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Crítica

Ouvimos: OK Go, “And the adjacent possible”

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Ouvimos: OK Go, “And the adjacent possible”

Pouca gente discorda que o OK Go já causou antipatia numa turma enorme – é algo que, de certo modo, faz sentido. Para muita gente, eles pareciam mais um Blue Man Group sem a tinta azul do que uma banda de rock. Ou uma banda criada apenas para vender iPhone e divulgar aplicativo. Lá pelos anos 2010 “hipster” era xingamento (era o novo “mauricinho”, quem lembra?) – e não parecia haver coisa mais hipster que o clipe das esteiras (Here it goes again), que observando com a distância do tempo, parecia adiantar em uns 15 anos o conteúdo de Tik Tok.

A verdade é que, se você tirasse os clipes, sobrava uma banda de art rock bem bacana, com shows ótimos e uma biblioteca de referências interessantes (Devo, Brian Eno, Talking Heads e David Bowie brotavam por ali). E depois de mais de uma década sem lançamentos, Damian Kulash, Andy Ross, Dan Konpka e Tim Nordwind conseguiram fazer seu melhor disco, o mais interessante e variado.

O detalhe é que And the adjacent possible – cujo título, diz Kulash, é “um conceito da teoria da complexidade, cunhado pelo biólogo evolucionista Stuart Kauffman para descrever como as condições atuais criam bolhas de potencial para o que vem a seguir” – investe mais no lado neo-psicodélico e vintage do OK Go. Um lado que já estava lá, mas talvez ninguém prestasse a devida atenção.

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Tirando a poeira do tal adjetivo “hipster”, que provocava náuseas em tanta gente, o OK Go volta na mesma estileira de sempre, mas investindo em novas vibes – como o indie pop de Impulse purchase, o neo-soul com discreta cara reggae de A stone only rolls downhill e a sonoridade distorcida e psicodélica de Love e A good, good day at last. Essa última, uma canção funkeada (inspirada, segundo a banda, em Eric Burdon & War), e com uma guitarra feroz que lembra Lanny Gordin.

This is how it ends é uma balada blues que mais parece tema de novela antiga – só que em clima ambient e espacial. Balanços lembrando The Cure e Talking Heads dão as caras em Take me with you e Better than this, enquanto um ar beatle surge no bolerinho bregadélico Fantasy vs fantasy. Um lado 60s e 70’s surge mais acentuado entre as referências da banda, do começo ao fim, dando as caras também no tom Queen de Golden devils (feita em parceria com Craig Wedren, que foi vocalista do finado Shudder To Think) e na balada sussurrada Don’t give up now, composta em homenagem a um amigo diagnosticado com câncer.

Adjacent tem lá seus momentos cansativos – de modo geral, o OK Go é uma banda da época em que o “formato CD” (leia-se: discos mais pensados para quem não precisaria levantar para trocar o lado do álbum) já andava desgastado. Só que, em meio a tantas referências e informações (Kulash detalhou o disco para o NME recentemente), vale ouvir devagar e acompanhar detalhe por detalhe do álbum. Inclusive porque, como quem não queria nada, o OK Go sempre foi bom nessa coisa aí, de prever o futuro.

Nota: 8,5
Gravadora: Paracadute
Lançamento: 11 de abril de 2025.

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Ouvimos: Mark Pritchard & Thom Yorke, “Tall tales”

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Ouvimos: Mark Pritchard & Thom Yorke, "Tall tales"

DJ e produtor, o britânico Mark Pritchard é uma companhia perfeita para Thom Yorke mergulhar em experimentações. Além da experiência de ambos em criar atmosferas sonoras densas e sensoriais, há um espírito comum: o gosto por projetos paralelos. Pritchard coleciona codinomes e colaborações; Yorke, por sua vez, é o tipo de artista que raramente se acomoda.

Tall tales, projeto que une música e filme, nasceu de um encontro entre os dois em 2011, quando Pritchard remixou faixas do Radiohead, e começou a tomar forma em 2020, em plena pandemia. Foi justamente o isolamento que impulsionou a colaboração: Thom, entediado em casa, pediu que Mark lhe enviasse ideias para trabalhar. O que se seguiu foram cinco anos de trocas virtuais — mensagens, conversas no Zoom — sem um único encontro presencial.

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A proposta era buscar sons não convencionais. Mark cavou fundo em synths fora de linha e softwares obscuros, enquanto Thom deixou de lado guitarras e investiu em sintetizadores e distorções vocais. O resultado? Um disco sem calor, nascido da distância e da incerteza — e que reflete exatamente isso. E não entenda o “sem calor” como depreciativo: o gelo faz parte da aventura.

Mesmo para os padrões já estranhos de Yorke, Tall Tales soa dissonante, tenso e desolador. A fake in faker’s world e Ice shelf, que abrem o disco, sugerem que estamos sempre à beira de um abismo — a segunda amplifica essa sensação com uma sirene circular e hipnótica. Bugging out again até soa etérea, quase sonhadora, mas só depois de atravessarmos um corredor de vocais distorcidos e espectrais.

