Cultura Pop
10 + 1 clássicos do bubblegum pop
E lá vem Noel Gallagher com o disco novo, Who built the moon. Dessa vez, o ex-Oasis ressucitou um estilo musical que foi mania nos anos 1960 e 1970, o bubblegum pop. Tudo aconteceu por intermédio do sample de uma banda desconhecida do estilo, Ice Cream, que ele usou em Holy mountain, o primeiro single.
O riff de flautinha da música – que surgiu em grande estilo até na apresentação de Noel no Morumbi, abrindo para o U2 – foi tirado de Chewing gum kid, raro single dessa banda de Ohio. Na época, Noel chegou a falar que a música era tão rara que não adiantava nem procurá-la no Google e no YouTube. O cacete: vários fãs acharam a canção de imediato no YouTube. Na época, demos até uma notinha a respeito.
O clima fofinho de Holy mountain e a doçura de Chewing gum kid têm tudo a ver com o bubblegum. Um estilo que era marcado por melodias cantaroláveis, corinhos felizes e letras que, em muitos casos, referiam-se a garotas como se fossem doces, sorvetes ou bolos com um glacê beeeem cremoso. Ou abordavam o universo infantil, com a ideia de atingir a criançada. E, como diz o próprio nome do gênero musical, tudo era feito pra grudar igual a chiclete.
O bubblegum, por sinal, tinha grande paixão pela indústria de doces, com artistas lançando suas próprias marcas de chicletes. E era ligado também à produção de desenhos animados. Algumas bandas ganharam suas próprias séries – ou, mais complexo ainda, alguns desenhos saíram das telas e viraram bandas. As origens da música dessa rapaziada estavam numa época em que o rock e o pop eram mais inocentes e menos psicodélicos. Muita gente cita bandas como Searchers (do pré-bubblegum Sugar and spice), Monkees e até os Beatles pré-1965 como pais espirituais dessa turma açucarada e chicletuda.
Abaixo, você conhece dez + 1 clássicos dessa era.
“SNOOPY VS. THE RED BARON” – THE ROYAL GUARDSMEN (1966). Esse grupo americano resolveu colocar em música as aventuras do cachorro do Charlie Brown contra o Barão Vermelho. Só esqueceram de pedir autorização para o criador dos quadrinhos, Charlie Schultz, o que acabou impedindo o lançamento do disco no Canadá. Os Guardsmen ainda gravaram outras músicas sobre o universo de Snoopy: Return of the Red Baron, Snoopy and his friends, Snoopy for president. Em 2006 voltaram, e tiveram uma recaída com a inacreditável Snoopy vs. Osama (!).
“THE RAIN, THE PARK AND THE OTHER THINGS” – THE COWSILLS (1967). O som desse grupo americano formado por cinco irmãos Cowsill estava mais para um encontro entre a psicodelia e o som chiclete. O principal hit deles, The rain…, era uma canção melancólica sobre uma garota cheia de flores nos cabelos (nas rádios, o pessoal ligava pra pedir pra tocarem “a música da flower girl”), que convidava o narrador para um passeio no parque. E no final, desaparecia, deixando uma flor na mão do sujeito. Essa sofrência chegou no Top 5 em todos os lugares do mundo.
“Poxa, conheço essa música e não lembro de onde”. É da sequência do sonho de Lloyd Christmas (Jim Carrey) em Débi & Lóide, quando ele sonha em visitar a amada Mary Swanson (Lauren Holly). Na cena, entre outras maluquices, ele diverte uma turma de amigos com várias histórias sequeladas e acende um peido com um isqueiro (agradecemos a Fernanda Bauer pela lembrança).
Aliás, os Mutantes gravaram essa música, no disco A banda tropicalista do Duprat, de 1968.
“GREEN TAMBOURINE” – THE LEMON PIPERS (1967). No auge do estilo, o bubblegum tinha sua Motown. Era a Buddah Records, dirigida por um sujeito chamado Neil Bogart, e que contratava todas as bandas do estilo que apareciam pela frente. Esse grupo meio bubblegum, meio psicodélico conseguiu o primeiro hit dessa galera e abriu alas para a candura e para a ingenuidade do rock. Anos depois, Bogart deixou a Buddah e montou a Casablanca Records, que tinha vários nomes da disco music entre seus contratados. E o Kiss.
No Brasil, o grupo argentino Beat Boys gravou a música como Meu tamborim. Beat Boys eram a banda que acompanhou Caetano Veloso em Alegria, alegria. O baixista do grupo, Willie Verdaguer, tocou com Secos & Molhados e até hoje toca com Guilherme Arantes.
