Connect with us

Crítica

Ouvimos: Joan Armatrading, “How did this happen and what does it now mean”

Published

on

Ouvimos: Joan Armatrading, “How did this happen and what does it now mean”
  • How did this happen and what does it now mean é o vigésimo-primeiro disco de estúdio da cantora e compositora britânica Joan Armatrading. A única coisa que ela não fez no disco foi a engenharia de gravação: ela compôs, tocou, cantou, produziu e programou tudo.
  • Ao The Guardian, ela explicou o título do disco (“como isso foi acontecer e o que significa agora?”): “Acho que nos tornamos polarizados porque quando você está cara a cara com alguém, coisas como linguagem corporal e contato visual nos impedem de fazer certas coisas. Isso não acontece nas mídias sociais, então se espalha para o mundo real. Não vamos nos livrar de todas as guerras e desentendimentos, mas o título do álbum está perguntando como diabos podemos sair dessa situação em que estamos e como voltamos para um lugar melhor”.

Descobrir, sem estar esperando, que Joan Armatrading lançou um novo álbum, é uma surpresa enorme. Ver que o disco é um projeto quase inteiramente solo (ela compôs, produziu, tocou e programou tudo sozinha) não chega a ser uma surpresa para quem conhece um pouco da história dela e pelo menos alguns hits e discos clássicos.

No caso de How did this happen and what does it now mean, o estilo conhecido de pop-rock confessional dela, já a partir do título, vem com um subtexto de sobrevivência e superação. Ainda que algumas histórias contadas nas letras apontem para ressacas amorosas e falsidades do amor em geral, como no pop-rock Someone else e no r&b I gave you my keys (“eu te dei minhas chaves para tudo que eu tinha/você era minha divindade, você governou meu mundo/governou minha terra, governou meu céu/como você pôde me machucar tanto?”).

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.

Já o blues-rock-soul percussivo I’m not moving põe violência urbana no disco, com Joan recordando as cenas que viu durante um assalto, e levando a história para uma situação em que a minoria tem as maiores cartas na mão (“posso ser pequeno/mas sou poderoso/você pode ser muito mais velho/mas ainda assim eu governo você”). O pop com argamassa soul e musicalidade herdada do folk, especialidade dela, volta em faixas como 25 kisses, Here’s what I know e a faixa-título, que conta outra história de amor que acaba com problemas e dúvidas (“onde está aquela versão de nós mesmos/que nós amávamos, que era tão preciosa/em nosso mundo, em nossos corações?”).

Para quem tem saudades do lado baladão de AM de Joan, registre-se a presença de Irresistible e Say it tomorrow e do gospel Redemption love. No disco novo, ela fez questão de que todos os seus lados musicais convivessem sem problemas, cabendo até dois instrumentais, Now what e Back to forth, nos quais ela se mostra uma excelente guitarrista de blues e rock. Aos 74 anos e sabendo fazer de tudo num estúdio, Joan é o poder, mesmo que falte um certo empoderamento nas histórias amorosas das letras.

Nota: 7,5
Gravadora: BMG

Crítica

Ouvimos: Ney Matogrosso & Hecto, “Canções para um novo mundo”

Published

on

Ouvimos: Ney Matogrosso & Hecto, “Canções para um novo mundo”
  • Canções para um novo mundo é o novo disco de Ney Matogrosso, que marca a parceria dele com a banda-dupla Hecto, formada por Guilherme Gê (voz, teclados, guitarra) e Marcelo Lader (guitarra). O disco tem participações de Roberto Frejat, Ana Cañas e Will Calhoum (Living Colour), além de colaborações musicais com Paulo Sergio Valle, Mauro Santa Cecilia e Sergio Britto (Titãs), entre outros.
  • “A decisão de gravar um álbum com a Hecto se deu pelo repertório, que eu gostei muito, além de adorar o rock. As letras são muito contundentes, o que me chamou a atenção. Aí eu canto, porque não tenho restrição. E olha, a parceria vocal com o Gê é uma novidade, né? Eu tinha feito isso só com o Pedro Luis, lá atrás (2004)”, diz Ney.
  • “Ney caiu de cabeça no álbum e claro, o projeto se transformou profundamente, foi o começo de uma grande parceria. Além disso, a generosidade e tranquilidade dele no processo todo é um aprendizado pra qualquer artista”, revela Guilherme.

