Crítica
Ouvimos: Rubel – “Beleza. Mas agora a gente faz o que com isso?”

RESENHA: Rubel surpreende em Beleza. Mas agora a gente faz o que com isso?, disco de MPB com ambiência rica, sons intimistas e canções que desafiam padrões.
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
- E assine a newsletter do Pop Fantasma para receber todos os nossos posts por e-mail e não perder nada.
Se você não via tanta graça assim no som de Rubel, pode se preparar para ser surpreendido/surpreendida. No quarto disco, Beleza. Mas agora a gente faz o que com isso?, ele parece finalmente ter encontrado uma identidade sonora que diferencia sua música não só pela composição, mas também pela ambiência e pelo design musical – aqueles detalhes que fazem toda a diferença na experiência de escutar um disco.
Beleza é um disco de MPB que você vai querer ouvir numa caixa acústica gigante – e talvez até se pergunte por que os CDs, antes símbolos de audiofilia avançada e altíssima fidelidade, perderam o charme. Sim, porque assim como acontece com a estreia de Joaquim, Varanda dos palpites (resenhado pela gente aqui), o novo de Rubel parece um daqueles discos que, lá por 1990, 1991, davam a impressão de que você podia “ver” a disposição dos músicos no estúdio. Ruídos de respiração, toques de instrumentos e até sons que lembram cliques de computador criam uma sensação de intimidade, como se estivéssemos assistindo a um ensaio enquanto a vida acontece ao redor.
É o caso da MPB guiada pelo violão em Feiticeiro gozador – faixa multipartida, com clima pós-bossa-folk, orquestrações e cara de trilha de novela dos anos 1970. Ou de A janela, Carolina, versão da canção A la ventana, Carolina, do mexicano El David Aguilar, que soa como uma resposta à Carolina, da canção de Chico Buarque. Só que aqui a personagem ganha liberdade, convidada a olhar para dentro de si, e não mais para rosas e estrelas pela janela. Ouro evoca uma MPB de dentro pra fora: soa antiga, mas com um balanço renovado.
Beleza foge da curva de Rubel e, como álbum, abriga músicas que fogem da própria curva. É o caso de Carta de Maria, com balanço afro, metais e clima que remete ao Caetano Veloso de Cores, nomes (1982). E também do encerramento com Reckoner, cover do Radiohead, reinventada no formato voz e violão. São interlúdios em um disco que, na maior parte do tempo, soa como uma faixa só. Nessa “faixa” cabem o quase folk de Azul, bebê, a MPB de quarto da pessimista e realista Noite de réveillon (“todo ano eu ouço: tudo vai mudar / eu já não caio / vou dormir”), e a dissonância em letra e música de Praticar a teimosia.
Inclui também a ousadia de Pergunta ao tempo. Na cola de Resposta ao tempo, de Aldir Blanc e Cristóvão Bastos, Rubel formula perguntas de desconcertar. Pelo menos uma delas, garanto que você já se fez: “desculpa perguntar / não quero atrapalhar / mas por que o ano encurta / depois de virar?” Um disco de pulgas atrás da orelha, e de sons que reverberam na mente por bastante tempo.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 9
Gravadora: Independente
Lançamento: 28 de maio de 2025
Crítica
Ouvimos: Supercombo – “Caranguejo” (parte 1)

RESENHA: Supercombo lança a parte 1 de Caranguejo: mistura criativa de metal, punk, emo, forró e piseiro, com letras irônicas e emotivas.
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
- E assine a newsletter do Pop Fantasma para receber todos os nossos posts por e-mail e não perder nada.
E aí? Como lidar com essa coisa dos lançamentos de discos, às vezes, serem divididos em duas partes? Enfim, quando o lado A sai primeiro e meses depois vem o B – caso por exemplo, do disco mais recente do Circa Waves. Decidimos que vale resenhar a primeira parte e, depois, fazer um texto mais completo – e com outra nota, maior ou menor – quando todo o conceito for colocado nas plataformas.
No caso da parte 1 de Caranguejo, novo disco do Supercombo, a torcida é para que a parte 2 complemente bem as ideias altamente criativas que a banda pôs nesse primeiro lançamento. Caranguejo, se fosse um EPzinho de 20 minutos, já seria o lançamento mais criativo e variado do grupo, buscando uma saída sonora que une metal, punk, emo e estilos que parecem tão imiscíveis a ele como óleo e água. A transmissão, na abertura, mescla som pesado, forró e piseiro para comentar sobre a vida dos artistas em época de pouco pagamento das plataformas digitais, e de rádio quase sucateado. Piseiro Black Sabbath você provavelmente já ouviu: um apelo aos bangers de cabeça aberta, um brega-metal de primeira.
As letras soam como um chamariz para o material e misturam-se ao clima livre do disco. Hoje eu tô zen é emo-anti-exaltação à turma gratiluz e aos coaches de plantão (e aos fãs deles). O eletroemo Testa é dedicado a alguém que já se foi, mas tenta abordar o tema de forma menos tensa. A ironia também toma conta da sofrência Nossas pitangas e da sofrência nonsense de O alfaiate – sobrou para Alento o momento sério do disco, um emo de encontros, desencontros e saudades, talvez de pai para filho (ou filha). Esperando agora pela parte 2.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Deck
Lançamento: 15 de agosto de 2025.
Crítica
Ouvimos: Water From Your Eyes – “It’s a beautiful place”

