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Crítica

Ouvimos: Billie Eilish, “Hit me hard and soft”

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Ouvimos: Billie Eilish, "Hit me hard and soft"
  • Hit me hard and soft é o terceiro álbum da cantora norte-americana Billie Eilish. O disco tem produção de seu irmão Finneas O’Connel, com quem ela compôs todas as faixas.
  • Billie não lançou singles antes do álbum – o compacto de Lunch saiu no dia do lançamento de Hit me hard and soft. Mas três faixas (Lunch, L’amour de ma vie e Chihiro) foram mostradas ao público durante um DJ set surpresa no festival Coachella em 13 de abril.
  • A turnê do álbum começa no dia 29 de setembro, no Videotron Centre, em Quebec, Canadá.

Relacionamentos são temas que dão discos interessantes – o mais recente de Dua Lipa, Radical optimism, é quase um Tinder musicado, versando sobre ghosting, dates furados, relacionamentos marcantes (para o bem e para o mal), e vai por aí. Bom, no caso de Hit me hard and soft, novo disco de Billie Eilish, não há só apenas relatos de casos amorosos nas letras, o que já diferencia o disco, de cara. O date mais profundo de Billie que surge narrado no álbum é com a própria vida. Com um monte de experiências que vão acontecendo dia após dia, com o caos, com as (digamos) tentações, com as coisas que aparecem e dá vontade de fugir delas.

Já há resenhas apontando que Billie mexe com uma vulnerabilidade incomum no universo pop. O que surge no disco é uma mescla de vulnerabilidade e coragem. Enfim, é um disco feito por uma mulher de 22 anos, e no caso específico de Billie, trata-se de uma mulher de 22 anos que, em pouco tempo de carreira, ganhou Grammys, dois Oscar, virou assunto da mídia, ganhou status de ícone fashion, e virou sinônimo de pessoa que chama a atenção, numa época em que conseguir a atenção das pessoas, muitas vezes, é como barras de ouro: valem mais do que dinheiro.

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Não deve ser por acaso que o disco abre com Skinny, uma música que mistura novos relacionamentos, o inferno dos comentários invasivos (“as pessoas dizem que estou feliz/só porque estou magra”), autoestima (“meu velho eu ainda sou eu/e talvez seja meu eu real/e eu acho que ela é bonita”) e amadurecimento. Na sequência das entrevistas que deu falando sobre sua sexualidade, Billie solta Lunch, música sexualmente ativíssima na qual ele já abre falando que “eu poderia comer aquela garota no almoço/ela dança na minha língua”. É pra deixar claro: se houve em algum momento qualquer dificuldade em lidar com comentários sobre seu corpo, sua sexualidade ou sua persona artística, Billie avisa que, apesar dos pesares do mundo, gosta de si própria, de suas escolhas e de sua história. E não vai aturar as bobagens de sempre.

Billie volta construindo um pop que, além de parecer realmente ter sido gravado num quartinho, parece ter sido feito para ouvir de fones de ouvido, ou num volume médio. Abre com a melancolia de Skinny, e prossegue com tom roqueiro e dançante em Lunch, e com a discrição pop de Chihiro e Birds of a feather. E com o tom tranquilo da balada L’amour de ma vie, com sua letra indicando mais e mais confusões amorosas. Já Wildflower e The greatest servem para acalmar os ânimos da turma que já se anima em encontrar referências bittersweet-jazzísticas-bossanovistas no som dela.

Encerrando o disco, por acaso, duas faixas significativas: Bittersuite (um synth pop em três partes, com tom dream pop no começo e no fim, além de bateria eletrônica rudimentar e beats latinos no meio). E Blue, música homônima do álbum de Joni Mitchell de 1971, mas que soa mais como um r&b de baixos teores. Vale como referência, como brincadeira e até como confusionismo, mas não existe possibilidade de as dores de crescimento de Billie serem comparadas ao bode pós-hippie de Mitchell (o jornal britânico The Telegraph fez essa comparação), nem musicalmente, nem existencialmente. E ainda assim Hit me hard and soft é um grande disco.

Nota: 8,5
Gravadora: Darkroom/Interscope

Crítica

Ouvimos: Samuel de Saboia – “As noites estão cada dia mais claras”

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Ouvimos: Samuel de Saboia - "As noites estão cada dia mais claras"

RESENHA: Disco de estreia de Samuel de Saboia mistura rock nordestino, MPB maldita, tropicalismo e pós-punk em um retrato intenso de desejo e identidade.

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As noites estão cada dia mais claras, primeiro álbum do pernambucano Samuel de Saboia, é um disco de rock brasileiro setentista lançado em 2025. Mas nada de Casa das Máquinas ou Made In Brazil. É uma estética de rock nordestino, influenciada por artistas malditos da MPB – a capa, com várias fotos, lembra o lay-out de Eu quero é botar meu bloco na rua, de Sérgio Sampaio, e o de Sweet Edy, de Edy Star – e que se utiliza de vibes e batidas latinas e ciganas em vários momentos.

O repertório de Samuel é construído em torno da força dos versos e dos vocais, como no clima épico de Vingança colorida (que prega: “vou mostrar como cobra pode voar”, em meio a violas e percussões) e na psicodelia espacial de Gira, evocando Paulo Diniz. Surge até algo de pós-punk em Deusa dos prazeres bobos – um dos melhores arranjos do disco, com metais simples e guitarra limpa lembrando Smiths.