O universo do rock não é nada estranho para Ney Matogrosso – que começou numa banda do estilo, Secos & Molhados, e em 1976, já solo, transformou Mulheres de Atenas, de Chico Buarque, numa canção perdida de David Bowie ou do T. Rex. Mas se alguém achava que faltava um disco “de rock” na discografia solo do cantor, não falta mais.

Acompanhado do Hecto, em Canções para um novo mundo, o cantor afia a pegada indo para os lados do rap-metal com herança de Titãs (a zoação cruel Pátria gentil, com linguagem de telemarketing), para o hard rock com referências de música latina e samba (Teu sangue) e para o samba-metal com guitarra pesada e pandeiro (Nosso grito). Solaris tem tom quase pós-punk, com violões lembrando R.E.M. e Smiths. Dessa música participa Roberto Frejat, o segundo convidado mais bem aproveitado do disco – o principal surge na abertura, em que Will Calhoun, da banda Living Colour, toca bateria em Pátria gentil.

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.

Em época de 40 anos de Rock In Rio (a primeira edição do festival, aberta por Ney em janeiro de 1985) e de memórias tristes evocadas pelo filme Ainda estou aqui, não surpreende a sinergia que vem de Canções para um novo mundo, disco cujas letras falam de situações lamentáveis do país, mas sempre enfatizando que algo novo bate na porta.

A faixa-título, lembrando a MPB pop dos anos 1980 (de discos como Ideologia, de Cazuza, de 1988), grita: “são as mesmas questões de Shakesperare/guerras e beijos (…)/ninguém pode impedir do novo mundo chegar”. Anonimato, MPB com pegada samba-rock vinda dos anos 1990, suscita várias questões: a letra trata da devolução à não-fama das pessoas que estão fora do universo dos algoritmos? Fala sobre alguém que é sempre apagado historicamente? O refrão traz a frase “que saudade de existir!”

Para fãs antigos de Ney, outra novidade é que o vocal do cantor foi gravado de maneira diferente no álbum, trazendo uma certa sujeira que dificilmente alguém vai ver num disco dele, ou mesmo num show. Canções para um novo mundo, mesmo não sendo propriamente um disco do cantor (é um álbum basicamente do Hecto, embora com personalidade vocal dada por ele) traz também um novo mundo para a história de Ney Matogrosso.

Nota: 9
Gravadora: Som Livre.

Continue Reading

Crítica

Ouvimos: Sofia Freire, “Ponta da língua”

Published

on

Ouvimos: Sofia Freire, “Ponta da língua”
  • Lançado em março de 2024, Ponta da língua é o terceiro álbum da cantora e compositora pernambucana Sofia Freire. No disco, ela cantou, compôs, produziu, editou e gravou todas as faixas. Por acaso, o estúdio dela se chama Eu Mesma Produções.
  • Definido como dark pop, o disco veio de uma crise criativa da pandemia. “Fiquei abalada mesmo, uma vida em pausa. Sabe quando algo está na ponta da língua e não sai? Tive dificuldades de lidar e de entender meus sentimentos, quase uma crise existencial. De alguma forma transformei isso em letras e esse disco é fruto disso. Por isso, o nome”, reflete Sofia.

Tem quase um ano que Ponta da língua, terceiro álbum de Sofia Freire, chegou às plataformas. E como os bons discos de art pop fazem, ele aponta tanto para o futuro que parece um lançamento de 2025 ou 2026. Basicamente é um disco de MPB feito com base no synth-pop. Mas não pense na MPB dos anos 1980, porque o lance aqui é outro, unindo referências claras de música brasileira experimental, indie rock, indie pop, e até neo-soul – na viagem anti-letargia e pró-transformações de Autofagia, que abre o álbum.