“YUMMY YUMMY YUMMY” – OHIO EXPRESS (1967). Se o bubblegum existisse como gênero fodão nos dias de hoje, possivelmente essa música seria o “hinão” do estilo. Letra romântico-fofinha, versos falando sobre um garota “que é mais doce que açúcar”, uma onomatopeia de HQ no título e no primeiro verso… Essa música produzida pelos Rick Bonadios do estilo (Jerry Kasenetz e Jeff Katz, da Super K Produções) ganhou fãs e haters quase em igual proporção. Chegou ao Top 5 na Europa e nos EUA, e ao oitavo lugar do ranking de músicas com letras bobas da Time.
https://www.youtube.com/watch?v=-4aQiFaCod8
“SIMON SAYS” – 1910 FRUITGUM COMPANY (1967). Surgido em Nova Jersey, esse grupo (que, no começo, dava shows para famílias em clubes, à beira da piscina) fez a alegria de muitas crianças com esse hit. Que reproduzia uma brincadeira infantil muito popular em acampamentos de férias nos EUA – o “Simon diz”. O grupo existe até hoje. Em entrevistas, costumam dizer que nunca foram uma armação de estúdio, ao contrário de várias bandas bubblegum. “Escrevemos várias coisas nos discos, embora não tenhamos feito vários dos hits”, disse o vocalista Frank Jeckell.
“DING-DONG, THE WITCH IS DEAD!’ – THE FIFTH ESTATE (1967). Essa banda do Connecticut estava mais para pop barroco e psicodelia. Mas acabaram sendo enfiados na subcultura bubblegum por terem gravado Ding-dong…, um tema tirado do filme O mágico de Oz – e que fez tanto sucesso que acabou tendo que ser regravado por eles em japonês. No mesmo, ano, ainda gravaram uma versão de Heigh-Ho!, da trilha de Branca de Neve e Os Sete Anões (o popular “eu vou, eu vou/pra casa agora eu vou”).
“THE TRA LA LA SONG (ONE BANANA, TWO BANANAS)” – BANANA SPLITS (1968). Criado pela Hanna-Barbera para concorrer com os Archies – que já existiam mas não haviam estourado – os Banana Splits eram um grupo de bonecos que tinha um programa na NBC, e soavam como um Monkees mais infantilizado. O repertório da banda era tocado e cantado por vários nomões dos estúdios. E vale dizer que outras animações da HB, como Scooby-Doo (que quase foi uma série-com-banda-fictícia), Tutubarão e Josie & The Pussycats vieram da mesma raiz.
“SUGAR, SUGAR” – ARCHIES (1969). “Formados” pelos personagens da popular revista de quadrinhos Archie Comics, os Archies tinham um álbum inteiro lançado antes de seu principal hit. Sugar, sugar surgiu em 1969 e formatou muita coisa que viria depois no segmento – além de sacramentar a união entre bubblegum, quadrinhos e desenho animado. Não foi o único hit do grupo ficcional, já que depois viriam Jingle jangle e Sunshine.
Em 1992, uma versão remix dessa música virou tema de abertura de uma novela da Rede Globo, Despedida de solteiro.
“GIMME GIMME GOOD LOVIN'” – CRAZY ELEPHANT (1969). Mais uma criação da Super K Produções, esse grupo americano durou pouco e teve praticamente só esse hit – que ofuscou todos os outros. Músicas desse grupo tiveram participação não-creditada de artistas como Kevin Godley, futuro 10cc, que fez lead vocals.
https://www.youtube.com/watch?v=HUTsfwCbN5I
“I THINK I LOVE YOU” – THE PARTRIDGE FAMILY (1971). Tem quem inclua grupos mais voltados para o soul, como Jackson 5, ou novidades roqueiras dos 1970 como Suzi Quatro e Alvin Stardust, na seara do bubblegum. Um dos exemplos mais bem acabados de como a estética chegou aos anos 1970 foi com a série que no Brasil passou na TV com o nome de Família Dó-Ré-Mi. E que despertou a atenção das adolescentes por causa do recém-falecido David Cassidy.
E + 1
“WE COME IN THE SUNSHINE” – DIRTBOMBS (2013). Banda de garagem de Detroit, os Dirtbombs fizeram recentemente um disco inteiro só de repertório autoral voltado para o bubblegum, Ooey Gooey Chewy Ka-Blooey!. Com citação explícita de Good vibrations, dos Beach Boys, We come… faz parte de uma miniópera que encerra o álbum, The sunshine suite. O líder do grupo, Mick Collins, manteve nos anos 80/90 a banda punk The Gories, que chegou a gravar na Sub Pop.
Crítica
Ouvimos: Joan Armatrading, “How did this happen and what does it now mean”
- How did this happen and what does it now mean é o vigésimo-primeiro disco de estúdio da cantora e compositora britânica Joan Armatrading. A única coisa que ela não fez no disco foi a engenharia de gravação: ela compôs, tocou, cantou, produziu e programou tudo.
