Crítica
Ouvimos: Glazyhaze, “Sonic”

Banda italiana com datas em abril em seu país e na Alemanha para divulgar seu segundo álbum (este Sonic), o Glazyhaze se localiza entre dois períodos do rock: a introdução de mais peso e barulho no pós-punk por intermédio de bandas como Killing Joke, e a chegada do noise pop, do shoegaze e outras nomenclaturas.
Em Sonic, o Glazyhaze faz punk com guitarra apitando em What a feeling, ganha tons mais próximos do pós-punk (mas com um lado shoegaze forte) em Breath, faz um som no qual parece estar eternamente chovendo em Forgive me e consegue soar até meio radiofônica (só um pouco), em Nirvana – que abre em clima pós-punk, depois acrescido de paredes de guitarra, e reforçado pelo vocal cândido da cantora e guitarrista Irene. Slap é tensa, e é levada adiante por um riff que lembra algo do Depeche Mode. Já a faixa-título Sonic (note o nome) faz lembrar o Sonic Youth de 1992.
Numa disputa de épocas, o noise rock ganha de longe na sonoridade do Glazyhaze, dando a letra em músicas como a balada Dwell (que abre em vibe gótica e ganha uma sequência bem pesada), a emparedada Stardust e a cavalar Not tonight. No final, Warmth, com vocais realmente bonitos, abre como uma balada sonhadora, mas vai ganhando micropontos de tensão – mesmo que sem barulheira.
Nota: 8
Gravadora: Independente
Lançamento: 21 de março de 2025.
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Crítica
Ouvimos: Lucy Dacus, “Forever is a feeling”

Quem acompanha o Pop Fantasma e lê as resenhas, já me viu falando de certos discos algo como: “é bom, mas falta uma certa esquisitice que rolava antigamente no som dessa banda/cantora/cantor”. Traduzindo: falta uma certa vontade de explorar, de ir além do que se espera, ultrapassar padrões, no sentido de evitar se tornar uma versão Tiny Toon de si próprio/própria. E fica aí a pergunta: Lucy Dacus não está se tornando um pouco isso aí em seu novo disco, Forever is a feeling?
Antes de tudo, importante falar que Forever é bom (desce aí para ver a nota que eu dei) e tem músicas ótimas. Os fãs (eu me incluo entre eles) vão adorar a sujeira sonora de Most wanted man, que lembra uma prima mais mal-humorada do Fleetwood Mac. Provavelmente vão amar também o experimentalismo e o quase progressivismo de Modigliani, balada indie-pop com belezas na percussão e nos arranjos de cordas. A vertiginosa Limerence, definida por Lucy como “um cabaré”, também gruda na mente.
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O problema de Forever is a feeling é que, se você comparar com os álbuns anteriores (especialmente com os ótimos No burden de 2016 e Home video, de 2011), e se você for além e comparar Forever com o disco do Boygenius, banda que reúne Lucy, Julien Baker e Phoebe Bridgers… ele sai perdendo. Fica a sensação de que o álbum não expande muito além do que Lucy já havia explorado em outros momentos, mesmo abrindo com uma curiosa vinheta em tons clássicos, Calliope prelude.
Em várias faixas, Lucy libera por completo a Karen Carpenter que existe dentro de si. Tudo bem, só que, no caso de Forever, isso resulta às vezes em uma uniformidade excessiva nas linhas vocais e, principalmente, na abordagem temática. Grande parte do disco gira em torno de relacionamentos complicados e impossíveis, do amor que antes de ser já era e, de maneira mais direta, de seus sentimentos não correspondidos por Julien Baker – amiga e parceira de banda no Boygenius.
Essa opção pela tristeza sonora (e pela evocação do bittersweet setentista) vem rendendo álbuns excelentes recentemente, mas aqui deu uma certa impressão que Lucy, se não tomar cuidado, pode acabar sendo condenada a fazer discos em que todo mundo encontra aquilo que já espera – exatamente o oposto do universo indie e extremamente criativo do qual ela veio. Do material que parece mais estandardizado, destaque para o soft rock gilete-no-pulso de Big deal (“você tem sua garota, você vai se casar com ela / e eu estarei assistindo em um terno listrado”), a vibe Lana del Rey de Best guess (a do clipe que imita os comerciais da Calvin Klein dos anos 1990) e a simplicidade da faixa-título.
De excepcional, o álbum ainda tem o clima ambient e perturbador de Talk, uma das melhores músicas da história de Lucy. Mas Forever is a feeling é um bom disco de transição para outra fase, e resta saber o que vem ai.
Nota: 7,5
Gravadora: Geffen
Lançamento: 28 de março de 2025.
Crítica
Ouvimos: Aya, “Hexed!”

