Lançamentos
Radar: Mateus Aleluia, Bonsai, Jonabug, Sudano, Noite Suite e outros novos sons

Fazendo a lista de sons nacionais do nosso Radar de hoje, deparamos com a diversidade da nova música que está sendo produzida no Brasil atualmente – tanto por gente muito experiente (olha o Mateus Aleluia encabeçando a lista de hoje!) quanto por bandas bem recentes (Noite Suite, Nuna, Jonabug) e artistas solos ligados em sons de todos os tempos (Zaina Woz, Sudano, Bonsai), além de uma banda que já soma duas décadas de ralação (o Pátria Celeste). É assim, unindo gerações e propostas musicais, que seguimos hoje. Dá play aí! (Foto Mateus Aleluia: Vinícius Xavier / Divulgação).
Texto: Ricardo Schott
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MATEUS ALELUIA, “NO AMOR NÃO MANDO”. Tarefa impossível: escutar o novo disco de Mateus Aleluia — um dos fundadores do grupo vocal Os Tincoãs — sem se emocionar profundamente. Intitulado simplesmente Mateus Aleluia, o álbum mergulha em faixas longas que soam como verdadeiras suítes da mata, da introspecção, da negritude e da espiritualidade individual. Os versos são tocantes: “eu não sou rebelde ao ensino que o amor me dá”, “quando o amor me manda eu sigo e vou / de caravela ou carro de boi, jegue ou teco teco / sigo o amor”.
Ambos os versos estão em No amor não mando, canção de nove minutos conduzida por violão, sopros, coral, acordeom e uma declamação de Mateus que define “a sonoridade do amor”. “Não está dentro de nós, está em nós (…). O amor nos rege, não sejamos rebeldes. Para nossa continuidade, entreguemo-nos sem pestanejar. O amor nos manda”. Ouça em volume máximo.
BONSAI, “ESPORTE DE CONTATO”. Para quem acredita que a vida se resume à internet, o rapper paulistano Bonsai tem algo a dizer. Esporte de contato, faixa do álbum Sorte ou revés, aborda o cotidiano nas ruas como uma vivência fundamental — dica nossa: não só para quem faz rap, mas para qualquer artista, e também para quem faz jornalismo. A base é soul-jazz: metais, baixo e bateria leve criam um clima quase relaxante, que contrasta com o tema e dá vontade de sair e encarar os “esportes de contato” da vida real.
JONABUG, “LOOK AT ME”. Direto do interior de São Paulo, mais exatamente da cidade de Marília, chega um sinal bonito e levemente fantasmagórico: Look at me, novo single da Jonabug, agora em formação de trio. É o anúncio do que vem aí — um disco cheio, o primeiro, que atenderá pelo nome de Três tigres tristes. O som mistura indie rock, shoegaze e um pouco da névoa das guitarras noventistas. As letras vão de um idioma ao outro, português e inglês, mas aqui o inglês é quem fala mais alto. Já o clipe da faixa, em preto e branco, foi gravado de forma totalmente independente na antiga estação ferroviária da cidade — hoje espaço cultural — com uma handycam e a ajuda do amigo Thales Leite.
SUDANO, “PRAZER, NB”. “A vida não é e nunca foi preto e branco / eu venho mostrar que as cores vêm pra ficar”, afirma Igor Sudano, 32 anos, cantor, compositor e bodypiercer de Niterói (RJ). Seu novo single fala sobre como a sociedade tenta apagar e silenciar a fala de pessoas não-binárias (daí o “NB” do título). “Acho que a letra fala por si só. Coloquei para fora tudo que uma pessoa não binária sente e passa desde jovem, quando se vê em um mundo que não a reconhece como uma pessoa real”, conta. O som tem pegada de emocore, e a letra é direta e literal como no punk.
NOITE SUITE, “OUTRAS PESSOAS”. Clima musical líquido e psicodélico, com um groove lento e uma sonoridade que parece prestes a derreter no ouvido. Assim é o som do Noite Suite, projeto musical baiano formado por Bianca Gonzalez (guitarra, voz e sintetizadores), Paulo Tiano (bateria e produção), João Sarno (baixo e guitarra) e Yan Franco (guitarra, voz e sintetizadores). O novo single, Outras pessoas, é uma faixa surrealista, herdeira do dream pop e da chillwave.
NUNA, “VELHA JAQUETA”. Entre a new wave oitentista e o emocore, essa banda paulista (que já se chamou Sem Meia) volta explorando o universo do pop-punk em seu novo single, Velha jaqueta. Tadeu Patolla, ex-produtor do Charlie Brown Jr, cuidou do som, e Rodrigo Psy dirigiu o clipe, gravado em três locações diferentes de São Paulo, e que mostra visualmente as diferentes fases mostradas na letra da música – que fala sobre seguir em frente. A cantora Manu Fair brilha nos vocais com carisma e intensidade.
