Crítica
Ouvimos: Bethany Cosentino, “Natural disaster”

- Natural disaster é o primeiro disco solo da ex-cantora da banda indie Best Coast, Bethany Cosentino. O grupo anunciou um hiato por tempo indeterminado em maio, com Bethany anunciando que “a vida é muito curta para não dar a si mesmo o que você sente que precisa e deseja”, e que queria deixar de ser “a Bethany do Best Coast” por uns tempos.
- O material do disco foi escrito por Bethany ao lado de autores conhecidos: entre eles Kate York (que compôs para a série de TV Nashville), Mike Viola (que trabalhou com Ryan Adams, Panic At The Disco! e outros) e Sarah Buxton. Butch Walker, produtor do disco, contribui em algumas faixas.
- A balada Easy, que saiu como single, é definida por Bethany como ” a primeira canção de amor que escrevi que parece… saudável”.
O mundo estaria preparado para (ou desejaria ter) uma versão indie da Sheryl Crow? Sim, uma cantora/compositora no mesmo naipe, unindo country e rock dos anos 1970, com slide guitars, baladas de piano, canções confessionais e meio existencialistas, na base do “eu era assim, mudei, amadureci, mas continuo perdida às vezes” – mas com certo trânsito num público pouca coisa mais alternativo. Pois lá vem a ex-Best Coast Bethany Cosentino trilhando exatamente esse caminho com seu primeiro disco solo, Natural disaster.
Bethany fez uma metamorfose uma tanto parecida com a que Jenny Lewis vem fazendo em seus discos mais recentes: falar de emoções de gente grande tendo como base uma sonoridade que, em tese, não envelhece. Natural disaster tenta passar uma imagem de maturidade, mas está mais para um bom começo, repleto de referências que hão de alegrar ouvintes com mais de 40 (Bonnie Raitt e Linda Ronstadt foram citadas por Bethany em entrevistas) e com uma leva bem interessante de composições. Por acaso, Bethany foi gravar o disco em Nashville, com Butch Walker na produção, levando Natural para lugares bem diferentes do Best Coast.
Um lado forte de rádio anos 1990 (falamos em Sheryl Crow, lembre-se) aparece, por exemplo nas três primeiras faixas, Natural disaster, Outta time e It’s fine – essa última faria sucesso numa trilha de novela de Manoel Carlos, inclusive. E em outras canções com cara de hit, como It’s a single day e a boa Calling on angels. Algumas músicas vão para o mesmo lado girl group que já influenciava o Best Coast, mas recauchutado numa onda mais folk – Carole King deve ter servido de referência, talvez. Muita coisa lembra o Fleetwood Mac da época de Rumours (1977), com Stevie Nicks dominando as atenções.
De baladas, o disco tem Easy, unindo romantismo àquela sensação de desencanto com a vida adulta que uns têm e outros fingem que nunca tiveram: “crescer é fácil quando você tem dezessete anos/agora tenho trinta e cinco e não sei bem o que isso significa/sempre pensei que seria uma mãe com um propósito a descobrir”. Tem também o encerramento com I’ve got news for you, country pop só com voz e piano, dando sensação de conforto e isolamento. Falta um pouco mais de identidade, mas já tem músicas legais e é um bom começo.
Gravadora: Concord
Nota: 7
Foto: Reprodução da capa do disco
Crítica
Ouvimos: Superchunk – “Songs in the key of yikes”

RESENHA: Superchunk une power pop, punk e heartland rock em Songs in the key of yikes, disco radiante sobre crises, guerras e novos tempos sombrios.
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Por alguma razão que só os anos 1990 explicavam, a banda norte-americana Superchunk sempre foi vista no Brasil como sendo mais “alternativa” do que era de fato. Na real, guitarras pesadas, vocais doloridos e sons que os aproximavam de bandas como Hüsker Dü e Replacements mostravam que o grupo criado em 1989 era uma espécie de convidado atrasado na festa do college rock oitentista. E um convidado atrasado que estava longe de ter a esperteza comercial do Weezer, por exemplo – tanto que a carreira do Superchunk sempre girou em torno de selos indie como Merge Records e Matador, e o grupo nunca entusiasmou as grandes gravadoras.
Décimo-terceiro álbum de estúdio do grupo, Songs in the key of yikes mostra que o Superchunk, com o tempo, foi seguindo um caminho parecido com o do Guided By Voices. Ou seja: tornou-se a banda indie boa de melodias que, com o tempo, foi ganhando ares de heartland rock, aquele tipo de som que exprime orgulho e memória, além de uma certa relação com sua própria terra e sua gente.
O radiante novo álbum do Superchunk une power pop, rock de garagem e punk herdado de bandas como Ramones, Hüsker Dü, Wire e Blondie para cantar os novos tempos de Trump, guerras, mortes, falta de sensibilidade, um mundo sem arte, e coisas do tipo. Abrem até com Is it making you feel something, uma canção cantarolável que, segundo o vocalista e guitarrista Mac McCaughan, fala sobre dilemas e crises do impostor quando se cria algo.
Essa mistura de melodias alegres e brabeiras emocionais, que volta e meia deixa o Superchunk meio parecido com grupos como Big Star e Teenage Fanclub, é a base do disco. Dá as caras também no powerpop de Bruised lung, no mal-estar de No hope (cuja traz a frase-título, “sem esperança”, repetida várias vezes, além de versos como “quando tudo está perdido e não pode ser encontrado / e cada palavra de amor é apenas um som cortante”, além de um riff de guitarra que se transforma em explosão emocional) e na vibe sixties de Climb the walls.
Musicalmente, o Superchunk volta fazendo lembrar Pixies no começo (no pós-punk com riff doce Some green), trazendo uma vibe pós-punk trevosa (Cue) e até arriscando algo próximo de bandas como T.S.O.L. e Joy Division (em Everybody dies, parecendo um relato sobre como os telejornais, hoje em dia, são feitos de morte, sangue e guerra e ninguém parece mais se importar). Já Stuck in a dream traz tristeza e despedida na letra, e distorção doce na melodia. Songs in the key of yikes é um disco cheio de beleza e barulho.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 9
Gravadora: Merge Records
Lançamento: 22 de agosto de 2025.
Crítica
Ouvimos: Terminal Guadalupe – “Serenata de amor próprio”

