fitas VHS, ou fitas K7, e que levam esse sentimento para o seu trabalho, seja na música que produzem ou no formato que utilizam. Ariel está lançando seu 16º disco, Dedicated to Bobby Jameson. Se você ainda não escutou, prepare-se para tomar contato com mais um candidato forte a “disco do ano”, graças a músicas como Feels like heaven, que você ouve aí embaixo. O clipe dela, muito legal, parece mais uma produção em vídeo dos anos 1980, olha só.

O novo álbum de Ariel é o primeiro dele pelo selo Mexican Summer, especializado em edições turbinadíssimas em LP (com vinil colorido, capas triplas, etc). E no título do novo disco, Ariel homenageia um sujeito cuja trajetória errante quase passou despercebida pelos historiadores do rock. Morto em 2015 de aneurisma, aos 70 anos, o americano Bobby Jameson deixara a música em 1985 quando tinha vinte anos de uma carreira que incluiu discos secretos, gravações nunca divulgadas e fracassos retumbantes. Morou nas ruas, teve envolvimento pesadíssimo com álcool e drogas, foi internado em hospitais psiquiátricos e foi dado como morto até por amigos próximos. Na década passada foi redescoberto, montou um blog e abriu um canal no YouTube.

Só para se ter uma ideia do quanto Jameson padeceu, seguem dois casos bastante bizarros da vida dele.

Em 1965, Jameson foi contratado por um selo chamado Surrey para compor todas as músicas de um disco chamado Songs of protest and anti-protest. Jameson era então um garotão de 20 anos que tinha alguns compactos gravados por selos pequenos (um deles com uma composição inédita de Mick Jagger e Keith Richards). Basicamente, ele deveria escrever as canções a partir de títulos já definidos, porque as capas já estavam impressas. E o LP sairia creditado a um cantor inexistente chamado Chris Lucey.

E por que isso? Porque a Surrey contratara um cara chamado Chris Ducey, sem saber que ele ainda tinha contrato com outra gravadora. A solução de jerico que o selo arrumou foi cortar um pedaço do “D” de Ducey, colocar uma foto de Brian Jones, dos Rolling Stones (!), na capa e chamar Jameson para preencher o conteúdo. Duro, desesperado para gravar e sem empresário, Bobby topou, gravou tudo e não recebeu nada pelo trabalho. Songs… pegou poeira nas lojas, foi redescoberto quando saiu Forever changes, do Love, em 1967 (fãs e críticos comparavam tanto os dois discos que rolou certa curiosidade). E saiu em CD em 2002. Está no Spotify.

O outro caso: em 1967, abandonado pela namorada Gail Sloatman, que o trocou pelo iniciante Frank Zappa (com quem ela se casaria), Bobby Jameson acabou trabalhando com Zappa. E foi levado por ele para a gravadora Verve, naquela mesma leva em que foram contratados Mothers Of Invention e Velvet Underground. Seu segundo disco, Color him in, saiu pelo selo, mas igualmente não teve repercussão alguma e não fez dinheiro algum para Jameson, que àquela altura mal tinha um contrato de gravação com o selo. Até morrer, o cantor reclamou que a mixagem estragou o disco. O músico saiu da Verve depois de um LP e alguns singles gravados. Color him in saiu em CD. Essa é Do you believe in yesterday.

Nessa mesma época, Bobby Jameson teve uma aparição de destaque num filme independente chamado Mondo Hollywood, dirigido por Robert Carl Cohen e que era “um guia psicodélico para Hollywood”. Bobby entrava numa festa chique tocando sua canção Metropolitan man. Foi durante essa produção que Frank Zappa e Gail (que aparece em 1:00, no trecho abaixo do filme) se apaixonaram.

https://www.youtube.com/watch?v=JTqq7-geUEI

As histórias e a música de Bobby Jameson foram as inspirações de Ariel Pink na preparação de Dedicated to Bobby Jameson. O cantor se identifica, de certa forma, com a trajetória errática de Bobby. Ao começar sua carreira musical, Pink soltou muito material gravado e lançado por conta própria, já tendo toda certeza de que não iria ganhar nada com aquilo. Afinal, como era ter a liberdade de lançar o próprio material a hora que quisesse, trabalhar da maneira que queria e não ter muita ideia de como faria para monetizar o próprio trabalho?

