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Entrevista: Salomão di Pádua fala sobre “Canta Brasília para o mundo”

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Maranhense de nascimento, Salomão di Pádua começou sua carreira musical em 1992, foi morar em Brasília em 1997 e passou a fazer shows por lá e a relacionar-se com a música local. Para comemorar os 30 anos de história na música e homenagear a capital federal, seu novo álbum, que sai pelo selo GRV, é Salomão di Pádua canta Brasília para o mundo, repleto de canções de artistas que escolheram Brasília para morar.

O disco tem participação do conterrâneo Zeca Baleiro, e tem releituras como Modo de ser (composta por Clodo Ferreira, autor de canções gravadas por Fagner), e Bicicleta (de Eduardo Rangel, compositor local). Tem também blues, como em Timidez, do autor local Fred Brasiliense. Já Quase um segundo, hit dos Paralamas do Sucesso, surge em versão bossa nova. Salomão, que acaba de lançar um novo single, A musa e o menestrel, ao lado de Carlos Jansen, bateu um papo com a gente para falar do disco (colaboração de Diego Pessoa, do selo Hominis Canidae).

Como a música apareceu na sua vida?

Sempre fui envolvido com a arte, desde pequeno – na escola, na igreja – nas pecinhas de teatro. Mas só fui enveredar pela música quando cursava o ensino médio – embora eu sempre tenha dado sinais da importância da música em minha vida desde quando ouvia Rita Lee, aos dez anos, escondido dos meus avós. Nasci numa família evangélica e lá não se ouvia “música do mundo”. Durante o ensino médio ingressei no coral da escola, depois ainda cantei em mais dois ou três corais da cidade. Em 1992, por meio de um festival promovido pela Secretaria de Cultura, realizei o meu primeiro show solo. Mas antes disso eu já me interessava em dar canjas pelos bares e fazia participações especiais nos shows de amigos cantores. Em 1997 parti para Brasília, onde vivo até hoje, fazendo música, e acho que não vou parar nunca mais.

Canto e faço música porque, de outra forma, é como se a vida não tivesse sentido. Música está presente em tudo o que faço, durante as 24 horas do meu dia, seja no chuveiro, no carro, no ônibus, andando, parado, malhando… Além do mais o artista não é artista porque escolheu ser, é preciso que ele sinta que é, e como um cantor nato que sei sou, genuíno, sinto que a música também é uma missão, porque ela transforma também, faz verdadeiros milagres na vida de quem canta, toca e ouve.

Como você foi parar em Brasília?

Interessante que Brasília nunca foi pra mim um lugar onde eu pudesse ter alguma visibilidade enquanto artistas, enquanto cantor. Enquanto vivia em São Luís sempre tive Brasília como uma cidade política que existia pra cuidar do país, de uma arquitetura linear, cinzenta, fria e seca. Eu nunca imaginei que aqui seria a cidade maravilhosa, achei que era o Rio (risos). Sempre trabalhei, desde os 18 anos, em São Luís. De 1989 a 1996 eu fui servidor da Secretaria de Planejamento do Estado, concursado e tudo. Aí em 1996 uma amiga resolve mudar-se para Brasília e me convida pra conhecer. Tirei uma licença e vim, mas não era nada do que eu pensava. Uma delicia de clima, de cidade, as pessoas, amigos que fui fazendo. Então ao retornar para São Luís, só fiquei o tempo de pedir demissão. Isso mesmo. Enquanto tanta gente se mata de estudar pra passar num concurso, fui lá e pedi pra sair (risos). Cheguei aqui pra ficar em abril de 1997.

O que ainda há do Maranhão na sua arte?

Eu tento manter ao máximo o que aprendi no Maranhão, em todos os sentidos. Mas claro que quando se vive em outro lugar, durante quase trinta anos se absorve costumes e peculiaridades que de tanto tempo vai tomando conta do seu modo de ser, da sua rotina, e você só percebe isso quando retorna ao seu ninho mais uma vez. Musicalmente eu sempre incluo em meu repertório músicas de compositores queridos, do Maranhão, sempre estou em contato com todos.

Sonoramente, você transita pelo que podemos chamar de MPB e música pop. Como chegou a isso?

Os caminhos me levaram para a MPB porque foi o que cresci ouvindo. Ainda bem que sou da época em que só se ouvia coisa boa, toda a safra da música popular brasileira da minha época é boa, permanece e é imortal. Tenho o privilégio de ter ouvido Rita Lee, Elis Regina, Clara Nunes, Tom Jobim, Cássia Eller, artistas que me ensinam muito ainda, porque a música se perpetuou. Tive a sorte de ter sido escolhido pela MPB, e se eu tivesse a oportunidade de escolher a escolheria com certeza. O pop, o samba, o baião, a bossa são estilos com os quais eu trabalho e tenho muita sorte por ter sido acolhido pela música pra fazer exatamente o que amo fazer, música popular brasileira.

