Notícias
Urgente!: Quando a magia de Brian Wilson voltou a funcionar
Brian Wilson, o cérebro criativo dos Beach Boys, passou décadas mergulhado em um estado de espírito mais denso e desafiador que o simples fracasso. Era, enfim, aquela coisa de observar que todas as suas fórmulas mágicas, de uma hora para outra, pararam de funcionar. Ainda que o sucesso insistisse em dar as caras, aqui e ali.
A palavra “fórmula” parecia acompanhar a história dos Beach Boys. Isso porque Mike Love, primo dos Wilson e eterno algoz de Brian no grupo, supostamente odiava as mudanças que Brian queria fazer no som dos BB. E supostamente teria soltado um ríspido “não foda com a fórmula (da banda)” numa das discussões com Brian. O “supostamente” é apenas um mínimo benefício da dúvida, porque Love cansou de negar tudo isso – disse que, pelo contrário, sempre gostou de Pet sounds (há controvérsias), que defendia Smile (mais ainda), etc.
(Por sinal, nas costas de Love repousa a responsabilidade por um dos maiores superfracassos da história dos Beach Boys: uma turnê com o ex-guru dos Beatles, Maharishi, em 1968. Um rolê que deu errado do começo ao fim. E que se resumiu a apenas três datas com som ruim, atuações cagadas – por parte dos BB – e vaias quando Maharishi abria a boca.)
Brian era aquele famoso caso de gênio incompreendido pelo mercado. Com direito a discos recusados pelas gravadoras (ao longo da vida foram vários), ordens expressas para fazer álbuns que vendessem, ideias interessantes quando ninguém ainda estava preparado para elas (o tal single engavetado de rap que ele fez em 1991).
Havia uma magia em ação ali que parece mesmo deslocada de tempo e espaço – por mais sucesso que ele tenha tido em fases anteriores. Num determinado momento dos anos 1970 tanto Brian quanto sua banda, trilhas sonoras da felicidade norte-americana na década anterior, haviam virado um troço absolutamente uncool. Mal comparando, era como ser fã de Belchior no Brasil dos anos 1980/1990.
Não que a imagem dos Beach Boys já não houvesse sido posta em cheque antes – isso ja vinha acontecendo desde a era de Woodstock. Lá por 1967 / 1968 / 1969, a estética do “sonho americano” do grupo estava em baixa e era tido como música da velha guarda. Em compensação, a turma do Norte da Califórnia (Grateful Dead, em especial) chegava à toda.
Só para você ter uma ideia: Brian Wilson era um dos caciques do festival de Monterey, realizado de 16 a 18 de junho de 1967. Mesmo assim a banda cancelou seu show no evento porque achou que o material antigo não levantaria a plateia – e Brian, comandante dos últimos movimentos do grupo em estúdio, estava sem tocar ao vivo com o BB fazia tempo.
Em 1970, os Beach Boys lançaram Sunflower, sua estreia pela Reprise Records – um disco excelente, mas ignorado por muitos. Em plena era de Led Zeppelin, Black Sabbath e do nascente glam rock, os Beach Boys pareciam completamente fora de lugar. As turnês da banda soavam mais como entretenimento nostálgico para fãs antigos do que como eventos imperdíveis. Bruce Johnston – um dos poucos membros que não fazia parte do clã Wilson – resumiu bem o clima da época: os Beach Boys eram vistos como “uma Doris Day do surfe”.
Com o tempo, o culto em torno da figura de Brian foi surgindo – trilhas de filmes resgataram a banda, jornalistas-fãs trouxeram de volta a história do aborto do disco Smile, e o próprio Brian, ainda paciente do controverso dr. Eugene Landy, foi voltando com álbuns novos. A ideia de que Brian foi um gênio demorou bastante a surgir na mente dos fãs de rock – e não custa lembrar que Pet sounds (1966), disco-virada dos Beach Boys, vendeu bem menos que os anteriores e foi visto pela Capitol, selo do grupo, como um risco não muito calculado.
O Brian Wilson que se despediu nesta quarta (11) era um cara diferente: um gênio aclamado pelos fãs, um cara cujos shows atraíam pessoas, um artista cuja ausência dos palcos (por motivos de saúde) era lamentada por quem nunca pôde vê-lo ao vivo. A magia do artífice dos Beach Boys voltou definitivamente a funcionar. Ou, vendo por outro aspecto, a genialidade de Brian demorou a coincidir com as expectativas do público e do mercado, essas duas entidades que muitas vezes, não esperam por ninguém. Seja como for, o mundo acabou, enfim, se curvando àquele som de praia, dor e vanguarda – que nunca deixou de soar, mesmo quando não era ouvido.
Texto: Ricardo Schott