RESENHA: Terminal Guadalupe retorna com Serenata de amor próprio, disco que mistura Beatles, britpop, folk e psicodelia em hinos cheios de energia.
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Para quem fica de olho nos términos, retornos, sístoles, diástoles, tapas e beijos do rock britânico – com suas bandas que começam, terminam, voltam e etc – a história da banda curitibana Terminal Guadalupe é um prato cheio. Não tem brigas de fechar o comércio (ao que consta), mas tem discos espaçados, sucesso de crítica, separação, projetos individuais, retomada de trabalhos, e uma e outra atividade para deixar os fãs felizes em meio a tudo isso.
Uma dessas “atividades” recentes foi um disco ao vivo de gravações do baú do grupo – o irônico Como despontar para o anonimato, com gravações entre 2006 e 2008, e lançado ano passado. Agora, Dary Jr (voz e letras) e Allan Yokohama (vários instrumentos) voltam com o novo disco de inéditas, Serenata de amor próprio. O TG usa sua sonoridade para abrir espaço tanto aos novos tempos quanto para obsessões musicais antigas: músicas como Foi por pouco, Vá ser feliz, Sonho não faz curva e Sara misturam Beatles, britpop, powerpop, climas ligados ao rock argentino e uma certa noção – talvez herdada de Oasis e Stone Roses – de que hinos do rock são compostos para serem cantados em clima de torcida.
No disco, Vá ser feliz faz isso ao ironizar os haters, enquanto Sara acrescenta micropontos de reggae e Nordeste à receita, e Sonho não faz curva adiciona muito de Beatles e Lô Borges. Já Volta soa como um Weezer menos punk e indie, trazendo clima esperançoso numa faixa que prega coisas como “quero todas as cores pra mim” e “bora ser feliz de novo”. Esse mesmo clima surge também no folk-rock Além da glória, nas emanações de Simon & Garfunkel de Black Jesus, no pós punk tranquilo e sombrio de Cuando me extranas e Calma, e na psicodelia de Amor, eu vou embora (com Ana Cascardo nos vocais). No final, o momento de chorar de rir com a faixa-bônus Não desanime, uma resposta bisonha a um candidato a emprego.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Independente
Lançamento: 8 de agosto de 2025
Crítica
Ouvimos: Sir Chloe – “Swallow the knife”

RESENHA: Sir Chloe, pseudônimo-projeto de Dana Foote, une noise rock, grunge e pós-punk em Swallow the knife, com dramas vocais e ecos 90s que brilham mais nos momentos pesados.
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Tem algo em Dana Foote, a popular Sir Chloe, que aponta para uma espécie de Chappell Roan do noise rock. Isso porque, ainda que Dana tenha um vocal grave e forte, tem um clima dramático que surge aqui e ali em letras e músicas de seu segundo disco, Swallow the knife. Mas vale também apontar que o rock alternativo feminino dos anos 1990, embebido em referências do country, também bate ponto em vários momentos do disco – o que já garante o diálogo entre fãs de barulho e fãs de sons mais acessíveis.
Sir Chloe, cujo vocal lembra às vezes uma Dolores O’Riordan (Cranberries) mais controlada e blasé, faz punk com cara triste (The hole), sons grunge entre Concrete Blonde e Julianna Hatfield (Forgiving, com texturas trevosas e peso nas guitarras) e canções quase no mesmo esquema loud-quiet-loud dos Pixies (Kiss, dos versos “não quero amor / eu quero vingança”, e a ótima Passenger). O típico pós-punk de bom refrão dá as caras em Forget it, Holy e Complicated – esta, com certo ar de New Order.
Take it, punk melódico que fala sobre amores e lembranças amargas, marca uma espécie de final antes do final em Swallow the knife – já que depois disso, o álbum vai desacelerando, e vai deixando saudades de quando era mais acelerado. Eyes vai pra próximo do folk meditabundo, Too much (Enough) é uma balada em tom tristinho (de versos como “tudo que tive que te dar não foi o suficiente”) e Candy já dá uma aumentadinha na pressão, com voz, guitarra e algo meio velvetiano. Quando fala alto e bota pressão, Sir Chloe manda melhor.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 22 de agosto de 2025
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