“Eu estava disposto a fazer minhas gravações e liberá-las de graça. Estava muito grato por alguém ter prestado atenção em mim, então eu agia da seguinte forma: ‘Aqui, escute meu som!’. Mas agora, isso não é o meu trabalho. Mantenho as minhas gravações como se elas fossem reféns. Não quero lançá-las, é a responsabilidade de uma outra pessoa fazer ese tipo de coisa. Se elas nunca saírem, melhor, então”, disse o Ariel Pink à Spin, em entrevista de lançamento de Dedicated to Bobby Jameson.

Bobby Jameson morreu bastante infeliz com todo o seu passado na música – um de seus últimos posts em seu blog trazia um texto tristíssimo, em que o compositor dizia ter passado “a maior parte” dos seus 70 anos chorando. Ariel mostra na entrevista que deu a Spin estar mais feliz e realizado com o que vem fazendo, embora tenha certas dúvidas se a trabalheira toda que teve valeu a pena. Seja como for, é a hora de você parar tudo e descobrir um álbum que pode se tornar um de seus discos preferidos. Pega Dedicated to Bobby Jameson aí. De nada 🙂

Leia mais sobre Frank Zappa aqui e sobre psicodelia aqui

Crítica

Ouvimos: Faust, “Blickwinkel” (curated by Zappi Diermaier)

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Ouvimos: Faust, "Blickwinkel" (curated by Zappi Diermaier)

Se você está procurando uma música indecente para assustar vizinhos e atazanar transeuntes, esqueça qualquer grupo de heavy metal ou de punk, e tente a banda alemã Faust. Artífices do krautrock – o rock experimental alemão, parente tanto do punk quanto do rock progressivo – eles começaram em 1971, e desde o começo, fizeram carreira na experimentação, na dissonância, nas microfonias e nos efeitos de estúdio. Tanto que Werner “Zappi” Diermaier, Hans Joachim Irmler, Arnulf Meifert, Jean-Hervé Péron, Rudolf Sosna e Gunther Wüsthoff (a primeira formação do grupo) fizeram questão de agregar um engenheiro de som exclusivo, Kurt Graupner.

O curioso a respeito do Faust é que as origens da banda são até bem (vá lá) comerciais, já que o grupo tinha um criador, produtor e mentor. Era o jornalista e crítico musical Uwe Nettelbeck, que havia sido procurado pela Polydor alemã com uma proposta tentadora: criar uma banda “underground” que poderia ser a resposta do país aos Beatles e Rolling Stones.

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Uwe, digamos, entendeu mais ou menos bem a proposta: reuniu duas bandas alemãs em uma e montou o Faust, que levou para a gravadora. Convencer a empresa de que aquela banda numerosa e “difícil” seria a sensação do ano deve ter sido até fácil. Difícil foi convencer o público a ouvir um grupo tão maluco e experimental, inspirado por jazz e música concreta. Afinal se tratava de um grupo que no terceiro disco, The Faust tapes (lançado em 1973 pela Virgin, quando a própria Polydor já havia desistido), apresentava só duas longas músicas sem título, divididas em pequenos segmentos com ruídos, microfonias e gravações caseiras.

O Faust existiu até 1975, se reagrupou durante os anos 1980 para poucas apresentações e retornou nos anos 1990 com três integrantes originais. Fizeram até uma primeira tour pelos EUA em 1994. De lá para cá, dá para dizer que a banda nunca mais parou, com direito a uma vinda ao Brasil em 2011. Em 2022, saiu Punkt, disco “perdido” deles gravado em 1974, e que havia sido recusado pela Virgin. Agora é a vez de Blickwinkel, álbum que marca uma fase em que a banda tem curadoria do fundador Zappi Diermaier, com a presença de uma turma animada de músicos (um deles, o também fundador Gunther Wüsthoff).

O grupo que ajudou a fundamentar a estética motorik (batidas intermitentes e quase robóticas), copiada pelo pós-punk todo, volta disposto a criar cenários fantasmagóricos e psicodélicos, em sete longas faixas instrumentais que chegam a parecer surrealistas – uma delas, basicamente uma música de violão, percussão e ruídos, se chama Sunny night (“noite ensolarada”). For schlaghammer, na abertura, parece uma música de perseguição, criada por percussões que lembram passos, sintetizadores e ruídos metálicos.

Künstliche intelligenz lembra um pouco a fase A saucerful of secrets, do Pink Floyd (1968), e tem um ar meio Syd Barrett em alguns momentos. Kriminelle kur é progressivo funkeado e distorcido na onda do King Crimson, e é a faixa do disco que mais se aproxima da noção de “rock instrumental”. No final, o ruído inconformista, perturbador e heavy de Die 5 revolution, e o batidão aterrorizante de Kratie.

É música, literalmente, feita para incomodar.