Do início ao fim, Tall Tales é um álbum gelado. Suas letras lembram fábulas, e suas faixas se alinham ao modelo de “não-canção” explorado pelo Radiohead em Kid A. Back in the game e Gangsters poderiam muito bem estar em trilhas de videogame — assim como a batida seca e minimalista de This conversation is missing your voice evoca o som vintage de um Tele-Jogo (lembra disso?). The white cliffs traz um blues ambient repleto de sintetizadores, com clima espectral e distante, quase como uma miragem — uma imagem potente para um mundo confuso como o de 2020. Já a faixa-título sintetiza o mundo como um deserto, em clima sombrio.

Entre tantas abstrações, The man who dances in stag’s head se destaca por lembrar uma canção de verdade — ainda que no sentido mais torto do termo. É uma balada que remete a Lou Reed, com pandeirola, vocais quase falados e atmosfera desolada que remete a Here she comes now, do Velvet Underground. Já a faixa final, Wandering genie, mistura vocais sobrepostos, cordas e sintetizadores até virar puro vento — como se tudo fosse varrido por uma força invisível.

No fim das contas, é art rock — mas bem mais art do que rock puro, como boa parte da trajetória do Radiohead.

Nota: 9
Gravadora: Warp
Lançamento: 9 de maio de 2025

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Ouvimos: Shn Shn, “Serpent’s skin”

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Ouvimos: Shn Shn, “Serpent’s skin”

Vinda do Canadá, a musicista, compositora e cantora Shn Shn (nome verdadeiro: Shanika Lewis-Waddell) se dedica a um experimentalismo eletrônico que lembra bastante a vibe dos anos 1980 – e daquele som que costumava ser chamado de new age. A música de seu primeiro álbum, Serpent’s skin, é um ambient relaxante, que se cruza com vários estilos, e que alterna silêncios e sons em poucos segundos. Outerlands une esse design sonoro com reggae, Divergent paths é um soul eletrônico que lembra um tema de filme (com direito a conversas ao fundo) e Home is another place cria um ambiente relaxante e caseiro, com teclados, cordas e poucas notas.

O som esparso do disco traz outras coisas na receita. Há um toque forte de jazz e afrobeats distribuídos pela sonoridade de Serpent’s skin. Um som que lembra uma steel drum coadjuva a visonária Glimmer, batidas afro criadas por baixo, teclados e cordas criam New horizons e um concretismo musical cavernoso dá as caras em Tender bodies. Anomalies e Blip in the… são temas de piano, marcados por ruídos de fundo, barulhos marítimos e por uma microfonação que revela o ruído do banquinho usado por Shn Shn. Já Flow é um ambient “voador” e percussivo. Um disco que convida à escuta atenta, e que revela novas camadas a cada audição.

Nota: 8
Gravadora: Stadik Records
Lançamento: 28 de março de 2025.

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Ouvimos: Big|Brave, “OST”

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Ouvimos: Big|Brave, "OST"

O som do grupo canadense de metal experimental Big|Brave já está bem longe de ser um dos mais acessíveis do mundo – sonoridades como rock industrial e shoegaze são pouca areia na hora de definir a banda. Mas dessa vez o grupo foi longe demais: OST (original soundtrack, “trilha sonora original”) é uma “trilha sonora” feita sem que haja um filme para o qual ela tenha sido composta – e a banda entrou em estúdio sem ter nenhuma composição pronta, só com a disposição para improvisar em cima do que aparecesse.

Esse clima de Araçá azul do demo perpassa todas as oito faixas do disco – todas chamadas Innominate, variando apenas o número delas (de I a VIII). Quem quer conferir sons aterrorizantes, pode pular para a Innominate nº II, com notas sombrias de piano, ruídos de estática e um zumbido que parece alguém bem de longe querendo dizer algo. O disco abre com ruídos que vêm de longe (na Innominate nº I), segue com tremeliçações sonoras (na III) e com algo que se assemelha a barulho de metal vibrando (na IV) – praticamente uma enciclopédia experimenta musical, que soa mais como os ruídos de fundo de um filme do que com a música usada para um galã beijar a gatinha, ou a câmera mostrar um cenário infinito.

Se você não estiver com a menor vontade de se irritar, recomendamos pular a Innominate nº V – os barulhos soam tanto como um inseto voando, que chega a dar vontade de pegar um jornal para matar o bicho. A Innominate nº VII volta vagamente para o clima de terror da segunda faixa, com gritos que parecem vir de uma comemoração, mas ganham logo um tom de horror – em meio a sons que lembram um berimbau sendo tocado e tratado eletronicamente. Ousadia musical para poucos, e poucas.

Nota: 7,5
Gravadora: Thrill Jockey Records
Lançamento: 25 de abril de 2025

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