Crítica
Ouvimos: Mark Knopfler, “One deep river”

- One deep river é o décimo disco solo de Mark Knopfler, lançado quase 30 anos após a dissolução de sua banda, Dire Straits – e quase 40 anos após o lançamento do principal disco do grupo, Brothers in arms (1985).
- O músico foi perguntado recentemente pela BBC se pensa em uma volta do Dire Straits. Disse que não, e contou que seu dia a dia é preenchido por seu estúdio, aonde passa o dia inteiro – e aonde gravou o disco novo. Também revelou que One deep river é tomado pela ideia do “voltar para casa”.
- Músicos como Ian Thomas (bateria), Greg Leisz (lap steel guitar, slide guitar), Glenn Worf (baixo) e Richard Bennett (guitarra) participam do álbum.
Sobre Mark Knopfler, algumas informações se perderam no tempo: Dire Straits, a ex banda do guitarrista inglês, era entendida como uma mescla de revolução musical e revisionismo quando começou, e foi um grupo da mesma cena local da banda new wave Squeeze (os de Cool for cats).
O mundo acabou enxergando Knopfler, por intermédio do álbum Brothers in arms (1985), como um rock quase acima do adulto-contemporâneo – o fato de Mark ter ganhado em 1981 o job de produzir Bob Dylan (no disco Infidels) ajudou nisso. Quem foi além das aparências e ouviu tanto a discografia da banda quanto os álbuns solo de Knopfler deparou com um guitarrista com abordagem quase mântrica ao tocar blues, rock e country. E que tem parentesco musical com David Gilmour e J.J. Cale, entre outros guitarristas de abordagem quase espiritualista.
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Agora corta para o décimo álbum solo de Mark, One deep river, cujo titulo e cuja foto de capa convidam o ouvinte a não tratar o álbum como um passatempo qualquer, ou como um disco de poucas faixas e canções diminutas. É um disco de rock calmo, adulto (vá lá) e contemplativo, em que Mark volta com seus fraseados típicos (feitos sem palheta), a serviço de uma sonoridade associável aos momentos mais tranquilos do Dire Straits, mas com outra roupagem.
Logo no começo do disco, Mark transita do blues rueiro ao country em Two pairs of hands, Scavengers yard (que tem até um discreto barulho de cuíca, entre as percussões) e Ahead of the game (dos versos “deixamos um sonho para trás em algum lugar/você tem que ter um sonho”). Partindo também para um bolerinho-balada anos 1950 em Smart money, para um conto de foras-da-lei que lembra Paul Simon e Bob Dylan, Tunnel 13, e para uma valsa-blues em Black tie jobs. Esta, curiosamente, um pequeno vislumbre do período em que Mark foi jornalista, na juventude – a letra fala sobre “amigos na redação” e “funções de terno e gravata”.
One deep river ganha lá suas semelhanças com os álbuns de Bruce Springsteen na romântica Janine, que abre uma fileira de faixas ainda mais contemplativas no disco, como no clima estradeiro e noturno de Sweeter than the rain, no country-blues floydiano Watch me gone, na balada country nostálgica Before my train comes. No final, o conto de promessas desfeitas e esperanças perdidas This one’s not going to end well, e a homenagem a um velho conhecido rio em One deep river. Um disco de rock de mensagem-na-garrafa, que poderia ter sido lançado nos anos 1970, 1980 ou 1990 (ou 2000, ou 2010), mas retorna como uma fórmula tão clássica que nunca envelhece.
Nota: 9
Gravadora: British Grove/Mercury
Crítica
Ouvimos: DJ Guaraná Jesus – “Ouroboros”