Nota: 9
Gravadora: Bureau B

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Cultura Pop

No nosso podcast, a época em que o Killing Joke revolucionou o pós-punk

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No nosso podcast, a época em que o Killing Joke revolucionou o pós-punk

Drogas, caos, peso, ocultismo, iluminação espiritual e paixão pela violência e pelo proibido marcaram a carreira do Killing Joke – e marcam até hoje, já que a banda ainda existe. Do começo até meados dos anos 1980, Jaz Coleman, Youth (e depois Paul Raven), Paul Ferguson e o recém-falecido Geordie inseriram mais e mais perigo num estilo musical, o pós-punk, marcado pela insinuação e pela exploração de demônios interiores.

No nosso podcast, o Pop Fantasma Documento, o assunto de hoje é a melhor fase do Killing Joke, uma das bandas mais misteriosas da história do rock, responsável por aproximar estilos como pós-punk, gótico e heavy metal. Terminamos no disco Brighter than a thousand suns (1986), mas a história do grupo ainda inclui muitos outros discos – ouça tudo.

Século 21 no podcast: Girls In Synthesis e Plastique Noir.

Estamos no Castbox, no Mixcloud, no Spotify e no Deezer .

Edição, roteiro, narração, pesquisa: Ricardo Schott. Identidade visual: Aline Haluch (foto: reprodução internet). Trilha sonora: Leandro Souto Maior. Vinheta de abertura: Renato Vilarouca. Estamos aqui de quinze em quinze dias, às sextas! Apoie a gente em apoia.se/popfantasma.

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Crítica

Ouvimos: Ramones, “Halfway to sanity” (relançamento)

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Ouvimos: Ramones, “Halfway to sanity” (relançamento)

Que ironia: um disco nota 6 dos Ramones causa crises de saudades e revisionismo histórico e… pelo menos aqui no Pop Fantasma, aumenta de cotação. Halfway to sanity (1987) volta agora às lojas brasileiras (as online e as que resistem), e no formato CD. Foi o último disco gravado com Richie Ramone na bateria, pouco antes do grupo fazer uma tentativa de colocar o ex-Blondie Clem Burke para substituí-lo.

Dizer que “o disco tal dos Ramones foi marcado por brigas durante a gravação” é chover no molhado, ainda mais em se tratando de uma banda que tinha o intransigente Johnny Ramone como guitarrista. Halfway, décimo álbum da banda, lançado originalmente em 15 de setembro de 1987, por sua vez, é um caso à parte: a porrada comeu antes, durante e depois. Para começar, em janeiro daquele ano, o grupo baixou em São Paulo para três shows – o primeiro deles terminou em briga generalizada provocada por skinheads.

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  • Temos episódios do nosso podcast sobre Ramones e Blondie.

No meio das gravações, Joey e Johnny Ramone, inimigos íntimos, não se entendiam. O produtor Daniel Rey tinha problemas de comunicação com boa parte da banda. Dee Dee Ramone (ainda no baixo do grupo), passava boa parte do tempo doidão, não conseguia se comunicar com ninguém e – dizem – teve suas partes de baixo tocadas por Rey. Pessoas que lidavam com os Ramones de perto dizem que a banda já estava de saco cheio de trabalhar feito louca, gravar um disco por ano e não ser reconhecida, com direito a amigos da onça perguntando a eles “quando a banda iria estourar”.

E aí que Halfway soa insano, embora sob controle. Curtíssimo (12 músicas em 30 minutos e uns quebrados), o álbum traz os Ramones fazendo algumas incursões pelo hard rock e pelo hardcore, com direito a vocais berradíssimos de Joey Ramone em faixas como I know better now, a agitada Weasel face (na qual a voz do cantor chega a lembrar a de Alice Cooper) e o skate punk legítimo I’m not Jesus. O grupo chega perto do pós-punk gótico em Garden of serenity, adere ao som tribal na onda do Public Image Ltd em Worm man, e soa revivalista na balada Bye bye baby (com cara de canção de girl group, e escrita, claro, por Joey) e no rock vintage Go lil Camaro go, marcado por uma apagada participação de Debbie Harry.

1987 foi um ano de três bateristas para os Ramones: com Halfway em curso, Richie saiu brigado da banda, e deu lugar para Clem Burke – jornalistas lançaram a piada de que ele adotaria o nome Clemmy Ramone, mas ficou mesmo como Elvis Ramone. Não deu certo e após dois shows confusos, Marky Ramone, que estava afastado da banda desde 1983, retornou. Hoje, vale a redescoberta.

Nota: 7,5
Gravadora: ForMusic (no Brasil)

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