Cultura Pop
E o XTC entrou em greve…
“A noção de popstars entrando em greve já é uma diversão por si só. Se enfermeiras, maquinistas de trem ou professores decidem não trabalhar, é óbvio que isso vai provocar um efeito em todo mundo. Agora, pop stars? É dureza mobilizar uma nação para isso”. Isso aí era o diário britânico Telegraph, há vinte anos e uns quebrados (foi em 8 de fevereiro de 1997) avisando que a banda inglesa XTC estava saindo de uma greve de quatro anos, em protesto contra a gravadora na qual gravava havia mais duas décadas, a Virgin.
O grupo já estava sumido dos palcos desde 1982, quando cancelaram vários shows por causa da síndrome do pânico do cantor e guitarrista Andy Partridge. Sem fazer turnês, a banda lançou grandes álbuns. Entre eles, “The big express” (1984) e “Oranges and lemons” (1989). Criaram também o projeto paralelo psicodélico Dukes Of Stratosphear (que gravou dois discos). E passaram a ter vários problemas com a Virgin, culminando no lançamento do single “Wrapped in grey” (1992), ignorado pela gravadora (Partridge disse em entrevistas que o selo mandou destruir cópias do disco).
Foi especialmente por causa disso – embora o grupo já reclamasse de questões financeiras havia tempo – que o pau quebrou entre a banda e o selo. Para obrigar a Virgin a renegociar o contrato, ou a desocupar a moita de vez, o XTC ficou quatro anos sem gravar nada. Nesse período, a gravadora do empreendedor Richard Branson ainda fez dinheiro com duas coletâneas do grupo. “Estimamos que a gravadora tenha feito mais de 30 milhões de libras em cima da gente em 18 anos de carreira, e não lucramos nada com isso”, contou Partridge no papo com o Telegraph.
Foram quatro anos duros. O baixista Colin Moulding e o baterista Dave Gregory trabalharam numa empresa que localizava carros usados abandonados. O versátil Partridge foi produzir outros artistas, mas acabou se dando mal. Um de seus primeiros jobs foi o segundo disco do Blur, “Modern life is rubbish” (1993), mas a gravadora da banda acabou afastando-o e colocou Stephen Street (Smiths) em seu lugar. Em entrevistas, Partridge reclamou de não ter sido pago pelos dias em que se trancou no estúdio com o grupo. Pra piorar, o músico também terminou seu primeiro casamento e ficou doente por vários meses.
Seja como for, o inconformismo do XTC viralizou e fez escola: naquele mesmo ano, a cantora Michelle Shocked entrou em greve contra a Mercury Records e conseguiu o cancelamento de seu contrato. Em 1993, Prince escreveu a palavra “escravo” no rosto e adotou um símbolo impronunciável como nome, como forma de protesto contra a gravadora Warner e ainda declarou à Rolling Stone que “quando você faz um homem parar de sonhar, ele se torna um escravo. É o que eu era. Não tenho a propriedade das minhas músicas. Se você não é o dono dos seus masters, eles são seus donos”.
Mais: questões parecidas levaram Michael Jackson a brigar com a Sony em 2001 e o rapper Dr. Dre a processar a própria gravadora que fundara (e havia deixado), a Death Row, em 1996. Dois anos depois, foi a vez da boy band NSync sair no tapa com sua gravadora Trans Continental. Quem também embarcou numa batalha parecida com a do XTC foi ninguém menos que George Michael, que se sentiu jogado pra escanteio pela Sony após o brilhante disco “Listen without prejudice vol.1” (1991). O popstar também passou um bom tempo processando a multi, indo e voltando de tribunais, sem lançar nada (e, que coisa, acabou contratado pela mesma Virgin do XTC).
E o XTC? Bom, a banda lançou o selo Idea Records e soltou dois discos por lá, “Apple Venus vol.1” (1999) e “Wasp star (Apple Venus vol.2” (2000). O grupo acabou em 1996, com Patridge e Moulding, os principais compositores, declarando que a amizade e a parceria entre os dois havia se encerrado. Um documentário sobre o grupo, “This is pop!” já rola por aí e vai ser até exibido no festival In-Edit esse ano.
Outro doc interessante sobre o MTV tem no YouTube e já foi assunto do POP FANTASMA. É o histórico “XTC at the Manor”, da BBC, mostrando os bastidores de uma gravação do grupo em 1980 – e que tem participação do próprio chefão da Virgin, Richard Branson, já que ele era o dono do estúdio no qual a banda aparecia gravando (o tal “Manor”).