- Ao The Guardian, ela explicou o título do disco (“como isso foi acontecer e o que significa agora?”): “Acho que nos tornamos polarizados porque quando você está cara a cara com alguém, coisas como linguagem corporal e contato visual nos impedem de fazer certas coisas. Isso não acontece nas mídias sociais, então se espalha para o mundo real. Não vamos nos livrar de todas as guerras e desentendimentos, mas o título do álbum está perguntando como diabos podemos sair dessa situação em que estamos e como voltamos para um lugar melhor”.
Descobrir, sem estar esperando, que Joan Armatrading lançou um novo álbum, é uma surpresa enorme. Ver que o disco é um projeto quase inteiramente solo (ela compôs, produziu, tocou e programou tudo sozinha) não chega a ser uma surpresa para quem conhece um pouco da história dela e pelo menos alguns hits e discos clássicos.
No caso de How did this happen and what does it now mean, o estilo conhecido de pop-rock confessional dela, já a partir do título, vem com um subtexto de sobrevivência e superação. Ainda que algumas histórias contadas nas letras apontem para ressacas amorosas e falsidades do amor em geral, como no pop-rock Someone else e no r&b I gave you my keys (“eu te dei minhas chaves para tudo que eu tinha/você era minha divindade, você governou meu mundo/governou minha terra, governou meu céu/como você pôde me machucar tanto?”).
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
Já o blues-rock-soul percussivo I’m not moving põe violência urbana no disco, com Joan recordando as cenas que viu durante um assalto, e levando a história para uma situação em que a minoria tem as maiores cartas na mão (“posso ser pequeno/mas sou poderoso/você pode ser muito mais velho/mas ainda assim eu governo você”). O pop com argamassa soul e musicalidade herdada do folk, especialidade dela, volta em faixas como 25 kisses, Here’s what I know e a faixa-título, que conta outra história de amor que acaba com problemas e dúvidas (“onde está aquela versão de nós mesmos/que nós amávamos, que era tão preciosa/em nosso mundo, em nossos corações?”).
Para quem tem saudades do lado baladão de AM de Joan, registre-se a presença de Irresistible e Say it tomorrow e do gospel Redemption love. No disco novo, ela fez questão de que todos os seus lados musicais convivessem sem problemas, cabendo até dois instrumentais, Now what e Back to forth, nos quais ela se mostra uma excelente guitarrista de blues e rock. Aos 74 anos e sabendo fazer de tudo num estúdio, Joan é o poder, mesmo que falte um certo empoderamento nas histórias amorosas das letras.
Nota: 7,5
Gravadora: BMG
Crítica
Ouvimos: Os Paralamas do Sucesso, “10 remixes”
- 10 remixes traz (como diz o próprio título) dez canções dos Paralamas do Sucesso remixadas. O trabalho foi orquestrado pelo DJ Marcelinho da Lua, que escolheu DJs de diferentes gerações. O trio e o empresário José Fortes também já tinham uma lista com alguns nomes.
- “Tudo começou quando eu estava num show do Paul McCartney em 2013, quando prestei atenção nas inúmeras releituras de músicas dos Beatles feitas por DJs que tocavam antes do Paul subir ao palco. Fiquei pensando como seria legal se fizessem o mesmo com o repertório dos Paralamas”, contou João Barone, baterista da banda, em seu Instagram.
Lançar um álbum de remixes dos Paralamas do Sucesso é uma ideia tão boa que não dá pra entender como ninguém pensou nisso antes. Discos de remixes de um mesmo artista, aliás, costumam sair bem irregulares, além de cometerem verdadeiras atrocidades. Felizmente, 10 remixes saiu legal, e quase tudo pode ser dançado na pista e ouvido em casa sem (muitos) atropelos.
Em Lanterna dos afogados, Mahmundi deu um ar dançante e viajante à música, e inseriu sua voz como parte das novidades da canção – soou tão bem que ela deveria pensar em fazer outras visitas à obra da banda. Ska, com DJ Marky, virou um cruzamento de ska, reggae e drum’n bass. O beco ganhou remix conceitualmente correto (e bom) do Tropkillaz, em clima funk-reggae, com os vocais de Herbert Vianna filtrados e à frente. Selvagem, nas mãos de Daniel Ganjaman, virou reggae-dub.
No 10 remixes, vale também citar o samba-funk-reggae que surge de O amor não sabe esperar (com Paralamas e Marisa Monte), capitaneado por Pretinho da Serrinha e Bossacucanova. Além do synthpop simultaneamente experimental e cheio de balanço de Mulú em Aonde quer que eu vá, e do redesenho drum’n bossa de Marcelinho da Lua em Mensagem de amor.