    • Ouvimos: Raquel – Não incendiei a casa por milagre
    • Ouvimos: Josyara – Avia
    • Ouvimos: Gabre – Arquipélago de Ilhas Surdas

Mesmo assim, a cara de As noites… é dada mesmo pela vibe tropicalista de faixas como Meteoros de haxixe (com andamento herdado de Taxman, dos Beatles) e Eu preciso de distância, ambas com vocais lembrando Edy Star e Gilberto Gil – a segunda é retomada ao fim do disco com uma releitura ao vivo.

Dando uma variedade maior ao disco, tem o clima quase soul de Amigo (que tem lembranças do já citado Sergio Sampaio), e a balada blues Rei de nada, que abre num clima parecido com o de Êxtase, de Guilherme Arantes, e vai mudando de cara. A força da voz de Samuel surge especialmente nos ecos e silêncios de Sangue, cheia de escalas árabes, e no beat nordestino, cantado em falsete, de Mainha.

As noites estão cada dia mais claras (definido por Samuel como um álbum de “desejo físico”) é repleto de descobertas e auto-descobertas. Ouça.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 9
Gravadora: Independente.
Lançamento: 7 de maio de 2025

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Crítica

Ouvimos: Marcos Lamy – “Braço de mar”

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Ouvimos: Marcos Lamy - "Braço de mar"

RESENHA: Marcos Lamy mistura forró, samba, rap e jazz com bom humor e criatividade no disco Braço de mar.

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O meio do ano chegou e, com ele, vão surgindo os discos legais para ouvir justamente na época das festas juninas. O maranhense Marcos Lamy, em Braço de mar, une o bom humor do forró a toques de outros estilos. Lá vem, logo na abertura, abre como forró-reggae e vai ficando mais ágil. O som parte para o forró marítimo da faixa-título, para a sacanagem de Mulecagem (com Lucas Ló) e para a união com samba de Passarinho (com os vocais de Clara Madeira).

Marcos lembra o desdobre universitário das sanfonas, triângulos e zabumbas em Dois beijos e, com Hermes Castro, acresenta um pouco da prosódia do rap em O que não é de mim, enquanto Virá traz um pouco da MPB setentista e lembra Caetano Veloso. Um lado mais experimental, por sua vez, surge em Baião dividido – com ritmo que vai ganhando intervalos pouco usuais até virar baião de vez – e no final, com o instrumental Olha o fole, Vinicius!, oscilando entre baião e jazz.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8
Gravadora: Independente
Lançamento: 22 de maio de 2025.

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Crítica

Ouvimos: The Wants – “Bastard”

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Ouvimos: The Wants - "Bastard"

RESENHA: Cinco anos após o debut, o The Wants lança Bastard: um pós-punk sombrio, eletrônico e emocional, marcado por perdas e uma vibe densa e melancólica.

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Trio de Nova York, o The Wants uniu design musical pós-punk e amor pelas criações ruidosas em seu disco de estreia, Container (2020). Cinco anos depois, sai o segundo álbum, Bastard, mais equilibrado na dicotomia barulho-melodia. Madison Velding-VanDam, Jason Gates e Yasmeen Night não apresentam nada tão perfeitamente audível quanto o quase-hit Fear my society, single do primeiro álbum – até hoje a melhor faixa da banda. Mas o disco novo tem alma e sombra, e se alimenta de ambas.

Bastard não tem um DNA feliz. Madison, o vocalista, viu seu pai morrer no finalzinho dos trabalhos em Container – ele partiu após vários anos de abusos com drogas e álcool. Assim que Container saiu, veio a pandemia, e todo o trabalho imaginado para o debute foi por água abaixo. As tais sombras tomam conta de todo o repertório do novo álbum, margeando o lado deprê de New Order e Depeche Mode em Void meets concrete, lembrando o Joy Division do começo (só que mais eletrônico e arrumadinho) em Data tumor, e partindo para o clima tribal e meio psicodélico de bandas como Siouxsie and The Banshees e Killing Joke em 87 gas.

Até ai você já percebeu que The Wants voltou com a cara do pós-punk na época em que o estilo se esforçava para parecer mais insociável. A onda continua firme e forte no som deprê e gélido de Disposable man (lembrando The sound e Killing Joke, com silêncios nos vocais e intervalos nos riffs de guitarra), na vibe afro-punk de All comes at once – com sons rangendo no fim – e no quase post-rock de Too tight. Já Feelin alright concentra todo o desnorteio do disco, enquanto Explosions abre quase zoeira, com synth lembrando Sparks e Japan – até fazer jus ao título aos poucos.

No meio de Bastard, uma música que pode apontar um outro caminho para o grupo é a balada sombria Cruel – uma canção triste e em tom ambient, como se descrevesse um cenário de solidão. E que reforça a ideia de que o novo álbum do The Wants é um mergulho sem volta nas dores que o mundo real insiste em não calar.

Texto: Ricardo Schott.

Nota: 9
Gravadora: STTT
Lançamento: 13 de junho de 2025.

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