RESENHA: Em Ouroboros, DJ Guaraná Jesus funde memórias e beats acelerados em 20 minutos de nostalgia 32-bit, funk, big beat e eletrônica pop multitonal.
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“O álbum é uma homenagem a um passado não tão distante – uma fusão de memórias e futuros imaginados convergindo para o presente”. Criado pelo produtor Julio Santa Cecilia, o projeto solo DJ Guaraná Jesus reúne memórias, música e sons eletrônicos num álbum curto (são nove faixas em menos de vinte minutos!), que voa como se fosse apenas uma faixa dinâmica, evocando desde sons de jogos em 32-bit, até sons como Prodigy e Skrillex.
Não foi à toa que ele escolheu para o disco o título Ouroboros – que nada mais é do que o conceito do eterno retorno, da morte e reconstrução, simbolizado pela serpente mordendo a própria cauda. Na real, não deixa de ser uma maneira construtiva de se referir ao próprio universo pop e à sua mistura de épocas e desenhos musicais, que aqui aponta para sons acelerados como num dia a dia anfetamínico (Vitalwaterxxfly3 e XP), sem descuidar das surpresas melódicas. E prossegue com o batidão quase funk de Mercúrio retrógrado e a viagem sonora de Unidade de medida e D-50 loop – a primeira em tom meditativo, a segunda de volta à aceleração.
- Ouvimos: Skrillex – FUCK U SKRILLEX YOU THINK UR ANDY WARHOL BUT UR NOT!! <3
- Ouvimos: Papatinho – MPC (Música Popular Carioca)
Ouroboros parte também para o heavy samba eletrônico e ágil de Brsl, o batidão-de-caixinha-de-música de Hauss_hypa_vvvv e o big beat de Firenzi dolce vitta, encerrando com um batidão que remete ao samba-funk aceleradíssimo (Campari Devochka). Algumas faixas rendem mais do que apenas poucos minutos – ou até segundos – e poderiam ser esticadas. Mas Julio, com o DJ Guaraná Jesus e Ouroboros, quis aparentemente fazer um disco que pudesse acompanhar um passeio rápido no dia a dia.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Seloki Records
Lançamento: 16 de maio de 2025
Crítica
Ouvimos: Jonabug – “Três tigres tristes”

RESENHA: No álbum Três tigres tristes, Jonabug mistura noise rock, grunge e pós-punk com letras em inglês e português, guitarras ruidosas e identidade forte
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Vindo de Marília, interior de São Paulo, o Jonabug vem sendo incluído no rol do “emo caipira”, de bandas vindas de cidades pequenas, e que são influenciadas pela cena emocore do Centro-Oeste norte-americano. É isso, mas não só isso: o grupo de Marília Jonas (guitarra, vocal), Dennis Felipe (baixo) e Samuel Berardo (bateria) é um dos melhores exemplos atuais do noise rock brasileiro. Misturando inglês e português, fazem em Três tigres tristes, álbum de estreia, um som que está mais para grunge do que para shoegaze – mesmo que invista em paredes de guitarra e ruídos.
Esse é o som de faixas como Mommy issues, Além da dor, Look ate me e At least on paper my mistakes can be erased, misturas de vocal provocativo, guitarras cheias de riffs, certo balanço na batida e vibe sombria e confessional. Músicas como Fome de fugir e You cut my wings levam o esquema do Jonabug para algo mais próximo do pós-punk. A sua voz é o motivo da minha insônia e Taste everybody’s tears dispensam rótulos e lembram a vocação ruidosa e melódica dos anos 1990. E Nº 365 é um guitar rock falado, soando quase como uma trilha de filme.
No fim, Brown colored eyes traz mais um diferencial para o som do Jonabug: é quase uma balada guitar rock, com clima tranquilo e solo de guitarra com design sonoro oriental. O Jonabug escapa de qualquer caixinha e entrega um disco coeso, intenso e cheio de identidade própria.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 15 de junho de 2025.
Crítica
Ouvimos: Monchmonch – “Martemorte”

RESENHA: Monchmonch lança Martemorte, disco punk-eletrônico gravado no Brasil e Portugal, com HQ, vinil exclusivo e vibe no-wave psicodélica.
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Lucas Monch, criador do projeto musical experimental Monchmonch, pensa grande: Martemorte, disco novo do projeto, teve sessões de gravação em Brasil e Portugal, e sai junto com uma HQ que transforma o disco em projeto visual. Também vai sair em vinil, com um lado B exclusivo da mídia física. Lucas também criou duas formações do Monchmonch, uma no Brasil e outra em Portugal.
Martemorte é um bom exemplo de punk experimental e eletrônico – tendendo para algo bem próximo da no-wave às vezes, ou da zoeira misturada de punk, funk e eletrônicos do Duo Chipa (por sinal, Cleozinhu, do Duo, participa do disco com produções, samples e ruídos). Efeitos de guitarra e sons que parecem videogames ou trilhas de desenho animado marcam Bolinha de ferro, Vala lava, o punk espacial de Jeff Bezos paga um pão de queijo e a psicodelia lo-fi de Prédios. Rola até um clima psico-krautrock em City bunda e Coisa linda.
O disco vai ainda para o punk-country sacana em Velhos brancos jovens carequinhas e para uma perversão dos Beach Boys do disco Smiley smile (1966) em Rasga céu, tema espacial-psicodélico apavorante, em que milionários e donos de big techs são fatiados sem dó.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Seloki Records
Lançamento: 17 de junho de 2025.
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