Existem filmes de terror, e Hexed!, novo álbum da britânica Aya Sinclair, é um disco de terror. A capa do disco já causaria náuseas em muita gente, mas a sonoridade também não fica atrás: é sombria, crua, ruidosa, causa sustos, dá nervoso, e, quando se torna mais pop, lembra artistas como Suicide.
Há algo que faz lembrar, de leve, a sonoridade de Colinho, disco novo de Maria Beraldo – mas Hexed! não veio para acalentar ninguém, nem de longe. Aya lembra sufocos recentes passados com drogas (segundo uma entrevista do jornal The Guardian ela está limpa há seis meses), abusos sexuais, traumas, descobertas (assumiu-se como mulher trans em 2018, e afirmou ao The Guardian: “Agora não consigo mais andar sozinha de noite”) e momentos em que os excessos deixaram-na distante de si própria.
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A eletrônica experimental de I am the pip I hit myself with, o hip hop quebrado de Off to the ESSO (do verso-berro “estou escorregando ladeira abaixo novamente / você está agarrando o sabão / estou dando uma tragada na coca”) e o suspense sonoro da faixa-título não apenas não mentem, como servem de diário de bordo para Aya – o diário de uma fase antiga, porque o release do álbum faz questão de afirmar que Hexed! “é o que acontece quando Aya acende a luz”. The names of faggot chav boys é hip hop gritado e sem flow, com clima de apresentação de personagem em videogame. Heat death é sombria, distorcida e lembra que o personagem-título da faixa “faz tudo parar”.
Na sequência, Peach é um rap raivoso e ritmado, com ruídos que soam como golpes de espada no vento, enquanto Droplets abre com gotas d’água fazendo a transição para um trip hop violento e fantasmagórico. O trio final de faixas tem r&b guerrilhento e amedrontador (Navel gazer), ambient demoníaco e cristialino (The petard is my holster) e eletrohardcore (Time at the bar). Aya testou seus limites pessoais durante vários anos, e fez de Hexed! um disco para quem gosta de testar seus próprios limites sonoros.
Nota: 8,5
Gravadora: Hyperdub
Lançamento: 28 de março de 2025
Crítica
Ouvimos: Bria Salmena, “Big dog”

“Eu não tenho grandes expectativas / o que quer que isso signifique”, jura a canadense Bria Salmena em Drastic, primeira faixa de sua estreia solo, Big dog. No Brasil, o nome de Bria provavelmente não é muito comentado – mas lá fora, ela já tocou numa banda de pós-punk chamada FRIGS e fez vocais de apoio para o novo countryman Orville Peck.
Tem até algo de country e pós-punk no som do disco dela, mas essencialmente, Big dog é uma espécie de disco de rock que, hum, “une todas as tribos” (como disse certa vez Dinho Ouro Preto ao citar o Nirvana e escrever erradamente “Norvana”). Bria tem voz grave, rouca e sexy e investe em tons sombrios, guitarras que formam paredes – sem que o som se transforme em shoegaze -, vibes que lembram Pretenders e Siouxsie and The Banshees e momentos em que o grito substitui o canto.
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Drastic abre o álbum jogando Big dog em climas trevosos (graças à guitarra e à bateria), Closer to you é uma canção agridoce e inorgânica – por causa dos teclados e bateria quase sequenciados – e Radisson parece evocar bandas oitentistas como The Church, que uniam pós-punk e dream pop. As indefectíveis referências de soft rock que aparecem em vários lançamentos surgem também em Big dog, em faixas como Backs of birds. Rags, que já rendeu um clipe safadinho, insere mais rock dos anos 1980 com argamassa gótica na história – nessa faixa, a voz de Bria se torna quase gutural.
No geral, Bria parece interessada em unir épocas diferentes do rock. Soa como um Queen raivoso, com drive na voz, no quase tecnopop Stretch the struggle, volta a climas sombrios em See’er (com Lee Ranaldo) e Peanut, e chega perto do post-rock em Twilight, On the line e Water memory. Tudo isso faz de Big dog um caderno de referências e um catálogo de explorações musicais, e uma estreia de peso.
Nota: 8
Gravadora: Sub Pop
Lançamento: 28 de março de 2025
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