Até mesmo o que poderia soar mais orgânico no disco, como a própria voz de Sofia, ganha tratamentos diferentes, e é inserido pela própria cantora como um instrumento a mais. Seja nas vozes sobrepostas que aparecem em quase todas as faixas – e que às vezes soam como Laurie Anderson – ou no design rítmico e ágil das interpretações de Sofia. É o que rola em Arrebento, que mescla ritmos orientais, synths que lembram músicas de Kate Bush e David Sylvian, e o próprio ritmo pessoal da cantora, na letra (“como uma criança/em sincera indisciplina/ri e chora estourando/os balões cheios de ar/quero logo estourar”, contando uma história que passa por feminismo, desejos e projetos).

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.

Ponta da língua tem uma espécie de tecno-reggae-brega, que é Minha imaginação, cuja sonoridade lembra o synthpop oitentista – os vocais que surgem como surpresas ao longo da música. Orlando lembra os lados mais experimentais do tecnopop. Big bang tem tom orientalista que lembra bandas como Japan e Ultravox, e uma letra que alude ao lado mais visionário e ficcionista-científico de Gilberto Gil. Na faixa-título, uma ótima marcação rítmica traz como surpresas micropontos de pop nacional oitentista, com destaque para versos como “não haverá mais dia/que se passe/sem que eu pense/sem que eu pulse de vontade/de tocar a minha liberdade/com a ponta da minha língua”.

Dentro de mim é outra pérola rítmica, com vocais quase mântricos e letra medindo os custos e benefícios das mudanças diárias (“dentro de mim/basta/ser quem eu sou/custa/ser quem vou ser”). Mormaço une pop sintetizado e Nordeste. E uma surpresa do álbum é Resta saber, que abre como um lounge anos 2000 e vai ganhando características de house music e de batidões dos anos 1990. Se por acaso você deixou escapar esse disco em 2024, ponha na lista do começo de 2025.

Nota: 9
Gravadora: Independente.

Continue Reading

Crítica

Ouvimos: Andréa Dutra, “Entre nós”

Published

on

Ouvimos: Andréa Dutra, “Entre nós”
  • Entre nós é o sexto álbum da cantora carioca Andréa Dutra, viabilizado por financiamento coletivo, e produzido por ela e por Léo Freitas.
  • O material foi todo composto por ela, e o álbum é de voz e piano, só que com uma diferença: ela aparece acompanhada por diversos pianistas diferentes ao longo das faixas do disco. Por acaso, é o instrumento que ela usa para compor e ensinar música (Andréa é preparadora vocal e professora de canto, além de jornalista).
  • A arte da capa foi feita por Tito Faria.

Entre nós tem um formato simplificado e atraente: nove músicas de voz e piano, todas com letra e música de Andréa Dutra – que surge acompanhada por pianistas diferentes em cada faixa. O material, apontando para a união de samba e jazz em vários momentos, ganha inicialmente uma cara alegre e expansiva no single Acerto, torna-se misterioso e introvertido em Entre nós (com versos esperançosos e engatilhados, simultaneamente) e lírico em Valsa nº1. São as três primeiras faixas, nas quais Andréa é acompanhada, respectivamente, por Adriano Souza, Paulo Malaguti Pauleira e Itamar Assiere.

Os pianistas acompanham o estilo de cada música. Entre os melhores momentos, o tom percussivo e simultaneamente clássico de Léo de Freitas em Deixa quieto, que celebra a chuva como um momento de introspecção (“meu pai disse: fica em casa, tá chovendo/nesses dias nem precisa trabalhar/chuva é feita pra tirar férias da vida/de olhos presos na vidraça até passar”), a percussão pianística do samba alegre Dadivosa, tocada por Leandro Braga, e o clima bossa pop de Maio, com Sheila Zagury. Pedra e flor, com letra de volta por cima, une Andréa a três dos pianistas (Adriano Souza, Leo de Freitas e João Braga), entre bases, solos e balanços.

No final, as várias partes de Conselhos para um adolescente na ponte-aérea RJ-SP, uma das melhores letras do álbum, com Antonio Fisher-Band no piano. Como se escrevia em algumas capas de LPs nos anos 1980, “este é mais um disco independente”. De verdade.

Nota: 8,5
Gravadora: Peneira Musical

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.

 

Continue Reading
Advertisement

Trending