PÁTRIA CELESTE, “JOHNNY J”. Essa banda de Caçapava (SP) voltou cinco anos no tempo e resgatou uma faixa do álbum Roda dos excluídos (2020) para lançar em videoclipe. E fez bonito: o vídeo é uma animação assinada por Leandro Franco (Garotos Podres, Supla, Inocentes, Autoramas), que mostra a banda e o personagem da música interagindo com programas históricos de TV e desenhos animados. “A música trata sobre as divertidas e controversas influências que as gerações de 1970 / 1980 sofreram pela TV”, diz o grupo. Se você se identificar com o protagonista do clipe, cuidado: o final pode surpreender (ou assustar).
ZAINA WOZ, “SUCESSO SEXUAL”. Composta por Leo Jaime e Leandro Verdeal e eternizada por Angela Ro Ro, Sucesso sexual ganhou nova vida na voz de Zaina, que a lançou como single e clipe — e também a incluiu em seu álbum de estreia, Zaina Woz – { Vol. 01 }, previsto para julho. A produção é dividida entre Zaina e Arthur Kunz (Marina Lima, Os Amantes), e o clipe, gravado no Museu do Sintetizador, em São Paulo, é um aceno perfeito à era tecnopop da música brasileira.
Crítica
Ouvimos: Sparks – “MADDER!” (EP)

RESENHA: Sparks lançam MADDER!, EP que expande o disco MAD! com humor ácido, synthpop barroco e clima psicodélico-circense.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Trangressive Records
Lançamento: 3 de outubro de 2025
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Nunca, jamais, em tempo algum, os Sparks vão lançar um disco e eu vou ficar sem conferir de alguma forma – um pouco por ser muito fã da banda, um pouco pela noção de que o pop e o rock atual devem muito aos Sparks. Aliás, a dívida com eles, em relação a certos artistas (Erasure, Pet Shop Boys, Franz Ferdinand) é impagável. Quem faz música com ironia e storytelling, e nunca nem sequer chegou perto de álbuns como Kimono my house (1974), tem que voltar três casas e ficar uma partida sem jogar.
Os irmãos Ron e Russell Mael também têm andado com vontade de experimentar novidades. Entre as mais recentes, estão o documentário Sparks Brothers, de Edgar Wright – que aqui no Brasil passou de sapato alto pela Netflix e já se mandou da plataforma. Tem também este MADDER!, um EP-continuação do álbum mais recente do grupo, MAD!, que foi lançado há alguns meses (e resenhado pela gente aqui). Os Sparks nunca haviam lançado um EP e agora lançam um spin-off de quatro faixas, com um resultado mais maluco e variado que no álbum.
- Temos episódio do nosso podcast sobre Sparks. Ouça aqui.
Dessa vez os Sparks retornam com um clima psicodélico-circense de araque que poucas vezes foi visto na obra deles. É o que surge no single Porcupine – uma música que fala sobre pessoas espinhosas e nada fofas – e no ambient de brincadeira Fantasize, que fala sobre um masturbador contumaz que começa a desenvolver uma estranha loucura solitária (“como posso fazer você entender / o mundo que construí onde estamos de mãos dadas?”).
No restante de MADDER!, os Sparks fazem uma espécie de circo dos horrores em Mess up, música em que um sujeito mais estranho ainda que o onanista de Fantasize parece confundir tela e realidade. E, em They, desenvolvem um synthpop barroco em cuja letra fãs se transformam em clientes dos artistas (“eles / vieram para ver um pouco de puro entretenimento / mas não ficaram felizes / e eles não estavam satisfeitos”).
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Crítica
Ouvimos: Saint Etienne – “International”

RESENHA: International, provável último disco do Saint Etienne, mistura pop, melancolia e dance music, soando mais como um até logo do que despedida.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Heavenly
Lançamento: 5 de setembro de 2025
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Ao que parecia pelos singles, essa despedida não seria das mais fáceis – International, até prova em contrário, é o último álbum da banda britânica Saint Etienne, e um disco pautado pela emoção. O Saint Etienne, por sinal, é um grupo que chegou a um patamar bastante particular no rock e na música pop: após 35 anos de carreira, ainda é “a banda” de muitos fãs, e é uma espécie de modelo secreto para muita gente que conseguiu até bem mais sucesso que eles. Também são uma banda que trabalha no terreno estranho da indefinição: o som é pop, é sofisticado, mas não é “sophistipop” da mesma forma que Style Council ou Prefab Sprout – só para citar dois exemplos.
O compromisso de Sarah Cracknell, Bob Stanley e Pete Wiggs, os três do grupo, é com sentimentos, lembranças, sensações e outras coisas que pairam no ar, e que nunca são perceptíveis à primeira vista. Se uma banda decidisse lançar um disco chamado Música para os bons momentos da vida, com um casal namorando na capa em meio a um jardim florido, pareceria uma brincadeira com os álbuns orquestrais temáticos dos anos 1960. O Saint Etienne é essa coisa da “música para os bons momentos” sem precisar colocar essa frase na capa para vender discos. E sem nenhum tipo de apelo fácil ou sofisticação de ostentação.
