Crítica
Ouvimos: Tatá Aeroplano, “Boate invisível”

- Boate invisível é o sétimo disco solo de Tatá Aeroplano (ou Octávio Francisco de Paula Neto, seu nome verdadeiro). É também uma construção coletiva: ele, como Bruno Buarque (Criolo), Dustan Gallas (Cidadão Instigado), Junior Boca (Otto), Kika e Malu Maria juntara-se numa imersão de cinco dias num estúdio paulistano (o Minduca) e fizeram o álbum.
- Ao contrário do que costumava rolar nos trabalhos com essa turma, Tatá não levou nada pronto e foi tudo criado coletivamente. Boa parte das músicas foram compostas através de improvisos, ora começando com a bateria, ora com o baixo, ora com o piano, ora com os sintetizadores – com Thales Castanheira gravando tudo. O disco tomou forma depois da imersão, com Tatá pensando em letras e melodias, e o material sendo organizado.
Tem alguma coisa na abertura deste Boate invisível, com Alquimia sensual, que é associada mais a bandas como King Gizzard & The Lizard Wizard do que a sons mais pop ou mais dançantes – seja por um certo estranhamento, ou desconjuntamento proposital, que surge no uso dos vocoders, com uma ou outra velocidade alterada. O conceito de “boate invísível”, por sinal, parece ser o de criar um lounge intangível, no qual sons que poderiam soar pop aparecem como se fizessem parte de um sonho. Ou de uma viagem pessoal, repleta de referências pop, turbinando o que já rolava em discos anteriores de Tatá Aeroplano, como Não dá pra agarrar (2022).
Gente na praia, com uma homenagem a Gal Costa encartada no verso “todo dia Gal”, é o lado tropicalista do disco, em ritmo e solos de guitarra (de Guilherme Held, mas lembrando Lanny Gordin em alguns momentos). Carta na mão, a balada que dá prosseguimento ao disco, tem de tudo: pop britânico oitentista, MPB anos 1980 de rádio, um tom brega (no bom sentido) no andamento da canção. O chacundum eletropunk de No fusca com t-rex e o tecnopop psicodélico da faixa-título (citando nominalmente New Order no refrão) completam o equivalente ao lado A do álbum. E são músicas para colocar no repeat e decorar.
O lado mais eminentemente psicodélico, herdado de Júpiter Maçã e Arnaldo Baptista, surge com força na segunda metade do álbum, incluindo o voo psicodélico de Coffees & Mandrix, o clima meditativo e perturbador (quase uma mescla de dreampop com o Pink Floyd do álbum Atom heart mother) de Sonho de Artaud. Ali pelo meio, tem o bom tecnopop Solidão guardada, soando como se o Depeche Mode fosse produzido por Mister Sam (só ouvir o corinho da faixa), mas o encerramento é com o dub Rio voador e com a cantiga percussiva e viajante Canto mistério. A Boate invisível fecha os trabalhos equilibrada entre o tecnopop e a lisergia.
Gravadora: Voador Discos
Nota: 8
Foto: Manoel Antonio Pereira/Divulgação
Crítica
Ouvimos: DJ Guaraná Jesus – “Ouroboros”

RESENHA: Em Ouroboros, DJ Guaraná Jesus funde memórias e beats acelerados em 20 minutos de nostalgia 32-bit, funk, big beat e eletrônica pop multitonal.
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“O álbum é uma homenagem a um passado não tão distante – uma fusão de memórias e futuros imaginados convergindo para o presente”. Criado pelo produtor Julio Santa Cecilia, o projeto solo DJ Guaraná Jesus reúne memórias, música e sons eletrônicos num álbum curto (são nove faixas em menos de vinte minutos!), que voa como se fosse apenas uma faixa dinâmica, evocando desde sons de jogos em 32-bit, até sons como Prodigy e Skrillex.
Não foi à toa que ele escolheu para o disco o título Ouroboros – que nada mais é do que o conceito do eterno retorno, da morte e reconstrução, simbolizado pela serpente mordendo a própria cauda. Na real, não deixa de ser uma maneira construtiva de se referir ao próprio universo pop e à sua mistura de épocas e desenhos musicais, que aqui aponta para sons acelerados como num dia a dia anfetamínico (Vitalwaterxxfly3 e XP), sem descuidar das surpresas melódicas. E prossegue com o batidão quase funk de Mercúrio retrógrado e a viagem sonora de Unidade de medida e D-50 loop – a primeira em tom meditativo, a segunda de volta à aceleração.
- Ouvimos: Skrillex – FUCK U SKRILLEX YOU THINK UR ANDY WARHOL BUT UR NOT!! <3
- Ouvimos: Papatinho – MPC (Música Popular Carioca)
Ouroboros parte também para o heavy samba eletrônico e ágil de Brsl, o batidão-de-caixinha-de-música de Hauss_hypa_vvvv e o big beat de Firenzi dolce vitta, encerrando com um batidão que remete ao samba-funk aceleradíssimo (Campari Devochka). Algumas faixas rendem mais do que apenas poucos minutos – ou até segundos – e poderiam ser esticadas. Mas Julio, com o DJ Guaraná Jesus e Ouroboros, quis aparentemente fazer um disco que pudesse acompanhar um passeio rápido no dia a dia.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Seloki Records
Lançamento: 16 de maio de 2025
Crítica
Ouvimos: Jonabug – “Três tigres tristes”