RESENHA: O Water From Your Eyes mistura pós-punk torto, ruído e melodias robóticas em It’s a beautiful place, disco curto e enigmático.
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
- E assine a newsletter do Pop Fantasma para receber todos os nossos posts por e-mail e não perder nada.
Nate Amos e Rachel Brown, os dois do Water From Your Eyes, criaram em seu terceiro disco, It’s a beautiful place, um universo que vem sendo chamado por aí de “alienígena”, “ficção científica”. Mas depois da audição e de uma olhadela em separado nas letras, a impressão que fica é a de que eles estão falando de algo que está dentro de nós mesmos. Ou de um mundo que faz a gente se iludir, como no jogo de tabuleiro musicado de Playing classics, em que, de passo em passo, uma pessoa “tentou chegar no além e acabou no shopping” e voam frases como “temos ídolos modernos para o fim de um era” e “eu só quero dançar, arquitetura sem aluguel”.
O som de It’s a beautiful place é difícil de definir. Entre vinhetas de ruídos e sons espaciais (como nos rasantes de sintetizadores de For mankind), o Water From Your Eyes parece querer fazer um pós-punk torto, uma no-wave ou um samba-punk – os três nomes cabem em Life signs, cheia de dissonâncias, mas que rende até bem em pistas de dança. Nights in armor é quase um pós-hardcore fincado numa superfície rotativa, transformado num samba robótico. Spaceship é pós-punk psicodélico com uma batida que vai se criando na cara do ouvinte – fica entre a primeira fase do Kraftwerk e uma espécie de valsa lisérgica.
Tem uma dicotomia entre “ruidoso” e “robótico” no som do grupo – tanto que sons de guitarra soam como se fossem feitos por máquinas, e ganham beats intermitentes, em faixas como Born 2 e a dance-punk Playing classics (que, segundo a banda, teve influência do Club classics, de Charli XCX). Agora, rola uma tentativa meio básica de soar tão despojado quanto artistas como Neil Young, J Mascis e até Ty Segall. Dá pra ver isso em solos de guitarra, riffs, vinhetas e em especial, no country rock dissonante e estranho da faixa-título (uma vinheta curtinha) e de Blood on the dollar, uma estranha canção de guerra do dia-a-dia (“não há inimigo / nada além de pele / sangue no dólar / deus, me faça vencer”). No fim, um disco curto (meia hora), que passa como um vento, e deixa perguntas.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Matador Records.
Lançamento: 22 de agosto de 2025
Crítica
Ouvimos: Jangada Pirata – “Sal de casa”

RESENHA: Jangada Pirata mistura pós-punk, psicodelia, caribe e guitarrada no disco Sal de casa, entre o sonho, o mar e o pop cearense.
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
- E assine a newsletter do Pop Fantasma para receber todos os nossos posts por e-mail e não perder nada.
Com um atrasinho de alguns meses, comentamos um lançamento indie bem instigante de 2025. O Jangada Pirata é uma banda cearense que passa estilos como rock, música caribenha, guitarrada, psicodelia e até micropontos de som gótico, tudo num filtro pós-punk. O som de Sal de casa alude à escuridão, a céu azul sobre a cabeça e a climas sonhadores e introspectivos – mesmo quando a banda faz música decididamente alegre.
Por vir do Ceará, o Jangada Pirata se associa naturalmente à variedade pop local. Mulher, na abertura, consegue soar cubana e gótica, Vai sofrer tem elementos de rock, reggae a até de pop adulto oitentista (Marina Lima em especial). Climas ligados ao blues tomam conta de Forma e pensamento, da cantiga apocalíptica Bandeira (com Mateus Fazeno Rock) e da valsa gótica-metal Mentes, além das experimentações rítmicas de Vem a lua cheia – que chega a lembrar a Gal Costa de Fa-Tal (1970/1971) no refrão.
Destacando os vocais de vibe jazz de Cecília Mesquita, o Jangada Pirata ganha clima espacial, quase na cola de bandas como The Waeve, na psicodelia de Carona numa estrela e na contemplação de Tenho sonhado com o mar. E investe em canções de quem olha o mar e o céu na base do sonho e da aventura.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Mercúrio Música
Lançamento: 8 de março de 2025.
-
Cultura Pop5 anos ago
Lendas urbanas históricas 8: Setealém
-
Cultura Pop5 anos ago
Lendas urbanas históricas 2: Teletubbies
-
Notícias7 anos ago
Saiba como foi a Feira da Foda, em Portugal
-
Cinema8 anos ago
Will Reeve: o filho de Christopher Reeve é o super-herói de muita gente
-
Videos8 anos ago
Um médico tá ensinando como rejuvenescer dez anos
-
Cultura Pop9 anos ago
Barra pesada: treze fatos sobre Sid Vicious
-
Cultura Pop7 anos ago
Aquela vez em que Wagner Montes sofreu um acidente de triciclo e ganhou homenagem
-
Cultura Pop8 anos ago
Fórum da Ele Ela: afinal aquilo era verdade ou mentira?