Alguns álbuns da sua extensa carreira não estão nos streamings. Por que?

Quando gravei o primeiro, Entre sambas e canções (em 2007), o único álbum que não está em streamings, a intenção era ter um cartão de visitas para apresentar melhor o meu trabalho, um CD-demo, como chamávamos. Eu ganhei o patrocínio de um amigo que infelizmente faleceu antes do CD ficar pronto, gravei 14 faixas entre músicas consagradas e inéditas. Não comercializei por não ter os direitos autorais de todas as faixas. E então chegaram as lojas digitais e também os outros álbuns que consegui jogar nos streamings, e nunca consegui verba suficiente para a liberação das músicas. Mas ainda farei isso.

O novo álbum é uma homenagem à Brasília e também à sua carreira que chega aos 30 anos. Como foi o processo de escolha das faixas? Foi muito difícil deixar canções de fora?

Muito difícil. Na verdade, tivemos que estabelecer um critério já que íamos deixar tanta música boa de fora. Então buscamos considerar os nomes dos autores. Quem era importante gravarmos? Mesmo assim ainda ficou gente de fora. Por coincidência alguns dos selecionados tinham verdadeiros clássicos da música de Brasília, a exemplo de Renato Matos, Eduardo Rangel e Paulo Mattos, dos quais gravei Um telefone é muito pouco, Bicicleta e Pequena mágoa, três hits consagrados em suas respectivas épocas que não poderiam ficar de fora. Então garantidas essas três, as outras vieram pelo que fui sentindo, simplesmente pela emoção, então trouxe a balada, o blues, o samba, a bossa-nova. E para a missão de escolha desse roteiro eu contei com o meu amigo Agilson Alcântara, produtor musical desse trabalho e ainda responsável por todos os arranjos e a direção musical.

Senti falta de alguma coisa da Legião Urbana, banda formada por artistas que não são nascidos em Brasília mas se criaram na capital. Não pensou em gravar nada deles?

Na verdade eu gostaria de gravar uma sequência de álbuns (volume 1, 2… 10) desse projeto. Infelizmente o recuR$o que recebemos não nos garantiu o pagamento de tantos direitos autorais, por isso a maioria da música é liberada de forma direta (negociada com o próprio compositor). E tivemos que eleger uma música nacional que representasse Brasília, então escolhemos Herbert Vianna, mas poderíamos sim ter escolhido alguma do Legião…

O ideal seria fazer como o Emílio Santiago, uma aquarela só de músicas de Brasília, parte 2, 3, 4… (risos). Música com certeza não faltaria. Muita música boa ficou de fora, com certeza, mas infelizmente não temos como fazer esse planejamento já que dependemos de recursos, sendo artistas independentes como somos.

Particularmente curti a inclusão de Um telefone é muito pouco, que nos anos 1980 foi gravada pelo Leo Jaime e tocou no rádio. O que representou essa música pra MPB de Brasília, pelo que você se recorda, já que é uma música que ficou bastante popular nessa época?

A gente teve que levar em consideração alguns critérios e o principal deles é o autor, então pela história do Renato Matos, um dos artistas mais conhecidos no cenário brasiliense, a gente escolhe sua música mais famosa Um telefone é muito pouco. E nossa responsabilidade de manter a qualidade, dando a nossa interpretação a nossa releitura foi um grande desafio. Essa música com certeza marca uma época de explosão musical não só em Brasília, mas em todo o Brasil.

O que o futuro te reserva? Já existem novos planos?

A princípio queremos trabalhar mais a divulgação desse novo álbum e tentar levá-lo o mais longe possível dentro do nosso quadradinho (DF) ou, quem sabe, fora dele. Aí necessariamente teríamos que ter um programa de incentivo ou um edital, já que os custos de um espetáculo não é barato. Fizemos recentemente um lindo show de lançamento no Teatro SESC Garagem, e contei com uma campanha de financiamento coletivo que deu muito certo. E isso é o que faz com a gente siga acreditando no nosso trabalho. Um dos meus planos como artista é fazer de algum modo um projeto de intercâmbio entre o Maranhão e Brasília, tendo em vista a quantidade de maranhenses residentes na capital federal. Com certeza teríamos um público significativo.

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