RESENHA: No álbum Três tigres tristes, Jonabug mistura noise rock, grunge e pós-punk com letras em inglês e português, guitarras ruidosas e identidade forte
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Vindo de Marília, interior de São Paulo, o Jonabug vem sendo incluído no rol do “emo caipira”, de bandas vindas de cidades pequenas, e que são influenciadas pela cena emocore do Centro-Oeste norte-americano. É isso, mas não só isso: o grupo de Marília Jonas (guitarra, vocal), Dennis Felipe (baixo) e Samuel Berardo (bateria) é um dos melhores exemplos atuais do noise rock brasileiro. Misturando inglês e português, fazem em Três tigres tristes, álbum de estreia, um som que está mais para grunge do que para shoegaze – mesmo que invista em paredes de guitarra e ruídos.
Esse é o som de faixas como Mommy issues, Além da dor, Look ate me e At least on paper my mistakes can be erased, misturas de vocal provocativo, guitarras cheias de riffs, certo balanço na batida e vibe sombria e confessional. Músicas como Fome de fugir e You cut my wings levam o esquema do Jonabug para algo mais próximo do pós-punk. A sua voz é o motivo da minha insônia e Taste everybody’s tears dispensam rótulos e lembram a vocação ruidosa e melódica dos anos 1990. E Nº 365 é um guitar rock falado, soando quase como uma trilha de filme.
No fim, Brown colored eyes traz mais um diferencial para o som do Jonabug: é quase uma balada guitar rock, com clima tranquilo e solo de guitarra com design sonoro oriental. O Jonabug escapa de qualquer caixinha e entrega um disco coeso, intenso e cheio de identidade própria.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 15 de junho de 2025.
Crítica
Ouvimos: Monchmonch – “Martemorte”

RESENHA: Monchmonch lança Martemorte, disco punk-eletrônico gravado no Brasil e Portugal, com HQ, vinil exclusivo e vibe no-wave psicodélica.
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Lucas Monch, criador do projeto musical experimental Monchmonch, pensa grande: Martemorte, disco novo do projeto, teve sessões de gravação em Brasil e Portugal, e sai junto com uma HQ que transforma o disco em projeto visual. Também vai sair em vinil, com um lado B exclusivo da mídia física. Lucas também criou duas formações do Monchmonch, uma no Brasil e outra em Portugal.
Martemorte é um bom exemplo de punk experimental e eletrônico – tendendo para algo bem próximo da no-wave às vezes, ou da zoeira misturada de punk, funk e eletrônicos do Duo Chipa (por sinal, Cleozinhu, do Duo, participa do disco com produções, samples e ruídos). Efeitos de guitarra e sons que parecem videogames ou trilhas de desenho animado marcam Bolinha de ferro, Vala lava, o punk espacial de Jeff Bezos paga um pão de queijo e a psicodelia lo-fi de Prédios. Rola até um clima psico-krautrock em City bunda e Coisa linda.
O disco vai ainda para o punk-country sacana em Velhos brancos jovens carequinhas e para uma perversão dos Beach Boys do disco Smiley smile (1966) em Rasga céu, tema espacial-psicodélico apavorante, em que milionários e donos de big techs são fatiados sem dó.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Seloki Records
Lançamento: 17 de junho de 2025.
- Ouvimos: Ultrasonho – Nós nunca vamos morrer
- Ouvimos: Duo Chipa – Lugar distante
- Ouvimos: Vovô Bebê – Bad english
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