Crítica

Ouvimos: Will Smith, “Based on a true story”

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“Ué, mas como assim o Will Smith gravou um disco? Ele é cantor? Achava que ele fosse só ator!”. Com o tempo, muita gente esqueceu que Will gravava discos (inicialmente como The Fresh Prince, ao lado do DJ Jazzy Jeff) desde os anos 1980 – e as novas gerações passaram a vê-lo apenas como o cara da série Um maluco no pedaço, e o astro de filmes como Homens de preto, Rei Ricardo e À procura da felicidade.

Não apenas Will foi/é cantor: sua perspectiva pop do rap ajudou a fazer com o que o estilo fosse mais ouvido durante os anos 1990, num espelho do que rolou com Gabriel O Pensador aqui no Brasil. Tem quem diga que isso fez com que o rap se infantilizasse mais, se tornasse mais comercial, mas faixas como Gettin’ jiggy wit it (1997) fizeram muita gente curtir o gênero diluído no pop, em plena era de ouro do gangsta rap, e prepararam os ouvidos de uma turma enorme. Como resultado, seus talentos de ator foram (bem) mais requisitados que os de cantor – tanto que seu último disco, Lost and found, saiu há vinte anos.

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Agora corta para 2025 e para Based on a true story. Will era tido, há duas décadas, como um rapper comportado, que não falava palavrão e que traduzia o idioma do hip hop para os fãs de música pop – era um rapper popstar, que estava mais interessado, de verdade, no mundo do cinema e das séries. Se ele decidiu gravar um disco novo, supõe-se, é porque ele tem muita coisa para contar. E em tese, tem mesmo: imprensa se metendo em sua vida, brigas na cerimônia do Oscar, seu casamento com arranjo pouco convencional, a vida em família, as armadilhas da fama, racismo no showbiz.

Dá para ver reflexos disso tudo no novo disco – um álbum que, por sinal, ele gravou sem se despir da capa de bom moço. Based on a true story é um compêndio dos conselhos que Will andou recebendo, e também traz o ator-cantor como coach e pastor protestante, em vinhetas que são estranhas pregações, e servem de introdução para algumas faixas. The reverend (Rave sermon) fala sobre resiliência, depressões e buracos ao longo do caminho (“quando eu falo em rave, quero dizer para olhar no fundo dos olhos do dragão e dizer: ‘hoje, não!’”). Essa vinheta abre Rave in the wasteland, gospel-rock-afro sobre jogar fora tudo que há dentro de você, e que não serve mais.

Based on a true story usa peso e agilidade para mandar recados, como no blues-rock-rap de Bulletproof e na cavalar Tantrum (“pego meus traumas e faço deles um hino”), e cai numa estileira mais pop no soul lento de Beautiful scars, cujo ritmo lembra Milli Vanilli. A vinheta Int. Barbershop – Day, com o antigo chapa DJ Jazzy Jeff e B Simone, fala sobre tudo que se seguiu após o tapa em Chris Rock no Oscar: cancelamento, gelo da imprensa, problemas em casa, exposição negativa, racismo velado ou nada velado. Hard times, simultaneamente um boogie oitentista e um tema no estilo da Disney (com Teyana Taylor) fala da superação de fossas pessoais. Essa, vale citar, é a melhor do disco.

Como criador de frases e de slogans certeiros, vale dizer, Smith está longe de ser um prodígio – aliás a própria escolha de um pastor como personagem do álbum parece querer dizer que não há problemas se Will decidir incorrer na auto-ajuda barata. É o que rola em vários momentos, especialmente em Work of art, gravada com o filho Jaden, e You can make it. Based on a true story serve bem como disco pop, mas há algo de mal resolvido como disco de rap em vários momentos.

Nota: 7
Gravadora: Slang
Lançamento: 28 de março de 2025

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