Por outro lado, Lourinha bombril rendeu menos do que poderia ter rendido nas mãos do Àttooxxá. Ela disse adeus, com Papatinho, virou um batidão funk pequenininho (com pelo menos um minuto a menos que o original) e sem muitos atrativos. E não sei até que ponto a balada stoniana Saber amar tinha que ganhar um remix techno de botar fogo na pista, que foi para as mãos de Ké Fernandes (Groove Delight).
Nota: 8
Gravadora: Universal
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
Crítica
Ouvimos: New Order, “Brotherhood (Definitive edition)”
Pode ser algum problema de atenção ou de audição, mas não percebi nenhuma diferença no som dessa edição definitiva de Brotherhood em relação à remasterização “de colecionador” do disco, lançada em 2008 (e vale lembrar que o quarto álbum do New Order, de 1986, já teve seus bastidores recordados aqui mesmo no Pop Fantasma). Dois anos antes do quadragésimo aniversário do Sgt Pepper’s às avessas do grupo, no entanto, a definitive edition lançada pela Rhino é a melhor forma de comemoração, por reunir num só lançamento o antes, durante e depois do álbum.
Resumindo a história em poucas linhas: Brotherhood saiu numa época de transição para o New Order, uma banda cujas vendas ajudavam a dar sustentação ao selo indie britânico Factory, mas que não vivia uma vida de grupo do primeiro time – com direito a shows nos cafundós, camarins zoados e uma certa sombra de desprestígio. O álbum era dividido entre um lado A mais roqueiro e um lado B mais eletrônico. As duas faces eram balizadas por uma espécie de pós-punk-country (Paradise, com letra inspirada nas “canções de partida” do estilo musical) e um futuro clássico dance-pop (Bizarre love triangle).
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
- Mais New Order no Pop Fantasma aqui.
- Episódio do nosso podcast sobre eles aqui.
Mas ainda havia no álbum rocks de pista (Broken promise, Way of life), outro pós-punk dançante (Weirdo, com abertura “falsa”), uma canção acústica pop e quase sixties (As it is when it was), dance music ambient (All day long), dance music sombria e lisérgica (Angel dust) e o encerramento com Every little counts, cantada por Bernard Sumner aos risos (ele chega a interromper a música para rir) e fechada com alguns minutos de psicodelia e ruídos.
A nova edição dá som a histórias sempre contadas a respeito do grupo, trazendo por exemplo, as músicas da demo gravada por eles no Japão em 1985, em meio a uma turnê por lá. A versão de State of the nation não é exatamente imperdível, mas a de As it is when it was vale a audição: vem mais tecnopop, sem violão, sustentada pelo baixo agudo de Peter Hook, e com certa cara de The Cure.
Evil dust, que já havia sido lançada na edição de colecionador de 2008, retorna – é uma versão “maligna” de Angel dust, com mais espaço para os vocais da cantora libanesa Dusya Yusin, sampleados de duas músicas de Brian Eno e David Byrne, The carrier e Regiment (ambas do disco My life in the bush of ghosts, de 1981). O material composto pelo New Order para o filme Salvation! (1987), de Beth B, aparece na íntegra, dos temas instrumentais (como as quase progressivas Salvation theme e Sputnik) ao single bem sucedido Touched by the hand of god.
Das inéditas lançadas na nova edição de Brotherhood, tem uma para escutar no último volume: Every little counts aparece em sua lendária versão completa, com alguns minutos a mais de psicodelia ruidosa e assustadora no final, um segundinho de silêncio e… o ruído de toca-discos pulando. Era para ser mais parecido ainda com A day in the life, fechamento do Sgt Peppers, dos Beatles, e era para dar mais sensação ainda de desnorteio. Brotherhood é uma ousadia que ainda permanece atual.
Nota: 9
Gravadora: Rhino
-
Cultura Pop4 anos ago
Lendas urbanas históricas 8: Setealém
-
Cultura Pop4 anos ago
Lendas urbanas históricas 2: Teletubbies
-
Notícias7 anos ago
Saiba como foi a Feira da Foda, em Portugal
-
Cinema7 anos ago
Will Reeve: o filho de Christopher Reeve é o super-herói de muita gente
-
Videos7 anos ago
Um médico tá ensinando como rejuvenescer dez anos
-
Cultura Pop8 anos ago
Barra pesada: treze fatos sobre Sid Vicious
-
Cultura Pop6 anos ago
Aquela vez em que Wagner Montes sofreu um acidente de triciclo e ganhou homenagem
-
Cultura Pop7 anos ago
Fórum da Ele Ela: afinal aquilo era verdade ou mentira?