E vai daí que International traz essa coisa que paira no ar quase encapsulada, talvez até mais que em diversos discos mais recentes do trio. Rola em faixas de pop clássico e dançante como a belíssima Glad e Save it for a rainy day (esta, parece o Erasure em clima de pop francês), no convite para dançar até amanhecer da bela Dancing heart, no rock oitentista gostosinho de The go betweens, no ambient feliz e pop de Take me to the pilot e na vibe quase cinematográfica de Sweet melodies – um pop que parece vir lá de longe, lembrando o Stereolab.
O Saint Etienne também manda bala num pop “futurista”, só que futurista de 1991/1992 – é a dance music He’s gone. A triste-pra-burro Fade é uma balada com cordas, soando como um clássico dos Carpenters levado para a pista, com Sarah dizendo que está “sentindo o nosso amor desaparecer”. Do lado pop-chique do grupo, os melhores exemplos são a melancolia de pista de Two lovers e a nostalgia de Brand new me – esta, com participação da banda australiana de electro pop Confidence Man, ganhou um clipe de desenho animado vintage. Com exceção do refrão, a letra é sensualmente narrada por Sarah Cracknell, encarnando uma mulher que largou um relacionamento cagado (“meu amor, meus lábios nunca disseram que meu coração era puro / talvez o tempo seja a cura”).
Chegando mais próximo do fim do álbum, o Saint Etienne embica na tarefa de dizer aos fãs que o fim está próximo. A já citada He’s gone, penúltima do álbum, fala em não olhar mais para trás. Já The last time, que encerra tudo, é uma dance music doce, tranquila e espacial em que (aí sim!) o grupo olha pra si próprio. Sarah, Bob e Pete lembram de quando entraram no Facebook e se assustaram ao ver a vidinha besta de seus ex-colegas de escola, todos sem muito assunto na vida a não ser as férias com a família.
Ainda em The last time, o “valeu a pena” do Saint Etienne é cheio de auto-ironia: “Parecemos suaves e refinados / mas não somos os elegantes homens da estrada / que você esperaria encontrar”. Não parece ser realmente um fim – aliás International parece mais um até logo, do começo ao fim. Mas aí só vendo.
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Crítica
Ouvimos: Ivy – “Traces of you”

RESENHA: Traces of you, novo do Ivy, revive demos antigas com emoção e leveza pop, marcado pela ausência de Adam Schlesinger.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 9
Gravadora: Bar None Records
Lançamento: 5 de setembro de 2025
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“Todos os dias inocentes em que costumávamos brincar / é estranho quando todos eles começam a desaparecer / eu queria saber que tudo iria embora / ainda assim, eu não saberia o que dizer”. A faixa-título do novo disco do Ivy, Traces of you, é bem o que se esperaria do grupo: algo entre o pop francês e a new bossa, sons relaxantes e hipnotizantes, beat leve, a voz luminosa da cantora Dominique Durand. Mas a faixa tem versos que soam marcados pela morte de Adam Schlesinger, colega de banda de Dominique e seu marido Andy Chase.
Adam saiu de cena em abril de 2020 devido a complicações da covid-19. Já era uma época em que o Ivy estava há bastante tempo sem lançamentos – All hours, o disco anterior, saíra em 2011, seis anos depois de In the clear, de 2005. A sonoridade alternativa e pop do grupo, que já era indie-pop antes que essa combinação virasse um projeto de estilo, conquistou muitos fãs sem que o Ivy se tornasse necessariamente um grande sucesso. Mas com a ausência de Adam, não parecia que o grupo seria reativado. Traces of you é essa reativação, ainda que em parte: o material é todo composto de demos e gravações de arquivo feitas entre 1995 e 2012, e retrabalhadas por Dominique e Adam.
Por serem demos antigas, as músicas de Traces of you têm rastros (traços, como diz o título) de Adam espalhados aqui e ali – mas todas elas acabaram ganhando outras colaborações durante sua elaboração. Uma das mais importantes foi a de Bruce Driscoll, tecladista e guitarrista de turnê, que ajudou a restaurar as músicas e contribuiu com letras. O repertório abre com a simplicidade pop de Midnight hour, soando como um New Order introvertido e etéreo, e com a beleza de Fragile people, que poderia passar por uma canção das Shangri-Las, só que com mellotron, beat eletrônico e vapor sonoro. Sons classudos na linha de Prefab Sprout e Swing Out Sister surgem em faixas como Mystery girl, Say you will e Heartbreak.
Apostando na emoção e na saudade como combustíveis, Traces of you também investe na mistura musical, às vezes em uma mesma faixa. The great unknown tem clima misterioso, beat e teclados que lembram um krautrock doce, ou um baile funk comandado pelo Can. Lose it all tem clima lento, celestial e meio lo-fi ao começar – depois vai se tornando uma música cada vez mais percussiva, e tem um pandeiro que parece samba. O arco existencial aberto pela morte de Adam também paira sobre o disco, em faixas como Fragile people e Hate that it’s true – essa última, uma balada celestial, de alegria triste, em que Dominique canta que “não há adeus / se eu ainda continuo amando você”. Traces of you, enfim, é um disco surpreendentemente fácil de ouvir, mesmo que lide de perto com o peso da ausência.
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